Resenha sobre o filme Pixote

21/04/2015 às 16:09
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O filme Pixote retrata a história de um menino que não conhecia seus pais e era morador de rua, seu nome deu origem ao título do filme.

O filme Pixote retrata a história de um menino que não conhecia seus pais e era morador de rua, seu nome deu origem ao título do filme. Depois de uma tentativa de furto de uma carteira que ocasionou na morte de um desembargador, Pixote (Fernando Ramos da Silva) é levado para um reformatório (FEBEM), juntamente com mais alguns jovens.

Naquele lugar, onde era para haver o processo de ressocialização dos menores, aconteceu exatamente o contrário, serviu de escola, da qual Pixote e seus colegas saíram analfabetos como entraram, porém, não inocentes para o crime. Ali, eles aprenderam que o sistema é dotado de toda hipocrisia, falsidades, desonestidades e inoperância com relação ao que era para ser o seu objetivo principal, ou seja, o zelo pelos direitos da criança e do adolescente e capacitá-los para o reingresso na sociedade. Pois, naquela escola, os menores eram vítimas de abusos, violências, humilhações etc. por parte dos outros jovens, bem como eram torturados, negligenciados, maltratados, humilhados, abusados, violentados e até mortos por aqueles que deveriam lhes proporcionar proteção. Ainda, eram forçados a assumir a culpa pela morte dos próprios colegas. Por isso, não suportando mais aquela situação, o grupo de Pixote e outros jovens decidem fugir da escola.

Aqui, cabe um breve parêntesis. Se ali é uma escola, imagine o nível superior, a faculdade, a universidade, o presídio.

Assim, depois de terem passado pela escola, com o ensino fundamental completo ou quase, o grupo de Pixote chegam às ruas novamente para aterrorizar. Começam com pequenos lances (pequenos furtos de carteiras, bolsas etc), passam em seguida para pequenos aviões (entrega de pequenas encomendas de droga), e acabam se tornando assaltantes, assassinos, cafetãs, ou seja, profissionalizaram-se no crime.

Sem querer fundamentar, muito menos fazer um comentário ou estudo aprofundado sobre o assunto, mas, apenas relembrar e refletir. Segundo alguns psicólogos, o ser humano nasce com a sua personalidade formada, porém, o seu caráter é moldado no dia-a-dia, pelo seu contexto social, educacional, econômico, moral, religioso, histórico. Desta forma, pode-se inquirir que se estes jovens tivessem passado por um cuidado maior de regeneração, com uma devida preocupação em buscar seus familiares e dar o devido suporte, econômico, moral, educacional etc. Se o local que eles nasceram e moraram fosse assistido de forma devida pelos governos, com sistema de educação, saúde, habitação, saneamento básico etc., será se esses jovens teriam os fins que tiveram?

Aqueles jovens, do grupo de Pixote, por terem escolhido?sido empurrados?forçados? àquela vida, tiveram fins trágicos. Chico (Zenildo Oliveira Santos) foi morto pela loira trapaceira, Débora (Elke Maravilha); Lilica (Jorge Julião) apenas sumiu; Dito (Gilberto Moura) foi morto por engano por Pixote, este ficou vagando sem rumo na linha férrea depois de ter sido expulso por Sueli (Marília Pêra); e os outros jovens que fugiram da escola junto com o grupo de Pixote apenas foi ignorado, assim como muitas partes do filme que foram trazidas pelo autor e esquecidas sem nenhuma explicação, de forma proposital ou por erro, não sei, meu conhecimento cinematográfico é muito pouco para fazer esta análise.

Contudo, aqui cabe mais uma reflexão. O argentino Hector Babenco, que ficou famoso internacionalmente depois de ter dirigido este filme, deixou a desejar muito em trazer alguns pontos de destaque no filme, mas, omitir-se em expor os verdadeiros culpados, a origem de todas aquelas mazelas, que eram os políticos ditadores, os quais se diferenciavam bem pouco dos da atualidade. Essa prática do diretor nos faz lembrar da atitude corriqueira por parte da maioria da população do Brasil, seja autoridades, governos, igrejas, famílias. Todos se comovem com um estupro de adolescente, assim como muitos se comoveram com aquele que aconteceu no filme. As pessoas ficam chocadas com ações de menores como aquela que uma criança foi arrastada até a morte por ter ficado preso ao cinto de segurança e não ter saído do carro da sua mãe, após os bandidos (menores) terem tomado de assalto. Porém, passado pouco tempo ninguém dá mais ênfase a isso, ninguém se move depois para provocar uma análise, um estudo de caso, a fim de encontrar soluções para estes jovens. Depois de 32 anos do filme, 23 anos de ECA as coisas estão bastante semelhantes. Aliás, agora está em pior, cada vez mais jovens são vítimas do crack e outras drogas, da violência e de outros tipos de violações a seus direitos. Cada vez mais cresce a cultura do jovem almejar por entrar na FEBEM, em uma viatura da polícia, no presídio, deseja-se ser bichão, ser o cara, que triste realidade, a que ponto deixou-se chegar. O procedimento é sempre o mesmo, o menor comete o ato infracional, coloca-se na escola, depois ele sai. Na melhor das hipóteses, ele volta para casa e procura ser outra pessoa (tá bom, eu sei, mas, vamos imaginar, vamos viajar no mundo da fantasia agora). Então, o menino chega à casa. Os vizinhos usando e/ou vendendo drogas. A mãe e o pai totalmente desequilibrados ou eles e os irmãos estão sem ter nada para comer, com a casa caindo os pedaços, consequentemente o menor não vai ter cabeça para estudar, o traficante não para de lhe oferecer o mundo da lua. Por outro lado, o governo omisso, as ongs omissas. Aliás não, elas trabalham muito, umas ajudando as pessoas, outras desviando as verbas. É o mais novo e eficiente meio de desviar o dinheiro público. Isso tudo colabora para que o menino volte ao mundo do crime e, consequentemente morra cedo, mas, não é o filho deles mesmo. Eles vão se preocupar para quê?

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Mas, deixando a emoção de lado e voltando ao diretor, ele teve uma iniciativa tremenda em convidar meninos, atores amadores, provenientes de bairros periféricos de São Paulo e Rio de Janeiro, de favelas, jovens que vivenciavam experiências semelhantes àquelas passadas pelas personagens do filme. Lastimosamente, pelo que se pode perceber com as críticas ao filme, o contrato com os atores foi limitado ao tempo que eles estavam atuando ou então eles foram lesados depois que o filme alcançou patamares significativos, chegando até ao mercado cinematográfico estadunidense. Outrossim, os governos e a sociedade brasileira não deram o suporte devido a esses artistas depois do filme. A Rede Globo convidou Fernando Para atuar em outros papeis, porém, sem dar o suporte educacional devido. Assim, o menino não conseguia decorar as suas falas, pois, ele era semi-analfabeto. Por isso, muitos voltaram a ficar pobres e outros a ingressar na vida criminosa, como exemplo, o próprio protagonista do filme, Pixote, que acabou pagando por isso com a morte. Fernando Ramos da Silva morreu em 1987, provavelmente por policiais, em uma batida policial, depois de ter sido perseguido por estes após o cometimento de mais um crime.

Talvez, de atitudes como a do diretor Babenco, no se refere à convocação desses meninos da própria favela, no início da década de 80 fez surgir e amadurecer ideais para o surgimento da lei 8069 em 1990 e outras iniciativas em prol da criança e do adolescente no Brasil. Por isso, é necessário cultivar esses tipos de iniciativa, mas não só, é importante acionar na mesma direção para que no futuro, não muito distante, sejam assegurados todos os direitos da criança e do adolescente, não só na letra, mas também, na prática, priorizando a proteção e dando mais valor ao jovem enquanto ele ainda não ingressou no crime, buscando proporcionar a este indivíduo um ambiente saudável no mais completo sentido da palavra. Para que continuar gastando mais com o delinquente quando se pode gastar menos antes que o jovem se torne um criminoso?

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Sobre o autor
Alexandre Dias Carneiro

licenciado em letras com língua espanhola e bacharel em direito pela UEFS; bacharelando em teologia pelo CETAD; e especializando em direito processual penal pela Candido Mendes.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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foi elaborado para avaliação do 8º semestre do curso de direito

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