Regulamentos
O autor conceitua regulamentos como regras jurídicas gerais, abstratas, impessoais, em desenvolvimento da lei, referente à organização e ação do Estado, enquanto Poder Público. São emanados pelo Poder Executivo, mediante decreto. Classificam-se em regulamentos executivos, ou de execução, em autorizados ou delegados, e em independentes ou autônomos.
Em relação aos regulamentos independentes ou autônomos o autor destaca que encerram poder remanescente da antiga atribuição legislativa dos monarcas, nos regimes autocráticos, ao abdicarem, paulatinamente, do seu poder de legislar, na marcha para os regimes populares, aristocráticos e democráticos, aos corpos representativos do povo, a quem entregam, de início, a participação na elaboração da lei e, ao depois, a obra legislativa.
Enfeixam faculdade regulamentar praeter legem e mesmo contra legem para regular qualquer matéria que constitucionalmente não tenha sido reservada aos órgãos legislativos, pertinentes às relações do Estado-poder com terceiros.
Os regulamentos autônomos, segundo o autor, subdividem-se em três categorias:
1.regulamentos autônomos orgânicos – são aquelas regras jurídicas decretadas pelo Executivo que dão organização à Administração Pública, limitado, tão somente, ao delineamento de sua estrutura, quanto às repartições públicas e agentes públicos, pela verba geral para levar a efeito tais despesas, nos termos orçamentários ou créditos especiais;
2.regulamentos autônomos regimentais – regulam as condições internas de execução dos serviços públicos e a maneira de sua utilização por terceiros interessados. Constituem, muitas das vezes, simples instruções sobre o funcionamento das repartições públicas;
3.regulamentos autônomos policiais – Enfeixam regras jurídicas para manter a ordem do Estado-sociedade e, assim, resguardar a segurança pública e a salubridade pública e preservar a liberdade e a propriedade dos indivíduos.
O autor destaca que os regulamentos autônomos são muito difundidos na Europa, sendo a França o que lhes empresta mais ampla utilização.
Na Alemanha, tanto na época monárquica, da Constituição de 1870, como na republicana, da Constituição de Weimar, de 1919, a obra legislativa era complementada pelo Executivo, através de regulamentos jurídicos externos, em desenvolvimento aos textos legais, mediante regulamentos autorizados ou delegados, ou para sua melhor aplicação, através de regulamentos executivos. E assim continua até o presente momento. Na Alemanha, os regulamentos administrativos internos equivalem aos regulamentos autônomos ou independentes no que diz respeito ao estatuto dos agentes públicos e à organização das repartições públicas e à prestação dos serviços públicos.
Na Itália, após a proclamação da República e promulgação da nova Constituição, ficaram bem restritos os poderes do Executivo quanto à emanação dos regulamentos orgânicos, pois as repartições públicas, nos seus expressos termos, são organizadas segundo disposições legais.
Em relação aos regulamentos autorizados ou delegados, o autor define como aqueles emanados pelo Executivo em razão de habilitação legislativa que lhe é conferida pelo Legislativo, porém nos termos desta determinação de competência, para desenvolver os preceitos constantes da lei de habilitação, que delimita seu âmbito a respeito. Alguns autores sustentam que eles se confundem com as ordenanças delegadas.
No entanto, para este autor, uma coisa é delegar o poder de legislar sobre o direito educacional, e outra habilitar o Executivo a regulamentar o texto de lei em que fixam as diretrizes a respeito. Ao levar a efeito essa delegação, o faz na conformidade da matéria demarcada no texto legal.
Desta forma, o autor afirma que os dispositivos complementares, em desenvolvimento, estão virtualmente contidos na lei de habilitação, embora tenham a força de alterar a ordem jurídica anterior.
O autor questiona sobre se é possível ao Legislativo dar habilitações regulamentares ao Executivo quanto ao regime constitucional estabelece a separação dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. Se corresponder à ampliação legislativa dos poderes regulamentares de simples execução, para inovar na ordem jurídica, segundo os preceitos legais, completando-os, ante o alargamento da faculdade regulamentar, em que o arcabolço legislativo está gizado na lei e o regulamento apenas o desenvolve, não se apresenta como delegação do poder de legislar, mas como sua regulamentação. Neste sentido, não se fere o princípio da separação dos poderes.
O autor explicita que a Inglaterra e os Estados Unidos não ficaram imunes a esse movimento. Embora em teoria o poder de legislar seja reservado ao Parlamento Inglês e ao Congresso Norte-Americano, na prática vem cada vez sendo mais sendo confiado a outros órgãos, por delegação.
Os regulamentos contingentes são os que o Legislativo delega ao Executivo as operações de acertar a existência de fatos e condições para a aplicação da lei, os pormenores necessários para que suas normas possam efetivar-se. Na realidade, essa atividade não é legislativa, é antes executiva. Certo, essa fixação de índices para aplicação da norma, embora textos legais minuciosos possam contê-los, não exprime norma jurídica obrigatória de ação. Por isso, os juristas denominam dispositivos legais de tal natureza de textos secundários de lei, em oposição aos textos primários.
O autor ensina ainda que ale da delegação ao Executivo para promulgar os regulamentos contingentes, o Legislativo, com aquiescência do Judiciário, confere-lhe poderes para promulgar regulamentos suplementares às leis por eles votadas. Então, desenvolve, em pormenor, através de normas coercitivas, o texto legal, objeto de simples diretrizes esboçadas pelo legislador, e, assim, enche o branco por ele deixado. Essas leis de habilitação se denominam leis-esqueleto, por serem guarnecidas pelas normas regulamentares.
Quanto aos regulamentos executivos, o autor explica que estes envolvem regras orgânicas destinadas a pôr em execução os princípios institucionais estabelecidos pela lei. Desenvolvem ao textos legais para efeito tão-somente de sua aplicação, atendendo às peculiaridades locais ou de tempo, às possibilidades de sua execução e às circunstâncias de sua atuação.
Em relação ao âmbito dos regulamentos, o autor assevera que o regulamento na rege relação jurídica entre particulares, mas do Estado-poder com terceiros, sejam servidores públicos, sejam particulares.
É de se observar que o regulamento, como norma jurídica independente da lei, só tem sua razão de existir com a concepção da teoria da separação dos Poderes, de modo que a atividade de fazer leis fique entregue aos órgãos legislativos e a de executá-las aos órgãos executivos. Então, para a boa aplicação da lei, nas relações entre Estado-poder e particulares, surgiu a interesse do Executivo regulamentá-las, através de regulamentos executivos.
Abordando a questão do regulamento no direito pátrio, o autor inicia afirmando que não existem regulamentos autônomos no Brasil, em decorrência do princípio constitucional da legalidade, que garante que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer (algo) senão em virtude de lei.
No entanto, podem existir regulamentos, tanto executivos quanto delegados, desde que tenham por conteúdo regras orgânicas e processuais destinadas a pôr em execução os princípios institucionais estabelecidos por lei, ou para desenvolver os preceitos constantes de lei, expressos ou implícitos, dentro da órbita por ela circunscrita, isto é, as diretrizes, em pormenor, por ela determinadas.
Relação entre lei e o regulamento
A lei e o regulamento distinguem-se sob o aspecto material e formal. Segundo a matéria, a diferença está em que a lei inova originariamente na ordem jurídica, enquanto o regulamento não a altera. Isso é verdade tanto para o regulamento executivo, que desenvolve a lei para efeito da sua aplicação, como para o regulamento autorizado ou delegado, porquanto a modificação na ordem jurídica, que resulta dos seus preceitos expressos, deve já estar virtualmente contida nas disposições programáticas, que lhe dão habilitação legislativa. Só os regulamentos autônomos ou independentes inovam livremente na ordem jurídica. Porém, como observado, constituem verdadeiras leis.
Portanto, a lei é fonte primária do Direito, ao passo que o regulamento é fonte secundária, inferior.
Quanto à natureza jurídica dos regulamentos, o autor afirma que o regulamento é um ato menos geral e abstrato que a lei, e, assim, corresponde à sua imediata execução. Entretanto, tomada a palavra executivo como ato concreto, específico e pessoal, em oposição ao ato normativo, abstrato, geral e impessoal, se há de concluir que o regulamento é um ato normativo, e não executivo, e até, se se quiser, legislativo secundário.
Desta forma, sem síntese, o autor explica que compete ao Executivo adaptar a lei para sua boa aplicação, mediante regulamentos executivos. Logo, deve ser essa atividade considerada, enquanto tal, atribuição do Executivo, independentemente de textos expressos, como problema técnico-jurídico para sua execução.
O autor frisa ainda que existem limites ao poder regulamentar, os quais são decorrentes do direito positivo. O regulamento não pode ampliar os poderes jurídicos constantes da lei. Entendem alguns juristas que também não os pode restringir, porque impor restrições ao exercício de uma competência envolve, na verdade, sua modificação.
Quanto ao tema das leis que dependem de regulamento, o autor ressalta que há leis que independem de regulamento para sua aplicação. Outras, no entanto, necessitam de regulamento para tornar possível a sua aplicação. A falta deste impede sua execução. O poder regulamentar conferido constitucionalmente ao Executivo é um direito, e ao mesmo tempo, um dever, Corresponde ao chamado direito-função.
O autor explicita também que um regulamento pode facultar a produção de efeitos anteriores à data de sua promulgação, embora posteriores à da entrada em vigor da lei. Isso porque lhe cabe dar aplicação a esta, processar a execução das suas determinações.
O autor esclarece ainda que em princípio, cabe ao chefe do Executivo o poder regulamentar. Mas por texto competente da lei, se tal atribuição não lhe ficou constitucionalmente atribuída em caráter privativo, pode ser conferida aos ministros ou secretários de governo, mediante habilitação legislativa, e o próprio chefe de governo pode transferir-lhes esta competência.
Segundo o autor ora ratado, o regulamento tem a mesma forma da lei. Compreende, portanto, três partes: preâmbulo, texto e fecho. E cada uma delas possui elementos iguais aos existentes na lei.
Quanto à vigência do regulamento, entende uns que será nos mesmos prazos previstos para as leis entrarem em vigor. Já outros sustentam que entra, então, imediatamente em vigor.
O autor é da opinião que a vigência se deve dar imediatamente após a publicação. As razões políticas de conhecimento e análise do texto para obediência, que aconselham a dilatação do prazo para entrada em vigor da lei, não tem o mesmo alcance para o regulamento executivo. Já se se trata de regulamento autorizado e regulamento autônomo a situação é diversa. Neste caso justifica-se regime jurídico semelhante ao da lei quanto á sua entrada em vigor.
O autor explica ainda que o regulamento que contrariar a lei regulamentada, ou outra lei em vigor, e a Constituição será nulo. E quando houver sucessão de uma entidade por outra, seja pelo fracionamento da primeira e criação da nova em conseqüência, ou desaparecimento da anterior e surgimento de outra em seu lugar, os regulamentos da antiga, como ocorre com as leis, permanecem em vigor enquanto não revogados.
O autor esclarece também que os atos praticados em desobediência aos regulamentos padecem de nulidade, pois, como as leis, constituem regras jurídicas imperativas, também obrigam, e de forma coercitiva. Sequer o órgão executivo que os emana pode desobedece-los sob pena de nulidade do seu ato concreto e específico.
Por fim, o autor ensina que as mesmas regras pertinentes à aplicação da lei no tempo e no espaço aplicam-se ao regulamento. O regulamento não pode ter aplicação retroativa e há de respeitar o direito adquirido ou a situação jurídica definitivamente constituída, bem como o ato jurídico perfeito. Só tem aplicação imediata, e, por isso, cumpre respeitar os fatos jurídicos realizados no passado. Por outro lado, em princípio, só obriga no espaço nacional. Excepcionalmente obrig também no espaço estrangeiro, quando lá tiver aplicação a lei por ele regulada.