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Os caminhos da tributação dos provedores de acesso

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01/05/2003 às 00:00
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Sumário: I – Resumo; II – O conceito de provedores de acesso; III - Tributação dos provedores de acesso: ICMS ou ISS; IV – A regra de incidência tributária e os provedores de acesso; V – Conclusão; VI – Referências.


I – Resumo

            A legislação tributária possui previsão de diversas hipóteses suscetíveis de sofrerem incidência tributária e, nos dias atuais, praticamente todos os atos praticados pelos contribuintes no mundo dos fatos se enquadram em um tipo legal tributário. Ainda assim, devido ao desenvolvimento tecnológico, iremos encontrar alguns atos do sujeito passivo, do contribuinte, que não estão previstos em nenhuma espécie tributária e que deveriam estar, a princípio, fora do mundo da incidência.

            No que se refere ao âmbito da informática, encontraremos questionamentos que pairam sobre o serviço realizado pelos provedores de acesso à internet e, se eles podem ou não, se configurar em relações jurídicas tributárias.

            Ocorre que tais relações, decorrentes do provimento de acesso à internet e dos demais serviços prestados, como a organização de home pages, vêm sofrendo tributação ora de ICMS de competência dos Estados e do Distrito Federal, ora de ISS, de competência dos Municípios, para o que ainda não temos decisão judicial pacífica sobre o assunto.

            Analisamos, por ora, a possibilidade de haver incidência de tributos sobre estas relações jurídicas realizadas entre os provedores de acesso e seus usuários, e confrontamos esta hipótese com os princípios informadores da tributação e com os requisitos legais, indispensáveis para que se configure uma relação jurídica tributária, como o é a necessidade de previsão legal e expressa de todos os elementos desta obrigação.


II – O conceito de provedores de acesso

            A questão das formas de tributação existentes nas diversas operações referentes ao uso da internet é demasiado ampla e polêmica. Neste meio de troca de informações instantâneas há uma conjugação de diversos serviços e operações, referentes a diferentes bens ou serviços.

            Nos provedores de acesso, tudo tem início, em regra, com um serviço de comunicação de qualquer natureza realizado pela empresa telefônica ao usuário (1), observada também a possibilidade de haver conexão via cabo, sem a prestação da empresa de telefonia, e outros meios mais avançados que possivelmente surgirão, como uma conexão via satélite. Deste momento em diante, este usuário da empresa de telefonia passa a acessar geralmente uma outra empresa (2), a provedora de acesso à internet, que lhe presta um serviço diverso do primeiro, agora o de disponibilizar aos seus usuários um canal que acesse a rede mundial de computadores via internet.

            Primeiramente devemos entender o que realiza a empresa provedora de acesso para, em seguida, verificarmos se este é um serviço de comunicação paralelo ao que é prestado pela empresa de telefonia e suscetível de tributação pelo ICMS; se é um serviço adicionado e sujeito à incidência do ISS nos termos do artigo 61 da Lei n.º 9.472/97 ou, ainda, se a provedora de acesso é uma usuária dos serviços de telefonia e realiza um outro serviço, o qual não faz parte do conceito de comunicação e deve, portanto, ser incluído na lista de serviços do ISS para que somente a partir daí sofra referida tributação.

            O conceito de comunicação, segundo o Dicionário Houaiss da língua portuguesa é, dentre outras significações, de:

            Ação de transmitir uma mensagem e, eventualmente, receber outra contra mensagem como resposta. (...) Processo que envolve a transmissão e a recepção de mensagens entre uma fonte emissora e um destinatário receptor, no qual as informações são transmitidas por intermédio de recursos físicos (fala, audição, visão, etc.) ou de aparelhos e dispositivos técnicos, são codificadas na fonte e decodificadas no destino com o uso de sistemas convencionados de signos ou símbolos sonoros, escritos, iconográficos, gestuais, etc. (3)

            E, para os provedores de acesso, para as empresas que realizam o contato entre o usuário e a rede de internet por meio de seus computadores permanentemente conectados à rede, encontramos a seguinte definição:

            Empresa ou organização que tem instalada uma conexão de alta capacidade com uma grande rede de computadores, e que põe à disposição de outros usuários o acesso a esta rede, por meio de linhas telefônicas ou cabos, cobrando ou não pelo serviço (4).

            Partindo destes conceitos, iremos analisar adiante os questionamentos sobre as possíveis incidências tributárias, as quais citamos no início deste estudo.


III - Tributação dos provedores de acesso: ICMS ou ISS?

            Ressaltamos inicialmente que, o serviço de telefonia, o qual dá suporte para a existência do acesso à internet quando de sua transmissão via telefone, já é tributado pelo imposto sobre "operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações se iniciem no exterior (5)" ou ICMS de competência dos Estados e do Distrito Federal já que, sem maiores questionamentos, se trata de um serviço de comunicação.

            Quanto ao conflito de competência, seja estadual ou municipal para se tributar o serviço prestado pelas empresas provedoras de acesso à internet, respectivamente por ICMS ou ISS (6), observamos primeiramente a espécie de atividade que os provedores de acesso realizam:

            O provedor de acesso à Internet, para execução de seu objetivo que consiste, basicamente, na disponibilização a seus usuários de um canal de acesso à rede internacional de computadores, contrata com uma empresa prestadora de serviços de telefonia a locação de uma porta em um dos roteadores da rede internet, com o intuito de atuar como meio de conexão entre usuários e tais empresas, celebrando com estes um subcontrato. (7)

            Parte da doutrina entende que, neste caso, deverá haver a tributação de ICMS, entendendo tratar-se, o provimento de acesso à internet, de um serviço de comunicação, como nos explica Aldemario Araújo Castro:

            No acesso à Internet, o provedor fornece ao seu usuário, por intermédio de seus equipamentos, um endereço IP (Internet Protocol) temporário (válido para uma sessão de acesso à rede) que viabiliza a chamada navegação pelos sites ou páginas existentes na Internet, garantindo que os pacotes de informação particionados pelo TCP (Transmission Control Protocol) sejam enviados aos destinos certos. Ora, nestes casos, temos o internauta como receptor, o responsável pelo site visitado como emissor, o conteúdo da página localizada como a mensagem. O último elemento, o meio ou canal de comunicação, mais precisamente o endereço lógico temporário para viabilizar a visita às páginas desejadas, não é fornecido pelas empresas de telecomunicações envolvidas na operação, e sim, pelo provedor de acesso. Se o provedor fornece os meios ou canais de comunicação, especificamente no ambiente da Grande Rede, o serviço por ele prestado qualifica-se como de comunicação sujeito ao ICMS.

            Por outro lado, outros autores entendem que os provedores de acesso são tomadores dos serviços prestados pelas empresas de telefonia, juntamente com os demais usuários de seus serviços, não sendo, portanto, sujeitos passivos do ICMS, acrescentando, Ives Gandra da Silva Martins a observação de que:

            É de se notar que a esmagadora maioria dos autores entendeu que os provedores de acesso exercem atividade não sujeita ao ICMS, mas ao ISS, dependendo, para que seja tributada, de lei complementar que a coloque em lista de serviços. E há, no momento, no Congresso Nacional, projeto de lei complementar para incluir o serviço dos provedores de acesso na lista de serviços sujeitos ao ISS, nos termos determinados pela Constituição Federal (art. 156, inciso III) (8).

            Quanto à hipótese de se tratar, o serviço prestado pelos provedores de acesso, de um serviço adicionado, novamente Aldemario Araújo Castro observa que:

            Não parece correta a invocação, para o caso, da presença de serviço de valor adicionado. Primeiro, porque o legislador não afirmou que o ato de prover acesso à Internet se qualifica como tal. Depois, porque a atividade do provedor enquadra-se como de comunicação, como antes explicitado.

            O serviço de valor adicionado é definido pelo artigo 61 da Lei n.º 9.472/97 (Lei Geral de Telecomunicações) como sendo aquele que "acrescenta, a um serviço de telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou recuperação de informações", o que não abrange o serviço prestado pelos provedores de acesso à internet devido à autonomia de sua operacionalidade perante o serviço de telefonia prestado pela operadora podendo, ainda, haver acesso à internet por outros meios que não o serviço de telefonia, como vimos anteriormente, nos casos de transmissões via cabo.

            No que tange aos julgados, estes eram inicialmente, concluídos no sentido de não ser possível a tributação dos provedores de acesso por ICMS, entendendo não ser tal hipótese a de um serviço de comunicação, pois os provedores seriam também usuários ou tomadores dos serviços de telecomunicação prestados pelas empresas de telefonia, e também, não seria possível a tributação por ISS, pois o serviço prestado pelas provedoras não encontra-se incluído em nenhum dos conceitos da lista do ISS, como nas seguintes ementas:

            TJPR - ICMS - Não-incidência - Provedor de acesso à Internet - Inocorrência de prestação de serviço de comunicação ou de telecomunicação no desempenho de tal atividade (9).

            1.TACivSP - ISS - Não-incidência - Provedores de Internet - Atividade peculiar que não consta da lista anexa ao Dec.-lei 406/68 - Impossibilidade de o Judiciário incluí-la entre os serviços tributáveis pelo Município, pois não podem ser considerados análogos a quaisquer um dos listados, máxime aos de agentes, corretores e intermediários de títulos (10).

          O entendimento análogo citado na segunda ementa e que seria utilizado para se incluir o serviço de provedor de acesso em algum dos conceitos já existentes na lista anexa do Decreto-lei n.º 406/68 não é correto, pois o uso da analogia em matéria tributária, conforme prevê o § 1.º do artigo 108 do Código Tributário Nacional, não pode resultar na exigência de tributo não previsto em lei. E, a possível inclusão de serviço de provimento de acesso à internet na lista do ISS, por força do disposto no inciso III do artigo 156 da Constituição Federal de 1988, somente poderia se dar, se fosse este o caso, por lei complementar federal.

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            Recentemente, porém, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça caminhou no sentido de que os provedores de acesso deverão estar sujeitos à tributação do ICMS, cassando liminar anteriormente concedida pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, com a incrível (não crível) fundamentação ‘jurídica’ de que os cofres estaduais não poderiam ficar "desprovidos de importante receita" como ficou explicado nas notícias deste próprio órgão julgador no dia 10 de setembro de 2002, noticiário referente ao Processo SS n.º 1.084, o qual transcrevemos na íntegra:

            As provedoras de acesso à internet Universo Online Ltda. e Brasil Online Ltda. vão continuar recolhendo o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS à Fazenda do Estado de São Paulo. A decisão é do presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Nilson Naves, que suspendeu a liminar concedida às duas empresas em ação que discute a cobrança do ICMS pelo Estado. Com isso, até a decisão para cancelar ou manter a cobrança do imposto, as provedoras continuam recolhendo o tributo.

            A Universo Online Ltda. e a Brasil Online Ltda. entraram com um mandado de segurança, com pedido de liminar, solicitando "a imediata suspensão da exigibilidade dos valores vencidos e vincendos do ICMS exigido sobre a atividade de provimento de acesso à internet desenvolvida pelas impetrantes (empresas)".

            O Juízo da 12ª Vara da Fazenda Pública da Comarca da Capital, São Paulo, negou o pedido de liminar. Com isso, as provedoras entraram com outro mandado de segurança também com pedido de liminar, desta vez, no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP). A liminar foi concedida, mas, ao analisar o pedido, o TJ-SP extinguiu o processo sem julgamento de seu mérito.

            Também foi negado o mérito do pedido do primeiro mandado de segurança pelo Juízo da 12ª Vara da Fazenda de SP. De acordo com a sentença, a atividade desenvolvida pelas empresas, "que disponibilizam o acesso à internet a usuários, que são seus clientes" gera uma "relação jurídico-tributária que permite ao Fisco Estadual – São Paulo, faça incidir, in casu (neste caso), o ICMS".

            Tentando modificar as decisões a Universo Online e a Brasil Online recorreram ao TJ-SP. Além do recurso de apelação, as provedoras também entraram com uma medida cautelar com pedido de liminar para suspender a cobrança do ICMS até a decisão final da discussão contra a Fazenda paulista. A solicitação foi acolhida pelo TJ-SP. Com isso, o Estado de São Paulo veio ao STJ com pedido de suspensão da liminar para continuar recolhendo o tributo.

            Segundo o Estado de São Paulo, a suspensão da cobrança causa lesão à ordem e à economia públicas "pela impossibilidade de o Poder Público receber, por um longo período de tempo, o imposto previsto em seu orçamento e pelo efeito multiplicador da aludida medida judicial, com a concessão de centenas de liminares, com graves danos aos cofres públicos do Estado". O Estado ressaltou que o pedido das empresas – de cancelamento da cobrança do imposto – "não sofre ameaças", pois, caso a Justiça entenda que a cobrança não está de acordo com a Lei, as provedoras poderão exigir a repetição dos valores recolhidos aos cofres públicos. No entanto, a situação do Estado não é a mesma, "pois terá dificuldades em recuperar o imposto não pago, afetando, por conseguinte, o interesse público".

            O presidente do STJ, ministro Nilson Naves, acolheu o pedido do Estado suspendendo a liminar concedida às provedoras. Dessa forma, fica mantida a cobrança do imposto às empresas. Segundo o ministro, no caso em questão "há risco de lesão à economia pública, visto que os cofres estaduais ficarão desprovidos da importante receita advinda da arrecadação do ICMS gerado em razão dos serviços prestados pelas impetrantes - provedoras da internet - havendo ainda possibilidade de ocorrência de efeito multiplicador, que poderá provocar um desequilíbrio na já combalida estrutura orçamentária do Estado de São Paulo (11).

            Discutível a justificativa que foi exarada para a cassação da liminar concedida no Processo n.º SS 1084, uma vez que a hipótese de perda na arrecadação não é fundamento jurídico e não justifica que se arrecade tributo indevido.

            E verificamos também, em mais recente manifestação do Superior Tribunal de Justiça, que o entendimento de ser possível a incidência do ICMS, possuiu a justificativa de que os provedores de acesso à internet prestam um serviço de comunicação, não se entendendo que possa ser um serviço de valor adicionado ou serviço que possa ser incluído na lista de incidência do ISS:

            1. Recurso Especial interposto contra v. Acórdão que entendeu que "o provedor de acesso à internet não presta serviço de comunicação ou de telecomunicação, não incidindo sobre a atividade por ele desempenhada o ICMS". 2. O Provedor da Internet é um agente interveniente prestador de serviços de comunicação, definindo-o como sendo "aquele que presta, ao usuário, um serviço de natureza vária, seja franqueando o endereço na INTERNET, seja armazenando e disponibilizando o site para a rede, seja prestando e coletando informações etc. É designado, tecnicamente, de Provedor de Serviços de Conexão à INTERNET (PSC), sendo a entidade que presta o serviço de conexão à INTERNET (SCI)". (Newton de Lucca, em artigo "Títulos e Contratos Eletrônicos", na obra coletiva Direito e INTERNET", pág. 60) 3. O provedor vinculado à INTERNET tem por finalidade essencial efetuar um serviço que envolve processo de comunicação exigido pelo cliente, por deter meios e técnicas que permitem o alcance dessa situação fática. 4. O serviço prestado pelos provedores está enquadrado como sendo de comunicação, espécie dos serviços de telecomunicações. 5. A Lei Complementar nº 87, de 13/09/1996, estabelece, em seu art. 2º, que incide o ICMS sobre "prestações onerosas de Serviços de Comunicação, por qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição a ampliação de comunicação de qualquer natureza", círculo que abrange os serviços prestados por provedores ligados à INTERNET, quando os comercializam. 6. Qualquer serviço oneroso de comunicação está sujeito ao pagamento do ICMS. 7. A relação entre o prestador de serviço (provedor) e o usuário é de natureza negocial visando a possibilitar a comunicação desejada. É suficiente para constituir fato gerador de ICMS. 8. O serviço prestado pelo provedor pela via da Internet não é serviço de valor adicionado, conforme o define o art. 61, da Lei nº 9.472, de 16/07/1997. 9. Recurso provido. (grifos nossos) (12).

            A decisão acima, muito embora entenda que os provedores de acesso estabelecem um processo de comunicação e devem ser tributados pelo ICMS, ainda deve ser estudada analisando a cientificidade na definição desta hipótese de incidência tributária, o que veremos no capítulo seguinte.


IV – Regra de incidência tributária e os provedores de acesso

            A relação jurídica tributária se constitui de alguns aspectos ou elementos necessários e indispensáveis para que se constitua a obrigação do contribuinte de recolher determinado valor aos cofres públicos. O encaixe perfeito ou a "subsunção" do fato gerador tributário à hipótese prevista em lei válida e vigente, pode ser constatado de modo eficaz se fracionarmos este fenômeno nos seus principais aspectos ou elementos, sejam eles: aspecto material ou objetivo, aspecto pessoal ou subjetivo, aspecto espacial, aspecto temporal e aspecto quantitativo.

            A lei específica para a criação de um tributo deve prever de forma hipotética quais serão estes aspectos quando ocorrer o fato imponível (13) no mundo real ou fenomênico. Para que isso ocorra, inicialmente, a Constituição Federal dá competência aos entes tributantes para que instituam, ainda de forma hipotética, os tributos previstos na Carta, como é o caso do ICMS de competência dos Estados e do Distrito Federal.

            Para parte da doutrina a Constituição Federal cria imediatamente os tributos, quando prevê a possibilidade de sua instituição pelo ente competente, sejam eles a União, os Estados, os Municípios ou o Distrito Federal. Outra facção doutrinária entende que a nossa Carta apenas prevê a criação, a qual somente ocorrerá de forma efetiva e plena quando aquele ente, competente para instituir o tributo, editar a lei ordinária, complementar ou a outra fonte normativa sempre prevista constitucionalmente delimitando todos os aspectos da relação jurídica tributária. Respeitados os entendimentos, entendemos que a última etapa desta criação ocorre com a entrada daquela lei específica em vigor, somente quando o tributo poderá ser exigido pelo ente competente.

            Teremos, portanto, que um tributo somente poderá se considerar instituído ou criado quando houver a possibilidade de sua arrecadação pelo ente, agora dotado de competência ou de capacidade tributária (14) e com a publicação de lei específica e sua entrada em vigor. A própria Constituição é expressa em dizer que à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios compete instituir (15)os impostos sobre o patrimônio, a renda, a circulação de mercadorias, os serviços e demais fatos imponíveis. Entender de forma diversa implica em aceitar que o ente competente para tributar possa iniciar a arrecadação apenas com base na previsão constitucional, sem qualquer complementação, o que geraria dúvidas e conflitos entre Fisco e contribuinte, como por exemplo, na definição de qual seria o momento ou o local da ocorrência do fato gerador do tributo, quem seria o responsável pelo pagamento e pela prestação das obrigações acessórias (16), qual a base de cálculo e a alíquota aplicável, dentre outros diversos problemas.

            Quanto à determinação do fato ocorrido no mundo real encontrar-se sob o manto da incidência de ICMS ou ISS, observamos a lição de José Eduardo Soares de Melo (17), explicando que, nas obrigações jurídicas em que se encontrar um ‘fazer’, ainda que este ‘fazer’ tenha por corolário uma obrigação de dar, haverá tributação por ISS e, aquelas obrigações que tiverem por objeto um dar, estarão, se houver a tipificação dos elementos previstos na lei, sujeitas à tributação de ICMS.

            Adentrando agora no que se refere à definição dos serviços de provedores de acesso como prestadores de serviços de comunicação e sujeitos ao ICMS, observamos que, para que haja o perfeito enquadramento no conceito de comunicações, como vêm se pronunciando os julgados das Cortes superiores, deve restar configurada a transmissão de uma mensagem, por meio de um canal, por um emissor, a um ou mais receptores e, o que os provedores realizam não é exatamente a disponibilização do canal, pois este é um suporte físico que geralmente já existe e já realiza o processo de comunicação, sobre o qual o provedor de acesso presta o seu serviço de interconexões entre seus usuários e a rede.

            Vejamos que, para que esta interconexão seja considerada uma espécie do gênero comunicação, não poderia haver outra estrutura, material ou imaterial, como a rede de telefonia, dando suporte para o processo de comunicação. Deveria ser, o provimento de acesso, por si só, estabelecedor do processo de comunicação, possuindo o seu próprio suporte de transmissão de dados, o que não ocorre, pois a comunicação já está estabelecida.

            Entendimento anterior previa que:

            Houve por bem, a União, com exclusiva, privativa e única competência, tanto para explorar a atividade quanto para legislar sobre a matéria, reconhecer e estabelecer que o "provedor de acesso" não exerce atividade de telecomunicação, prestando apenas um serviço paralelo, adicional ao de telecomunicações, razão pela qual, apesar de ser utilizado apenas como auxiliar às "telecomunicações", não é serviço de "telecomunicação" (art. 61, § 1.º da Lei n.º 9.427/97). E agiu por bem, na medida que os provedores são, eles próprios, usuários das linhas telefônicas – estas sim, suporte material da prestação de serviços de telecomunicações – consistindo sua atividade em meros serviços de seleção e acesso, típicos de intermediação (18).

            Entendemos, desta forma, que não poderia haver a tributação por ICMS do serviço de acesso à rede, pois este serviço se utiliza de um serviço de comunicação já tributado e que serve de suporte para a sua prestação de serviço. O estabelecimento da comunicação se dá pela operadora de telefonia, o qual já é tributado, não havendo como se estabelecer uma comunicação onde já existem os elementos essenciais para o processo de comunicação (emissor, receptor, código, canal) e a comunicação já se encontra, portanto, estabelecida.

            O que se deve verificar é, quando da conexão por outro meio que não a empresa de telecomunicações, se o processo de comunicação estabeleceu-se de forma independente pelo provedor de acesso, quando seria correto se entender que esta empresa estaria estabelecendo o processo de comunicação.

            Cabível, seria, no caso dos provedores de acesso com suporte na comunicação via telefonia, a tributação por ISS, incluindo-se na lista de serviços o de dar acesso à rede mundial de computadores via internet, observados os requisitos de lei complementar e com a disposição, pela lei dos municípios, de todos os aspectos ou elementos desta obrigação.

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Sobre a autora
Lais Vieira Cardoso

Analista judiciária do TRT da 15ª Região, professora universitária do Centro Universitário Moura Lacerda, Mestre em Direito das Obrigações Público e Privado pela UNESP de Franca e especialista em Direito Tributário pela PUC Campinas.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CARDOSO, Lais Vieira. Os caminhos da tributação dos provedores de acesso. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 65, 1 mai. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4038. Acesso em: 21 nov. 2024.

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