A isenção tributária e a redução parcial da base de cálculo do tributo

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Este trabalho tem por finalidade estudar o instituto da isenção tributária e verificar se a redução parcial da base de cálculo de um tributo pode ser considerada uma forma de isenção

1. Teorias acerca da isenção tributária

            Muitos doutrinadores têm estudado o instituto da isenção tributária, sendo que várias teorias surgiram a respeito do assunto.

            É certo que muitas dessas teorias, com o passar do tempo, mostraram-se incompletas e deixaram de ser adotadas. No entanto, todas foram relevantes para a compreensão do assunto, motivo pelo qual, faz-se necessária a análise dos posicionamentos que mais tiveram notoriedade e destaque.

1.1. Isenção como “dispensa legal do pagamento do tributo”

            Esta teoria, desenvolvida por Rubens Gomes de Sousa, foi adotada por vários doutrinadores, dos quais se destacam Amílcar de Araújo Falcão[1] e Aliomar Baleeiro.

            De acordo com esta corrente doutrinária, a isenção deve ser entendida como a dispensa legal do pagamento do tributo.

            Rubens Gomes de Sousa[2] assim definia isenção: “isenção é o favor fiscal concedido por lei, que consiste em dispensar o pagamento de um tributo devido.”

            Os seguidores deste entendimento defendem que existe o nascimento da obrigação tributária, sendo que posteriormente haveria a incidência da norma isentiva, a qual dispensaria o pagamento do tributo em questão.

            Em outras palavras, haveria o nascimento do fato jurídico em um primeiro momento, o que faria nascer a obrigação tributária, e, num momento posterior, haveria a incidência da norma de isenção, operando-se a dispensa do pagamento da exação tributária.

            Esta teoria foi alvo de várias críticas, sendo que, atualmente, é adotada por um número mínimo de doutrinadores.

            As contestações a este entendimento são no sentido de que a norma de isenção, ao contrário do que defende a teoria, impede o nascimento da obrigação tributária. Na verdade, não existe uma cronologia na incidência das normas, ou seja, tanto a norma de incidência quanto a concessiva da isenção atuam no mesmo instante, quando tratam de um mesmo fato social. Uma não tem maior velocidade que a outra.

            Paulo de Barros Carvalho[3] explica este ponto de vista:

“Não há cronologia na atuação de normas vigorantes num dado sistema, quando contemplam idêntico fato do relacionamento social. Equivaleria a atribuir maior velocidade à regra-matriz de incidência tributária, que chegaria primeiro ao evento, de tal sorte que, quando chegasse à norma de isenção, o acontecimento do mundo real já se encontrasse juridicizado.”

            Assim, não há que se falar em dispensa legal do pagamento do tributo devido, pois não se pode dispensar aquilo que não existe, isto é, não se pode dispensar o cumprimento de uma obrigação tributária que sequer chegou a nascer.

1.2. Isenção como “hipótese de não-incidência tributária, legalmente qualificada”

            Outra teoria que surgiu sobre o assunto, muito mais científica e com o intuito de contestar o entendimento defendido por Rubens Gomes de Sousa, foi a que entendia a isenção como “hipótese de não-incidência tributária, legalmente qualificada”.

            O precursor desta teoria foi Alfredo Augusto Becker, que conquistou adeptos como José Souto Maior Borges[4].

            Para melhor compreender o posicionamento de Alfredo Augusto Becker[5], é necessário transcrever trecho de sua obra, que apesar de extenso, traz inegável contribuição para os estudiosos do direito:

“Poderia parecer que a regra jurídica tributária, que estabelece a isenção do tributo, estaria estruturada como regra desjuridicizante total, isto é, haveria uma anterior relação jurídica tributária atribuindo ao sujeito passivo a obrigação de pagar o tributo; a incidência da regra jurídica de isenção teria como conseqüência o desfazimento daquela preexistente relação jurídica tributária. Aliás, este é o entendimento de grande parte da doutrina tributária, a qual costuma conceituar a isenção do seguinte modo: ‘Na isenção, o tributo é devido, porque existe a obrigação, mas a lei dispensa o seu pagamento; por conseguinte, a isenção pressupõe a incidência, porque é claro que só pode dispensar o pagamento de um tributo que seja efetivamente devido’. A lógica desta definição estará certa apenas no plano pré-jurídico da Política Fiscal quando o legislador raciocina para criar a regra jurídica de isenção.

Uma vez criada a regra jurídica de isenção, portanto, já agora no plano jurídico do direito tributário, quando o jurista interpreta aquela regra jurídica e examina os efeitos resultantes de sua incidência, aquele conceito de isenção falece de lógica e contradiz a ciência jurídica que investigou a fenomenologia da incidência das regras jurídicas.

Na verdade, não existe aquela anterior relação jurídica e respectiva obrigação tributária que seriam desfeitas pela incidência da regra jurídica de isenção. Para que pudesse existir aquela relação jurídica tributária, seria indispensável que, antes da incidência da regra jurídica de isenção, houvesse ocorrido a incidência de regra jurídica da tributação. Porém, esta nunca chegou a incidir porque faltou, ou excedeu, um dos elementos da composição de sua hipótese de incidência, sem o qual, ou com o qual, ela não se realiza. Ora, aquele elemento faltante, ou excedente, é justamente o elemento que, entrando na composição da hipótese de incidência da regra jurídica de isenção, permitiu diferenciá-la da regra jurídica de tributação, de modo que aquele elemento sempre realizará uma única hipótese de incidência: a da isenção, e desencadeará uma única incidência: a da regra jurídica da isenção, cujo efeito jurídico é negar a existência de relação jurídica tributária. A regra jurídica de isenção incide para que a de tributação não possa incidir.

A regra jurídica que prescreve a isenção, em última análise, consiste na formulação negativa da regra jurídica que estabelece a tributação.

A realização da hipótese de incidência da regra jurídica de isenção faz com que esta regra jurídica incida justamente para negar a existência de relação jurídica tributária. Por sua vez, as hipóteses não enquadráveis dentro da hipótese de incidência da regra jurídica explícita de isenção tributária são precisamente as hipóteses de incidência de regras jurídicas implícitas de tributação.”

            Fica evidente que neste posicionamento, em suma, a norma de isenção incide para que a norma de tributação não possa incidir.

            Apesar da contribuição de Alfredo Augusto Becker, esta teoria, também, possui alguns equívocos, que a tornam vulnerável.

            Como na hipótese anterior, está-se concedendo maior velocidade à norma de isenção em detrimento da regra-matriz de incidência tributária, o que, como visto anteriormente, não pode ser admitido no sistema do direito positivo.

            Aprofundando no estudo desta teoria, José Souto Maior Borges sustenta o entendimento de que a isenção, na verdade, pode ser tida como uma hipótese de não-incidência tributária, legalmente qualificada.

            Para referido autor, a norma que concede uma isenção tributária impede o nascimento da obrigação tributária:

“A norma que isenta é assim uma norma limitadora ou modificativa: restringe o alcance das normas jurídicas de tributação; delimita o âmbito material ou pessoal a que deverá estender-se o tributo ou altera a estrutura do próprio pressuposto de sua incidência”.[6]

            Em outro ponto completa:

“A norma de isenção, obstando o nascimento da obrigação tributária para o seu beneficiário, produz o que já se denominou fato gerador isento, essencialmente distinto do fato gerador do tributo”. [7]

           

            No entanto, apesar de coerente, a teoria desenvolvida por José Souto Maior Borges padece de um pecado lógico, que é a definição de conceito pela negativa, o que certamente deve ser evitado.

1.3. Teoria desenvolvida por Paulo de Barros Carvalho

            Com o intuito de desenvolver o estudo sobre as isenções tributárias, Paulo de Barros Carvalho propôs uma teoria, que parece ser a mais completa e acertada em relação ao assunto.

            Porém, antes de procedermos à analise pormenorizada de referida doutrina, faz-se necessário a fixação de alguns pontos relevantes.

1.3.1. Norma de estrutura e norma de comportamento

            É certo que no interior do sistema do direito positivo existem dois tipos de normas jurídicas: aquelas que são dirigidas à conduta humana, regulando o comportamento dos indivíduos em sociedade, em suas relações intersubjetivas; e, aquelas que veiculam procedimentos de criação das normas anteriores, disciplinando e estabelecendo como outras normas podem ser inseridas, modificadas e expulsas do sistema.

            As primeiras normas são denominadas de normas de conduta ou de comportamento, ao passo que as segundas são tidas como normas de estrutura.[8]

            Fundamental, neste ponto, a contribuição de Norberto Bobbio[9]:

“Existem normas de comportamento ao lado de normas de estrutura. As normas de estrutura podem também ser consideradas como as normas para a produção jurídica: quer dizer, como as normas que regulam os procedimentos de regulamentação jurídica. Elas não regulam o comportamento, mas o modo de regular um comportamento, ou, mais exatamente, o comportamento que elas regulam é o de produzir regras”.

            Importante ressaltar, ainda, que nas normas de comportamento, o conectivo dever-ser aparece modalizado deonticamente em obrigatório (O), proibido (V) e permitido (P). As normas de estrutura, por outro lado, expressam-se, na maioria das vezes, por um dever-ser neutro, não se modalizando em obrigatório, permitido ou proibido.

            A distinção entre norma de comportamento e norma de estrutura é bastante relevante[10], pois ambas integram o sistema de direito positivo, mas prestam-se para diferentes fins.

1.3.2. A isenção tributária como norma de estrutura

            Tendo em vista a diferenciação entre norma de estrutura e norma de comportamento feita no item anterior, fica evidente que quando falamos em normas de isenção tributária, estas devem ser entendidas como sendo normas de estrutura.

            Isto porque é inegável que as normas veiculadoras de isenção trazem modificações à norma de incidência do tributo, esta sim, voltada para os indivíduos em sociedade, em suas relações intersubjetivas, sendo, portanto, uma norma de conduta.

1.3.3. Isenção tributária na proposta de Paulo de Barros Carvalho

            Para o professor Paulo de Barros Carvalho[11]:

“Guardando a sua autonomia normativa, a regra de isenção investe contra um ou mais dos critérios da norma-padrão de incidência, mutilando-os, parcialmente. É óbvio que não pode haver supressão total do critério, porquanto equivaleria a destruir a regra-matriz, inutilizando-a como norma válida no sistema. O que o preceito de isenção faz é subtrair parcela do campo de abrangência do critério do antecedente ou do conseqüente”.

            Assim, isenção tributária pode ser tida como uma norma de estrutura, que pressupõe um encontro normativo, através do qual ela acaba por reduzir o campo de alcance da regra matriz de incidência tributária.

            Fica evidente, portanto, que a isenção tributária pode limitar o campo de abrangência da regra-matriz de incidência tributária tanto em seu antecedente, quanto no conseqüente.

            Neste norte, a isenção pode reduzir a funcionalidade da norma instituidora do tributo de oito maneiras diferentes:

I – Redução da hipótese normativa:

- limitação do critério material, atingido o verbo;

- limitação do critério material, atingindo o complemento;

- limitação do critério espacial;

- limitação do critério temporal.

II – Redução do conseqüente normativo:

- limitação do critério pessoal, atingindo o sujeito ativo;

- limitação do critério pessoal, atingindo o sujeito passivo;

- limitação do critério quantitativo, atingindo a base de cálculo;

- limitação do critério quantitativo, atingindo a alíquota.

            Em sua teoria, Paulo de Barros Carvalho assevera, ainda, que a redução do campo de abrangência dos critérios da regra-matriz de incidência tributária, pela regra de isenção, não pode ser total, seja no antecedente ou no conseqüente. Isto porque, caso houvesse uma total supressão de um dos critérios constantes na norma instituidora da exação tributária, haveria uma inutilização da norma-padrão de incidência, eis que os fatos descritos jamais poderiam ocorrer na realidade social, o que poderia levar a revogação da regra-matriz de incidência em questão.[12]

         Este posicionamento é de grande aceitação da doutrina, sendo que tem influenciado vários autores quando do estudo das isenções tributárias, motivo pelo qual passamos a adotá-lo no presente trabalho.

1.4. Proposta de Roque Antonio Carrazza

            Por derradeiro, parece interessante expormos a linha de raciocínio de Roque Antonio Carrazza, quando trata deste assunto.

            Referido autor, influenciado por seu ex-orientando, Eliud José Pinto da Costa, defende a ideia de que a regra isentiva e a regra que institui o tributo convivem de forma harmônica e formam uma única norma jurídica tributária.

            O autor tem tal entendimento, pois da análise do ordenamento jurídico pode-se concluir que nem sempre existe uma norma jurídica tributária anterior a uma norma jurídica isentiva. Na verdade, em grande parte das vezes, ocorre que a própria norma instituidora do tributo, também trata de estipular a isenção para certos fatos.

            Assim, a regra que institui a isenção não mutila um critério da regra-matriz de incidência, mas sim dá uma nova feição à norma jurídica tributária.

            Roque Carrazza[13] conclui da seguinte forma:

“Portanto, isenção é uma limitação legal do âmbito de validade da norma jurídica tributária, que impede que o tributo nasça ou faz com que surja de modo mitigado (isenção parcial). Ou, se preferirmos, é a nova configuração que a lei dá à norma jurídica tributária, que passa a ter seu âmbito de abrangência restringido, impedindo, assim, que o tributo nasça in concreto (evidentemente, naquela hipótese descrita na lei isentiva)”.

            Com todo respeito, discordamos desta posição.

            Isto porque, mesmo que a regra isentiva esteja inserida dentro da norma instituidora do tributo, aquela possui uma regra-matriz de incidência própria.

            Desta forma, a regra-matriz de incidência do tributo e a regra-matriz da isenção tributária atuarão no mesmo instante, quando do nascimento da obrigação tributária com a subsunção do fato jurídico à norma, sendo que esta última mutilará elementos ou critérios da norma instituidora do tributo, não permitindo o nascimento da obrigação tributária para aquela determinada hipótese.

            Isto não quer dizer, que é uma nova feição dada pela norma isentiva. Na verdade, há sim a mutilação de um dos critérios da regra-matriz de incidência tributária, o que impede que a exação recaia sobre aquele fato contemplado na lei.

2. Isenção e institutos afins

           Em diversas oportunidades, o instituto da isenção foi confundido com outras figuras jurídicas afins.

            Contudo, não há que se confundir imunidade, isenção, não-incidência, remissão e anistia. São signos absolutamente diversos, com características próprias e verificados em momentos distintos. Senão vejamos:

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            O instituto da imunidade tributária pode ser conceituado como um conjunto determinável de normas jurídicas, expressamente previstas na Constituição Federal, que delimitam a competência tributária dos entes públicos, que passam a ser incompetentes para veicular normas instituidoras de tributos, que tratem das matérias elencadas no Texto Constitucional.

            As imunidades são normas constitucionais, que devem ser observadas no início do processo de enunciação que dará origem à norma instituidora de tributo.

            Já o instituto da isenção aparece no plano da legislação infraconstitucional. Apesar de também serem as regras de isenção classificadas como regras de estrutura, elas pressupõem um encontro normativo, em que acabam por reduzir o campo de abrangência da regra-matriz de incidência tributária, esta sim, norma de comportamento.

            A não-incidência, por sua vez, refere-se à impossibilidade de tributação de determinadas situações, eis que a regra-matriz de incidência tributária não se ajusta a tais situações.

            Roque Carrazza[14] define não-incidência como:

“A não-incidência é simplesmente a explicitação de uma situação que ontologicamente nunca esteve dentro da hipótese de incidência possível do tributo”.

            Outro instituto incompatível com a isenção é a remissão.

            Esta é o perdão legal do débito tributário, sendo uma causa extintiva do crédito tributário, conforme estipula o artigo 156, inciso IV, do Código Tributário Nacional.

            A principal diferença entre a remissão e a isenção é que a primeira atinge o tributo já existente, ou seja, a obrigação tributária já nasceu. A isenção, como vimos, obsta o nascimento da obrigação tributária, portanto, não há que se falar em tributo.

            Por fim, a anistia também é um instituto diverso. Apesar de ser uma hipótese de exclusão do crédito tributário assim como a isenção, a anistia se refere à penalidade pecuniária. Na verdade, a anistia perdoa a sanção decorrente do ato ilícito tributário.

            De acordo com Hugo de Brito Machado[15]:

“Anistia é a exclusão do crédito tributário relativo a penalidades pecuniárias. O cometimento de infração à legislação tributária enseja a aplicação de penalidades pecuniárias, multas, e estas ensejam a constituição do crédito tributário correspondente. Pela anistia, o legislador extingue a punibilidade do sujeito passivo infrator da legislação tributária, impedindo a constituição do crédito”.

3. Conceito de isenção

            Adotando-se a teoria proposta por Paulo de Barros Carvalho, temos que a norma de isenção pode ser entendida como uma norma de estrutura que restringe o âmbito de abrangência da regra-matriz de incidência tributária, mutilando, parcialmente, um de seus critérios, seja no antecedente ou no consequente, fazendo com que a exação tributária não incida sobre determinadas situações previstas em lei.

            É importante frisar que a regra isentiva obsta o nascimento da obrigação tributária para aquela situação discriminada na lei, motivo pelo qual o momento de sua incidência ocorre no mesmo instante da incidência da norma padrão, instituidora do tributo.

            Trata-se, na verdade, de um encontro de normas, de um lado a regra-matriz de incidência tributária e de outro a regra de isenção, sendo que deste encontro surge a exação tributária, que não incidirá sobre aquela parcela retirada pela norma isentiva.

4. Isenção e os princípios

            José Souto Maior Borges[16] leciona:

“Em virtude do princípio da supremacia da Constituição, a teoria jurídica da isenção tributária há de apoiar-se, com se viu, em normas constitucionais que autorizam e delimitam o exercício da competência tributária pelo legislador ordinário. Radica na própria Constituição Federal o poder de isentar”.

            As isenções tributárias, que podem ser entendidas como o reverso do poder de tributar, devem estar embasadas pelos princípios constitucionais, mais notadamente, pelas diretrizes da legalidade, justiça e segurança tributárias.

4.1. Isenção e o princípio da legalidade

            De acordo com o artigo 5º, inciso II, da Constituição Federal, “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.

            Em referido dispositivo constitucional encontra-se positivado o princípio da legalidade, o qual influencia todas as searas do direito positivo brasileiro.

            Tendo em vista tal afirmação, é possível verificar-se no artigo 150, inciso I, da Constituição Federal, o princípio da estrita legalidade tributária, decorrência lógica do princípio da legalidade acima exposto:

“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I – exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça”.

            Fica evidente, da análise destes enunciados, que a disciplina de todos os tributos é reservada à lei. Da mesma forma, a disciplina das isenções também deve ser reservada à lei. Em outras palavras, as isenções tributárias devem respeitar o princípio da legalidade.

            Roque Antonio Carrazza[17] leciona que:

“Só a pessoa que validamente criou (ou pode criar), por meio de lei, o tributo é que pode criar a isenção, desde que o faça, também, por meio de lei”.

            Importante destacar, também, as palavras de Lúcia Valle Figueiredo[18] acerca do tema:

“Funcionando a norma de isenção como excepecionante da generalidade da tributação, ou como fato impeditivo, na acepção de Alberto Xavier, só poderá estar sob reserva absoluta de lei. Ou, por outro giro: não podem ser concedidas isenções por atos administrativos que não estejam, diretamente, respaldados na lei. Isso porque, estando o tributo sob reserva de lei, não poderia a isenção ser veiculada por meio de outro instrumental que não fosse de sua mesma natureza – ambas as normas devem ser hierarquicamente iguais”.

            Assim, se o ente tributante não pode exigir ou aumentar um tributo sem prévia lei que o estabeleça, o mesmo ocorre com a isenção, que não existirá sem lei que a determine. O princípio da legalidade deve ser aplicado e verificado tanto no aspecto positivo da tributação, quanto no aspecto negativo da exoneração fiscal[19].

            Verificando-se a necessidade de lei para a disciplina da isenção, é necessário esclarecer que não é qualquer espécie legislativa a adequada para inserir no sistema jurídico positivo normas isentivas.

            O ordenamento jurídico determina que as isenções tributárias devem ser estabelecidas e veiculadas, em regra, através de leis ordinárias.

            Neste norte, aquelas isenções que sejam criadas através de decretos, embora sejam bastante freqüentes, são maculadas de vícios, sendo, portanto, injurídicas.

4.2. Isenção e o princípio da justiça

            Nas palavras de Paulo de Barros Carvalho, o princípio da justiça na verdade é um sobreprincípio, sendo uma diretriz suprema no ordenamento jurídico brasileiro.

            O respeito ao princípio da justiça é inquestionável, pois este ocupa posição superior frente aos outros princípios constitucionais, motivo pelo qual, muitos doutrinadores entendem por bem colocá-lo como um sobreprincípio fundamental em relação aos demais.

            Para que haja a fiel observância do sobreprincípio da justiça, é necessário que exista o respeito a outros princípios constitucionais pelos operadores dos direito.

            Assim, o primeiro princípio que deve ser observado é o da igualdade, devidamente positivado no artigo 5º, caput, da Constituição Federal.

            Na esfera tributária, o princípio da igualdade está resguardado no artigo 145, parágrafo 1º, bem como no artigo 150, inciso II, ambos da Constituição Federal, sendo, desta forma, vedada a discriminação tributária através de tratamentos privilegiados ou favorecimentos a determinadas pessoas.

            Ressalta-se que o princípio da igualdade, assim como o princípio da legalidade, são destinados ao legislador, que detém o exercício do poder legislativo, isto é, o poder de criar leis.

            Desta feita, as isenções tributárias devem obedecer obrigatoriamente o princípio da igualdade, sendo terminantemente proibido ao legislador instituir uma isenção que favoreça ou privilegie determinada classe ou grupo de contribuintes.

            José Souto Maior Borges[20] ensina que:

“As isenções não configuram, portanto, transgressões ao princípio da igualdade tributária. Excetuam, isso sim, as pessoas isentas, da regra da generalidade da tributação, a fim de que, deste modo, esteja obedecido o princípio da isonomia”.

            Outro princípio de obrigatória observância é o da capacidade contributiva.

            O princípio da capacidade contributiva, previsto no artigo 145, parágrafo 1º da Constituição Federal[21], é decorrência do princípio da igualdade, bem como do direito de propriedade.

            O legislador, no momento da criação de isenções tributárias, deve levar em consideração a capacidade contributiva dos destinatários da norma isentiva.

            De tal princípio decorre a chamada isenção do mínimo vital, segundo a qual, não deve incidir tributação daquelas situações que regulam o mínimo físico da existência do indivíduo.

            Pode-se afirmar que a isenção do mínimo vital é uma exigência que se origina da justiça tributária.

4.3. Isenção e o princípio da segurança

            O princípio da segurança jurídica está implícito no Texto Constitucional, sendo decorrência de vários outros dispositivos constitucionais que devem ser aplicados em conjunto, a fim de que o corolário da segurança seja atingido.

            A segurança jurídica visa a garantir a estabilidade do ordenamento jurídico, no sentido de que os cidadãos não possam ser pegos de surpresa através de atos do Poder Público.

            Tércio Sampaio Ferraz Júnior[22] ensina que a segurança jurídica é “a determinação permanente dos efeitos que o ordenamento jurídico atribui a um dado comportamento, de modo que o cidadão saiba ou possa saber de antemão a conseqüência de suas próprias ações”.

            No caso das isenções tributárias deverá, uma vez mais, haver obediência a referido princípio constitucional.

            A observância da segurança jurídica tem fundamental importância nas hipóteses de revogação das isenções tributárias.

            Isto porque, o princípio da segurança jurídica determina que, para que não haja surpresas para o contribuinte, as regras de isenção não podem ser modificadas arbitrariamente.

            Neste ponto é importante destacar a existência das seguintes espécies de isenção:

- as isenções incondicionais – são aquelas que não exigem qualquer contraprestação do beneficiário;

- as isenções condicionais – são aquelas que exigem determinadas condições por parte dos beneficiários;

- isenções por prazo indeterminado; e

- isenções por prazo certo ou transitórias.

            É certo que, em regra, as isenções incondicionais e aquelas por prazo indeterminado são revogáveis a qualquer tempo.

            Por outro lado, as isenções condicionais e por prazo certo, podem ser revogadas, quando for invocado o princípio da supremacia do interesse público sobre o particular. No entanto, sempre deve haver, nestas hipóteses, o respeito ao direito adquirido do contribuinte, de acordo com o artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, que não pode se ver privado arbitrariamente de vantagens tributárias, quando tiver cumprido todas as exigências necessárias para fazer jus a uma determinada isenção.

            José Souto Maior Borges[23] comentando os ensinamentos de Seabra Fagundes assevera que:

“A situação do contribuinte beneficiado por uma isenção tributária, outorgada a troco de obrigações por ele assumidas, está protegida pelos princípios preservadores dos direitos públicos subjetivos, ou, na terminologia constitucional, pelos princípios que resguardam os direitos do indivíduo em face do Estado”.

            Misabel Abreu Machado Derzi[24], em suas atualizações na obra Direito Tributário Brasileiro, de Aliomar Baleeiro[25], tem o mesmo entendimento:

“Assim a lei nova, que cancela a isenção, a redução do imposto ou o benefício, jamais poderá retroagir, prejudicando o direito adquirido. O que configura direito adquirido? A jurisprudência do STF, como registra Aliomar Baleeiro, no tópico anterior, firmou o entendimento de que a isenção, concedida a prazo certo e mediante condições onerosas para o contribuinte isento, não poderá ser cancelada enquanto correr o prazo do favor legalmente concedido. A lei nova não alterará a situação preestabelecida, em razão da qual fez o contribuinte investimentos, às vezes elevados, confiando no retorno do capital e em seus frutos. O que se protege, mais uma vez, é a boa-fé, a confiança na lei.

5. O equívoco da expressão exclusão do crédito tributário

            O instituto da isenção tributária é tratado pelo Código Tributário Nacional como uma forma de exclusão do crédito tributário, conforme se depreende do disposto no artigo 175 de referido diploma legal:

“Art. 175. Excluem o crédito tributário:

I – a isenção;

II – a anistia.

Parágrafo único. A exclusão do crédito tributário não dispensa o cumprimento das obrigações acessórias, dependentes da obrigação principal cujo crédito seja excluído, ou dela conseqüente.”

            Ocorre que, de uma breve análise de citado artigo, percebe-se, claramente, uma incoerência em sua redação. Senão vejamos:

            Quando há o nascimento de uma obrigação tributária, que ocorre com a concretização do fato previsto no antecedente da regra-matriz de incidência tributária, surge para o sujeito ativo da exação o direito subjetivo de exigir do sujeito passivo o objeto (prestação pecuniária) da relação jurídica instalada. Em contrapartida, o sujeito passivo tem o dever jurídico de entregar ao sujeito ativo o objeto da relação jurídica.

            O direito subjetivo do sujeito ativo é denominado crédito, enquanto que o dever jurídico do sujeito passivo é denominado débito.

            Paulo de Barros Carvalho[26] assevera:

“Definimos crédito tributário como o direito subjetivo de que é portador o sujeito ativo de uma obrigação tributária e que lhe permite exigir o objeto prestacional, representado por uma importância em dinheiro”.

            Evidencia-se, assim, que o crédito tributário é um dos elementos da obrigação tributária, sendo que o nascimento daquele ocorre no momento em que o evento do mundo social, descrito no prescritor de uma regra-matriz de incidência tributária, relatado em linguagem competente, efetivamente ocorre. No entanto, este também é o momento em que nasce a obrigação tributária.

            Com efeito, é impossível a existência de uma obrigação sem que haja o crédito e o débito tributário correspondente. Tal binômio é intrínseco à idéia de obrigação.

            Desta forma, quando o Código Tributário Nacional contempla que a isenção é uma hipótese de exclusão do crédito tributário, na verdade, deve ser entendido que com a isenção existe uma extinção da obrigação tributária, vez que se o crédito for retirado do vínculo entre os sujeitos, desaparecerá a própria obrigação em si.

            José Souto Maior Borges[27] ratifica este entendimento:

“De todo o exposto, poder-se-á, com segurança até então não atingida pela doutrina, concluir que, nas hipóteses de isenção, não há, a rigor, crédito tributário, dado que este não passa de um direito-reflexo da obrigação tributária. Precisamente por esse motivo não se deverá afirmar, como o faz certa doutrina, que a isenção exclui o crédito, mas preserva, na sua integralidade, a obrigação tributária. Quando o art. 175 do CTN inclui a isenção entre as hipóteses de exclusão do crédito tributário implicitamente contempla uma hipótese de exclusão da própria obrigação tributária”.

           Assim, a despeito da utilização pelo Código Tributário Nacional da expressão “exclusão do crédito tributário”, deve-se interpretá-la como sendo “extinção da obrigação tributária”, a fim de que exista uma harmonia dentro do sistema de direito positivo nacional.

6. Redução parcial da base de cálculo

            Como visto em item anterior, a isenção investe contra um ou mais critérios ou elementos da regra-matriz de incidência tributária, mutilando-os parcialmente.

            Assim, a regra isentiva pode reduzir o campo de atuação da norma instituidora do tributo de oito maneiras diferentes:

I – Redução da hipótese normativa:

- limitação do critério material, atingido o verbo;

- limitação do critério material, atingindo o complemento;

- limitação do critério espacial;

- limitação do critério temporal.

II – Redução do conseqüente normativo:

- limitação do critério pessoal, atingindo o sujeito ativo;

- limitação do critério pessoal, atingindo o sujeito passivo;

- limitação do critério quantitativo, atingindo a base de cálculo;

- limitação do critério quantitativo, atingindo a alíquota.

            No presente estudo, importa-nos a análise da regra de isenção limitando o campo de atuação da norma-padrão do tributo, quando há a redução do critério quantitativo, mais especificamente com a mutilação da base de cálculo, elemento integrante do conseqüente normativo.

            Para referida análise, é necessário verificarmos a pertinência da classificação das isenções tributárias em integrais e parciais.

            Como é notório, as classificações não são válidas ou inválidas, certas ou incertas. Na verdade, as classificações dos institutos são úteis ou inúteis, dependendo do prisma que a análise é feita e principalmente das premissas adotadas.

            Neste norte, quando se classifica a isenção em total ou parcial, dependendo do ponto de vista que se está analisando, tal classificação pode ou não ser útil para o intérprete do direito.

            Pontes de Miranda[28] é um defensor da classificação acima referida. Segundo o autor:

“As isenções são totais e parciais. Dizem-se parciais as isenções que deduzem do percentual do imposto ou do imposto fixo. As isenções totais são preexcludentes da imposição: o imposto não recai no objeto ou no negócio jurídico a que se refere a regra jurídica de isenção”.

            Ocorre que, a despeito do posicionamento acima exposto, entendemos não ser possível classificarmos a isenção tributária em total ou parcial.

            Como verificado anteriormente, a regra de isenção impede o nascimento da obrigação tributária, fazendo com que a exação tributária não recaia sobre aquela determinada situação prevista na norma isentiva.

            Desta forma, é possível afirmar que somente a chamada isenção total é que satisfaz plenamente a condição acima referida, ou seja, somente através de uma isenção que reduz ou mutila totalmente um dos critérios da regra-matriz de incidência tributária é que não existirá o nascimento da obrigação tributária.

            Na hipótese da chamada isenção parcial, há o nascimento da obrigação tributária sobre determinada situação, ocorrendo tão somente uma diminuição do valor do débito a ser pago pelo contribuinte, decorrente do tributo devido.

            Sacha Calmon Navarro Coelho[29] analisando o tema, assim se posicionou:

"Ocorre, no entanto, que, à luz da teoria da norma jurídica tributária, a denominação de isenção ‘parcial’ para o fenômeno da redução parcial do imposto a pagar, através das minorações diretas de bases de cálculo e de alíquotas, afigura-se absolutamente incorreta e inaceitável. A isenção ou é total ou não é, porque a sua essentialia consiste em ser modo obstativo ao nascimento da obrigação. Isenção é o contrário de incidência. As reduções, ao invés, pressupõem a incidência e a existência do dever tributário instaurado com a realização do fato jurígeno previsto na hipótese de incidência da norma de tributação. As reduções são diminuições monetárias no quantum da obrigação, via base de cálculo rebaixada ou alíquota reduzida".

            Outro não é o entendimento de Paulo de Barros Carvalho[30]:

“Não confundamos subtração do campo de abrangência do critério da hipótese ou da conseqüência com mera redução da base de cálculo ou da alíquota, sem anulá-las. A diminuição que se processa no critério quantitativo, mas que não conduz ao desaparecimento do objeto, não é isenção, traduzindo singela providência modificativa que reduz o quantum de tributo que deve ser pago. O nome atribuído pelo direito positivo e pela doutrina é isenção parcial”.

            Assim, não é possível admitirmos a existência de isenções tributárias parciais, eis que estas são, na verdade, meras reduções tributárias, pois não impedem o nascimento da obrigação tributária no caso concreto[31].

6.1. Posicionamento do Supremo Tribunal Federal

            O Supremo Tribunal Federal em vários julgados, cujo tema central é a discussão sobre o estorno dos créditos de ICMS relativo às operações anteriores, quando as operações subseqüentes ocorrem com redução da base de cálculo do imposto, consolidou jurisprudência no sentido de que a redução parcial da base de cálculo deve ser entendida como isenção parcial do tributo.

            Tal posicionamento foi firmado a partir do julgamento do Recurso Extraordinário nº 174.478-SP, em 17.03.2005, cuja ementa transcreve-se a seguir:

“EMENTA: TRIBUTO. Imposto sobre Circulação de Mercadorias. ICMS. Créditos relativos à entrada de insumos usados em industrialização de produtos cujas saídas foram realizadas com redução da base de cálculo. Caso de isenção fiscal parcial. Previsão de estorno proporcional. Art. 41, inc. IV, da Lei estadual nº 6.374/89, e art. 32, inc. II, do Convênio ICMS nº 66/88. Constitucionalidade reconhecida. Segurança denegada. Improvimento ao recurso. Aplicação do art. 155, § 2º, inc. II, letra "b", da CF. Voto vencido. São constitucionais o art. 41, inc. IV, da Lei nº 6.374/89, do Estado de São Paulo, e o art. 32, incs. I e II, do Convênio ICMS nº 66/88”.

            O Ministro Cezar Peluso, no julgamento do recurso acima referido, ao tratar da redução parcial da base de cálculo, asseverou em seu voto o seguinte:

“Na verdade, cuida-se aqui de um favor fiscal que, mutilando o aspecto quantitativo da base de cálculo, corresponde à figura da isenção parcial, porque impede a incidência da regra matriz de incidência tributária na sua totalidade. Quer dizer, substancialmente é caso de isenção”.

            O entendimento do Ministro Peluso foi acompanhado por outros Ministros, sendo que a posição pacífica da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal atualmente ainda é no mesmo sentido:

EMENTA: Embargos de declaração em agravo regimental em recurso extraordinário.

2. ICMS. Base de cálculo reduzida. Compensação proporcional dos créditos. Possibilidade.

3. Não ocorrência de violação ao princípio da não-cumulatividade. Redução da base de cálculo interpretada como isenção parcial. Precedentes.

4. Embargos de declaração acolhidos para negar provimento ao recurso extraordinário.

(Embargos de Declaração no Agravo Regimental no Recurso Extraordinário 154.179-2 – SP – 2ª Turma – Relator Min. Gilmar Mendes – 28.11.2006).

EMENTA: Agravo Regimental em Recurso Extraordinário – Tributo - Impossibilidade de compensação dos créditos relativos à entrada de insumos realizada com redução da base de cálculo - Caso de isenção fiscal parcial - Agravo Regimental provido para conhecer do Recurso Extraordinário interposto pela ora agravada e negar provimento a ele.

(Agravo Regimental no Recurso Extraordinário 146.145-4 – SP – 1ª Turma – Relatora Min. Carmen Lúcia – 26.09.2006).

            Apesar do posicionamento do Supremo Tribunal Federal, entendemos não ser possível falarmos em isenção parcial.

            É certo que o Direito é constituído de palavras e essas, na maioria das vezes, são ambíguas. No entanto, certos institutos do Direito devem ter sentido próprio.

            Assim, não há que se confundir isenção, não incidência e incidência com redução parcial de base de cálculo. São institutos jurídicos diversos, que causam diferentes conseqüências, não podendo um ser invocado em nome do outro.

            Quando falamos em isenção, devemos ter em mente que a regra isentiva impede o nascimento da obrigação tributária. Isto, contudo, não ocorre, quando se trata de redução parcial da base de cálculo.

            Nesta, existe o nascimento da obrigação tributária, surgindo, conseqüentemente, o crédito tributário. Entretanto, o valor a ser recolhido aos cofres públicos pelo contribuinte será menor, justamente pela existência do benefício da redução tributária, conferido pelo ente tributante.

            Percebe-se, desta forma, que são institutos diversos que devem ter tratamentos também diversos, motivo pelo qual, o entendimento exposto pelo Supremo Tribunal Federal não deve prevalecer.

7. Conclusões

            Não se pretendeu, no presente trabalho, esgotar as análises sobre a isenção tributária.

            Trata-se de um instituto bastante polêmico, sendo que a discussão de todos os temas a ele ligados seria tarefa impossível.

            No entanto, pudemos perceber que há bastante divergência acerca do assunto, com a existência de diversas teorias desenvolvidas por vários juristas, sendo que todas possuem seus adeptos e seguidores.

            Ocorre que, dá análise de referidas teorias, chegamos à conclusão de que a mais adequada ao estudo do tema é aquela desenvolvida por Paulo de Barros Carvalho, por ser a mais completa e a que melhor se adequa à visão contemporânea do Direito.

            Assim, podemos entender isenção tributária como sendo uma norma de estrutura que restringe o âmbito de abrangência da regra-matriz de incidência tributária, mutilando, parcialmente, um de seus critérios, seja no antecedente ou no conseqüente, fazendo com que a exação tributária não incida sobre determinadas situações previstas em lei.

            Trata-se, na verdade, de um encontro de normas, de um lado a regra-matriz de incidência tributária e de outro a regra de isenção, sendo que deste encontro surge a exação tributária, que não incidirá sobre aquela parcela retirada pela norma isentiva.

            Percebe-se, a partir dessa definição, que a regra de isenção impede o nascimento da obrigação tributária. Conseqüentemente, não há que se falar em existência de crédito tributário, eis que este é um dos elementos da obrigação tributária, ou seja, não existe crédito se não houver obrigação.

            Tendo em vista tais premissas, é correto afirmar que a isenção tributária pode reduzir o campo de atuação da norma instituidora do tributo de oito maneiras diferentes, através da limitação dos critérios existentes no antecedente e no conseqüente da regra-matriz de incidência tributária.

            Tal limitação deve ocorrer de forma que, para aquela determinada situação prevista em lei, não haja a incidência do tributo, justamente pelo fato do não nascimento da obrigação tributária.

            Desta forma, quando falamos em redução parcial da base de cálculo de alguma exação tributária, não podemos admitir que se trate efetivamente de uma isenção tributária de forma parcial.

            Isto porque, nas hipóteses de redução parcial há o nascimento da obrigação tributária para aquela situação específica, com o conseqüente surgimento do crédito tributário. A única diferença é que o valor a ser recolhido aos cofres públicos pelo contribuinte será menor, justamente pela existência do benefício da redução tributária, conferido pelo ente tributante.

            Na verdade, portanto, a redução parcial da base de cálculo do tributo deve ser entendida como uma simples forma de redução tributária e jamais deve ser confundida como uma hipótese de isenção, ainda que parcial.

            É importante ressaltar, ainda, que a isenção tributária deve estar pautada e embasada nos princípios constitucionais, pois, caso contrário, a regra isentiva estaria viciada, não podendo fazer parte do sistema de direito positivo brasileiro.

            Ocorre que, o Supremo Tribunal Federal, ao adotar posicionamento pacífico no sentido de que a redução parcial da base de cálculo do tributo deve ser entendida como uma forma de isenção parcial, está ferindo, flagrantemente, o princípio da segurança jurídica, além de outros princípios constitucionais verificados em cada caso específico.

            A confusão entre os institutos não pode existir, eis que muitas conseqüências danosas ao contribuinte podem existir caso um instituto seja aplicado em detrimento do outro.

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Sobre o autor
Márcio Alexandre Loti Henrique

Advogado; especialista em Direito Processual Civil pela PUC/SP; mestre em Direito Processual Civil pela PUC/Campinas; especialista em Direito Tributário pelo IBET; mestre em Direito Tributário pela PUC/SP; doutorando em Direito Tributário pela PUC/SP

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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