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A legalização da eutanásia no Brasil

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22/09/2003 às 00:00
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I – DA EUTANÁSIA

1. Antecedentes Históricos

A discussão a cerca dos valores sociais, culturais e religiosos envolvidos na questão da eutanásia apareceu, em primeiro plano, na Grécia Antiga, de modo que encontramos em Platão, Epicuro e Plínio os primeiros filósofos a abordarem o tema. Platão em sua República estabelece conceitos de caráter solucionador patrocinando o homicídio dos anciões, dos débeis e dos enfermos. Igualmente, Sócrates (1) e Epicuro defendiam a idéia de que o sofrimento resultante de uma dolorosa doença justificava o suicídio. Aristóteles, Pitágoras e Hipócrates (2), ao contrário, condenavam o suicídio. Apesar da falta de unanimidade entre os filósofos, os antigos praticavam a eutanásia em larga escala.

Na Grécia Antiga, era freqüente a prática da eutanásia entre os cidadãos cansados da carga do Estado e da existência. Vinham até a um magistrado e expunham as razões que os levavam a desejar a morte e, se o juiz entendesse suficiente, autorizava.

Em Esparta, era comum, a fim de evitar qualquer sofrimento ou vir a tornar-se carga inútil, a precipitação do alto do Monte Taijeto de recém-nascidos malformados (para alguns autores, chegava até ser obrigatória) por serem imprestáveis para a comunidade. Na mentalidade, o espírito bélico se sobrepunha a qualquer sentimento ou laço familiar, "onde todo filho ´macho´ era visto sob o aspecto militar. Ao Estado era dispensado manter uma criança que não lhe fosse útil. Para a família era vergonhoso possuir um rebento incapacitado para as glórias da guerra" (3). Vale salientar que em Esparta o homicídio não era considerado crime, desde que praticado em honra de deuses e o assassinato dos velhos era uma obra de piedade filial quando muito pedido por eles mesmos.

Em Atenas, o Senado tinha poderes absolutos de facultar a eliminação dos velhos e incuráveis, dando-lhes bebida venenosa ("conium maculatum") em cerimônias e banquetes especiais.

As discussões não ficaram restritas apenas a Grécia. Cleópatra VII (69aC-30aC) criou no Egito uma "Academia" para estudar e realizar experiências sobre as formas de morte menos dolorosas.

Na Índia Antiga, os doentes incuráveis ("os inúteis" em geral) eram atirados publicamente ao Rio Ganges, depois de obstruídas a boca e as narinas com um pouco de barro, uma espécie de lama sagrada – sempre arrumavam um motivo justo para essas execuções, geralmente com o intuito de apaziguar a cólera divina. Os Brâmanes tinham por lei matar ou abandonar nas selvas os recém-nascidos que padeciam de má índole e velhos enfermos, sendo considerados inaproveitáveis para a sociedade, imprestáveis aos interesses do grupo (4).

Os Celtas, além de matarem as crianças deformadas, eliminavam também os idosos (seus próprios pais quando estes se encontravam velhos e doentes), uma vez que os julgavam desnecessários à sociedade, tendo em vista que os mesmos não contribuíam para o enriquecimento da nação (5).

Os Germanos matavam os enfermos. Na Birmânia, eram enterrados vivos os doentes incuráveis, enquanto que os Eslavos e Escandinavos apressavam a morte de seus pais que padeciam em enfermidade.

Em Roma, era comum lançarem-se ao mar os deficientes mentais. O Imperador romano Júlio César decretou que os gladiadores feridos de morte, depois do combate no circo romano, fossem mortos se os césares voltassem o polegar para baixo (pollice verso - o polegar para baixo dos césares era uma indulgente autorização à morte, permitindo aos gladiadores feridos, que tardavam morrer, evitarem a agonia e o ultraje) para não prolongar a agonia, o que equivalia, segundo Giuseppe Del Vecchio, à prática eutanásica. Os gladiadores mortalmente feridos nos combates viam, portanto, abreviados os sofrimentos pela compaixão real.

Fustel de Coulanges observa que, em Roma, segundo Paulo Lúcio NOGUEIRA: "O Estado tinha o direito de não permitir cidadãos disformes ou monstruosos. Por conseqüência, ordenava ao pai a quem nascesse semelhante filho que o matasse" (6).

Ainda em Roma, os condenados à crucificação tomavam uma bebida que produzia um sono profundo, para que não sentissem as dores dos castigos e iam morrendo lentamente.

Referindo-se às passagens bíblicas, alguns teólogos atribuem à morte do Rei Saul, de Israel, como sendo a primeira prática de eutanásia da história. Ferido na batalha e a fim de não cair prisioneiro, Saul lançara-se sobre a sua espada e, já ferido, pedira a um amalecita (ou amalequita) que lhe tirasse a vida (7).

O supramencionado exemplo bíblico não serve de paradigma para a imposição da prática da eutanásia. No referente episódio bíblico, o rei Davi revela sua total repulsa à eutanásia, no instante em que sentenciou de morte o mesmo amalecita que por piedade matara o rei Saul, no monte Gelboe, por ter ousado tirar a vida do "ungido" de Deus, mesmo depois de ter entregado a coroa e o bracelete roubados. Os ungidos eram intocáveis e Davi os respeitava.

O próprio Cristo, o patriarca máximo da obediência e da submissão, no Calvário foi submetido aos suplícios da crucificação. Segundo Cícero, deram-lhe de beber vinagre e fel, chamado "vinho da morte", mas ele, provando a mistura, não a quis tomar. Apesar da denominação "vinho da morte", há quem afirme que o gesto dos guardas judeus de darem a Jesus uma esponja embebida de tal mistura, antes de constituir ato de zombaria e crueldade, teria sido uma maneira piedosa de amenizar seu sofrimento, numa atitude de extrema compaixão. Segundo Dioscorides, esta substância "produzia um sono profundo e prolongado, durante o qual o crucificado não sentia nem os mais cruentos castigos, e por fim caía em letargo passando à morte insensivelmente".

Na Idade Média, os guerreiros feridos em combates eram sacrificados – ato de "misericórdia" – mediante golpes de punhal muito afiado introduzido na articulação, por baixo do gorjal da armadura, que lhes servia para evitar o sofrimento e a desonra.

As populações rurais norte-americanas, que, devido aos fatores ambientais, eram nômades, sacrificavam enfermos e anciãos para não os abandonar ao ataque de animais selvagens.

Até o ano de 1600, conta-nos Lombroso que na Suécia velhos e doentes incuráveis eram mortos por seus próprios familiares.

A discussão sobre o tema prosseguiu ao longo de toda a história da humanidade, com a participação de Lutero, Thomas Morus (Utopia), David Hume (Of suicide), Karl Marx (Medical Euthanasia), Schopenhauer, Immanuel Kant, entre outros.

Segundo o mestre Afrânio Peixoto, "na Utopia, o país ideal de Thomas Morus, havia magistrados incumbidos de informarem a incuráveis e débeis, aleijados e inúteis, que se deviam eliminar ou serem eliminados: uns deixavam-se morrer de fome, outros eram mortos, no sono". Desta forma, todos os que se sentiam inúteis deveriam se autodestruir, como um meio de ajudar a sociedade a progredir economicamente. Por outro lado, para Immanuel Kant a vida não vale para si mesma, mas em função de um projeto de vida com liberdade e autonomia. A eutanásia está justificada se permitir a base material para uma vida merecedora.

É imperioso frisar o caso de Napoleão Bonaparte na campanha do Egito, onde o "gênio da guerra" pediu ao médico Desgenetes que matasse os 3 ou 4 soldados atacados pela peste, moribundos e irremediavelmente perdidos, tendo o cirurgião respondido: "Mon devoir a moi c’est de conserver" ("o médico não mata, sua função é curar").

A eutanásia atingiu o seu apogeu na Prússia em 1859 durante a discussão do seu plano nacional de saúde, quando foi proposto que o Estado deveria prover os meios para a realização de eutanásia em pessoas que se tornaram incompetentes para solicitá-la.

Em 1884, Enrique Ferri imprimira um trabalho sugestivo, publicado no Arquivo de Lombroso, intitulado "L´omicidio-suicidio" em que aborda a responsabilidade jurídica daquele que dá a morte a outro com seu consentimento.

No Brasil, na Faculdade de Medicina da Bahia, mas também no Rio de Janeiro e em São Paulo, inúmeras teses foram desenvolvidas neste assunto entre 1914 e 1935.

No século XX, durante as décadas de 30 e 40, a discussão sobre o tema eutanásia realizava-se de modo equivocado, como forma de eliminar deficientes, pacientes terminais e portadores de doenças consideradas indesejáveis. Nesses casos, o que se denominou de eutanásia, na realidade, era homicídio. A justificativa se amparava na associação, especialmente na Europa, da eutanásia com eugenia. (8)

Nessa esteira, durante a segunda guerra mundial (outubro de 1939), a Alemanha Nazista implantou, através de Hitler, a"Aktion T 4", que era um programa de eliminação de recém-nascidos e crianças pequenas, até 3 anos, com retardo mental, deformidades físicas e outras condições limitantes consistindo em um dever de médicos e parteiras notificar a autoridade sanitária a verificação de tais casos examinados por uma junta médica de três profissionais procedendo-se à eliminação somente quando houvesse unanimidade.

O programa repentinamente se estendeu para adultos e velhos portadores de esquizofrenia, epilepsia, desordens senis, paralisias que não respondiam a tratamento, sífilis, retardos mentais, encefalite, doença de Huntington e outras patologias neurológicas, incluindo-se também os pacientes internados a mais de 5 anos ou criminalmente insanos. Com o lema de "purificação da raça", foram acrescidos os critérios de não possuir cidadania alemã, ou ascendência alemã, discriminando especialmente negros, judeus e ciganos. Em 3 de agosto de 1941, um sermão do bispo católico Clemens von Galen denunciou contundentemente o extermínio, levando devido às repercussões deste sermão, Hitler, em 23 de agosto do mesmo ano, a suspender a Aktion T 4 (9).

A Igreja Católica, em 1956, posicionou-se de forma contrária à eutanásia por ser contra a "lei de Deus". No entanto, em 1957, o Papa Pio XII, numa alocução a médicos, aceitou a possibilidade de que a vida possa ser encurtada como efeito secundário à utilização de drogas para diminuir o sofrimento de pacientes com dores insuportáveis. (10)

Admitida na Antiguidade através dos costumes, a eutanásia foi condenada incisivamente tão-somente a partir do judaísmo e do cristianismo, em cujos princípios à vida tinham o caráter sagrado. No entanto, foi a partir do sentimento que cerca o direito moderno que a eutanásia tomou caráter criminoso, como proteção irrecusável do mais valioso dos bens: a vida. Devido a esse caráter criminoso, diante do redimensionamento de valores e de ideais, é que a comunidade internacional se prostra em face da questão da legalização da eutanásia, que será desenvolvida no presente trabalho tendo como principal referência o ordenamento jurídico brasileiro.

2. Etimologia

O termo foi criado no século XVII (em 1623) pelo filósofo Francis Bacon, em sua obra "Historia vitae et mortis", como sendo o "tratamento adequado as doenças incuráveis", significando, portanto, eufemisticamente, uma "boa morte". A palavra eutanásia traz sua construção semântica dividida em "Eu" (que significa "boa" ou "bem") e "thanatos" ou "thanasia" (que significa morte). O vocábulo eutanásia deriva do grego "eu" + "thanatos" (duas palavras gregas na sua etimologia) que tem por sentido literal

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Define-se como sendo uma teoria segundo a qual será lícito apressar a morte dos doentes incuráveis, para lhes evitar o sofrimento da agonia. Por eutanásia entende-se quando alguém causa deliberadamente a morte de outrem que está mais fraco, debilitado ou em sofrimento. Neste último caso, a eutanásia seria utilizada para evitar a distanásia, que, segundo Maria Celeste SANTOS, seria o seu antônimo, definida como morte lenta, ansiosa e com muito sofrimento. (11)

O termo eutanásia é muito amplo e pode ter diferentes interpretações no instante em que designa toda a ação que vise deliberadamente provocar a morte de uma pessoa doente, revestindo-se tal definição de neutralidade, sendo ajustável a diferentes perspectivas, como a proposta no século XIX, pelos teólogos Larrag e Claret, em seu livro "Prontuários de Teologia Moral", publicado em 1866. Eles utilizavam eutanásia para caracterizar a "morte em estado de graça". Dentre inúmeras designações, destacamos: "a morte sem sofrimento e indolor" ou, ainda, "... morte fácil e sem dor", "morte boa e honrosa", "morte tranqüila", "alívio da dor", "golpe de graça", "morte apropriada", "homicídio por piedade", "morte direta e indolor", "morte suave", "morte harmoniosa", "morte sem angústia, feliz", revelando idéia de morte, piedosa, altruísta, caridosa.

Para Milton Schmitt tem um sentido mais amplo, abrangendo outras modalidades: "O termo Eutanásia, hodiernamente passou a ser utilizado para designar a morte deliberada de uma pessoa que sofre de enfermidade incurável ou muito penosa, sendo vista como meio para suprir a agonia demasiadamente longa e dolorosa do, então chamado, paciente terminal. Porém, seu sentido ampliou-se passando a abranger o suicídio, a ajuda em nome do Bom Morrer, ou Homicídio Piedoso" (12).

"Em Medicina legal e Direito Penal, assim denomina o homicídio, por motivos de piedade, contra doente desenganado ou portador de doença incurável". (13)

No vernáculo correto – e também na pronúncia – o termo correto é eutanasia, mas o costume e a prática têm ditado o contrário, ou seja, eutanásia, assim como necrópsia e necropsia, e tantos outros termos semelhantes.

3. Conceito

Segundo a medicina, a eutanásia consiste em minorar os sofrimentos de uma pessoa doente, de prognóstico fatal ou em estado de coma irreversível sem possibilidade de sobrevivência, apressando-lhe a morte ou proporcionando-lhe os meios para consegui-la. Este fato típico é realizado em virtude de relevante valor moral, que diz respeito aos interesses individuais do agente, entre eles os sentimentos de piedade e compaixão.

Ricardo Royo-Vilanova y Morales, conforme citado pela Enciclopédia Saraiva coordenada pelo Prof. R. Limongi França (14), assim define a eutanásia: "É a morte doce e tranqüila, sem dores físicas nem torturas morais, que pode sobrevir de um modo natural nas idades mais avançadas da vida, surgir de modo sobrenatural como graça divina, ser sugerida por uma exaltação das virtudes estóicas, ou ser provocada artificialmente, já por motivos eugênicos, ou com fins terapêuticos, para suprimir ou abreviar uma inevitável, larga e dolorosa agonia, mas sempre com prévio consentimento do paciente ou prévia regulamentação legal".

Na mesma Enciclopédia, Morache (Naissance et mort, Paris, 1904) restringe o sentido de eutanásia apenas à agonia boa ou suave: "A agonia que se desenrola sem dores na qual, na qual as funções sensoriais vão se extinguindo pouco a pouco, pode ser chamada de agonia tranqüila, de eutanásia, sendo distanásia as situações nas quais o agônico, em plena lucidez, sofre dores físicas e morais, considerando com libertadora a morte que se aproxima em passos lentíssimos" (15).

O Prof. Hélio Gomes nos traz conceitos de autores, através de José Náufel (16). Vejamos:

  1. MORSELLI (L’uccisione pietosa, 1933): "É aquela morte que alguém dá a outrem que sofre de uma enfermidade incurável, a seu próprio requerimento, para abreviar agonia muito grande e dolorosa."
  2. PINAM define-a como "o ato pelo qual uma pessoa põe termo à vida da outra, que sofre de enfermidade incurável ou então a aleijados padecendo dores cruéis, atendendo às suas solicitações reiteradas, levada puramente pelo espírito de piedade e humanidade".

O autor citado não traz propriamente uma definição desta prática, apenas diz ser "o direito que se pretende conferir a uma junta médica de dar a morte suave aos doentes que sofram dores insuportáveis, estejam atacados de doença incurável e o desejem ou solicitem."

A eutanásia, como já vislumbramos nos conceitos citados, consiste na prática da morte visando atenuar os sofrimentos do enfermo - e de seus familiares - tendo em vista a sua inevitável morte, sua situação incurável do ponto de vista médico. Traço importante é a idéia de causar conscientemente a morte de alguém, por motivo de piedade ou compaixão, introduzindo outra causa, que por si só, seja suficiente para desencadear o óbito. A morte por eutanásia é considerada uma morte "não natural".

Segundo Edmundo de Oliveira, "a eutanásia alcança três níveis de manobras para lidar com a morte:

  1. Acabar com a vida indigna, na hipótese do autor proporcionar a morte da pessoa por entender que ela leva uma vida intolerável. É a hipótese do enfermo hostil e agressivo, afetado por uma esquizofrenia do tipo paranóide, caracterizada por idéias delirantes de perseguições e alucinações;
  2. Acabar com a vida de doente sem perspectiva médica de alívio para suas intensas dores físicas ou torturas morais. É o que ocorre com o portador de câncer inoperável e multimetástico;
  3. Acabar com a vida do paciente, antecipando-lhe a morte inevitável, que já estava em curso, na hipótese do prognóstico concluir que a pessoa está irremediavelmente chegando ao fim com cruciante agonia. É o caso do terrível acidente de trânsito que leva ao esmagamento da medula ou coluna raquiana da vítima". (17)

Dentro dos limites da conceituação jurídica, a eutanásia compreenderia o "direito de matar" ou o "direito de morrer", em virtude de razão que possa justificar semelhante morte, em regra, provocada para término de sofrimentos, ou por medida de seleção, ou de eugenia. Destarte, a eutanásia leva à discussão sobre o direito de uma pessoa por fim à própria vida, valendo-se de outra pessoa.

Podemos indagar se haveria apenas uma faculdade ou um direito juridicamente tutelado, isto é, que possa ser coercitivamente exigido. No mundo jurídico, se alguém tem um direito, pode socorrer-se do processo, para fazê-lo valer e, se este não consegue por seus próprios meios, outrem precisa ter o dever de realizá-lo.

Suscita-se a questão: a quem caberia realizar essa ação destinada a eliminar o sofrimento de um doente, causando sua morte? Na concepção de Bacon, que cunhou o termo eutanásia, seria dever do médico acalmar os sofrimentos e as dores, mesmo quando esse alívio sirva para trazer uma morte doce e tranqüila. (18)

A posição do filósofo inglês representa uma quebra na ética médica baseada na tradição hipocrática, que impõe ao médico o dever de proteger e preservar a vida humana. Ao se aceitar a eutanásia como ato médico, os médicos e outros profissionais terão também a tarefa de causar a morte.

Até hoje, os médicos juram abster-se de toda ação ou omissão, com intenção direta e deliberada de pôr fim a uma vida humana. A participação na eutanásia não somente alterará o objetivo da atenção à saúde, como poderá influenciar, negativamente, a confiança para com o profissional, por parte dos pacientes.

Modernamente, eutanásia é a morte consentida de uma pessoa em grande sofrimento sem perspectiva de melhora, produzida por médico. Nos países que a legalizaram ou a toleram, o consentimento do paciente exclui a ilicitude da intervenção, consagrando o princípio da vontade livre como garantia suprema do exercício e renúncia a direitos fundamentais. Eutanásia não é morte por piedade, mas é morte por vontade.

4. Classificação

Como o presente estudo centra-se na legalização da eutanásia passiva no Brasil, dentre inúmeras classificações encontradas na doutrina, é oportuna apenas a classificação da eutanásia em ativa e passiva.

  1. Eutanásia ativa – consiste no ato deliberado de provocar a morte sem sofrimento do paciente, por fins misericordiosos. Considera-se o modus procedendi. É ativa quando o agente ministra substância capaz de provocar a morte instantânea e indolor;
  2. Eutanásia passiva ou indireta – dá-se quando a morte do paciente ocorre, dentro de uma situação de terminalidade, ou porque não se inicia uma ação médica ou pela interrupção de uma medida extraordinária (p. ex.: não colocar ou retirar o paciente de um respirador); pode também ser chamada eutanásia por omissão, ortotanásia ou paraeutanásia; O médico deixa de prolongar, por meios artificiais e extraordinários, a vida irrefragavelmente condenada, haja vista que o tratamento para prolongar a vida traz sofrimento ao paciente terminal.
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Sobre o autor
Luiz Inácio de Lima Neto

acadêmico de Direito na UFPB

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA NETO, Luiz Inácio. A legalização da eutanásia no Brasil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 81, 22 set. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4217. Acesso em: 19 nov. 2024.

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