Resumo
O presente artigo visa ofertar o entendimento acerca dos direitos do consumidor nas relações de consumo no meio virtual, abordando o direito que o consumidor tem de desistir da compra de um produto ou eventual serviço que tenha sido adquirido por via internet ou telefônica nas hipóteses em que se tem a caracterização do marketing agressivo, onde fornecedores ofertam produtos e serviços ao consumidor por meio de técnicas de persuasão, induzindo o consumidor em adquirir a oferta sem fazer um exercício mental acerca da conveniência e necessidade de adquirir o mesmo.
Palavras-chave: Direito de arrependimento; Consumidor; Relação de consumo
Abstract
This article aims to offer the understanding of consumer rights in consumer relations in the virtual environment, covering the right of the consumer has to withdraw from the purchase of a product or any service that has been purchased through Internet or telephone in cases where has been the characterization of aggressive marketing, where vendors proffer goods and services to consumers through persuasion techniques, inducing the consumer to purchase the offer without making a mental exercise about the convenience and need to purchase the same.
Keywords: repentance law; consumer; Consumer relationship
Introdução
É notável que, atualmente, as pessoas vivem cada vez mais conectadas ao mundo virtual, haja vista a praticidade, bem como o conforto e a rapidez que se leva para almejar aquilo que ele deseja, seja para ler o noticiário, assistir filmes, estudos, realizar atividades bancárias e, principalmente, a compra de produtos e serviços em sites comerciais.
Com o fenômeno da globalização, o comércio ajuda a traçar uma nova via, a internet, caminho virtual pelo qual pessoas de várias partes do mundo se encontram e passa a ter um intercâmbio de informações simultâneas entre ambos.
Certamente, a medida que cresce o número de adeptos desta ferramenta, ocorre a expansão do comércio eletrônico, fato notável em nosso cotidiano, tanto é, que é comum surgir a cada dia sites destinados a ofertar produtos e serviços independente do conteúdo, trata-se do fenômeno denominado de comércio eletrônico.
Nestes termos, expõe Brunno Giancoli e Marco Antônio Araújo, “A importância desse modelo de negócio é notória no mercado de consumo e, portanto, revela uma enorme preocupação dos operadores do direito sobre o tema. A lição de Ricardo L. Lorenzetti ilustra de forma precisa esta questão: “o surgimento da era digital suscitou a necessidade de repensar importantes aspectos relativos à organização social, à democracia, à tecnologia, à privacidade e à liberdade, e se observa que muitos enfoques não apresentam a sofistificação teórica que semelhantes problemas requerem; esterilizam-se, obliterados pela retórica, pela ideologia e pela ingenuidade (Comércio eletrônico, p.22)”. (2013, p.165).
Conforme expõe José Geraldo Brito Filomeno: “Em artigo intitulado exatamente “A certificação Digital e o Direito”, Renato M. S. Ópice Blum chama a atenção para essa realidade, assinalando que: “o Brasil é o país da América do Sul que possui o maior número de internautas e o que mais fomenta negócios no Comércio Eletrônico. Em fevereiro de 2002, o Brasil ultrapassou a marca de 13 milhões de pessoas com acesso à internet, uma das maiores do mundo, segundo dados publicados no site www.ibope.com.br”. (2015, p.121).
O comércio eletrônico
Podemos conceituar o comércio eletrônico como o meio no qual ocorre à relação consumerista entre fornecedor e consumidor, ou seja, a compra e venda de produtos ou serviços no meio virtual, sendo este considerado o estabelecimento comercial, no entanto, denominado de estabelecimento virtual.
Ou seja, nas palavras de Fábio Ulhoa Coelho, “o comércio eletrônico é a venda de produtos (virtuais ou físicos) ou a prestação de serviços realizados em estabelecimento virtual”. (2010, p.32).
De acordo com Brunno Giancoli e Marco Antônio Araújo, “o comércio eletrônico pode ser classificado em direto (compra e venda de bens intangíveis (softwares, músicas, pesquisas) ou indireto (encomenda de bens tangíveis, ou seja, físicos: livros, DVDs, eletroeletrônicos etc), conforme o tipo de mercadoria comercializada”. (2013, p.166).
Sendo assim, não importa a natureza do bem ou serviço que é adquirido pelo consumidor, seja um simples download de um CD, livros ou jornais, bem como a compra de um produto como relógios, sapatos, utensílios comerciais ou domésticos, pois o que caracteriza o comércio eletrônico é o fato de a negociação ter ocorrido no interior do estabelecimento virtual, onde se tem a eventual transmissão eletrônica dos dados trocados entre consumidor e fornecedor.
Tal fato caracteriza o contrato firmado entre as partes, uma vez que ocorreu a oferta e aceitação do produto ou serviço, embora não tenha o contrato sido firmado na forma escrita (papel).
Com o advento do Decreto de nº 7.962, de 15 de março de 2013, veio uma série de regras para o comércio eletrônico, sendo as normas bastante abrangentes, regulamentando aspectos contratuais, pré- e pós-contratuais, questões relativas ao arrependimento, as ofertas para as compras coletivas etc, sendo que já se tem vários aspectos regulados pelo CDC, no entanto sendo bem vindo o Decreto presidencial, uma vez que elimina algumas dúvidas existentes conforme expõe Rizzato Nunes (2015, p.688).
Estabelece o artigo 1º do referido decreto os direitos básicos do consumidor na contratação de compras via internet, tais como o fornecimento de informações claras a respeito do produto, do serviço e do fornecedor; o atendimento facilitado ao consumidor; e o respeito ao direito de arrependimento.
Da formação do contrato e o Princípio da Equivalência Funcional
Uma vez que tenha ocorrido a oferta e a aceitação do produto ou serviço, embora não tenha o contrato sido firmado na forma escrita (papel), há a formação do mesmo, pois o fato de ter ocorrido à transmissão eletrônica de dados entre fornecedor e consumidor, o contrato estará firmado.
Isto é, conforme expõe Fabio Ulhoa Coelho, “a manifestação de vontade dos contratantes (oferta e aceitação) não se veicula nem oralmente, nem por documento escrito, mas pelo registro em meio virtual (isto é, despapelizado)” (2010, p.37).
Em razão disso, vem à tona o Princípio da Equivalência Funcional, o qual aduz que, o contrato firmado por meio de informações eletrônicas cumpre as mesmas funções de um contrato escrito, o que de fato uma vez aceitando-se tal premissa, afasta as hipóteses para considerar o contrato inválido ou ineficaz por ter sido registrado no meio virtual.
Ou seja, de acordo com Fabio Ulhoa, “pelo princípio da equivalência funcional, afirma-se que o suporte eletrônico cumpre as mesmas funções que o papel. Aceita essa premissa, não há razões para se considerar inválido ou ineficaz o contrato tão só pela circunstância de ter sido registrado em meio magnético”. (2010, p.39).
Tal princípio não ampara os vícios de consentimento ou sociais, bem como das demais causas de nulidade e anulabilidade dos negócios jurídicos previsto no Direito Civil e Comercial.
Importante destacar, que conforme diz o doutrinador Rizzatto Nunes, o Decreto n. 7.962 determina que, para garantir o atendimento facilitado ao consumidor, o fornecedor deverá:
“a ) apresentar um sumário do contrato antes da contratação, com as informações necessárias ao pleno exercício do direito de escolha do consumidor, enfatizadas as cláusulas que limitem direitos;
b) fornecer ferramentas eficazes ao consumidor para identificação e correção imediata de erros ocorridos nas etapas anteriores à finalização da contratação;
c) confirmar imediatamente o recebimento da aceitação da oferta;
d) disponibilizar o contrato ao consumidor em meio que permita sua conservação e reprodução, imediatamente após a contratação;
e) manter serviço adequado e eficaz de atendimento eletrônico, que possibilite ao consumidor a resolução de demandas referentes a informação, dúvida, reclamação, suspensão ou cancelamento do contrato;
f) confirmar imediatamente o recebimento das demandas do consumidor pelo mesmo meio empregado por ele;
g) utilizar mecanismos de segurança eficazes para pagamento e para tratamento de dados do consumidor.
Anote-se que o fornecedor tem cinco dias para encaminhar resposta ao consumidor sobre as demandas referentes a informação, dúvida, reclamação, suspensão ou cancelamento do contrato”. (2015, p.690).
Da abrangência do comércio eletrônico
O tipo de acesso feito ao estabelecimento é que vai diferenciar a classificação do mesmo, compreendendo o estabelecimento físico como aquele no qual o consumidor se desloca até o espaço físico, ou seja, a loja, a empresa; ao passo que o estabelecimento virtual é caracterizado em razão de ocorrer a transmissão simultânea de dados.
Importante ressaltar, que o comércio eletrônico não abrange apenas a internet, mas também os serviços feitos por via telefônica uma vez que ocorre a conexão à agência virtual, ou seja, os serviços de telemarketing.
O empresário dedicado ao comércio eletrônico tem, em relação ao consumidor, as mesmas obrigações que a legislação consumerista atribui aos fornecedores de maneira geral, sendo que o fato da venda ter sido efetivada em um estabelecimento seja este físico ou virtual, os direitos dos consumidores, bem como as obrigações dos empresários continuam os mesmos, ou seja, os contratos firmados por via eletrônica de consumo no Brasil se sujeitam aos mesmos princípios e regras presentes no Código de Defesa do Consumidor.
No entanto, é necessário destacar, que tal hipótese não ampara os contratos firmados no comércio eletrônico internacional, sendo que tais contratos terão suas cláusulas subordinadas ao fornecedor estrangeiro, ao passo que o consumidor brasileiro se sujeita a tal contrato.
O motivo decorre do fato de que o Código de Defesa do Consumidor não é aplicado em tais relações de consumo, tendo em vista que a lei que rege as obrigações resultantes do contrato, segundo o direito brasileiro é a do domicílio do proponente, conforme preceitua o artigo 9º, parágrafo 2º, da Lei de Introdução ao Código Civil.
O direito de arrependimento e o marketing agressivo
Tendo em vista que é comum, a cada dia a pessoa realizar suas compras por via internet, via telefone, ou seja, pela transmissão de dados, as ofertas na maioria das vezes são apresentadas ao consumidor com um grande poder de persuasão, muitas vezes, tentadoras, onde se tem apelos como “ligue já”, “leve três e pague dois”, “na compra de mais um produto, o outro é de graça”, “os primeiros que comprarem ganha 50% de desconto”, entre outras.
Tal fenômeno é chamado de marketing agressivo, método pelo qual se usa técnicas de vendas que em certas situações interferem a capacidade do consumidor em refletir sobre a compra do produto, onde os fornecedores geralmente são pessoas simpáticas, educadas e com alto grau de poder em persuadir o cliente de modo com que este decida de imediato em efetuar a compra.
Trata-se de uma forma de ludibriar o consumidor, oferecendo propostas tentadoras e, ao mesmo, fazendo com que este opte em adquirir o produto ou serviço ofertado sem fazer uma reflexão sobre a conveniência e oportunidade do ato de consumo, isto é, se realmente vale a pena, o que de certo modo acaba gerando decisões precipitadas na hora da compra.
Geralmente, os produtos e serviços ofertados por tal marketing são ruins e dependem desta técnica para serem consumidos.
Sendo assim, caso a pessoa tivesse um tempo maior para refletir se é vantajoso ou não adquirir o que está sendo oferecido a ela, certamente teria a tendência em não querer adquirir o produto ou serviço.
Por tal motivo, o direito pátrio procura resguardar o direito do consumidor nos casos em que ocorrem tais práticas, sendo que a legislação que protege o consumidor assegura o direito de arrependimento nas situações em que o fornecedor utiliza o marketing “agressivo”, conforme o artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor, que aduz:
Art. 49. O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 (sete) dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio.
No entanto, para ocorrer à caracterização da prática agressiva, necessário se faz levar em consideração o lugar em que ocorreu a concretização do negócio, ou seja, devendo este ocorrer fora do estabelecimento físico do empresário.
Porém, o referido artigo não pode ser aplicado ao comércio eletrônico, tendo em vista que o negócio firmado entre consumidor e fornecedor não foi realizado fora do estabelecimento do fornecedor.
Isto é, embora o consumidor acesse o site (estabelecimento comercial) do fornecedor, considera-se que ele encontra-se diante da hipótese em que se dirigiu ao estabelecimento físico.
Fábio Ulhoa Coelho explica: “O art. 49 do CDC não deve ser aplicado ao comércio eletrônico, porque não se trata de negócio concretizado fora do estabelecimento do fornecedor. O consumidor está em casa, ou no trabalho, mas acessa o estabelecimento virtual do empresário; encontra-se, por isso, na mesma situação de quem se dirige ao estabelecimento físico”. (2010, p. 49).
Por tal razão, o direito de arrependimento só poderá ser exercido diante das circunstâncias em que o fornecedor pratique o marketing agressivo, em situações nas quais o website estimula o consumidor em adquirir o produto ou serviço naquele exato momento, sem a possibilidade de fazer uma análise do objeto.
Embora tal direito só possa ser exercido em tais circunstâncias, Brunno Giancoli e Marco Antônio Araújo mencionam que, “o artigo 5º do Decreto 7.962/1013, determina que o fornecedor deve informar, de forma clara e ostensiva, os meios para o exercício do direito de arrependimento, o qual engloba, inclusive, a rescisão dos contratos acessórios. Além disso, o consumidor poderá exercer tal direito pela mesma ferramenta utilizada na contratação, devendo o fornecedor enviar confirmação imediata do recebimento da manifestação de arrependimento”. (2013, p.167).
Conclusão
Sendo assim, uma vez que o consumidor sofreu o marketing agressivo, onde não foi possível avaliar a questão da conveniência e oportunidade de adquirir o produto ou serviço, o seu arrependimento deverá ser eficaz, ou seja, ocorrendo a venda fora do estabelecimento físico, sob a condição resolutiva, e ao receber o produto ou serviço, o consumidor percebendo que aquilo não é de seu interesse, tem o direito de rescindir o contrato, no prazo de 7 (sete) dias, ressaltando que, caso não se tenha a caracterização do marketing agressivo, não dá ensejo ao direito de arrependimento.
Referências bibliográficas
GIANCOLI, Brunno Pandori e Marco Antônio Araújo Júnior, Direito do Consumidor, 4ª. Ed. São Paulo, 2013.
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial, contratos e recuperação de empresas. 11ª. Ed. São Paulo, 2010.
FILOMENO, José Gerardo Brito. Manual de Direitos do Consumidor, 13ª. Ed. São Paulo, 2015.
NUNES, Rizzatto. Curso de Direito do Consumidor, 10ª. Ed. São Paulo, 2015.