Relações entre Direito Internacional do Trabalho, Direito Econômico e Direitos Humanos

Resumo:

Resumo


  • A crise econômica global desde 2007 impactou severamente os trabalhadores, que foram os menos assistidos por medidas de proteção dos seus direitos.

  • O estudo aborda a aplicação do Direito Internacional do Trabalho e do Direito Internacional Econômico como meios para a efetivação dos Direitos Humanos, explorando qual organização seria mais adequada para tal, a OMC ou a OIT.

  • A análise sugere que, embora a OIT seja o organismo mais apropriado para lidar com os padrões trabalhistas, a colaboração com a OMC poderia reforçar a aplicação e eficácia das normas internacionais de trabalho.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Diante da crise econômica que assola o mundo desde 2007, os trabalhadores foram os menos beneficiados e assistidos por programas e medidas que salvaguardassem seus direitos. A atuação conjunta da OIT e da OMC seria uma saída para tal situação.

RESUMO
Diante da crise econômica que assola o mundo desde 2007, os trabalhadores foram os menos beneficiados e assistidos por programas e medidas que salvaguardassem seus direitos. Como uma forma de resposta a esse quadro, o presente trabalho analisa como a aplicação conjunta do Direito Internacional do Trabalho e do Direito Internacional Econômico pode representar uma saída viável e adequada para a instrumentalização e efetivação dos Direitos Humanos dos milhões de pessoas que perderam seus meios de subsistência em razão de crise. Por fim, estudaremos qual o âmbito ideal para tal aplicação: a Organização Mundial do Comércio ou a Organização Internacional do Trabalho.
Palavras-chave: Direito Internacional do Trabalho – Direito Internacional Econômico – Direitos Humanos – OIT – OMC

ABSTRACT
Given the economic crisis sweeping the world since 2007, workers were the least benefited and helped by programs and measures that guarantee their rights. As a form of response to this situation, this paper examines how the application of the International Labour Law and International Economic Law may represent a viable and suitable solution for the enforcement the human rights of millions of people who lost their means livelihood due to the crisis. Finally, we will study which sphere is the ideal for this application: the World Trade Organization or the International Labour Organization.
Key-words: International Labour Law – International Economic Law – Human Rights – ILO – WTO

Sumário: Introdução. 1. Direitos Humanos. 2. Direito Internacional Econômico. 2.1. Direito Internacional Econômico e Direitos Humanos de 2ª Geração. 3. Direito Internacional do Trabalho. 4. Organização Mundial do Comércio. 5. Organização Internacional do Trabalho. 6. Ação integrada entre OMC e OIT. Conclusão. Referências bibliográficas.

Introdução

Em 2007 o mundo se deparou com um novo cenário de crise econômica globalizada, comparável, segundo respeitáveis analistas, ao vivenciado pela geração de 1929. Este quadro ainda não mudou e as economias nacionais ainda derrapam no caminho de sua reconstrução.
Muitos bancos faliram, diversas empresas declaram bancarrota e mesmo países inteiros mergulharam em um estado de crise endêmica. Diante desse processo de degradação econômica, foram organizados pacotes de ajuda e socorro às instituições financeiras, às empresas multinacionais, aos inúmeros governos combalidos.
No entanto, em momento alguns foi organizado um pacote ou um programa de assistência aos milhões de trabalhadores que perderam seus empregos, seus meios de subsistência, suas casas e mesmo sua dignidade. Em um mundo em crise, os obreiros hipossuficientes foram os menos assistidos.
Tendo isso em mente, cabe a pergunta: em que medida o Direito Internacional Econômico, cujo foco principal seria o desenvolvimento e o crescimento econômicos, e o Direito Internacional do Trabalho, conjunto de normas cujo escopo é a proteção dos diferentes tipos de trabalhadores, constituem instrumentos para a conquista e a consolidação dos Direitos Humanos?
Partindo da análise de dois ramos aparentemente irreconciliáveis, procuraremos demonstrar o ponto de intersecção entre ambos: os chamados direitos humanos de segunda geração (ou dimensão), isto é, os direitos sociais, de apelo econômico e cultural. 
Adotando-se a premissa de que os direitos humanos de segunda geração conjugam em seu cerne o Direito Internacional Econômico e o Direito Internacional do Trabalho, perquiriremos sobre a sua tutela no âmbito internacional, pesquisando qual seria o ambiente mais propício para sua instrumentalização e efetivação: a Organização Mundial do Comércio, com forte proeminência do Direito Internacional Econômico, ou a Organização Internacional do Trabalho, verdadeira matriz do Direito Internacional do Trabalho. 
Por se tratar de um estudo descritivo e exploratório, será realizado com base na pesquisa bibliográfica e histórica, utilizando por vezes do método dedutivo e outras o indutivo, principalmente nas críticas e reflexões acerca dos textos normativos. 

Direitos Humanos

A fim de delinearmos o que vem a ser direitos humanos com um mínimo de exatidão é importante conhecermos os principais caracteres deste ramo jurídico. 
- Caráter histórico: ligado à ideia de gerações ou dimensões de direitos humanos. Em razão de seu caráter expansivo /comunicativo nascem novos direitos oriundos dos direitos preexistentes, num processo de “dinamogenesis” dos direitos humanos. Com a “dinamogenesis” os direitos contemplados pelas gerações anteriores permanecem válidos nas posteriores, adotando nova roupagem, já que o contexto histórico e o paradigma dominante são diferentes;
- Caráter expansivo (indivisibilidade e interdependência): Os direitos humanos coexistem de forma sistêmica e harmônica, havendo restrições de meios de escolhas eticamente responsáveis. Essa característica serve como critério para resolver conflitos aparentes entre direitos sociais e direitos econômicos, como trataremos no decorrer do presente trabalho. Importante ter em mente que referida indivisibilidade relaciona-se com o caráter sistêmico, já que os direitos humanos formam uma unidade cujos elementos são interdependentes. São, portanto, todos iguais, não havendo relação de hierarquia entre eles;
- Caráter dialético e não taxativo: Inexiste um rol concreto e taxativo de referidos direitos. Sua enumeração depende de diversos fatores, como a consciência social, o grau sociocultural existente, o desenvolvimento científico-tecnológico existente. Os direitos humanos são dialéticos porque há uma tensão em todos os planos da realidade social delineada por esses direitos. Por exemplo, a tensão entre as diferentes teorias jurídicas sobre esse direito, entre os poderes vencedores e os poderes vencidos, entre os direitos positivados e os que ainda não o são – apesar de já socialmente exigidos.
- Caráter universal: embasam o chamado “mínimo ético”: tudo o que for necessário à concretização da dignidade da pessoa humana. O relativismo cultural, comum em sociedades plurais e complexas, já não pode oposto aos direitos humanos, uma vez que a dignidade da pessoa humana foi explicitada como seu principal fundamento. Em tempos de globalização, importante notar a extrema capilaridade de tal preceito, englobando todos os indivíduos, independente de características pessoais que os passam diferenciarem em um primeiro momento. Hoje se percebe que os direitos humanos possuem um valor permanente, perceptível e válido para todos;
-Caráter utópico: utopia seria a representação daquilo que não existe ainda, mas poderá existir se o homem lutar para a sua concretização. O pensamento utópico guiaria o caminho em prol do que é justo, sem receito das restrições impostas pela lei, que nem sempre estão de acordo com o que se entende por justiça.
Após analisarmos as principais características dos direitos humanos, relevante estudarmos as diferentes fundamentações possíveis para esses importantes valores. São elas:
Fundamentação ético-jurídica ou jusfilosófica: engloba os posicionamentos jusnaturalistas e juspositivistas. A primeira afirma que o fundamento do direito positivo são os próprios direitos humanos enquanto direitos que correspondem à natureza humana. Já a segunda entende o fundamento jurídico dos direitos se encontra nas mesmas normas de direito positivo que os reconhecem. A concepção jusnaturalista divide-se, ainda, em:
- fundamento último, mediato ou indireto dos direitos humanos: a dignidade da pessoa humana. Enquanto na era medieval o caráter pessoal era o que determinava que o homem fosse a imagem e semelhança de Deus, hodiernamente baseia-se no homem como ser racional, com possibilidade de realizar-se igualitária, livre e solidariamente junto aos demais seres humanos. Em sua perspectiva negativa, a dignidade pressupõe que a pessoa não pode ser objeto de ofensas e humilhações, enquanto uma perspectiva positiva a traduz como o pleno desenvolvimento da personalidade no âmbito social.
- fundamento próximo, imediato ou direto dos direitos humanos: o valor segurança, pelo qual há a necessidade de garantir a dignidade da pessoa humana para que se possa respeitá-la e os valores dela derivados. 
b) Fundamentação jurídico-positiva: os valores e princípios que as Constituições reconhecem de forma explícita ou implícita. Esses valores constitucionais apresentam tripla dimensão: I. fundamentadora, como o conjunto de disposições e instituições constitucionais e do ordenamento jurídico como um todo; II. orientadora, como a ordem jurídico-política  que torna ilegítima qualquer disposição normativa que objetive fins distintos ou obstaculize a consecução de tais valores; III. Crítica, como critério ou parâmetro para avaliar fatos ou condutas;
c) Fundamentação jurídico-política: conexão ente dignidade e Estado de Direito. Há duas teorias fundamentais sobre esta questão. I. teoria do consenso: os consensualistas requerem certa ética da “ação comunicativa”, onde todo sujeito capaz de falar e atuar pode participar da discussão. Todos podem questionar qualquer informação, introduzir qualquer afirmação no discurso e manifestar suas posições. II. teoria do dissenso: para esta posição a primeira teoria seria deveras ingênua, na medida em que tal nível de comunicação e consequente consenso são impraticáveis. O fundamento ou ponto de partida dos direitos humanos não seria o consenso sobre o que é justo, mas um momento prévio em que se constata o dissenso entre os homens, e que os impulsionará na busca pelo consenso. 
Vladmir Oliveira da Silveira destaca a definição de Pérez-Luño, para quem os direitos humanos são “um conjunto de faculdades de instituições que, em cada momento histórico, concretizam as exigências da dignidade, da liberdade e das igualdades humanas, as quais devem ser reconhecidas positivamente pelos ordenamentos jurídicos a nível nacional e internacional”. 
Diz-se que os valores ínsitos aos Direitos Humanos são universalmente aceitos, ainda que não integralmente aplicados e respeitados por todos os Estados, por serem parte integrante do conjunto do jus cogens internacional. 
Explica Cláudio Finkelstein que jus cogens foi a denominação dada “... à norma peremptória, obrigatória, inderrogável, seja pela vontade dos Estados, seja por imposição de Estado. Em termos concretos tem um significado além da cogência comum a qualquer ordem jurídica. (...) O conceito é baseado em uma aceitação de valores fundamentais e superiores, por toda a comunidade internacional, dentro do sistema e, em alguns aspectos, assemelham-se ao conceito de ordem pública internacional ou a ordem pública na ordem jurídica interna. (...) É um corpo de princípios imperativos de direito internacional que são universais e não derrogáveis. Com efeito, o ‘jus cogens’ representa as normas fundamentais do direito internacional que se aplicam a todos os Estados, independentemente de vontade ou consentimento.”
Em que pese tamanha aquiescência acerca de sua relevância, o mesmo não se aplica à sua definição. Não há um conceito de direitos humanos que seja amplamente aceito e observado, dada a subjetividade inerente à matéria. Consideramos, no entanto, que a simplicidade desconcertante de Oscar Ermida Uriarte define a matéria de maneira muito adequada. Para ele, “... Direitos humanos são (...) aqueles direitos inerentes, próprios da personalidade humana; por isso se chamam direitos humanos. Esses mesmos direitos são direitos fundamentais porque são direitos humanos, são fundamentais enquanto são essenciais à personalidade humana.”
Importante tangenciarmos também, ainda que brevemente, suas diferentes gerações ou dimensões. Ainda que haja pensadores defendendo a existência de direitos humanos de quarta e quinta geração, nos ateremos à divisão clássica em três gerações ou dimensões, quais sejam:
- Direitos Humanos de primeira geração: ainda que decorrentes de um longo processo, cujo início se deu com a Magna Carta assinada pelo rei João Sem Terra (1215), culminaram na Revolução Francesa (1789). São os direitos atinentes às liberdades públicas e aos direitos políticos, traduzindo o valor de liberdade;
- Direitos Humanos de segunda geração: inspirados pela Revolução Industrial Europeia, no século XIX, surgem os direitos sociais, culturais e econômicos, correspondendo aos direitos de igualdade.
- Direitos Humanos de terceira geração: com a crescente globalização, a interdependência dos países componentes da comunidade internacional torna-se cada vez mais premente. Dessa nova realidade surge a necessidade de elaboradas tutelas coletivas, especialmente nas esferas ambientais e de direito do consumidor. Assim, o ser humano é inserido em uma coletividade e passa a ter direitos de solidariedade. 
O mais importante meio de tutela dos direitos humanos foi a formalização escrita. Em um primeiro momento, isso se deu apenas na esfera internacional, com as declarações de direitos humanos, “atos solenes através dos quais organizações intergovernamentais regionais ou mundiais, ou organizações não governamentais de direitos humanos, proclamam sua adesão e apoio aos princípios gerais de direitos humanos, embora sem a formalidade e o valor jurídico que caracterizam os tratados internacionais e as normas jurídicas estatais”.
Entre as mais importantes declarações, podemos citar a Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão (França, 1789), ponto seminal de toda a matéria, e a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), documento importantíssimo que representou a necessária mudança de paradigmas após os horrores da 2ª Guerra Mundial. 
Em decorrência do reconhecimento na esfera internacional, há a normatização desses direitos também nas esferas nacionais. Como ensinam Vladmir Oliveira da Silveira e Maria Mendez Rocasolano:
“Da restauração napoleônica, em 1804, até a Primeira Guerra Mundial, em 1914, surge a constitucionalização dos direitos enunciados nas primeiras declarações. Com isso os homens passam a gozar de direitos humanos por força da lei, através de sua positivação das declarações de direitos humanos, ultrapassando o estágio de reivindicações morais para converter-se numa questão sociopolítica (...).
[...]
No processo de reconhecimento dos direitos humanos também de estabelece uma ampliação progressiva do conteúdo dos direitos reconhecidos, o que vem a  ser uma exigência diante da ‘dinamogenesis’ de novos direitos, que são novos reclamos ou concretizações ou novas interpretações de direitos preexistentes.” (destacado no original)

Direito Internacional Econômico      

Tendo o Direito Internacional Público sido formalmente inaugurado com a Paz de Vestfália em 1648, o Direito Internacional Econômico, ramificação daquele, só tomou corpo com o incremento das relações econômicas internacionais após a 2º Guerra Mundial, juntamente com o fortalecimento do liberalismo econômico como pensamento vigente.
As primeiras obras doutrinárias a respeito do tema vêm a lume na década de 1950, com poucas reverberações práticas nas décadas seguintes. Os anos 1990 representam a grande guinada do Direito Internacional Econômico, com a criação da Organização Mundial do Comércio e o predominante papel exercido pelo Fundo Monetário Internacional na renegociação das dívidas externas e nas ondas de privatização após o fim da Guerra Fria. 
Não há efetivamente um conceito universalmente aceito sobre o que vem a ser o Direito Econômico Internacional. Pode-se dizer que este é um ramo que se encontra em constante reformulação, tal qual os fatos que estuda e aborda. 
Assim, vale ressaltar que este é um ramo do Direito Internacional Público que procura regrar as questões referentes à produção e a circulação de seus diversos fatores (pessoas, bens, capitais e serviços), o consumo, o direito da cooperação, do comércio, dos investimentos, das instituições econômicas internacionais, da integração regional e o desenvolvimento.
Tendo-se em mente que o escopo fundamental do Direito Internacional Econômico é o desenvolvimento e a paz, para a consecução desses objetivos o conteúdo deste ramo varia enormemente no tempo e no espaço, de acordo com a evolução histórica da humanidade. Portanto, para a correta compreensão deste tema o operador do direito deve possuir conhecimento em ramos correlatos, como direito internacional da cooperação, do direito do comércio internacional, do direito internacional monetário, do direito das instituições econômicas internacionais, do direito internacional da integração, do direito comunitário, do direito internacional do desenvolvimento, bem como da história, da economia, das ciências políticas, da sociologia, da antropologia e das relações internacionais, entre outras áreas do conhecimento.

2.1. Direito Internacional Econômico e Direitos Humanos de 2ª Geração (Dimensão)

Os direitos humanos de primeira dimensão (direitos civis e políticos) têm autoaplicabilidade, devendo ser assegurados imediatamente pelo Estado. Os direitos sociais, econômicos e culturais, por outro lado, apresentação realização progressiva. A realização destes direitos está condicionada à atuação do Estado, que deverá adotar medidas econômicas e técnicas, com meios próprios e mediante cooperação internacional, a fim de alcançar progressivamente a sua completa realização.
 A implementação progressiva dos direitos sociais, econômicos e culturais reflete o reconhecimento de que a realização integral e completa desses direitos, em geral, não se faz possível em um curto período de tempo. Ao Estado cabe assegurar, pelo menos, o núcleo essencial mínimo, isto é, os patamares mínimos civilizatórios essenciais à tutela da dignidade da pessoa humana. 
Importante ter-se em mente que não se deve adotar a visão simplista de que os direitos sociais, ao contrário dos direitos civis e políticos, demandariam apenas prestações positivas do Estado, enquanto aqueles demandariam prestações negativas ou mera abstenção estatal.  
Incrivelmente, os Direitos Sociais são alvo de um comportamento por vezes pernicioso dos Estados também na esfera internacional. Preleciona Flávia Piovesan: “... a comunidade internacional continua a tolerar frequentes violações a direitos sociais, econômicos e culturais que, se perpetradas em relação aos direitos civis e políticos, provocariam imediato repúdio internacional. Em outras palavras, ‘independentemente da retórica, as violações de direitos civis e políticos continuam a ser consideradas como mais sérias e mais patentemente intoleráveis, que a maciça e direta negação de direitos econômicos, sociais e culturais’”.
“Em geral, a violação aos direitos sociais, econômicos e culturais é resultado tanto da ausência de forte suporte e intervenção governamental como da ausência de pressão internacional em favor dessa intervenção”.
O Direito Internacional Econômico mostra-se um útil instrumento na tutela internacional dos direitos humanos de segunda geração. Sendo certo que o fim último deste ramo é o desenvolvimento e a paz, elementos essenciais à progressiva implementação desses direitos, percebe-se uma fina simbiose entre os dois temas em apreço.

Direito Internacional do Trabalho

Os Direitos Humanos foram divididos metodologicamente em diferentes gerações ou ondas. Tal divisão gera controvérsias, mas a discussão de tal polêmica escapa aos estreitos limites do presente trabalho. Para o fim a qual nos propomos, importa saber que o Direito do Trabalho, estando consagrado no rol dos Direitos Sociais, estaria incluído nos chamados Direitos Humanos de segunda geração. 
Conforme ensina Francisco Rezek, “Esse direito tem a ver basicamente com as condições do trabalho, com a retribuição do trabalho humano, com o ajuste a esse tipo de relação – que se presume desigual – de diversos princípios gerais do Direito, como o da isonomia”. E continua: “os de segunda geração são (...) os que têm a ver com o direito ao trabalho, à igual remuneração por igual trabalho, às condições de associação sindical, à liberdade sindical, ao repouso, à proibição de formas de trabalho não condizentes com a dignidade humana ou com as condições especiais de certas categorias de pessoas”.
O Direito Internacional do Trabalho possui inegável importância na tutela dos direitos e garantias destinados aos trabalhadores, em geral a parte mais frágil em uma relação jurídica da qual retiram os meios para sua subsistência. Essa importância é, inclusive, histórica. Tal ramo da ciência jurídica foi consagrado no plano internacional pela criação da Organização Internacional do Trabalho que, juntamente com o Direito Humanitário e com a extinta Liga das Nações, contribuiu para o processo de internacionalização dos Direitos Humanos. 
A OIT é o verdadeiro marco de nascimento e consagração do Direito do Trabalho. É interessante notar que antes de sua criação as normas trabalhistas eram poucas, esparsas e tímidas. Foram as suas convenções que inspiraram e nortearam a criação e a consolidação de leis protetivas ao obreiro em grande número de países. Curioso também é que o Direito do Trabalho, além de ter nascido internacional, também nasceu constitucional. As primeiras normas nacionais a consagrarem relevante rol de direitos trabalhistas foram a Constituição Mexicana de 1917 e a Constituição de Weimar de 1919.
Hoje vivemos uma espécie de globalização também dos Direitos Humanos, aí incluído o Direito do Trabalho. É o que muitos chamam de Direitos Humanos Universais, reconhecidos como válidos e aplicados pela maioria dos povos. Isso é bastante perceptível no ramo trabalhista, onde muitos países adotam os critérios mínimos de proteção apontados pela OIT como sustentáculos para a incipiente – quando não inexistente – legislação interna. Importante ressaltar, assim, que ainda que o Direito Internacional do Trabalho seja aplicável a todos os países, desempenha papel preponderante nos países em desenvolvimento. 
A garantia dos Direitos Sociais aos trabalhadores é fundamental, não podendo ser dissociada da proteção dos obreiros como seres humanos. “O trabalhador tem duas classes de direitos humanos: os direitos trabalhistas específicos (...) e os demais direitos do cidadão, inespecíficos, não específicos do trabalhador, mas que ele conserva, como cidadão, na relação de trabalho.”
“Claro, o exercício desses direitos – liberdade de expressão, direito à intimidade, dignidade da pessoa humana, direito à saúde – pode ser modelado, adaptado a uma relação de subordinação na relação de dependência, na relação de pertinência a uma organização produtiva, mas existe”. 
Eis a real dimensão da necessidade da consagração dos direitos trabalhistas na esfera dos Direitos Humanos. Insta que o trabalhador seja protegido também como cidadão que é, evitando que a energia por ele despendida seja tratada cinicamente como mera mercadoria. Não podemos esquecer que atrás da mão-de-obra contratada, que atrás do serviço prestado, existe um ser humano, titular de direitos indisponíveis, que por todos devem ser observados. Inclusive pelos Estados.
Em um mundo de capitalismo internacional quase descontrolado, os trabalhadores têm que ser protegidos não só dos desmandos de empregadores, mas também do Estado, que na ânsia de atrair investimentos estrangeiros pode passar por cima das garantias trabalhistas.  Nesse quadro, ganha imensa relevância a consagração dos princípios da dignidade da pessoa humana, da segurança jurídica e a proibição do retrocesso social. Este último, além de ser cláusula pétrea do Brasil, é garantido pelo artigo 2.1 do Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. 
Não é possível vislumbrar a efetiva garantia e proteção dos direitos dos obreiros se os instrumentos que os consagram são vistos como diplomas legais de conteúdo programático. A Constituição e os Tratados Internacionais não são apenas normas enunciativas, mas sim as fontes supremas a serem observadas na interpretação e na aplicação do Direito do Trabalho. Não devem ser enunciados pairando no ar, com papel meramente abstrato. Devem desempenhar efetiva função balizadora.

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Organização Mundial do Comércio (OMC)

 As nações aliadas, por meio de seus representantes, reuniram-se, no ano de 1944, em Bretton Woods, New Hampshire, EUA, para a “Conferência Monetária e Financeira das Nações Unidas”, objetivando reestruturar o sistema capitalista mundial, combalido pela Segunda Grande Guerra, ainda em curso.
Além da definição de um corpo de disposições regulamentando a economia mundial, foram criadas duas instituições para auxiliar e viabilizar o processo de reconstrução: o Internacional Bank for Reconstruction and Development (Banco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento – BIRD) e o Internacional Monetary Fund (Fundo Monetário Internacional – FMI).
Em adição aos Acordos de Bretton Woods, os Estados Unidos apresentaram, em novembro de 1945, as “Propostas para a Expansão do Comércio Mundial e do Emprego”. As chamadas “The Proposals” versavam, basicamente, sobre quatro temas:
- eliminação das restrições governamentais ao livre comércio, como subsídios, cotas, tarifas diferenciadas, entre outras;
- combate às limitações impostas por monopólios privados. Essa era uma grande novidade: os governos deveriam não só abrir mão de expedientes limitantes ao livre comércio, como também impor aos empresários a obrigação de fazer mesmo;
- regulação dos mercados de produtos de base, como trigo, açúcar, algodão, etc;
- manutenção de níveis elevados de produção e emprego, iniciativa já manifestada pela Carta Atlântica. Essa era uma preocupação generalizada, conforme já visto. Sendo de conteúdo mais programático, a sua consecução era de mais difícil aferição. 
Juntamente com essas propostas, os Estados Unidos propugnavam a criação da “Organização Internacional do Comércio”, que atuaria como Instituição Especializada das Nações Unidas. Com base na proposta americana, a ONU convocou, em 1946, a “Conferência Mundial sobre Comércio e Emprego”.
Durante as tratativas, eram distinguíveis três teses: os Estados Unidos, como economia mais forte e dominante, defendia a abertura total, com nível zero de proteção; os países em desenvolvimento, com economias frágeis e indústrias incipientes, esperavam se beneficiar de um tratamento especial e de maior proteção; os europeus, por sua vez, estavam em uma posição intermediária, aceitando um desmonte tarifário parcial, mas pretendendo manter os sistemas de preferências tarifárias com os integrantes de seus impérios coloniais e com suas ex-colônias.
No fim, a Carta de Havana consagrou uma combinação dos diferentes pontos de vista. Os europeus conseguiram não só a manutenção, ainda que temporária, das preferências imperiais, como também a possibilidade de criar uniões aduaneiras e zonas de livre comércio.
Foram negociações de vulto, tendo 53 países assinado a Ata Final da Conferência de Havana, à qual se anexada a Carta da OIC. Nada obstante os esforços empreendidos, principalmente pelo governo estadunidense, a OIC nunca saiu do papel. Ironicamente, sua existência efetiva foi impedida pelo Congresso dos Estados Unidos, que, durante o procedimento de ratificação, se recusou a aprovar o texto. Os congressistas consideraram as derrogações exagerada e incabíveis, contrárias ao espírito do livre-comércio. 
Assim, em 1951 o projeto da OIC chegou ao fim, antes mesmo de ganhar vida. No entanto, os trabalhos da Conferência não foram realmente em vão. Em 1947, paralelamente à Conferência de Havana, aconteceu, também por iniciativa norte-americana, uma negociação multilateral sobre política tarifária. Em apenas 7 meses, os 23 países participantes reduziram seus direitos alfandegários sensivelmente. Tanto assim o foi que o resultado imediato da aplicação do General Agreement on Trade and Tariffs (GATT – Acordo Geral sobre Comércio e Tarifas), em 1948, foram 45.000 concessões tarifárias, referentes a um comércio de 10 bilhões de dólares.
Com o prematuro fim da OIC, o GATT, que deveria ser apenas um acordo temporário, passou a ser, obrigatoriamente, o único quadro multilateral a reger o comércio internacional, assim permanecendo por quase 50 anos. O GATT, embora não sendo uma organização internacional pela literalidade jurídica, atuava como uma. Contudo, não se pode esquecer que constituía um tratado, que, strictu sensu, era apenas uma norma.
Justamente por isso, contava com uma estrutura bastante simples, prevendo apenas um órgão: a “Reunião das Partes Contratantes”. Importante salientar que, por não ser uma organização internacional, os estados integrantes não recebiam a denominação de “membros”, mas sim de “partes contratantes”. Com o passar do tempo, foram criados outros órgãos, como a “Sessão das Partes Contratantes” e o “Conselho dos Representantes”, entre outros, tendo o GATT reunido todos os elementos de uma organização internacional, sem jamais tê-lo sido oficialmente.
Ocorreram, sob os auspícios do GATT, diversas negociações multilaterais, denominadas “Rodadas”. Ainda que o desmonte tarifário fosse o tema principal, eram abarcados outros assuntos concernentes ao livre comércio. Na Rodada Tóquio (1971) foi analisada, entre outras questões, a prática do dumping e a aplicação de direitos antidumping. Um “Código Antidumping”, elaborado durante a Rodada Kennedy (1962), foi submetido a um comitê especial que aprovou o procedimento ali disciplinado.
De todas as Rodadas, a mais importante e vultosa foi a do Uruguai, iniciada em 1986. Com a duração prevista de 4 anos, acabou por se estender até 1994. Ainda assim, terminou com um acordo incompleto, excluindo três setores importantes: finanças, transportes marítimos e o audiovisual. Também se aproveitou para definir com maior precisão o método a ser utilizado para determinar a existência de dumping e também os critérios para comprovar o prejuízo e a relação causal entre a prática incriminada e o dano.
A Rodada Uruguai foi encerrada em 15 de abril de 1994, com a assinatura da Ata Final de Marakesh (Marrocos), à qual foi anexado, entre outros documentos, o acordo constitutivo da Organização Mundial do Comércio (OMC). A recém-criada organização teria cinco grandes missões:
- garantir a aplicação do conjunto de acordos anexados à Ata Final de Marakesh;
- oferecer um quadro para futuras negociações comerciais;
- examinar regularmente as políticas comerciais dos seus membros, de maneira a eliminar os obstáculos às trocas;
- garantir maior eficiência na solução de controvérsias;
- oferecer foro permanente de negociações;
Não há no âmbito da OMC qualquer dispositivo regrando relações de trabalho e sua precarização, ainda que para fins de vantagem comercial indevida. Em verdade, a Declaração Ministerial ao fim da Conferência de Singapura em 1996, ao reafirmar o compromisso com a observância dos padrões trabalhistas internacionalmente reconhecidos, apontou a OIT como organização competente para determinar e instrumentalizar tais padrões, rejeitando o uso destes para fins protecionistas. 

Organização Internacional do Trabalho

A Organização Internacional do Trabalho foi criada pelo Tratado de Versailles em 1919, como parte da Sociedade das Nações, logo após a Primeira Guerra Mundial, durante o processo de paz. Sua concepção foi resultado de um longo processo de conscientização dos trabalhadores, dos empregadores e dos governantes da necessidade de instituir-se uma rede de proteção aos obreiros, muitos dos quais submetidos a condições aviltantes de trabalho.
Conforme visto, o liberalismo oriundo da Revolução Francesa (1789) pregava, entre outras coisas, a plena autonomia da vontade e a não-intervenção estatal nos negócios privados. Decorria desses paradigmas a liberdade contratual plena, que, segundo os intelectuais liberais, seria inviabilizada por qualquer “classe de corporações de cidadãos do mesmo estado ou profissão”, razão pela qual foram abolidas e proibidas (art. 1º da Lei Chapelier, de 17 de julho de 1791). Tal vedação se alastrou por outros ordenamentos jurídicos.
Ocorre que tão defendida liberdade gerava situações anacrônicas, dada a desigualdade existente entre as partes contratantes em muitos casos, notadamente nos contratos de trabalho subordinado. Na tentativa de corrigir e reverter esse quadro os operários se uniram, apesar da proibição existente. As “trade unions” inglesas foram uma importante demonstração da força da união dos trabalhadores. Em resposta aos esforços por elas empreendidos, o Parlamento Britânico, em 1824, revogou a proibição ao sindicalismo, passando a tolerar as “trade unions”, sem conferir a elas, contudo, personalidade jurídica. Somente em 1871 o Governo inglês regulamentou o direito de sindicalização, sendo seguido por outros países, marcadamente França e Estados Unidos. 
Ao mesmo tempo, alguns intelectuais e governantes passaram a defender a tese da internacionalização das normas de proteção ao trabalho. A primeira manifestação que se tem notícia nesse sentido foi do empresário Robert Owen, que aplicou ideias inovadoras em sua fábrica de tecidos na Escócia. Em 1818, Owen propôs ao Congresso de Aix-la-Chapelle que fosse instituído um limite legal internacional da jornada de trabalho. Ele não obteve êxito e não recebeu apoio de nenhum governo, mas suas sugestões revolucionárias abriram caminho para as futuras transformações que se sucederiam. 
Uma dessas transformações foi a “Assembleia Internacional dos Trabalhadores” (comumente denominada Primeira Internacional), ocorrida em Londres no ano de 1864, onde Marx e Engels lançaram um manifesto conclamando a união do proletariado e a criação de uma legislação social internacional. 
A ideia de estabelecer “... uma legislação internacional que, instituindo direitos irrenunciáveis em favor dos trabalhadores, tivesse também por escopo equilibrar o ônus da proteção social, entre países industrializados e concorrentes no comércio mundial" tomava mais corpo e ganhava força.
Neste esteio, a Suíça, por iniciativa dos deputados Decurtens e Favon, convocou os Estados industrializados europeus para uma conferência que seria realizada em Berna em 05 de maio de 1890, onde seriam discutidas futuras normas protetivas internacionais. Contudo, o Kaiser Guilherme II, aproveitando-se do reconhecimento internacional gozado pela Alemanha convocou a Conferência de Berlim, para 15 de março de 1890. Importante destacar que a Alemanha foi a precursora em adotar um regime de Previdência Social, sob o comando do Chanceler Bismarck.
Tal Conferência de Berlim ocorreu conforme o planejado, mas seus resultados práticos foram parcos, em parte pela hesitação dos governos europeus em adotar normas internacionais de proteção aos trabalhadores e em outra parte por ter o Kaiser Guilherme II perdido o entusiasmo pela causa, após conseguir a maioria no Reichstag. Contudo, não foi em vão, uma vez que foi reunido amplo material que serviria de base para futuras normas.
Posteriormente, em julho de 1900 ocorreu o Congresso Internacional de Legislação do Trabalho, durante a Exposição Internacional de Paris. Entre outros tópicos, foi aprovada, por unanimidade, a criação da “Associação Internacional para a Proteção Legal dos Trabalhadores”. Com o apoio financeiro do governo suíço, a Associação iniciou seus trabalhos na cidade da Basiléia. Exerceu laboriosa atividade até a eclosão da Primeira Guerra Mundial, possuindo 15 seções nacionais e tendo realizado oito reuniões. 
Desde o início da Primeira Guerra, a organização sindical norte-americana American Federation  of Labour (AFL) empreendia ações para que o futuro Tratado de Paz abarcasse normas de amparo ao trabalhador. Sindicalistas europeus encamparam essa ideia, ampliando-a, defendendo a participação das organizações sindicais na Conferência da Paz ao lado dos governantes, sob pena não serem obtidos resultados práticos em favor dos operários.
A questão social passou a importar aos países beligerantes por razões eminentemente práticas: considerando a importância das fábricas de armas, munições, entre outras, para as operações militares, era do interesse dos governos regulamentar o trabalho nesses locais para obter a máxima produtividade. Junte-se a isso a tomada de consciência dos trabalhadores. Tendo ajudado na vitória dos países aliados, seja no confronto bélico direto, seja na produção interna, possuíam legítimas reivindicações de melhores condições de trabalho. 
No mesmo dia da instalação da Conferência da Paz (25 de janeiro de 1919), no Palácio de Versailles, foi designada uma “Comissão de Legislação Internacional do Trabalho”, que deveria, entre outras atribuições, apontar os meios necessários para a instituição de uma organização conexa à Sociedade das Nações, objetivando melhorar as condições de trabalho. 
Conforme lição de Süssekind, referida Comissão "... tomou por base para discussão o projeto que havia sido apresentado pela delegação inglesa, o qual dispunha sobre a criação de um organismo tripartite, constituído de representantes governamentais, patronais e operários, que votariam individual e independentemente. Desde logo se verificou que, quanto às delegações da França e da Itália realçavam o papel dos governos no funcionamento do organismo e na consequente evolução das leis de proteção ao trabalho, os norte-americanos preferiam atribuir aos empregadores e trabalhadores os maiores ônus na solução dos seus próprios problemas, fixando-se os ingleses numa posição intermediária, que, afinal, veio a prevalecer. (...) Após 35 sessões, a Comissão concluiu, em 24 de março, o projeto que, com pequenas alterações, foi aprovado pela Conferência e passou a constituir a Parte XIII do Tratado de Versailles. Em 06 de maio de 1919 a Conferência adotou o texto completo do Tratado de Paz”. 
Nascia, assim, a Organização Internacional do Trabalho, com sede na Suíça. Nos anos entre- guerras (1919-1939), a OIT exerceu profícua atividade, com a criação de normas internacionais de proteção ao trabalho. A inovadora fórmula do tripartismo mostrou-se acertada, constituindo importante meio de legitimação da nova organização nas mais distintas esferas sociais, notadamente entre as classes operárias.
Com o início da Segunda Guerra Mundial, as atividades da OIT ficaram comprometidas. Em novembro de 1941 aconteceu em Nova Iorque uma Conferência para definir as medidas a serem adotadas após o fim do conflito bélico para garantir a continuidade da Organização. A conveniência e a importância de suas atividades foi afirmada à época pelo Presidente Roosevelt, que, com o Primeiro Ministro Inglês Winston Churchill, firmara em agosto do mesmo ano a Carta do Atlântico, onde manifestava-se a intenção de promover a cooperação internacional para incrementar normas de trabalho, prosperidade econômica e segurança social.
Em 1944, realizou-se na Filadélfia a 26ª sessão da Conferência, onde foi aprovada a Declaração da Filadélfia, que tratava, entre outros pontos, dos seguintes tópicos:
- ampliação dos princípios do Tratado de Versailles (1919), ressaltando que a cooperação internacional era essencial para a segurança social da humanidade;
- reafirmação do tripartismo e a imperatividade da justiça social;
- ampliação da competência da OIT, incumbindo-a de promover programas de cooperação técnica;
- colaboração com outros organismos internacionais.
Apesar do prestígio alcançado pela OIT, sua existência corria risco após do desaparecimento da Sociedade das Nações e a criação da Organização das Nações Unidas (ONU), em junho de 1945, durante a Conferência de São Francisco. Em 30 de maio de 1946, foi firmado um acordo entre a ONU e a OIT, estipulando que esta seria um organismo especializado daquela, estando a ela vinculada, com gozando de completa personalidade jurídica e autonomia.
Ainda em 1946 foi aprovado o novo texto da Constituição da OIT, da qual a Declaração da Filadélfia passou a ser parte integrante. Se antes dessa reforma a OIT tratava apenas da regulamentação das condições de trabalho e do seguro social, depois dela abraçou uma missão maior, tutelando os direitos humanos fundamentais do trabalhador. 
Atualmente, muitos críticos entendem que a atuação da OIT se mostra esvaziada, uma vez que não estão previstas em sua Constituição sanções efetivas contra os países membros que descumprem as Convenções por ele ratificadas, mas tão somente advertências de cunho moral. No entanto, enquanto a necessária reforma do sistema da OIT não é realizada, entende-se que referido organismo internacional pode apoiar e encorajar que seus Membros adotem e desenvolvam os padrões trabalhistas mínimos internacionalmente reconhecidos.
Os efeitos positivos das boas práticas comerciais e trabalhistas devem ser divulgados com maior entusiasmo e os países membros devem ser pressionados a justificar mais acuradamente as razões pelas quais eles não tomam as iniciativas necessárias e não observam os padrões trabalhistas determinados pela OIT.  
Ação integrada entre OMC e OIT

O presente trabalho se propõe a abordar temas que parecem irreconciliáveis, apesar de sua estreita ligação: a economia de mercado, com seu objetivo de atingir máxima produtividade e lucro, e a massa de trabalhadores, com sua necessidade de proteção. Não haveria produtos e serviços a serem comercializados se não houvesse pessoas engajadas nessas atividades. Mesmo em uma época eminentemente tecnológica como a em que vivemos, há funções que só podem ser exercidas por seres humanos. Já os trabalhadores não teriam onde empregar a sua energia se não existisse coisas a serem produzidas e serviços a serem prestados. Como um elo a fechar essa cadeia, há a contraprestação percebida pelos obreiros, primordial à subsistência desses e que os tornará consumidores, essenciais para a prosperidade do mercado.
Tendo isso em mente, é deveras importante manter esses diferentes fatores em sintonia, em fino equilíbrio. De um lado, há que se fomentar a iniciativa privada, possibilitando que esta floresça e atinja altos níveis de produtividade e alcance os frutos financeiros esperados. Por outro, é imperativo que o exercício da atividade econômica não ocorra sacrificando-se a energia vital do empreendimento – a energia humana.
Ainda que vivamos em dias onde prevalece o Estado mínimo, com pouca intervenção do governo nos rumos do mercado, é necessário haver certa ingerência estatal na economia. As ditas mãos invisíveis do mercado não são suficientemente imparciais para privilegiar o interesse de todas as esferas sociais, não só o dos empreendedores. Não defendemos uma economia planificada, com demasiada burocracia e legislação engessante. Apenas cremos ser imprescindível que o Estado estabeleça limites, ainda que fluídos, onde a economia possa se movimentar livremente, e, ao mesmo tempo, atender à sua função social. 
A crise econômica que reverberou mundialmente desde 2007 demonstrou a falibilidade da concepção do liberalismo contemporâneo (também denominado de neoliberalismo), defensora da autorregulação da economia. O que evitou resultados ainda mais assoladores foi a pronta intervenção dos governos, dispostos a injetar enormes quantias de dinheiro em empresas e instituições financeiras, a fim de manter a economia funcionando e frear a queda dos postos de trabalho. 
Ainda que a atuação estatal seja necessária para equilibrar a relação entre o mercado e a força de trabalho, ela, por si só, não é suficiente para corrigir todas as distorções geradas pelo livre comércio. Depreende-se isso do próprio fato de não terem havidos iniciativas governamentais relevantes com o fito de garantir a dignidade dos trabalhadores, a manutenção dos postos de trabalho existentes e a criação de novos.
Ao estabelecer Tratados contendo direitos essenciais destinados a todos os obreiros, a OIT e seus membros formam uma rede sólida de normas e debates sobre o tema. Uma das razões para o grande número de ratificações das Convenções desta organização é a sua notória parcimônia ao estabelecer os padrões mínimos a serem observados. Ainda que alguns critiquem referida prudência, julgando-a prova de fraqueza e falta de vontade política, é, na verdade, medida de bom senso, a fim de se congregar realidades sociais as mais dispares possíveis. 
Paralelamente, a atuação da OMC é de reconhecida importância para manter a livre concorrência no mercado entre os países, evitando tratamentos discrepantes e também a adoção de medidas distorcivas ao comércio internacional. Entre essas medidas podemos citar o dumping social, praticada por alguns países que, para atrair investimentos externos, aceitam flexibilizar as normas de proteção ao trabalho a níveis inimagináveis, chegando a caracterizar o aviltamento do trabalhador. Mesmo que com um viés comercial, visando proteger o mercado e a livre concorrência, a OMC desempenha importante papel na abolição dessas práticas nocivas, impondo medidas sancionatórias aos países que as adotam. 
Para combater práticas distorcivas que ferem a dignidade do trabalhador enquanto pessoa humana são sugeridas, por diferentes linhas de pensamento, algumas saídas. Uma delas seria a aplicação de direitos antidumping, sob os auspícios da OMC, assim como se faz quando há comprovada prática de dumping meramente econômico.
 Outra seria a adoção de cláusulas sociais, embutidas em tratados comerciais, também no bojo da OMC. Como visto, os países desenvolvidos defendem a fixação de padrões mínimos de proteção ao trabalho a serem respeitados por todos os Estados-membros, sob pena de sofrerem sanções comerciais. Os países em desenvolvimento, por sua vez, acreditam que a instituição de cláusulas sociais inviabilizaria as suas exportações.
A OIT, por seu turno, sugeriu a criação de um “selo social”, de engajamento voluntário por parte das empresas, que receberiam um certificado atestando serem respeitadoras das normas de proteção aos trabalhadores. Essa possível solução, assim como as outras, é alvo de críticas e discursos inflamados, pois dificultaria o desenvolvimento de indústrias incipientes ou que ainda não são tão competitivas no campo tecnológico quanto as provenientes de países desenvolvidos.
Porém, ainda que compreendamos a visão eminentemente pragmática dos que defendem a não normatização internacional sobre o dumping social, com ela não coadunamos. O desenvolvimento econômico de um país só poderá ser considerado legítimo quando não for construído sobre o desrespeito dos direitos trabalhistas e, principalmente, quando os frutos dele advindos não se limitarem apenas aos empreendedores.
Ainda que não defendamos a visão de que todos os trabalhadores são hipossuficientes, não podemos esquecer que grande parte deles o é. Esta é a realidade de muitos obreiros, principalmente em países em desenvolvimento – justamente os maiores praticantes do dumping social. É importante ter isso em mente ao se analisar a questão. Não é cabível manter a cínica concepção de que os fins justificam os meios – que, para a aferição de lucros cada vez maiores, é aceitável o aviltamento dos trabalhadores como um dos efeitos colaterais.
Não, não o é. Procuramos demonstrar que o Direito do Trabalho está incluído no rol dos Direitos Sociais, consagrados na chamada 2ª Geração de Direitos Humanos. Sendo, portanto, um das formas de exteriorização dos Direitos Humanos, o Direito do Trabalho deve ser considerado de suma importância, como instrumento viabilizador das mudanças sociais, políticas e econômicas necessárias para atingir-se a proteção dos direitos mínimos dos trabalhadores. O alegado custo com a mão de obra não pode sobrepor-se ao valor da dignidade da pessoa humana.
Neste quadro, entendemos que a atuação da OIT deve ser preponderante, por ser ela a organização internacional cujo acervo de normas e princípios é o mais adequado para reger o assunto. Um dos valores basilares defendidos pela OIT, em toda a sua trajetória, é o que o trabalho humano não é mercadoria. A fixação de um rol mínimo de convenções a serem ratificadas por seus membros foi um importante passo no combate a práticas aviltantes à condição do trabalhador. 
Contudo, entendemos faltar força coercitiva às iniciativas na OIT. Isso, por si só, não é o suficiente para transferir a tutela dos direitos do trabalhador para a esfera da OMC. Mais produtivo seria, em nosso humilde entender, estabelecer mecanismos que conferissem maior efetividade às normas e decisões da OIT, como a fixação de multas ou, até mesmo, a aplicação de sanções comerciais em conjunto com a OMC, em uma atuação multidisciplinar. Nunca perdendo de vista, entretanto, que o papel de destaque seria da OIT. 
Por fim, vale citar o interessante entendimento de Christine Kaufmann, para quem as disposições de Direito Internacional Econômico devem ser interpretadas sob a luz das obrigações de Direitos Humanos assumidas pelas partes envolvidas, para que seja mantida a coerência entre os sistemas normativos da OMC e da OIT. Para referida autora, a Declaração de Singapura não impede que a OMC trate de práticas comerciais distorcivas que acarretem a precarização dos padrões trabalhistas – e ressalta, ainda, que onde houver dúvida sobre o conteúdo de tais padrões a autoridade competente será a OIT. 

Conclusão

Diante da crise econômica que assola o mundo desde 2007, os trabalhadores foram os menos beneficiados e assistidos por programas e medidas que salvaguardassem seus direitos. Como uma forma de resposta a esse quadro, o presente trabalho procurou analisar como a aplicação conjunta do Direito Internacional do Trabalho e do Direito Internacional Econômico pode representar uma saída viável e adequada para a instrumentalização e efetivação dos Direitos Humanos dos milhões de pessoas que perderam seus meios de subsistência em razão de crise. 
Em um primeiro momento tratamos sobre os Direitos Humanos, perpassando por suas características e seus fundamentais, com o objetivo de se chegar a um conceito de tão importante ramo jurídico, que se divide em diferentes gerações (ou dimensões). Dentre essas, destacamos a 2ª Geração, em cujo bojo encontra-se os direitos sociais, econômicos e culturais, justamente por sua proximidade com o Direito Internacional Econômico. 
Sendo parte integrante do Direito Internacional Público, o Direito Internacional Econômico procura regrar as questões referentes à produção e a circulação de seus diversos fatores (pessoas, bens, capitais e serviços), o consumo, o direito da cooperação, do comércio, dos investimentos, das instituições econômicas internacionais, da integração regional e o desenvolvimento.
Já o Direito Internacional do Trabalho, verdadeira expressão dos Direitos Humanos de 2ª Geração, constitui ciência essencial para que os padrões trabalhistas mínimos internacionalmente reconhecidos sejam observados. Insta que o trabalhador seja protegido também como cidadão que é, evitando que a energia por ele despendida seja tratada cinicamente como mera mercadoria. Não podemos esquecer que atrás da mão-de-obra contratada, que atrás do serviço prestado, existe um ser humano, titular de direitos indisponíveis, que por todos devem ser observados. Inclusive pelos Estados.
Principal organismo internacional do âmbito do Direito Econômico Internacional, a OMC veio a lume em 1994, dentro da Rodada Uruguai. Não possui qualquer dispositivo regrando relações de trabalho e sua precarização, ainda que para fins de vantagem comercial indevida. Em verdade, a Declaração Ministerial ao fim da Conferência de Singapura em 1996, ao reafirmar o compromisso com a observância dos padrões trabalhistas internacionalmente reconhecidos, apontou a OIT como organização competente para determinar e instrumentalizar tais padrões, rejeitando o uso destes para fins protecionistas.
A OIT, por seu turno, é a verdadeira fonte e matriz do Direito Internacional do Trabalho. Atualmente, muitos críticos entendem que a atuação da OIT se mostra esvaziada, uma vez que não estão previstas em sua Constituição sanções efetivas contra os países membros que descumprem as Convenções por ele ratificadas, mas tão somente advertências de cunho moral. No entanto, enquanto a necessária reforma do sistema da OIT não é realizada, entende-se que referido organismo internacional pode apoiar e encorajar que seus Membros adotem e desenvolvam os padrões trabalhistas mínimos internacionalmente reconhecidos.
Entendemos faltar força coercitiva às iniciativas na OIT. Isso, no entanto, não é o suficiente, por si só, para transferir a tutela dos direitos do trabalhador para a esfera da OMC. Mais produtivo seria, em nosso humilde entender, estabelecer mecanismos que conferissem maior efetividade às normas e decisões da OIT, como a fixação de multas ou, até mesmo, a aplicação de sanções comerciais em conjunto com a OMC, em uma atuação multidisciplinar. Nunca perdendo de vista, entretanto, que o papel de destaque seria da OIT, palco por excelência da evolução do reconhecimento e efetivação dos padrões trabalhistas mínimos internacionalmente reconhecidos.

Referências Bibliográficas
 
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SÜSSEKIND, Arnaldo. Direito Internacional do Trabalho. 3. ed. atual. e com novos textos. – São Paulo: LTr, 2000.

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Sobre os autores
Fabrício Felamingo

Doutorando e Mestre em Direito Internacional pela PUC-SP. Professor de Direito Internacional na Graduação e na Pós- graduação da PUC-SP. Coordenador do Curso de Especialização em Direito Internacional da PUC-SP/ COGEAE. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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