O idoso e a legislação brasileira: considerações acerca das garantias dadas ao idoso no Estado do Ceará

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COM O AUMENTO DA LONGEVIDADE DE NOSSA POPULAÇÃO TORNA-SE NECESSÁRIO A APLICAÇÃO E CRIAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS CAPAZES DE SATISFAZER E AMPARAR ESSA NOVA FAIXA POPULACIONAL.

Segundo Dias, que envelhecer é um processo multifatorial e subjetivo, ou seja, cada indivíduo tem sua maneira própria de envelhecer,

Sendo assim o processo de envelhecimento é um conjunto de fatores que vai além do fato de ter mais de 60 anos, deve-se levar em consideração também as condições biológicas, que está intimamente relacionada com a idade cronológica, traduzindo-se por um declínio harmônico de todo conjunto orgânico, tornado-se mais acelerado quanto maior a idade; as condições sociais variam de acordo com o momento histórico e cultural; as condições econômicas são marcadas pela aposentadoria; a intelectual é quando suas faculdades cognitivas começam a falhar, apresentando problemas de memória, atenção, orientação e concentração; e a funcional é quando há perda da independência e autonomia, precisando de ajuda para desempenhar suas atividades básicas do dia-a-dia (PASCHOAL, 1996; MAZO, et al., 2007 apoud Dias, 2007).

Tratamos aqui, enfatizando sempre a idade igual ou superior, grifo nosso, pois, essa ênfase, pode ser crucial quando tratamos do conceito de idoso no ordenamento penal, pois, do cometimento do crime, essa diferenciação poderá fazer toda a diferença na determinação tanto na tipificação quanto na penalidade a ser cumprida.

É nessa faixa etária que se inicia alguns dos problemas de saúde que exigem da família determinados cuidados mais apurados e dedicação especial, pois, a partir da senilidade, o idoso passa a ter maiores limitações, requer cuidados e possui necessidades específicas de sua idade.

Historicamente falando, as mulheres, assumiam essa responsabilidade, mas, frente às mudanças ocorridas no mundo, entre tais, a inserção do trabalho feminino no mercado de trabalho, o aumento generalizado da escolaridade feminina e o número cada vez maior de famílias que possuem como principal provedora do lar, a mulher, chamadas famílias matriarcais, acaba por modificar de forma irreversível, o papel dos cuidadores dos mais velhos das famílias.

O que se nota, é que essas alterações no núcleo familiar acabam por enfraquecer alguns laços antes tidos como assegurados. Há um numero cada vez maior de pessoas que moram sozinhas, que buscam independência e que, por conseqüência, se afastam dos pais e avós, que necessitam dessas mesmas pessoas, para continuar tendo uma vida digna quando chegam nas idades mais avançadas.

Segundo Debert,

A preocupação da sociedade com o processo de envelhecimento deve-se, sem dúvida, ao fato de os idosos corresponderem a uma parcela da população cada vez mais representativa do ponto de vista numérico. Contudo, explicar por razões de ordem demográfica a aparente quebra da “conspiração do silêncio” em relação à velhice é perder a oportunidade de descrever os processos por meios dos quais o envelhecimento se transforma em um problema que ganha expressão e legitimidade, no campo das preocupações sociais do momento. Considerar que as mudanças das imagens e nas formas de gestão do envelhecimento são puros reflexos de mudanças na estrutura etária da população é fechar o acesso para a reflexão sobre um conjunto de questões que interessa pesquisar. (2004)

Conforme Souza, uma das principais causas do abandono do idoso à própria sorte é a vida moderna, que exige cada vez mais do indivíduo para que ele permaneça em constante crescimento, ou pior, que apenas permaneça no mercado de trabalho empregado, ativo e em evidencia, cobrando-lhe mais que dedicação e conhecimento. Cobra também tempo e sacrifícios, que a sua família, na maioria das vezes, é obrigada a suportar para manter a instituição firme.

Quando chega um determinado momento, o indivíduo vai perdendo seus papéis sociais e o trabalho não o aceita mais. Se nessa esfera não é aceito, ele também começa a perder o seu papel no âmbito familiar. O indivíduo começa a ser considerado inútil, um incômodo. Então, ele vai ser descartado em algum lugar. Na verdade, existe uma série de coisas que podem servir como tentativa de justificativa. Mas o que acontece é um individualismo exacerbado, prejudicando quem não representa mais o paradigma de indivíduo proposto pela sociedade. (SOUZA, 2010, online)

Nesse cenário, entram em cena, a sociedade e o Estado, como agentes necessários e capazes de responder e corresponder às expectativas e necessidades ora surgidas com essas mudanças, referentes aos cuidados dos idosos que perdem sua autonomia para o desempenho de atividades antes corriqueiras. Essa questão se dimensiona na medida em que esses mesmos idosos, que já contribuíram com seu trabalho para o desenvolvimento desse país e, que agora necessitam ser amparados, não vêem outra forma de serem protegidos e respeitados.

Nossa legislação, assim como, o ordenamento jurídico voltado para o idoso, tem fortes bases e partem de princípios respeitadores dos direitos humanos, como a da igualdade, respeito e inserção social. Isso, sem levar em consideração os princípios humanitários que devem reger tais normas.

Segundo aduz Pelegrini,

O princípio da dignidade da pessoa humana surge como uma conquista em determinado momento histórico. Trata-se de tutelar a pessoa humana possibilitando-lhe uma existência digna, aniquilando os ataques tão freqüentes à sua dignidade. (2004)

Ratificamos isso desde a promulgação de nossa Constituição Federal, de 1988, em seu artigo primeiro e terceiro, a saber,

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

...

III - a dignidade da pessoa humana;

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;

...

IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

E nosso ordenamento também nos oferece a implantação e implemento da Política Nacional do Idoso, Lei nº 8.842, regulamentada em 1994 e, do Estatuto do Idoso, Lei nº 10.741, promulgado em 2003. Resultantes dos valores éticos quanto aos cuidados com a pessoa idosa, traz à tona a responsabilidade desses cuidados à família, e responsabiliza tanto a sociedade que os acolhe quanto ao Estado, maior garantidor dos direitos dos cidadãos, quando do cumprimento desses deveres e benesses ao idoso.

Mesmo levando em consideração a renda mínima ofertada ao cidadão aposentado, amparado pela Seguridade Social, esse acesso, reduz a dependência dos familiares na esfera econômica dos idosos, mas, em nada influencia na continuidade da dependência física e emocional que lhes é devotada.

Esse acesso ao sustento dado pela aposentadoria, além de levar à completa independência, ainda pode acabar por colocar o idoso numa situação ainda mais delicada, quando constata-se de que, em algumas regiões do País, ou, em algumas classes sociais, essa aposentadoria, por vezes, é a única renda da família. Nesse ponto, a saúde, alimentação e outras necessidades do idoso, que deveriam ser suprimidas por esse recurso, são substituídas pela saúde e alimentação de toda a família, que não possui outra fonte para sua subsistência.

Chegaríamos aqui, num ponto extrínseco, onde a questão passaria a ser de programas e políticas de geração de renda, empreendedorismo, oferta de emprego e outros, que, estão intimamente ligados ao assunto da inserção do idoso no seio familiar, mas que, sucumbe ao nosso propósito acadêmico.

O que vemos em comum, tanto nas prerrogativas legais mundiais quanto às nacionais, isso nos âmbitos federal, estadual e municipal, é que a manutenção do idoso em seu ambiente familiar é a mais adequada para o seu bem-estar, mas, isso não tira do Estado, a necessidade de promover programas e políticas que ofereçam ao idoso, um atendimento especializado em organizações e instituições direcionadas e capacitadas a promover sua saúde física, mental e plena adequação social.

Uma das maneiras, e isso já está em pleno funcionamento na Europa, são os abrigos e lares que promovem cuidados de longa duração, não apenas aos mais fragilizados e em situação de rua, mas, a todos aqueles cuja família não possa ou ainda, não queira, reservadas as afrontas à lei, cuidar dos seus anciãos. São as chamadas Instituições de Longa Permanência para Idosos - ILPIs.

Em nosso país, até bem pouco tempo atrás, não havia registros fidedignos de instituições desse porte. Para preencher de forma correta essa lacuna, em 2006, o Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada - IPEA, a Secretaria Especial de Direitos Humanos - SEDH e o Conselho Nacional de Pesquisa – CNPq iniciaram uma Pesquisa Nacional sobre Condições de Funcionamento e Infraestrutura nas ILPIs.

Para a ANVISA, ILPIs são instituições governamentais ou não-governamentais, de caráter residencial, destinadas a domicílio coletivo de pessoas com idade igual ou superior a 60 anos, com ou sem suporte familiar, em condição de liberdade, dignidade e cidadania. É comum associar ILPIs a instituições de saúde. Mas elas não são estabelecimentos voltados à clinica ou à terapêutica, apesar de os residentes receberem – além de moradia, alimentação e vestuário – serviços médicos e medicamentos. O papel dessas atividades é o de promover algum grau de integração entre os residentes e ajudá-los a exercer um papel social. Sumarizando, entende-se ILPI como uma residência coletiva, que atende tanto idosos independentes em situação de carência de renda e/ou de família quanto aqueles com dificuldades para o desempenho das atividades diárias, que necessitem de cuidados prolongados.

No Ceará, até julho de 2014, havia 26 (vinte e seis) registros de ILPIs, sendo três dessas localizadas em nossa Capital, Fortaleza.

Os principais desafios a serem conquistados para a oferta de um envelhecimento digno, são encontradas no portalsaude.gov.br, abaixo elencadas:

{C}·      Mudança de paradigma sobre envelhecimento, com garantia de direitos, participação e  protagonismo das pessoas idosas;

{C}·      Articulação entre Controle Social e poder público para implementar  diretrizes do Estatuto do Idoso, que comemora 11 anos de existência no dia 1º de outubro;

{C}·      Inclusão nas agendas das políticas públicas de ações articuladas que considerem o acelerado envelhecimento da população e seus impactos;

{C}·      Investimentos em novos arranjos institucionais para o cuidado. Como ampliação de políticas inclusivas, atuação intersetorial nos territórios, criação de serviços dia, oferta de cuidadores e novos arranjos para apoiar famílias cuidadoras e oferta de cuidados às pessoas idosas mais vulneráveis nos aspectos clínicos e/ou sociais;

{C}·      Ampliar o acesso e qualificar o cuidado à pessoa idosa em todos os pontos de atenção do  SUS,  considerando a suas particularidades e com foco na capacidade funcional;

{C}·      Propor Políticas públicas considerando os desafios do envelhecimento em condições de grandes desigualdades sociais e de vulnerabilidades;

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{C}·      Ampliar e qualificar ações de promoção da Saúde e prevenção de violências contra pessoas idosas.

Além das necessidades básicas do idoso, que entre elas, estão a saúde, alimentação, vestuário, educação, acesso à justiça e outros, enfrentamos também, pela modernização das relações sociais, a necessária inclusão digital, acessibilidade a edificações, transporte, lazer e cultura.

Sim, tais condições são asseguradas pelo Estatuto do Idoso, por guias de acessibilidade a prédios e outras edificações, programas sociais de inclusão e que, oferecem aos idosos cursos básicos de informática, custo de meia-entrada em cinemas, atendimento preferencial em farmácias, supermercados, bancos, hospitais e outros, vagas em estacionamentos, teatros e shows e mais, gratuidade no seu deslocamento tanto em transporte público local.

O artigo 39, da Lei 10.741/03, conhecida como o Estatuto do Idoso, preconiza

Art. 39. Aos maiores de 65 (sessenta e cinco) anos fica assegurada a gratuidade dos transportes coletivos públicos urbanos e semi-urbanos, exceto nos serviços seletivos e especiais, quando prestados paralelamente aos serviços regulares.

§ 1o Para ter acesso à gratuidade, basta que o idoso apresente qualquer documento pessoal que faça prova de sua idade.

§ 2o Nos veículos de transporte coletivo de que trata este artigo, serão reservados 10% (dez por cento) dos assentos para os idosos, devidamente identificados com a placa de reservado preferencialmente para idosos.

§ 3o No caso das pessoas compreendidas na faixa etária entre 60 (sessenta) e 65 (sessenta e cinco) anos, ficará a critério da legislação local dispor sobre as condições para exercício da gratuidade nos meios de transporte previstos no caput deste artigo.

Quanto aos transportes interestaduais (que se deslocam de um estado ao outro) a Lei obriga que as empresas reservem duas vagas gratuitas para idosos com renda igual ou inferior a dois salários mínimos, ou desconto de 50%, no mínimo, quando essas duas vagas gratuitas forem excedidas.

Chamamos atenção para o disposto no parágrafo terceiro do referido artigo,pois, como dito anteriormente, há uma discrepância entre a legislação local e a federal no que diz respeito à idade em que é assegurado ao idoso sua gratuidade nos transportes públicos coletivos.

Deixamos em destaque, o retorno do idoso ao mercado de trabalho. Será que são habilitados, após sua aposentadoria, retornar ao campo do trabalho, seja por empreendedorismo seja por emprego na iniciativa privada ou eles carregam consigo a morte em vida, onde não são mais capazes de transmitir aos mais jovens, suas experiências, aprendizados e conhecimentos adquiridos durante toda a sua vida produtiva?

Nossos idosos, algumas vezes, têm desejo de retonar não só ao seu compromisso profissional diário, mas, também, querem voltam à vida escolar, às cadeiras de sala de aula, que, a depender do acesso à educação que tiveram durante toda a sua vida, pode varias da sala de alfabetização até uma graduação ou maior diploma, retomando dessa forma, sonhos deixados de lado enquanto lutavam e trabalhavam para oferecer aos seus uma vida mais confortável e segura.

A válvula facilitadora do acesso ao idoso em espetáculos e afins, foi, originariamente exposta em nosso Estado, pelo Deputado Federal Jackson Pereira (in memoriam), em seu Projeto de Lei nº 1.568/91, que estabelecia descontos em ingressos de espetáculos culturais e artísticos aos aposentados e aos portadores de deficiência física. O substitutivo do Senado estendeu o desconto a todos os maiores de 65 anos - e não apenas aos aposentados nessa condição.

Cabe aqui, um questionamento. Frente a todas as necessidades aqui expostas, será que a família, a sociedade ou o Estado estão preparados para esse envelhecimento em seu seio?

Há de se haver respeito integral, sem qualquer preconceito e despidos de estigmas que desabonam a capacidade laborativa, emocional ou social do idoso em seu convívio.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

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AZEVEDO, Álvaro Villaça; VENOSA, Silvio de Salvo. Código Civil Anotado e Legislação Complementar. Editora Atlas, 2004.   

BATISTA, A. S. et al. Envelhecimento e dependência: desafios para a organização da proteção social. Brasília: MPS/SPPS, 2008. (Coleção Previdência Social, v. 28)

BRASIL. Código Civil. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2002.  

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BRUNO, Herliene Cardoso. As relações de gênero na velhice – Estudo realizado no Lar Torres de Melo, em Fortaleza - Ceará. 2006. 98 f. Monografia (Graduação em Serviço Social) – Centro de Estudos Sociais Aplicados, Universidade Estadual do Ceará, Fortaleza. 2006.

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CAMARANO. A. A. Os novos idosos brasileiros: muito além dos 60? Rio de Janeiro: IPEA, 2004.

DEBERT, Guita Grin. A reinvenção da velhice: socialização e processos de reprivatização do envelhecimento. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo: Fapesp, 2004.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Responsabilidade Civil. 17° ed. aum. e atual. De acordo com o novo Código Civil (Lei 10.406, de 10-1-2001) São Paulo: Saraiva, 2003, v.7.  

IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. População residente de 60 anos ou mais de idade. Disponível em: <http:// www.ibge.gov.br/>.

MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 21ª ed. São Paulo: Atlas, 2007. 

QUEIROZ, Maria Gomes de. A violência intrafamiliar na contramão das políticas públicas de proteção ao idoso: seu significado para os idosos “vitimizados”. 2008. 100 f. Dissertação (Mestrado Profissional em Políticas Públicas e Sociedade) – Universidade Estadual do Ceará. 2008.  

SOUSA, Ana Maria Viola de. Tutela jurídica do idoso: a assistência e a convivência familiar. São Paulo: Alínea, 2004.

VILAS BOAS, Marco Antonio. Estatuto do Idoso Comentado. Rio de Janeiro, Forense, 2005.  

WORLD HEALTH ORGANIZATION (WHO). Envelhecimento ativo: uma política de saúde. Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde, 2005.

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