Responsabilidade civil, administrativa e criminal de pessoas jurídicas no Direito Ambiental

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05/11/2015 às 13:39
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O PRESENTE ARTIGO ABORDA UMA REFLEXÃO SOBRE A RESPONSABILIDADE CIVIL, ADMINISTRATIVA E PENAL DAS PESSOAS JURÍDICAS NO DIREITO AMBIENTAL, VISANDO SOMENTE À RESPONSABILIDADE DO SÓCIO E ADMINISTRADOR DE EMPRESAS.

RESUMO

O PRESENTE ARTIGO ABORDA UMA REFLEXÃO SOBRE A RESPONSABILIDADE CIVIL, ADMINISTRATIVA E PENAL DAS PESSOAS JURÍDICAS NO DIREITO AMBIENTAL, VISANDO SOMENTE À RESPONSABILIDADE DO SÓCIO E ADMINISTRADOR DE EMPRESAS. NA INSTÂNCIA CIVIL É TRATADA COMO A OBRIGAÇÃO DE REPARAÇÃO DOS DANOS CAUSADOS, DESTACA-SE A SUA NATUREZA OBJETIVA, COM A ADOÇÃO DA TEORIA DO RISCO. NA ESFERA CRIMINAL, APRESENTAM-SE AS PRINCIPAIS INOVAÇÕES INSERIDAS PELO TEXTO CONSTITUCIONAL.

PALAVRAS-CHAVE: Responsabilidade Civil; Responsabilidade Administrativa; Responsabilidade Penal; Pessoa Jurídica; Direito Ambiental; Sócio; Administrador;

ABSTRACT

THIS ARTICLE DEALS WITH A REFLECTION ABOUT THE CIVIL, ADMINISTRATIVE AND CRIMINAL RESPONSIBILITY OF LEGAL PERSONS IN THE ENVIRONMENTAL LAW, IN ORDER ONLY THE RESPONSIBILITY OF THE MEMBER AND BUSINESS ADMINISTRATOR. INSTANCE IN CIVIL IS TREATED AS THE OBLIGATION TO REPAIR THE DAMAGE, STANDS OUT YOUR OBJECTIVE NATURE, WITH THE ADOPTION OF RISK THEORY. IN CRIMINAL SPHERE, PRESENT THOSE KEY INNOVATIONS ENTERED THE CONSTITUTIONAL TEXT.

KEYWORDS: Civil responsibility; Administrative responsibility; Criminal responsibility; Legal person; Environmental Law; partner; administrator 

1 INTRODUÇÃO                        

Nos termos da Constituição Federal art. 170, caput e VI, a ordem econômica brasileira. “fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa” adota entre seus princípios, a “defesa do meio ambiente”.

Para corrigir e/ou coibir eventuais ameaças ou lesões ao meio ambiente, o art. 225, § 3º da Constituição prevê que “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independente da obrigação de reparar os danos causados”.

Como se vê, atos atentatórios ao ambiente tem (ou podem ter) repercussão jurídica tripla, já que ofendem o ordenamento de três maneiras: Administrativa, em decorrência da denominada responsabilidade administrativa,  Civil, em razão da responsabilidade civil e Penal, por conta da responsabilidade penal.

Num primeiro ponto de analise, temos que os ilícitos administrativo, civil e penal, são pautados num mesmo conceito: a antijuridicidade. Todos os tipos estão relacionados como uma reação do ordenamento jurídico contra a antijuridicidade praticada. Todavia há diferenças entre essas três penalidades. Dentre os critérios identificadores da natureza dos ilícitos, podemos indicar: a) o reconhecimento do objeto tutelado por cada um; e b) reconhecimento do órgão que imporá a respectiva sanção.

O elemento identificador da sanção (se é de natureza administrativa, civil ou penal) é o objeto precípuo da tutela. No caso da administrativa, o objeto da tutela são os interesses da sociedade e, portanto, terá lugar a uma sanção devido ao descumprimento das regras e princípios do sistema violado. Já para os demais tipos (civil e penal), o elemento de discernimento da sanção concentra-se no regime jurídico a que está sujeita, sendo que a civil visa, via de regra, uma limitação patrimonial, enquanto a penal uma limitação a liberdade, direitos e multa.

2 RESPONSABILIDADE ADMINISTRATIVA AMBIENTAL:

A responsabilidade administrativa é uma manifestação do poder de polícia do Estado, denominada por Édis Milaré de "o poder de polícia administrativa ambiental, definido como incumbência pelo art. 225 da Constituição federal, a ser exercido em função dos requisitos da ação tutelar”.


           A responsabilidade administrativa fundamenta-se na capacidade que têm as pessoas jurídicas de direito público de impor condutas aos administrados. Esse poder administrativo é inerente à Administração de todas as entidades estatais – União, Estados, Distrito Federal e Municípios - nos limites das respectivas competências institucionais.

Todas as entidades estatais dispõem de poder de polícia referentemente à matéria que lhes cabe regular. Como cabe às três unidades proteger o meio ambiente, também lhes incumbe fazer valer as providências de sua alçada, condicionando e restringindo o uso e gozo de bens, atividades e direitos em benefício da qualidade de vida da coletividade, aplicando as sanções pertinentes nos casos de infringência às ordens legais da autoridade competente.

Infração administrativa é o descumprimento voluntário de uma norma administrativa para o qual se prevê sanção cuja imposição é decidida por uma autoridade competente no exercício da função administrativa – ainda que não necessariamente aplicada nesta esfera.

Reconhece-se a natureza administrativa de uma infração pela natureza da sanção que lhe corresponde, e se reconhece a natureza da sanção pela autoridade competente para impô-la. Não há, pois, como cogitar de qualquer distinção substancial entre infrações administrativas e sanções penais.

                Sanção administrativa é a providência gravosa prevista em caso de incursão de alguém em uma infração administrativa cuja imposição é da alçada da própria Administração. Isto não significa, entretanto, que a aplicação de sanção, isto é, sua concreta efetivação, possa sempre se efetuar por obra da própria Administração. Com efeito, em muitos casos, se não for espontaneamente atendida, será necessário recorrer à via judicial para efetivá-la, como ocorre, por exemplo, com uma multa, a qual, se não for paga, só poderá ser judicialmente cobrada.

Em relação ao sujeito, poder-se-á tratar de pessoas físicas ou jurídicas, de Direito Privado ou de Direito Público.

A despeito da culpabilidade das pessoas jurídicas, a partir do momento que a lei determina a responsabilização tanto das pessoas físicas quanto das pessoas jurídicas, não nos restam dúvidas de que a teoria da responsabilização do agente deve ser aplicada às duas categorias.

Para que alguém possa ser administrativamente sancionado ou punido, seja quando se trate de sanções aplicadas por autoridades judiciárias, seja quando se cogite de sanções impostas por autoridades administrativas, necessário que o agente se revele ‘culpável'".

Evidentemente que se exige uma ação ou omissão do agente para efeitos de responsabilidade.
A omissão há de significar uma violação de um dever de agir, estabelecendo-se uma relação de causalidade puramente normativa entre a conduta e o resultado. O agente se omite de uma conduta que lhe era juridicamente exigível. Essa omissão, em regra, pode ser culposa, mas depende do tipo sancionador.

Na doutrina, também é pacífica a ideia de que a culpabilidade exige dolo ou ‘negligência’, inclusive nos ilícitos “omissivos".

                O que se conclui, portanto, de todas as considerações acima expostas é que, para fins de responsabilização administrativa, é necessária a existência de, no mínimo, “voluntariedade”, ou seja, é imprescindível a comprovação da culpa ou dolo para a caracterização da responsabilidade administrativa por danos causados ao meio ambiente, ou seja, é necessário que a ação ou omissão do agente tenha sido praticada no sentido de produzir o resultado.

                Outrossim, a impossibilidade ou inexigibilidade de conduta diversa por parte do agente, o que configura, inclusive, uma excludente da culpabilidade.

A responsabilidade administrativa não se fundamenta na teoria objetiva, mas sim, na teoria subjetiva, com a necessidade de comprovação de dolo ou culpa, somente podendo-se falar em responsabilidade objetiva quando no âmbito da responsabilidade civil e para fins de reparação ou indenização.

Feitas estas considerações, vale dizer, na sequencia, que a responsabilidade administrativa por dano ambiental deverá ser apurada, necessariamente, por meio de um processo administrativo (artigo 71 da Lei 9.605/98), respeitando-se o contraditório e a ampla defesa em estrita observância do princípio insculpido no artigo 5º, inciso LV da Constituição Federal e ao § 4º do artigo 70 da Lei 9.605/98. Respeitando-se, sobretudo, o princípio da legalidade, não podendo haver sanção sem que esta esteja prevista em lei.

                O artigo 72 da Lei 9.605/98 estabelece os tipos de sanções que podem ser aplicadas em matéria ambiental, quais sejam: advertência (inc. I), multa simples (inc. II), multa diária (inc. III), apreensão de animais, produtos ou subprodutos de fauna e flora (inc. IV), destruição ou inutilização de produtos (inc. V), suspensão de venda e de fabricação do produto (inc. VI), embargo de obra ou atividade (inc. VII), demolição de obra (inc. VIII), suspensão parcial ou total de atividades (inc. IX), sanção restritiva de direitos (inc. X).

Na prática, a caracterização da intencionalidade do agente não é fácil e há quem afirme que, em razão desta dificuldade de se demonstrar a culpabilidade, haveria uma presunção de culpabilidade em desfavor do agente.

                Em resumo, podemos dizer que a responsabilidade administrativa ambiental se diferencia da responsabilidade civil ambiental porque: i) A responsabilidade administrativa se caracteriza pela imposição de uma sanção administrativa ao agente causador do dano ambiental, sanção esta que é expressão do ius puniendi do Estado, exercício do Poder de Polícia desencadeado pela infração às normas ambientais praticadas pelo agente; enquanto a responsabilidade civil ambiental se caracteriza pelo caráter reparatório, objetivando a recomposição do status quo do meio ambiente danificado - quando for possível - ou a indenização pelo dano provocado, o que deverá ser apurado através de um processo judicial de natureza civil, de competência do Poder Judiciário; ii) A responsabilidade administrativa ambiental, dentro da classificação dos tipos de responsabilidade, é extracontratual subjetiva, sendo esta a regra adotada pelo ordenamento pátrio; a responsabilidade civil ambiental, por sua vez, é objetiva, por força do artigo 14, § 1º, da Lei 6.938/81, tendo o ordenamento consagrado, excepcionalmente neste ponto, a teoria da responsabilidade civil objetiva, independente da comprovação de culpa ou dolo.

3 RESPONSABILIDADE CIVIL DOS SÓCIOS NO DIREITO AMBIENTAL

A relevância do meio ambiente ecologicamente equilibrado acompanha o fato do mesmo ser um conceito jurídico indeterminado, a medida que sua lista de objetivos e princípios norteadores varia.

Este conceito deve ser considerado como o maior bem da vida, objeto de proteção constitucional e, consequentemente, de proteção jurisdicional.  Assim, ao ser tutelado pelo Direito Público, o meio ambiente torna-se um bem indisponível, inalienável e indivisível, consagrando-se como bem de uso comum do povo e de existência fundamental para a possibilidade da vida e de sua qualidade.

O Direito Ambiental tem três esferas de atuação: a preventiva, a reparatória e a repressiva. Cuidaremos neste tópico da reparação do dano ambiental, no âmbito da esfera civil de responsabilização jurídica.

O instituto jurídico da responsabilidade civil pressupõe prejuízo a terceiro e pedido de reparação de danos, consistente na recomposição do status quo ante ou no pagamento de uma indenização em dinheiro.

4 RESPONSABILIDADE CIVIL BASEADA NA REGRA DA CULPA

O Código Civil de 2002 introduziu importantes modificações nas normas que disciplinam a responsabilidade civil, atento à crescente complexidade das relações presentes na moderna sociedade brasileira.

O novo regramento migrou com as novas modificações para um sistema dualista, que reproduziu no artigo 186[2] a responsabilidade sem culpa, com esteio no risco da atividade (artigo 927, § único[3]).

Desta forma, passou a coexistir o sistema tradicional da culpa com o risco proveniente de atividades perigosas.

O princípio que caracteriza a responsabilidade extracontratual é o da responsabilidade subjetiva ou aquiliana, fundada na culpa ou dolo do agente causador do dano. Continua em vigência a regra de que o dever ressarcitório pela prática de atos lícitos decorre da culpa lato sensu, que pressupõe a aferição da vontade do autor, enquadrando-a nos parâmetros do dolo que se resume na consciência e vontade de praticar o ato ou da culpa stricto sensu, ou seja, a violação do dever de cuidado, atenção e diligência com que todos devem se pautar na vida em sociedade.

Assim, o comportamento do infrator será reprovado ou censurado quando, ante certas circunstâncias, era de se entender que o sujeito poderia ou deveria ter agido de modo diferente. Portanto, o ato ilícito, para fins de responsabilidade civil, qualifica-se pela culpa. Em não havendo culpa via de regra, não haverá responsabilidade reparatória.

5 A RESPONSABILIDADE CIVIL BASEADA NA REGRA DA OBJETIVIDADE

A Expansão das atividades econômicas na denominada sociedade de risco, marcada pelo consumo de massa e pela desenfreada utilização de recursos naturais, exigiu o tratamento da matéria sob o viés da objetividade, não apenas sob o elemento subjetivo da culpa, quando a atividade desenvolvida pelo sujeito, implicar por sua natureza em risco para os direitos de outrem, reconhecendo a teoria objetiva de responsabilidade civil e da reparação de danos provenientes de atividades perigosas, normalmente desenvolvidas pelo causador do dano.

 É o reconhecimento da responsabilidade sem culpa, segundo a teoria do risco criado, que se funda no princípio de que se alguém introduz na sociedade uma situação de risco ou de perigo para terceiros, deve responder pelos danos causados em resultado dessa situação.

6 A RESPONSABILIDADE CIVIL NO DIREITO DO AMBIENTE

A preocupação com o meio ambiente requereu dos doutrinadores, da jurisprudência e do legislador a percepção de que as regras clássicas de responsabilidade civil, não ofereciam proteção suficiente e adequada as vítimas do dano ambiental, relegando-as ao completo desamparo. Primeiro, porque a natureza difusa do dano atingia uma pluralidade de vítimas, desamparadas pelo direito que somente ensejava a composição do dano individualmente sofrido. Segundo, porque a dificuldade de prova da culpa do agente poluidor era encoberto pela legalidade materializada através de atos do Poder Público, como Licenças e Autorizações. Terceiro, porque no regime jurídico vigente eram admitidas as excludentes de responsabilização, como o fato de terceiro, o caso fortuito e o motivo de força maior.

Foi nesse contexto onde a atividade ruinosa do poluidor correspondia à indevida apropriação do bem de todos, que surgiu a busca por instrumentos legais mais eficazes, visando à proteção do meio ambiente e uma apropriada abordagem jurídica do dano ambiental, decorrendo na promulgação da Lei nº 6.938/1981, a qual instituiu a Política Nacional de Meio Ambiente, com a festejada substituição da responsabilidade subjetiva pela objetiva no seu artigo 14, § 1º[4], fundada no risco da atividade empresarial desenvolvida.

Como bem pondera Paulo Salvador Frontini, na obra Meio ambiente, sua natureza perante a lei e sua tutela – Anotações jurídicas em temas de agressão ambiental. Legitimidade do Ministério Público, órgão do Estado, para agir em juízo. Em ação civil públca: Lei 7.347/1985 – Reminiscências e reflexões após dez anos de aplicação (coord. Edis Milaré). São Paulo: RT, 1995, p. 399: “se é, em princípio, lícito o uso do meio ambiente, o abuso nessa utilização ultrapassa os limites da licitude, entrando na área do antijurídico. Assim, o abuso na utilização de qualquer de seus componentes passa a qualificar-se como agressão ao meio ambiente. Fácil é perceber como essa questão é complexa, porque, não raro, a agressão resulta a ação de múltiplos  agentes, cada qual, a seu turno, agindo na faixa de utilização. Quer dizer: embora cada agente esteja agindo licitamente (simples utilização), o resultado global resulta ilícito (agressão ao meio ambiente, poluição e dano ambiental). Essa peculiaridade do problema induz a adoção do princípio da responsabilidade objetiva do poluidor (lei 6.938, art. 14, § 1º), em razão de ser, muitas vezes, difícil – senão impossível – enquadrar o ato de poluir no âmbito da culpa civil”.

A lei nº 6.938/1981 conceituou no artigo 3º que:

Art 3º - Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:

I - meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas;

II - degradação da qualidade ambiental, a alteração adversa das características do meio ambiente;

III - poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente:

a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população;

b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas;

c) afetem desfavoravelmente a biota;

d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente;

e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos;

IV - poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável,   direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental;

V - recursos ambientais: a atmosfera, as águas interiores, superficiais e subterrâneas, os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a fauna e a flora.  (Redação dada pela Lei nº 7.804, de 1989).

Em continuidade no tempo, o artigo 225 da Constituição Federal de 1988 [5] advieram as bases da proteção ao meio ambiente no país, consagrando, inclusive, a responsabilidade objetiva do Estado em matéria ambiental, bem como do poluidor nas atividades nucleares e minerárias, fortalecendo o denominado princípio do poluidor-pagador, o qual faz recair sobre o autor do dano, o ônus decorrente dos custos sociais de sua atividade. Agora, segundo essa ótica objetivista, para tornar efetiva a responsabilização, basta a prova da ocorrência do dano e do vínculo causal deste dano, com o desenvolvimento de determinada atividade humana.

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Aliás, antes mesmo da Lei da Política Nacional de Meio Ambiente de 1981, na obra Responsabilidade civil por dano ecológico. Revista de Direito Público, v. 49-50, p. 38, 1979, Sérgio Ferraz sustentava que: “em termos de dano ecológico, não se pode pensar em outra colocação que não seja a do risco integral. Não se pode pensar em outra malha que não seja a malha bem apertada, que possa, na primeira jogada de rede, colher todo e qualquer possível responsável pelo prejuízo ambiental”.

7 PRINCÍPIOS BÁSICOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL

A reparação e a repressão ambientais representam atividades menos valiosas do que a prevenção. Sim, porque aos objetivos do Direito Ambiental são fundamentalmente preventivos.

Assim, a repressão e a reparação cuidam do dano já causado, a prevenção e a precaução, ao revés, atêm-se ao momento anterior: o do mero risco. Na prevenção e na precaução há uma ação inibitória, enquanto a reparação do dano é mero remédio ressarcitório.

Essa é a ótica que orienta todo o Direito Ambiental. Não podem a humanidade e o próprio Direito concentrar-se em reparar e reprimir o dano ambiental, que como regra é irreparável. É por isso que os princípios da prevenção e precaução são basilares para o Direito Ambiental, não podem ser deixados de lado, mesmo na aplicação dos institutos da responsabilidade civil e administrativa do dano ambiental.

Inclusive, com base nesses princípios, os legitimados para o ajuizamento de ação civil pública não serão obrigados a aguardar a consumação do dano ambiental iminente para agirem, ao contrário, o remédio processual pode e deve ser usado para coibir práticas que apresentem mera potencialidade de dano, obrigando os responsáveis por essas atividades a ajustarem-se as normas técnicas aplicáveis ao caso, de modo a mitigar o risco a elas inerentes.

Quando houver descumprimento das regras jurídicas tutelares do patrimônio ambiental, o SISNAMA – Sistema Nacional do Meio Ambiente (instituído pela Lei 6.938/1981, regulamentada pelo Decreto 99.274/1990) que é constituído pelos órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e pelas Fundações instituídas pelo Poder Público, responsáveis pela proteção e melhoria da qualidade ambiental.

O SISNAMA tem a seguinte estrutura organizacional: Órgão Superior: O Conselho de Governo Órgão Consultivo e Deliberativo: O Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA; Órgão Central: O Ministério do Meio Ambiente – MMA; Órgão Executor: O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA; Órgãos Seccionais: os órgãos ou entidades estaduais responsáveis pela execução de programas, projetos e pelo controle e fiscalização de atividades capazes de provocar a degradação ambiental; Órgãos Locais: os órgãos ou entidades municipais, responsáveis pelo controle e fiscalização dessas atividades, nas suas respectivas jurisdições; a fim de aplicarem as sanções administrativas, independentemente da ocorrência da lesão.

8 O PRINCÍPIO DO POLUIDOR-PAGADOR

O princípio do poluidor-pagador constitui o fundamento primário da responsabilidade civil em matéria ambiental. O princípio da responsabilidade objetiva é o da equidade, para que se imponha o dever de reparação do dano e não somente porque existe responsabilidade.

Desta forma, o agente poluidor assume todos os riscos de sua atividade, pondo-se fim, em tese, à prática inadmissível da socialização do prejuízo e da privatização do lucro.

O princípio poluidor-pagador impõe a internalização dos custos decorrentes das externalidades negativas ambientais, isto é, dos efeitos nocivos resultantes do desenvolvimento de atividades humanas que, embora não sejam necessariamente voluntários, merecem igual reparação, uma vez que incidem sobre a qualidade do meio ambiente, em prejuízo a toda a sociedade.

Como explica Cristiane Derani, na obra Direito ambiental econômico, 3º edição, São Paulo, Saraiva, 2008, p. 143, 147 e 149: “pelo princípio do poluidor-pagador, arca o causador da poluição com os custos necessários à diminuição, eliminação ou neutralização deste dano. (...) O custo a ser imputado ao poluidor não está exclusivamente vinculado à imediata reparação do dano. O verdadeiro custo está numa atuação preventiva, consistente no preenchimento da norma de proteção ambiental. O causador pode ser obrigado pelo Estado a mudar o seu comportamento ou a adotar medidas de diminuição da atividade danosa. Dentro do objetivo estatal de melhora do ambiente deve, então, participar ativamente o particular (...). Esse princípio é um meio de que se vale tanto o aplicador da legislação, especialmente na formação de políticas públicas, como o legislador, na elaboração de textos destinados a uma proteção mais eficiente dos recursos naturais”.

Outra vez é notória a conotação preventiva do Direito Ambiental, uma vez que o princípio poluidor-pagador, a par de existir a recomposição do dano, possui, em última análise, efeito preventivo consistente em coibir futura prática de condutas lesivas ao meio ambiente.

9 PRINCÍPIO DA REPARAÇÃO INTEGRAL

O dano ambiental mede-se por sua extensão, impondo a reparação integral, a teor do que estabelecem os artigos 14, § 1º, da Lei nº 6.938/1981 e 225, § 3º da carta Magna, os quais não fazem qualquer referência a uma indenização tarifária ou progressiva.

Isto porque o Brasil adotou a teoria da reparação integral do dano ambiental, o que significa que a lesão causada ao meio ambiente há de ser recuperada em sua integralidade e qualquer norma jurídica que disponha em sentido contrário ou que pretenda limitar o montante indenizatório a um teto máximo será inconstitucional, quando não for possível a reparação do dano, ainda será devida indenização pecuniária correspondente, a ser necessariamente revertida para os Fundos de Defesa dos Direitos Difusos, previsto no artigo 13 da lei nº 7.347/1985[6].

O esforço reparatório pode ser superior a capacidade financeira do degradador. Tal dificuldade faz despertar a necessidade de se aprofundar em estudos de conveniência da instituição de seguros de responsabilidade civil ou fundos de compensação para assegurar o pagamento do quantum necessário para a reparação, segundo a tendência apontada hodiernamente pelo Direito Ambiental Internacional.

10 PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANO AMBIENTAL

No regime da responsabilidade objetiva, fundada na teoria do risco da atividade, para que se possa pleitear a reparação do dano, basta a demonstração do evento danoso e do nexo de causalidade com a fonte poluidora. A ação, da qual a teoria da culpa faz depender a responsabilidade pelo resultado, é substituída pela assunção do risco em provocá-lo.

11 O EVENTO DANOSO

O evento danoso vem a ser resultante de atividade que, de maneira direta ou indireta, cause a degradação do meio ambiente, da qualidade ambiental ou de um ou mais de seus componentes.

De acordo com o artigo 1º da Lei nº 7.347/1985[7], com redação dada pelo artigo 88 da Lei nº 8.884/1994, tanto as lesões materiais como as imateriais são suscetíveis de composição, ressaltando a integrante questão estabelecida entre o uso e o abuso, isto é, o limite ou a intensidade do dano capaz de detonar a obrigação reparatória. Para o Direito só interessam aquelas significativas ocorrências de diminuição ou perturbação da qualidade do ambiente, que impliquem em reflexos negativos que transcendem os padrões de suportabilidade.

A solução não é tão simples, primeiro porque a lei não estabelece parâmetros que permitam uma verificação objetiva das modificações infligidas ao meio ambiente, segundo porque a danosidade ambiental é regida pela responsabilidade objetiva fundada no risco, não perquirindo a licitude da atividade, mas somente a lesividade é suficiente para provocar a tutela jurisdicional e terceiro porque a poluição não se caracteriza pela inobservância das normas e dos padrões, mas pela degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente: a) prejudiquem á saúde, a segurança e o bem-estar da população; b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; c) afetem desfavoravelmente a biota; d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente.

Assim, à míngua de critérios objetivos e seguros, pode-se concluir que a aferição da anormalidade ou perda do equilíbrio se situa fundamentalmente no plano fático e não no plano normativo. Consequência disso é que a caracterização do evento danoso acaba entregue ao subjetivismo e descortino dos agentes públicos e dos juízes no exame da situação fática e das peculiaridades de cada caso.

O regime da responsabilidade objetiva adotado pelo nosso sistema normativo afasta a investigação da culpa, porém não prescinde do nexo causal, ou seja, da relação e causa e efeito entre a atividade poluidora e o dano dela advindo.

A atividade poluidora é analisada indagando-se se o dano causado em razão dela, para se concluir que o risco que lhe é inerente, é suficiente para estabelecer o dever de reparar o prejuízo. Assim, basta que se demonstre a existência do dano, para cujo desenlace danoso o risco da atividade influenciou decisivamente.

 A determinação do nexo causal em matéria ambiental é muito difícil, tendo em vista a complexidade dos fatores poluentes, os quais permanecem camuflados pelo anonimato, pela multiplicidade de causas, de fontes, de comportamentos, seja por sua tardia consumação, seja pelas dificuldades técnicas e financeiras de sua aferição, seja, enfim, pela longa distância entre a fonte emissora e o resultado lesivo.

No entender de Ada Pellegrini Grinover, Sérgio Ferraz, Francisco José Marques Sampaio: ”Daí que, sem abdicar do liame da causalidade, não surpreenderá que o caminho a prosseguir conduza e justifique a instituição legal de um sistema assentado na inversão do ônus da prova, à semelhança do que já ocorre entre nós, em tema de relação de consumo.

Segundo José Rubens Morato Leite a inversão do ônus probandi em casos de danos ambientais é bastante apropriado, pois se transfere ao demandado a necessidade de provar que sua atividade não tem nenhuma ligação com o evento poluidor, favorecendo a coletividade, considerando que o bem ambiental pertence a todos. Defende ainda a adoção de presunção de dano, mediante prévia autorização legal ou por decisão judicial fundada na livre convicção do juiz, com base indícios suficientes como autorizado pelo artigo 335 do Código de Processo Civil, sempre que a prova de determinado fato seja particularmente difícil realização ou inviável.

12 CONSEQUÊNCIAS DA OBJETIVAÇÃO DA RESPONSABILIDADE CIVIL FUNDADA NA TEORIA DO RISCO INTEGRAL

A adoção da teoria do risco integral, da qual decorre a responsabilidade objetiva, traz como conseqüências principais para que haja o dever de indenizar: a) a prescindibilidade de investigação da culpa; b) a irrelevância da licitude da atividade; c) a inaplicação das causas de exclusão da responsabilidade civil.

A obrigação de investigação e de indenizar emerge da simples ocorrência de um resultado prejudicial ao homem e ao meio ambiente, sem qualquer aplicação subjetiva da contribuição da conduta do poluidor para a produção do dano. 

 Uma segunda consequência da adoção da responsabilidade civil objetiva sob a modalidade de risco integral consiste na irrelevância da licitude da atividade. A intenção do legislador atendeu às aspirações da coletividade, porquanto não raras vezes em que o poluidor se defendia, alegando ser lícita a sua conduta, uma vez que estava dentro dos padrões traçados pela autoridade administrativa e, ainda, que possuía uma autorização ou uma licença para exercer aquela atividade.

Muito embora isso não fosse causa excludente de sua responsabilidade, os permissivos administrativos já colocavam dúvidas na consciência do julgador, o que acabava redundando em ausência de indenização por parte do poluidor. Ocorre que não tem o Poder Público o direito de consentir na agressão á saúde da população, através do poder de controle exercido pelos seus órgãos.

A outorga de autorização de licença ou permissão pelo Poder Público, ainda que acorde com a legislação vigente, apenas trará para este, solidariamente, a obrigação de indenizar. A licitude da atividade não é excludente, em hipótese alguma, da responsabilidade civil.

A terceira conseqüência diz respeito à inaplicabilidade do caso fortuito, da força maior e do fato de terceiro como exonerativas, e com a impossibilidade de invocação de cláusula de não-indenizar.

O dever de indenizar independe da análise da subjetividade do agente, fundamentada somente pelo fato de existir a atividade da qual adveio o prejuízo. O motivo de força maior é aquele que decorre da natureza e seus elementos, superiores às forças humanas (por exemplo: tempestades, tornados, rompimento de barragem...), enquanto o caso fortuito diz respeito a uma obra do acaso (por exemplo: quebra de uma peça da turbina, explosão de um reator nuclear...).

Merece referência também que a questão do dano preexistente não constitui motivo de exoneração da responsabilidade civil. Deve-se ter em mente que, nessas hipóteses, o fator cumulativo dos agentes poluidores , projeta efeitos adversos só muito tempo depois de sua emissão e que podem ser agravados pela contribuição de novas atividades.

Desta forma, verificado o acidente ecológico, quer por falha humana, quer por falha técnica, quer por obra do acaso, quer por força da natureza, o fato é que o empreendedor deve responder objetivamente pelos danos ambientais decorrentes de sua atividade, podendo quando possível agir em regresso contra o verdadeiro causador do evento danoso. 

A cláusula de não-indenizar é meio através do qual pretende o devedor se liberar da reparação do dano, ou seja, da indenização propriamente dita, direcionamento somente admitido quando relacionado com obrigações passíveis de modificação convencional. Não é o que ocorre com as regras informadoras do Direito Ambiental, de natureza pública, mas apenas com aquelas destinadas à tutela do mero interesse individual, estritamente privado.

Dita cláusula é muito comum em contratos de compra e venda de empresas com passivos ambientais, embora inaplicável em matéria de responsabilidade ambiental, vale entre as partes, facilitando o direito de regresso daquele que isoladamente tiver sido responsabilizado.

Com a teoria do risco integral só haverá exoneração da responsabilidade civil do poluidor quando o dano não existir ou quando o dano não guardar relação de causalidade com a atividade da qual emergiu o risco.

13 O SUJEITO RESPONSÁVEL

O poluidor é a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável direta ou indiretamente pela atividade causadora da degradação ambiental.

14 O EMPREENDEDOR COM RESPONSÁVEL PRINCIPAL

 Os custos sociais decorrentes do dano ambiental devem ser suportados por aquele que diretamente lucra com a atividade e que está melhor posicionado para controlá-la: o próprio empreendedor. Ele é o titular do dever principal de zelar pelo meio ambiente e é a ele que aproveita, direta e economicamente, a atividade lesiva.

Como decorrência do sistema da responsabilidade objetiva, havendo mais de um empreendedor, prevalece entre eles o vínculo e as regras da solidariedade. Aplicam-se ao Direito Ambiental os preceitos do artigo 942 do Código Civil:

Art. 942 Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação.(g.n.)

Para o Direito Ambiental aplicam-se as normas e princípios da solidariedade passiva entre a empresa poluidora e seus sócios, portanto, o codevedor poderá ser incluído no pólo passivo da ação, visando à plena satisfação da obrigação de indenizar. Não se trata de uma ordem de execução de bens, diga-se, primeiro da execução dos bens da empresa e, depois de esgotadas as possibilidades, dos bens particulares de seus sócios, mas, com base na responsabilidade solidária, o credor poderá executir a seu critério tanto os bens da sociedade como de seus sócios.

A regra prevista no artigo 4º da lei nº 9.605/1998 se refere a desconsideração da pessoa jurídica (e não do clássico instituto da desconsideração da personalidade jurídica), sempre que a sua personalidade for óbice à reparação dos danos causados ao consumidor e ao meio ambiente. 

Considerando que o dano ambiental é também uma violação da função social da pessoa jurídica, premissa estabelecida no artigo 170 da Constituição Federal, tendo enunciado em seus incisos o dever de zelar pela defesa da livre concorrência, do consumidor e do meio ambiente, bem como pela busca do pleno emprego e da valorização do trabalho humano.

Nesse contexto, surge a relativização da pessoa jurídica, à luz dos princípios constitucionais da atividade econômica e da função social da pessoa jurídica, devendo os danos causados ao meio ambiente serem reparados independentemente da pessoa jurídica, ou seja, ainda que esta não possua patrimônio suficiente ou adequado à indenização, hipóteses em que os bens dos sócios, que aceitaram os riscos de explorar aquela determinada atividade econômica lesiva, devem responder solidariamente pelos prejuízos causados. 

Uma das maiores dificuldades que se pode ter nas ações relativas ao meio ambiente, é a determinação de quem partiu efetivamente a conduta que provocou o dano ambiental, especialmente, quando isso acontece em grandes complexos industriais.

Assim, a individualização do dano deve aparecer como uma conseqüência a fixação do montante do prejuízo atribuível a cada um, operando a fusão de dois danos num só e único prejuízo.

A jurisprudência tem entendido que a ação civil pública pode ser proposta contra o responsável direto, contra o responsável indireto ou contra ambos, pelos danos causados ao meio ambiente. Trata-se de responsabilidade solidária, ensejadora de litisconsórcio facultativo e não de litisconsórcio necessário.

Àquele que couber o pagamento da integralidade da indenização, caberá ação de regresso contra eventuais corresponsáveis, desta vez pela via da responsabilização subjetiva, procedimento que permitirá a discussão da participação de cada parte no evento danoso ao meio ambiente.

15 A RESPONSABILIDADE DO ESTADO

As pessoas jurídicas de direito público podem ser responsabilizadas pelas lesões que causarem ao meio ambiente, não só como agente poluidor, quando o ente público se expõe ao Poder Judiciário (por exemplo: em razão da construção de novos aterros sanitários), mas também quando se omite no dever constitucional de proteger o meio ambiente (por exemplo: falta de fiscalização, inobservância de regras).

O Estado também pode ser responsabilizado por danos ambientais provocados por terceiros, já que seu dever de fiscalizar e impedir que tais danos aconteçam. Este entendimento se reforça com a máxima constitucional que impõe ao poder Público o dever de defender o meio ambiente e de preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

Assim, afastando-se da imposição legal de agir ou agindo deficientemente, deve o Estado responder por sua incúria, negligência ou deficiência, que traduzem um ilícito ensejador do dano não evitado que, por direito, deveria sê-lo. Reparada a lesão, a pessoa jurídica de direito público igualmente à privada, também poderá demandar regressivamente contra o causador do dano.

Na prática, deve-se relativizar a regra da solidariedade quanto ao Poder Público, acionando o Estado somente quando ele for o verdadeiro causador do dano ambiental, tendo em vista tratar-se da opção mais conveniente aos interesses da comunidade, visando não penalizar a própria sociedade pelo dano ambiental, posto que é ela quem paga as contas públicas.

16 A RESPONSABILIDADE CIVIL DO PROFISSIONAL

O regime jurídico da responsabilidade civil do profissional que trabalha com meio ambiente, cuida dos procedimentos e dos critérios adotados no licenciamento ambiental, consignando no parágrafo único, do artigo 11, da Resolução nº 237/1997, do CONAMA[8], que os estudos necessários para tais procedimentos, deverão ser realizados por profissionais legalmente habilitados, os quais serão responsáveis pelas informações apresentadas, sujeitando-se ainda as sanções administrativas, civis e penais.

Aquele que desempenha uma profissão, o faz porque se dá por habilitado, entendendo-se capaz de exercer as tarefas técnicas próprias da atividade. Desta forma, presume-se em tais profissionais a habilitação, a perícia, a atenção, a objetividade e a prudência exigidas pela lei.

A responsabilidade profissional tem sido considerada pela jurisprudência como delitual, com fundamento na prática de ato ilícito e não com base em cláusulas contratuais.

Logo, de preferência há de ser ele o indicado a suportar os riscos inerentes desta atividade e o dever ressarcitório, pela simples verificação do nexo causal entre o evento danoso e a atividade. Na verdade, o empreendedor é quem colhe os benefícios da atividade lesiva ao meio ambiente.

Assim, não há de se cogitar na reponsabilidade objetiva dos profissionais que, por falha humana ou técnica, tenham colaborado decisivamente para a ocorrência do dano ambiental, porque isso implicaria na investigação de conduta culposa, circunstância que não coaduna com o sistema objetivo de responsabilidade civil em matéria ambiental. Obviamente, o empreendedor também poderá agir em regresso contra o profissional causador do dano ambiental.

17 O SEGURO AMBIENTAL

O seguro ambiental, assim como os fundos de indenização, é um importante instrumento de implementação do princípio da reparação integral do dano ambiental. Isso porque o seguro ambiental garante a disponibilidade dos recursos financeiros necessários a repristinação total do dano causado ao ambiente, mesmo em caso de insolvência do poluidor.

E mesmo em caso de solvência do poluidor, na eventualidade de um acidente de grandes proporções, o impacto econômico provocado por pesados investimentos deverão ser empreendidos a fim de remediar o dano e também para a aquisição de equipamentos mais eficientes, abalando a estabilidade financeira do negócio, a garantia de reparação integral do dano, a mantença dos postos de trabalho e a continuidade das atividades.

No dizer de Roberto Durço, na obra Seguro ambiental – Direito ambiental em evolução (Org. Vladimir Passos de Freitas), Curitiba, Juruá, 1998, p. 313 e 314: “guarda em si, de forma equilibrada, o atendimento das obrigações reparatórias e indenizatórias de parte do agente poluidor, e, ao mesmo tempo, possibilita, com as devidas correções, a continuidade da atividade empresarial”.

Muitos países vêm buscando viabilizar a utilização prática dessa modalidade de garantia financeira de atividades utilizadoras de recursos ambientais, como os estados Unidos, a França, o Reino Unido e a Holanda, observando-se variações quanto à abrangência das coberturas oferecidas.

Há de se fazer constar também que a Lei nº 11.284/2006, ao cuidar da gestão de florestas, referiu-se ao seguro ambiental entre os instrumentos econômicos que passaram a compor o rol daqueles já previstos na Lei nº 6.938/1981.

Por outro lado, em 1995 foi lançado o Compromisso Ambiental para a indústria de Seguros pelas principais companhias do mundo, em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente – PNUMA.

Ainda não foi possível achar uma fórmula que concilie os interesses econômicos das seguradoras, a segurança dos segurados e a cobertura de eventuais danos ambientais. Do ponto de vista das seguradoras, a solução aponta para a formação de pools de companhias, como única forma de diminuir o impacto do pagamento de elevadas indenizações. Ocorre que os problemas de determinar a causa exata da poluição e de mensurar o valor do dano e sua fixação num espaço temporal, tem se mostrado muito difíceis, já que na maioria das vezes, o dano ambiental propriamente dito só aparece muito tempo depois do evento danoso em si.

No Brasil a prática ainda é muito tímida, aparecendo apenas como um apêndice do Seguro de Responsabilidade Civil Geral, para a cobertura de danos ambientais decorrentes da poluição súbita ou inesperada, de menor custo e exigências mais modestas, enquanto o seguro da poluição continuada de maior valor e continua carente de diagnóstico que o possa avaliar.

18 RESPONSABILIDADE PENAL AMBIENTAL

O Direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, na sua concepção é um dos direitos fundamentais da pessoa humana, o que, por si só, justifica a imposição de sanções penais as agressões contra ele perpetradas.

Preservar e restabelecer o equilíbrio ecológico em nossos dias é questão de vida ou morte. Os riscos globais, a extinção de espécies animais e vegetais, assim como a satisfação de novas necessidades em termos de qualidade de vida, deixam claro que fenômeno biológico e suas manifestações sobre o Planeta estão sendo perigosamente alterados.

As consequências desse processo são imprevisíveis e isto compromete inclusive a viabilidade de sobrevivência de grandes contingentes populacionais da espécie humana. Por esta razão o direito Penal também vem acudindo o clamor social pela criminalização das condutas antiecológicas.

Desta forma, ocorrendo um evento danoso provocado por empresa, será esta, enquanto pessoa jurídica, responsável diretamente pelos danos causados ao meio ambiente, porém, cabe aqui o questionamento, já que pessoas jurídicas são abstrações legais representadas por pessoas físicas que de fato manifestam vontade, quando é que os administradores/sócios/acionistas serão responsabilizados?

19 RESPONSABILIDADE PENAL INDIVIDUAL

Até pouco tempo atrás, sustentava-se que só o ser humano, pessoa física, podia ser sujeito ativo de crime, por estar à responsabilidade penal, no sistema brasileiro, assentada na imputabilidade definida como “conjunto de condições pessoais que dão ao agente capacidade para lhe ser juridicamente imputada a pratica de um fato punível”.

A imputabilidade exigia do autor, no momento da prática delitiva, plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com este entendimento e por este motivo o legislador brasileiro resistiu em aceitar a responsabilidade da pessoa jurídica.

Contudo, conclui-se que o infrator da norma penal ambiental não se encaixa no perfil do criminoso comum, o criminoso ambiental, via de regra, não age individualmente, mas atua em nome de uma pessoa jurídica e a atividade do infrator ambiental não se volta para o crime como um fim em si mesmo; a conduta delitiva intenciona um resultado benéfico para a sociedade na produção de bens.

20 RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA

Superar o caráter meramente individual da responsabilidade penal, cumprindo a o art. 225,§ 3º da CF, levou a pessoa jurídica a condição de sujeito ativo da relação processual penal, dispondo, no art. 3º da Lei 9.605/98, que “as pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto na Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou beneficio da sua entidade”.

O Intuito do legislador foi punir o criminoso certo, isto porque, via de regra, o verdadeiro delinquente ecológico é uma pessoa jurídica que quase sempre busca lucro como principal finalidade, e para a qual pouco interessam os prejuízos a curto e longo prazos causados à coletividade, assim como a quem pouco importa se a saúde da população venha a sofrer com a poluição. É o que ocorre geralmente com os grandes grupos econômicos, os imponentes conglomerados industriais, e por vezes até mesmo o próprio Estado, tido como um dos maiores poluidores por decorrência de serviços e obras publicas sem controle.

A responsabilidade da pessoa jurídica, como está escrito no parágrafo único do art. 3º, é obvio que não excluí a das pessoas físicas, autoras e coautoras ou participes do mesmo fato, na medida em que a empresa, por si só não comete crimes.

Sendo assim, é impossível conceber a responsabilização da pessoa jurídica desvinculada da atuação de uma pessoa física, que atua como elemento subjetivo próprio, seja a titulo de dolo ou de culpa.

Deste modo, sempre que se constatar responsabilidade criminal da empresa, ali também estará presente culpa do administrador que exerceu o comando para a conduta reputada antijurídica. Da mesma forma responderão também o preposto que obedece a ordem ilegal e todo o empregado que de alguma forma colaborar para o resultado.

Vale ressaltar a importância da omissão elencadas no art. 13, § 2º, do Código Penal, acrescentou a lei mais uma situação ao estabelecer no art. 2º a responsabilidade do diretor, administrador, membro do conselho e de órgão técnico, auditor, gerente, preposto ou mandatário de pessoa jurídica, que, sabendo da conduta criminosa de outrem, deixar de impedir a sua pratica, quando podia agir para evita-la.

Entretanto, a extensão de responsabilidade penal aos mandatários da sociedade tem seus limites, pois deve haver, entre a ação ou omissão do dirigente e o fato danoso, um nexo de causalidade, sendo que, ausente este liame, não há como imputar ao dirigente o cometimento de crime ambiental, pelo fato de integrar ele o corpo diretivo da pessoa jurídica, sob pena de se estar contemplando a responsabilidade penal objetiva a pessoas físicas.

Nem todo ato lesivo ao meio ambiente imputável a uma empresa implica um ato criminoso de seu dirigente, isto porque, o nosso Código Penal, no que tange à relação de causalidade, adotou a teoria da equivalência dos antecedentes causais, que considera causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.

Vale dizer que quando a ação ou omissão do dirigente exerce a mínima influencia no resultado, a responsabilidade penal da pessoa jurídica torna-se uma realidade e vem sendo pouco a pouco reconhecida pelos nossos tribunais.

Deste modo, no tocante a responsabilização diante de uma conduta realizada por uma pessoa jurídica, devemos inicialmente avaliar se essa conduta foi efetuada em beneficio ou visando satisfazer os interesses sociais da pessoa jurídica e, num segundo momento, o elemento subjetivo, dolo ou culpa, quando da execução ou da determinação do ato gerador do delito. Isto porque se o ato praticado através da pessoa jurídica visou apenas satisfazer os interesses do dirigente, sem qualquer vantagem ou benefício para a pessoa jurídica, essa deixa de ser o agente do tipo penal e passa a ser o meio utilizado para a conduta criminosa.

21 DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA

A lei 9.605/1998, em seu artigo 4º, na trilha sinalizada por inovadora doutrinas e jurisprudência, assim como nas Leis 8.078/1990 – (art. 28 - CDC), 8.884/1994 – (art. 18) e no Código civil Brasileiro – (art. 50), acolheu a chamada disregard legal entity, possibilitando a desconsideração da pessoa jurídica “sempre que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados a qualidade do meio ambiente”.

Na lição de Rubens Requião, “diante do abuso de direito e da fraude no uso da personalidade jurídica, o juiz brasileiro tem o direito de indagar, em seu livre convencimento, se há de consagrar a fraude ou abuso de direito, ou se deve desprezar a personalidade jurídica, para, penetrando no seu âmago, alcançar as pessoas e bens que dentro dela se escondem para fins ilícitos ou abusivos”.

Neste sentido, cabe reconhecer que a desconsideração confere um ingrediente de segurança jurídica às relações negociais, uma vez que, na medida em que repele as condutas contaminadas pelo dolo e pela fraude, privilegia as relações pautadas pela boa fé.

22 RESPONSABILIDADE PENAL DOS SÓCIOS E ADMINISTRADORES

Neste sentido a lei ambiental é expressa quando trata do tema de responsabilidade no âmbito penal, o texto legal é claro ao dizer que, quem, de qualquer forma, cocorrer para a pratica dos crimes previstos nessa lei, incidirá nas penas a estes cominadas, na medida de sua culpabilidade, assim como aquele que, sabendo da conduta criminosa de outrem, deixar de impedir sua pratica, quando podia agir para evita-la.

Dessa forma, temos que ocorrendo quaisquer dos fatos indicados como crimes na referida lei, serão apurados a participação e culpabilidade dos agentes na concretização do resultado danoso ao meio ambiente.

Nota-se, portanto, que no âmbito penal a responsabilização direta do administrador/sócio dependerá de sua participação no evento danoso ao meio ambiente e se, da apuração dos fatos e provas, ficar evidente que estes não agiram somente em nome da empresa.

23 SANÇÕES PENAIS

Nos moldes do Direito Penal, a repressão às infrações penais ambientais são:  i) pena privativa de liberdade, ii)  pena restritiva de direitos e iii) multa.

As sanções previstas para infrações cometidas por pessoas físicas compreendem: pena privativa de liberdade (reclusão, detenção e prisão simples), pena restritiva de direitos (prestação de serviços à comunidade, interdição temporária de direitos, suspensão parcial ou total das atividades, prestação pecuniária e recolhimento domiciliar) e multa.

Para as pessoas jurídicas as penas aplicáveis são: multa, restritiva de direitos e prestação de serviços à comunidade.

Dentre estas penas, a restritiva de direito merece especial atenção, vejamos: i) suspensão parcial ou total das atividades, aplicável quando estas não estiverem obedecendo às disposições legais ou regulamentares, relativas à proteção do meio ambiente (art. 22, I e §1º.); ii) interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade, aplicável quando estes estiverem funcionando sem a devida autorização, ou em desacordo com a concedida, ou com violação de disposição legal ou regulamentar (art. 22, II e §2º); iii) proibição de contratar com o poder publico, bem como obter dele subsídios, subvenções ou doações, pelo prazo de dez anos, em caso de descumprimento de normas, critério e padrões ambientais (art. 22, III e §3º); e  iv) prestação de serviços à comunidade, consistente em: custeio de programas e de projetos ambientais; execução de obras de recuperação de áreas degradadas; manutenção de espaços públicos; contribuições a entidades ambientalistas ou culturais publicas (art. 23).

E a liquidação forçada, que poderá ser decretada quando se conclui que a pessoa jurídica foi constituída ou utilizada preponderantemente com o fim de permitir, facilitar ou ocultar a pratica de crime ambiental.  A liquidação forçada significa a verdadeira pena de morte da empresa, com a perda de seus bens e valores.

24 CONCLUSÃO

Pelo exposto, acreditamos que a pessoa jurídica tem existência distinta das pessoas de seus sócios, não se podendo presumir que entre elas exista solidariedade em relação a crime ambiental e também, vale ressaltar que o Princípio da Pessoalidade estabelece que a pena não pode passar da pessoa do condenado (art. 5º, XLV, da CF)e, portanto, não se pode presumir a responsabilidade criminal daquele que se se encontra no contrato social como sócio somente por revestir-se dessa condição.

REFERÊNCIAS


[1] MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente. Doutrina, prática, jurisprudência, glossário. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 260.
[2] SILVA, José Afonso da.
Direito Ambiental Constitucional. 4ª ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 301.            [3] REQUIÃO, Rubens. Abuso de direito e fraude através da personalidade jurídica. RT, São Paulo, V.410 p. 14,1969.

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Sobre a autora
Makely Garcia Santos

Graduanda em Direito pela Universidade Paulista (UNIP)

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