A proibição do uso dos celulares em instituições bancárias do Ceará

13/11/2015 às 08:51
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Para evitar o crime conhecido como "saidinha de banco", onde os bandidos usam o celular para passar informações para seus comparsas, encarregados de assaltar as vítimas na saída de agências, alguns estados proibiram o uso do aparelho dentro dos bancos.

Introdução:

O Direito Digital consiste na evolução do próprio Direito, abrangendo todos os princípios fundamentais e institutos que estão vigentes e são aplicadas até hoje, assim como introduzindo novos institutos e elementos para o pensamento jurídico, em todas as suas áreas, e vem sendo uma evolução necessária, com o objetivo de regular e criar parâmetros jurídicos para a interação existente entre o ser humano e os meios tecnológicos, abrangendo a esfera cível, comercial, autoral dentre outras.

A Sociedade Digital traz consigo características peculiares, entre elas, a evolução do próprio direito, a fim de acompanhar as novas necessidades, pois não há como escapar da realidade sendo assim necessário unir esforços a fim de contribuir com esta maravilhosa oportunidade de fazer parte da transformação.

A proibição de uso do celular como forma de combater o crime da "saidinha de banco", no Estado do Ceará foi regulamentado pela Lei nº 14.961 de 08 de julho de 2011, publicada no Diário Oficial do Estado em 19 de julho de 2011.

Esta Lei dispõe sobre a instalação de divisórias individuais, da proibição do uso de celular, e da instalação de câmeras de segurança, juntamente da contratação de empresa especializada para as agências bancárias do Estado do Ceará.

Sendo assim ela nos deixa claro que as agências bancárias são obrigadas a instalar divisórias individuais entre os caixas e o espaço reservado para clientes que aguardam atendimento, proporcionando privacidade e segurança às operações financeiras, sendo essas divisórias com a altura mínima de 1,80m e serem confeccionadas em material opaco, que impeça a visibilidade, para que a outra pessoa não veja as transações efetuadas pelos clientes.

A mesma Lei enfatiza que as agências bancárias e estabelecimentos que realizam transações financeiras, devem instalar câmeras de seguranças e contratar empresas especializadas para garantir a segurança dos usuários.

No artigo 2°. e 3°. da referida Lei temos:

Art. 2º Ficam as agências bancárias e estabelecimentos que realizam transações financeiras, obrigados a instalarem câmeras de seguranças e contratar empresas especializadas para garantir a segurança dos usuários.

Art. 3º Fica proibido à utilização de telefone celular dentro das agências bancárias do Estado do Ceará.

Referencial Teórico:

Foi neste mesmo dispositivo que ficou regulamentado a proibição da utilização de telefone celular dentro das agências bancárias do Estado do Ceará, gerando pelo seu não cumprimento uma multa diária, como podemos notar no artigo 4°. da Lei: “Art. 4º O não cumprimento das disposições desta Lei sujeitará ao infrator multa diária de 500 (quinhentas) Ufirce - Unidade Fiscal de Referencia do Estado do Ceará”.

Esta determinação tem gerado controvérsia em razão da utilidade dos aparelhos de celular para aqueles que exercem atividade em que o mesmo é imprescindível, como médicos, agentes de segurança e mesmo para pessoas que, por uma razão ou outra, necessitem de alguma informação da qual não dispõem no momento do pagamento de uma conta, ou fornecimento de algum número de documento que esqueceu em casa ou ainda para desmarcar ou adiar compromissos em razão do atraso na fila do guichê.

No seu artigo 5°. da referida Lei temos: “Art. 5º. A fiscalização do cumprimento desta Lei e a aplicação das penalidades competem ao órgão estadual de defesa do consumidor ou à entidade municipal assemelhada formalmente conveniada”.

A lei, sancionada proíbe a utilização de telefone celular e equipamentos similares no interior das agências bancárias e postos de atendimento instalados de acordo com a lei, caso haja descumprimento, o infrator pode ter o seu aparelho apreendido enquanto estiver no local e devolvido assim que deixar o estabelecimento, juntamente com uma multa diário, esta fiscalização é feita pelos seguranças das agências.

De acordo com a Lei, a fiscalização do cumprimento pelas instituições bancárias ficará a cargo dos órgãos de defesa do consumidor como o Procon e Decon.

Podemos notar que há vários pontos positivos, pois estabelece a instalação das divisórias individuais, junto com a obrigatoriedade da instalação de câmeras de vigilância e a contratação de empresas de segurança em todas as unidades bancárias.

Esta norma também se aplica aos correspondentes bancários, onde todos os estabelecimentos que prestam serviços financeiros terão que ter a empresa de segurança e a câmera de vigilância, inclusive os correspondentes, que hoje não contam com qualquer tipo de proteção.

Vendo por esse ponto de vista esta Lei é também traz benefícios para a sociedade, especialmente para o interior do Estado, onde as saidinhas bancárias também tem se destacado.

Já quanto à proibição do uso de celulares podemos notar também alguns maléficos que primeiramente pode se dizer que isso não tem uma aplicação direta na segurança, vez que impede o cidadão de comunicar qualquer coisa de anormal que esteja acontecendo dentro da agência bancária.

Podemos destacar assim que é positiva a instalação de biombos e de vigilância eletrônica, mas a proibição do uso de celular é improdutiva e pode causar constrangimentos entre vigilantes e clientes e criar situações embaraçosas.

Neste caso os bancos terão que ter muito cuidado com relação à aplicação desse ponto para não causar problemas ao vigilante, pois é ele que tem, na maioria das vezes, o primeiro contato com o usuário e o celular é um objeto de uso pessoal dos clientes, e de acordo com a lei, os bancos terão de exibir placas ou cartazes em locais de grande visibilidade para alertar os clientes sobre a proibição.

Vale ressaltar que o celular não é o vilão da saidinha bancária, pois o ponto chave desse tipo de crime é o observador, quer ele esteja com celular ou não poderá comunicar a outra pessoa sobre as transações vistas.

A CRFB de 1988 determinou, em seu art. 37, Parágrafo 6º, a responsabilidade objetiva do Estado e responsabilidade subjetiva do funcionário, como pode ver abaixo:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

(...)

§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

(...)

Foi adotada a teoria do risco administrativo como fundamento da responsabilidade objetiva da Administração Pública e não a teoria do risco integral, condicionando a responsabilidade objetiva do Poder Público ao dano decorrente de sua atividade administrativa, isto é, aos casos em que houver relação de causa e efeito entre a atuação do agente público e o dano.

Um ponto importante que ficou de fora da norma foi a da obrigatoriedade das portas giratórias antes do autoatendimento, que podem evitar mais a “saidinha bancária” do que o não uso de celulares, juntamente com as fachadas blindadas, que também não foram citadas na Lei.

Podemos ver assim que a norma fere o princípio constitucional da liberdade individual, não sendo vista esta medida como a de que está proibição visa à segurança do cliente e consumidor dos serviços bancários, pois evita ações criminosas na saída do banco, pois a obrigação do Poder Público de garantir segurança não deve prevalecer sobre a liberdade individual do cidadão.

Podemos até considerar a proibição do uso de celular em bancos uma medida importante para coibir a criminalidade, mas temos que ver que a proibição, isoladamente, é insuficiente para prevenir os casos de assalto na saída do banco.

O correto era promover ações conjuntas entre bancos, órgãos do poder público, municipal ou estadual, e a sociedade, uma medida inicial é a de orientar os bancos a esclarecer seus clientes sobre a importância de não usar o celular dentro das agências.

Na Constituição da Republica Federativa do Brasil temos no seu capítulo III, onde se regula a defesa do Estado e das instituições democráticas, mais diretamente na segurança pública em seu artigo 144, o seu seguinte texto:

Artigo 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:

I – polícia federal;

II – polícia rodoviária federal;

III – polícia ferroviária federal;

IV – polícias civis;

V – polícias militares e corpos de bombeiros militares.

[…]

§ 5º. Às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública […].

§ 6º. As polícias militares e corpos de bombeiros militares; forças auxiliares e reserva do Exército, subordinam-se, juntamente com as polícias civis, aos governadores dos Estados, do Distrito federal e dos Territórios.

[…]

§ 8º. Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei.

A segurança pública é um dever do Estado que vem a ser um direito e a responsabilidade de todos sendo esta exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, sendo a sua manutenção a base estrutural que garante ao povo a possibilidade de convivência no seio da sociedade, buscando para tanto, prevenir e reprimir ações que vão de encontro à segurança pública, individual e coletiva.

Como esta convivência nos pressiona para a preservação dos direitos e garantias fundamentais, é necessário existir uma atividade constante de vigilância, prevenção e repressão de condutas delituosas, tendo assim a segurança pública manterem o equilíbrio nas relações sociais.

Nos bancos deve haver para a segurança dos clientes vigilantes armados, alarme eficiente, equipamentos elétricos, eletrônicos e de filmagens, juntamente com artefatos que retardem a ação dos criminosos, como as portas giratórias com detectores de metais.

Assim, apesar da segurança pública ser representada pelos órgãos já citados, a Constituição coloca indiscriminadamente que esta é responsabilidade, direito e dever de todos, tendo em vista que a sociedade pede por segurança não deve abandonar esta responsabilidade nas mãos do Estado, deve, sim, cooperar para alcançar esta segurança que é o instrumento de meio e fim por qual o Estado deve se utilizar para afirmar sua a sua soberania dentro de todo território nacional.

Entretanto, Carta maior nos diz em seu artigo 24, inciso VIII, fixa como competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal, tirando os Municípios, de legislar sobre responsabilidade por dano ao consumidor.

Ou seja, pode-se entender que uma vez que o conjunto legislativo tem por objeto a criação de normas que previnam situações indesejáveis socialmente, cabe somente aos entes federativos mencionados legislar sobre a proteção ao consumidor.

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A violência urbana deve ser coibida pela Polícia Militar, ligada ao Governo do Estado, abrangendo igualmente todos os municípios daquela Unidade Federativa, sendo uma das maiores provas desse fato é a proliferação de legislações locais intentando a proibição do uso de celulares nas agências bancárias como forma de diminuir uma ocorrência criminal específica.

Outro erro dessa norma é a grave ofensa ao princípio da presunção de inocência, uma garantia fundamental inscrita no artigo 5ª, inciso LVII - "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória".

O princípio da presunção da inocência é um princípio jurídico de ordem constitucional, aplicado ao direito penal, que estabelece o estado de inocência como regra em relação ao acusado da prática de infração penal.

E mediante a esse fato a Lei de proibição do uso de celular em agências bancárias é inconstitucional por perder a presunção de inocência, onde a alegação de que o cidadão não pode usar o celular dentro do banco para evitar uma falha da segurança pública e do próprio banco agrava ainda mais a criação desta lei, pois, para este tipo de crime deve ser feito é uma segurança pública e privada das agências bancárias mais eficientes e não punir o cidadão.

Isso significa dizer que somente após um processo concluído em que se demonstre a culpabilidade do réu é que o Estado poderá aplicar uma pena ou sanção ao indivíduo condenado.

Sendo a proibição de uso de celulares nas agências e postos bancários destinados a coibir a ocorrência de roubos nas saídas das mesmas, passa-se a tratar todo e qualquer cidadão como criminoso em potencial, ferindo o princípio da inocência insculpido da Carta Maior.

Presume-se que o cidadão que utiliza o telefone na agência está, necessariamente, auxiliando na prática de um ilícito penal, cabendo à instituição bancária proibir o cliente de utilizar o celular.

Outro ponto que deve ser debatido é que o Estado está de forma irregular transferindo às agências bancárias a obrigação de zelar pela segurança pública, pois mesmo se entendendo que a segurança pública é dever de todos, há limites já que apenas o Estado detém o poder de polícia, não tendo os bancos, como instituições privadas, qualquer poder ou autoridade sobre os clientes de suas agências, de forma que não podem simplesmente determinar a alguém que desligue o aparelho enquanto estiver na agência.

Entretanto, as instituições bancárias não possuem autoridade sobre seus clientes para aplicar sanções em caso de descumprimento, na medida em que lhes falta o poder de coerção característico do ente público que é o caso da multa diária.

Conclusão:

Desta forma verificamos que a norma tem por objetivo que o cliente não utilize o telefone móvel dentro da agência, mas, ainda que a norma se destine ao cliente, em caso de infração por parte deste será o estabelecimento bancário o responsável pelo pagamento da multa, e ausente à condição de repassar o prejuízo ao consumidor sem infringir os direitos deste.

Do ano de 2011 até 2015 quatro anos após ser sancionada, a lei que proíbe o uso de celulares em banco continua e a mesma continua sendo violada, tendo em vista que a maior parte das pessoas faz uso do aparelho celular dentro dos bancos sem problema.

Muitas pessoas se justificam pelo fato de muitas vezes anotarmos coisas no celular ou precisamos responder um e-mail de trabalho, essa restrição impossibilita isso, há alguns que se respaldam com o tempo, já que ir ao banco não atividade rápida, e se fica horas na fila, é tempo demais para ficar incomunicável em pleno expediente.

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Sobre o autor
Francisco Milton Bezerra

Licenciatura Curta em Ciências<br>Cursando Último Semestre de Direito na Faculdade Paraíso do Ceará.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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