O modo como o capital se estruturou no decorrer do século XX tornou a relação de emprego a forma mais tradicional de organização do trabalho humano. No início do século passado, o Taylorismo e o Fordismo despontaram como sistemas de gestão paradigmáticos, tornando-se os modelos a serem seguidos nas décadas seguintes.
Esses modelos exigiam um rígido controle sobre as tarefas executadas pelos trabalhadores, o que apenas podia ser alcançado mediante a clássica relação de emprego, em que impera o vínculo de subordinação entre empregado e empregador.
Já na segunda metade do século XX surgiram novas formas de organização do trabalho, tais como o Toyotismo e o Volvismo, que passaram a exigir modelos mais flexíveis de trabalho. Paralelamente multiplicam-se alternativas à clássica relação de emprego, como, por exemplo, uma maior demanda por serviços terceirizados.
Essa nova necessidade fez aflorar relações de trabalho, as quais nem sempre se enquadravam com perfeição no conceito de trabalho subordinado, mas que também não podiam ser consideradas como trabalho autônomo. Diante dessa situação fática e da dificuldade do direito em emoldurar o mundo dos fatos dentro dos institutos jurídicos pré-existentes, a doutrina italiana criou uma figura intermediária, denominada “parassubordinação” e que foi introduzida no ordenamento jurídico desse país pela Lei Biaggi.
A parassubordinação é um conceito ainda em construção e não admitido pela jurisprudência trabalhista brasileira. Ela não se confunde nem com a autonomia e nem com a subordinação e pauta-se pela colaboração e coordenação, ou melhor, pela colaboração coordenada.
Conforme o ensinamento de Amauri Mascaro Nascimento “a parassubordinação se concretiza nas relações de natureza contínua, nas quais os trabalhadores desenvolvem atividades que se enquadram nas necessidades organizacionais dos tomadores de seus serviços, contribuindo para atingir o objeto social do empreendimento, quando o trabalho pessoal deles seja colocado, de maneira predominante, à disposição do contratante, de forma contínua”[1].
Essa forma de trabalho estaria presente, por exemplo, em representantes comerciais que possuem liberdade quanto ao horário de trabalho e visita a clientes, mas ao mesmo tempo respeitam regras impostas pela empresa representada, seguem suas diretrizes, utilizam-se da estrutura empresarial do tomador e prestam os serviços de maneira continuada e com pessoalidade. Assim, a autonomia do trabalhador é mesclada com certo controle exercido pelo tomador do serviço.
Outro elemento importante presente no trabalho parassubordinado diz respeito à dependência econômica do trabalhador em relação ao tomador do serviço. Embora a existência desse elemento não seja unânime na doutrina, em sua maioria ela é citada como uma das características da parassubordinação.
No direito italiano, o trabalho parassubordinado encontra expressão em algumas formas específicas de contrato, como o trabalho por colaboração coordenada e continuada, por colaboração com um projeto, por colaboração ocasional e por associação de participação.
O trabalho parassubordinado, no direito italiano, possui um rol de direitos assegurados inferior àqueles garantidos ao empregado subordinado. São eles: sujeição ao processo do trabalho; aplicação dos juros e correção monetária próprios dos créditos trabalhistas; irrenunciabilidade e intransacionalidade de direitos de natureza imperativa; seguro obrigatório contra acidentes do trabalho e doença profissional; liberdade sindical; direito de greve e cobertura previdenciária para aposentadoria, maternidade e auxílio familiar.
Também o Direito espanhol tratou de regular essas novas forma de contratação do trabalho. A Lei 20/2007 e o Real Decreto 197/2009 daquele país criaram a figura do trabalhador autônomo economicamente dependente, definido pelo artigo 11 da mencionada Lei como aquele que “realiza uma atividade econômica ou profissional a título lucrativo e de forma habitual, pessoal, direta e predominantemente para uma pessoa física ou jurídica, denominada cliente, da qual depende economicamente em virtude de receber dela ao menos 75% de seus rendimentos de trabalho e de atividades econômicas ou profissionais”.
Nota-se que no caso espanhol a lei atribuiu centralidade à dependência econômica na criação da nova figura jurídica, afastando a necessidade de haver subordinação jurídica, como ocorre na relação de emprego clássica.
O trabalhador autônomo economicamente dependente tem direito a férias anuais de 18 dias úteis, mas não tem 13º salário. No caso de rescisão do contrato por parte da empresa, ele terá direito a uma indenização por perdas e danos, cujo valor deverá estar prevista no contrato.
Verifica-se, assim, o esforço do Direito estrangeiro em identificar por meio de novas figuras jurídicas as mudanças que já são realidades no mundo do trabalho. Ressalta-se que a simples criação de tais institutos não significam, a priori, diminuição de direitos trabalhistas ou sua manutenção. Elas, efetivamente, contribuem para afastar as chamadas zonas cinzentas das relações de trabalho e para reconhecer juridicamente situações que fogem da clássica divisão entre trabalho autônomo e subordinado.
Diante disso, é salutar o reconhecimento de tais figuras como forma de se alcançar a segurança jurídica. A clássica dicotomia, por vezes, lança o trabalhador submetido a essa zona cinzenta a uma aposta de tudo ou nada, onde poderá ser reconhecido como empregado e ter todos os direitos daí decorrentes ou ser considerado autônomo sem nenhuma proteção trabalhista. Conforme as palavras de Amauri Mascaro Nascimento “a concepção binária autonomia-subordinação cede lugar para a concepção tridimensional autonomia-parassubordinação-subordinação”.
[1] NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Ordenamento jurídico trabalhista. São Paulo: LTr, 2013. p. 322.