RESUMO
A natureza da responsabilidade do Estado por atos omissivos é discutida amplamente sob a ótica de consagrados juristas e doutrinadores. O presente trabalho trata sobre as divergências sobrevindas dessas discussões, apontado os argumentos de defesa e alegações correspondentes à teoria subjetiva e objetiva, além de analisar os principais entendimentos em torno do tema.
Palavras-chave: Responsabilidade do Estado. Atos Omissivos. Entendimentos Jurisprudenciais e Doutrinários. Teoria Subjetiva e Objetiva.
ABSTRACT
The nature of the State for failure to act acts responsibility is widely discussed from the perspective of renowned jurists and scholars . This paper deals with the divergênciassobrevindas these discussions appointed defense arguments and claims related to the subjective and objective theory , and analyze key understandings on the theme .
1 INTRODUÇÃO
A responsabilidade civil é um tema muito abrangente que envolve não só as omissões da Administração Pública como também, as omissões legislativas e judiciais. As duas últimas merecem considerações específicas, devendo ser estudadas de forma diversa e separadamente.
O presente trabalho tem como propósito abordar o tema da responsabilidade civil no âmbito da Administração Pública, pelos atos omissivos dos seus agentes, baseando-se em entendimentos doutrinários e jurisprudenciais a respeito do artigo 37, § 6º da Constituição Federal e artigo 43 do Código Civil.
O estudo volta-se às responsabilidades extracontratuais do Estado, excluindo a responsabilidade contratual, tendo em vista que esta é regida por princípios próprios, atinentes aos contratos administrativos.
Desde já, é importante perceber que a responsabilidade civil do Estado não possui um dispositivo legal disciplinando seus aspectos gerais e específicos. Há apenas uma norma constitucional que estabelece o princípio da responsabilidade objetiva do Estado, previsto no art. 37, § 6º, o que faz emergir divergências no âmbito constitucional e jurisprudencial.
O ordenamento jurídico brasileiro oscila entre as doutrinas subjetiva e objetiva da responsabilidade civil da administração, sendo este um tema recorrente que remonta desde o Império até os dias atuais, trazendo inúmeros debates jurídicos, sobretudo no que diz respeito à aplicação da teoria objetiva de responsabilização que, a cada dia, vem alcançando maior espaço, principalmente com a ascensão do Novo Código Civil.
Feitas as considerações iniciais, para efeito de organização, esta obra será dividida em duas partes, a saber: considerações gerais acerca da responsabilidade da administração pública por atos omissivos extracontratuaise os entendimentos doutrinários e jurisprudências nesse sentido.
2Considerações gerais acerca da responsabilidade da Administração Pública por atos omissivos extracontratuais
O Estado causa danos a particular por ação ou por omissão. Quando o fato administrativo é omissivo, o Estado não impede a ocorrência dodano, sendo responsável civilmente e obrigado a reparar os prejuízos, porem, nem toda conduta omissiva produzirá fato gerador de responsabilidade para o mesmo.
Importante destacar que em se tratando de responsabilidade por omissão, esta sempre decorrerá de um comportamento ilícito, que advém de uma norma legal que impõe um agir. Sem a presença dessa norma não há que se falar em inercia da administração, pois que não seria possível a aplicação do principio da legalidade, que só permite a atuação desta quando tal comportamento encontra previsão no ordenamento jurídico.
Na responsabilidade decorrente de omissão, o Estado tem o dever de agir e deve ter a possibilidade de agir para evitar o dano. Tem que se tratar de uma conduta que seja exigível da Administração e que seja possível, devendo tal possibilidade ser examinada frente ao caso concreto.
No que diz respeito à responsabilidade extracontratual, ou aquiliana, cabe destacar que esta resulta de um ilícito extracontratual e de um inadimplemento normativo, isto é, da prática de um ato ilícito por pessoa capaz ou incapaz, não havendo vínculo anterior entre as partes, por não estarem ligados por uma relação obrigacional ou contratual.
Sua fonte basilar é a inobservância de lei causando lesão ao direito, cabendo o ônus da prova à vítima que deve provar a culpa do agente pela ocorrência do prejuízo por ela sofrido.
A problemática existente dentro da conduta omissiva surge pela leitura do art. 43 do vigente Código Civil, onde o Estado somente seria responsabilizado, por omissão, de forma subjetiva, ou seja, provada a culpa ou dolo da administração, diferentemente do art. 37, §6º da CF que preconiza a responsabilidade objetiva, porém, sem ser específico quanto à forma de conduta.
O artigo 37, § 6º da Constituição Federal prevê a responsabilidade objetiva do Estado em casos em que seus agentes, nessa qualidade, causarem danos a terceiros. Ocorre que tal dispositivo não deixou expresso se o caso se aplica também às condutas omissivas. Essa lacuna ocasionou o surgimento de duas teorias: a teoria do risco - aplicada também às omissões do ente público - e a teoria da culpa, em que os defensores acreditam que deva haver demonstração de dolo ou culpa do Estado nos casos de omissão.
3 Entendimentos doutrinários e jurisprudenciais: responsabilidade objetiva ou subjetiva da Administração Pública por atos omissivos extracontratuais
A doutrina não é pacífica quanto à responsabilidade do Estado por seus atos omissivos. Nesse sentido, apesar de filiar-se à corrente contrária, DI PIETRO, afirma que a maioria da doutrina entende que a responsabilidade do mesmo deve objetiva, portanto, prescinde de culpa.
Defensor da teoria subjetiva, Celso Antônio Bandeira de Mello, preleciona que “quando o dano foi possível em decorrência de uma omissão do Estado (o serviço não funcionou, funcionou tardia ou ineficientemente) é de aplicar-se a teoria da responsabilidade subjetiva”. Tudo isto porque se não agiu, não pode ser autor do dano, tampouco responsável pelo mesmo.
Ainda nesse diapasão, afirma que a responsabilidade estatal por ato omissivo é sempre responsabilidade por comportamento ilícito, derivando de uma conduta negligente, imperita ou imprudente. Como os referidos elementos são característicos da culpa, por esse motivo, deve ser esta a responsabilidade subjetiva e não objetiva. Contudo, não pode tratar-se de qualquer omissão, de uma omissão genérica qualquer. Aduz ainda o autor que é imprescindível que a omissão seja específica, do contrário, responderá subjetivamente.
Por outro lado, a teoria objetiva de responsabilidade do Estado por seus atos omissivos tem fundamento no art.37 §6º da Constituição Federal pelo qual:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
§ 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
Assim, defendem que o referido artigo não é claro quanto ao tipo de conduta adotada pelo Estado, se comissiva ou omissiva. Há que se depreender do mesmo, apenas o fato de “causarem” danos a terceiros. Por esse motivo não haveria qualquer equívoco em aplicar nos casos de omissão do Estado a responsabilidade objetiva. Dessa forma, entendem autores renomados como Hely Lopes Meirelles, para o qual “o exame desse dispositivo revela que o constituinte estabeleceu para todas as entidades estatais e seus desdobramentos administrativos a obrigação de indenizar o dano causado a terceiros por seus servidores, independente da prova de culpa no cometimento da lesão”. (Direito Administrativo Brasileiro, p. 635, 30ª Ed).
Quanto ao entendimento jurisprudencial também não há unanimidade. Assim, é pertinente destacar:
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. CONSTITUCIONAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. PRISÃO DE PESSOA INOCENTE. DANOS MORAIS. IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME DE PROVAS. SÚMULA N. 279 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.
ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, sob a Presidência do Ministro Ricardo Lewandowski, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, à unanimidade, em negar provimento ao agravo regimental no recurso extraordinário com agravo, nos termos do voto da Relatora. Não participou, justificadamente, deste julgamento, o Ministro Gilmar Mendes. Ausente, justificadamente, o Ministro Celso de Mello. (STF, RE 727.076, Rel. Ministra Cármen Lúcia, DJ 02/04/2013).
No caso supramencionado é de se destacar que todos os presentes na Segunda Turma, presidido pelo ministro Ricardo Lewandowski, foram unânimes em reconhecer a responsabilidade civil objetiva do Estado.
Em sentido contrário, temos posicionamento segundo o qual, deve ser vigente a teoria subjetiva, sendo imprescindível assim que se comprove a existência de culpa ou dolo. Vejamos.
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ATO OMISSIVO DO PODER PÚBLICO: DETENTO FERIDO POR OUTRO DETENTO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA: CULPA PUBLICIZADA: FALTA DO SERVIÇO. C.F., art. 37, § 6º. I. - Tratando-se de ato omissivo do poder público, a responsabilidade civil por esse ato é subjetiva, pelo que exige dolo ou culpa, em sentido estrito, esta numa de suas três vertentes -- a negligência, a imperícia ou a imprudência – não sendo, entretanto, necessário individualizá-la, dado que pode ser atribuída ao serviço público, de forma genérica, a falta do serviço. II. - A falta do serviço - faute du service dos franceses -- não dispensa o requisito da causalidade, vale dizer, do nexo de causalidade entre ação omissiva atribuída ao poder público e o dano causado à terceiro. (...) IV. – RE conhecido e provido. (RE 382054 / RJ - Rio De Janeiro Recurso Extraordinário Relator (a): Min. Carlos Velloso Julgamento: 03/08/2004 Órgão Julgador: Segunda Turma).
“Parece dominante na doutrina brasileira contemporânea a postura segundo a qual somente conforme os cânones da teoria subjetiva, derivada da culpa, será admissível imputar ao Estado a responsabilidade pelos danos possibilitados por sua omissão. (RE 237.536, Rel. Min. Sepúlveda Pertence)”.
4 CONCLUSÃO
Conforme demonstrado a responsabilidade por omissão demonstra uma inércia, caracterizando uma conduta ilícita, esta afirmativa, decorre do fato da existência de um comando normativo, o qual direciona a conduta do Estado diante do caso concreto, ou Estado acarretará na análise do aspecto subjetivo do fato administrativo, ou seja, a culpa.
O artigo 43 do Código Civil estabelece que o Estado somente seria responsabilizado por omissão de forma subjetiva, havendo a necessidade nesse caso de provar a culpa ou o dolo da Administração, enquanto que, o artigo 37, § 6º da Constituição Federal que estabelece a responsabilidade objetiva, porém, sem ser específico quanto à forma de conduta.
Observamos dessa forma que ainda continuam as divergências doutrinárias e jurisprudênciais quanto a responsabilidade civil da administração pública por condutas omissivas, destacando-se a tendência do Supremo Tribunal Federal na direção da objetivação, havendo uma ampliação da responsabilidade objetiva do Estado, mas havendo a necessidade de ponderação e análise de cada caso concreto, para não se estender de forma exagerada tal responsabilidade, comprometendo o bom andamento e desenvolvimento das atividades da Administração Pública.
REFERENCIAS
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 22 ed. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2009.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 30 ed. São Paulo: Malheiros, 2009.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 21. ed. rev. E atual. São Paulo: Malheiros, 2006.
PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 22 ed. São Paulo: Atlas, 2008.