Ofendículos:artefatos de defesa

07/12/2015 às 22:19
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Conforme o aumento da criminalidade nos dias atuais, muitas pessoas procuram alguma forma de proteção para resguardarem os seus bens jurídicos como a vida, o domicílio, o patrimônio e qualquer outro bem que sofra ameaça ou ataque.

1.CONCEITO DE OFENDÍCULOS

            O conceito de ofendículos em primeiro momento, conforme dispõe o dicionário técnico jurídico de Deocleciano Torrieri Guimarães, significa:

Meio mecânico de defesa da propriedade que consiste na instalação de arame farpado, cacos de garrafas em muros, cercas de ferro com pontas aguçadas (lanças), eletrificação de grades e maçanetas. Os ofendículos estão respaldados na inviolabilidade do domicílio, mas os excessos são puníveis (C.F.,art.5º, caput,XI e XXII).

Na visão lexicológica, ofendículos significam aparatos, tropeços, empecilhos, com o objetivo principal de dificultar e repelir a agressão ao bem jurídico que se pretende resguardar, como também no cuidado e preservação à integridade física e até mesmo a própria vida do agente e de seus familiares.

Já na visão doutrinária, os ofendículos são todos os artefatos de defesa que visam à proteção do patrimônio e inibem a atuação de invasores, ou seja, são aparatos, estorvos ou empecilhos. Os tipos de defesas mais comuns são: Cercas elétricas, arame farpado, pontas de lanças, cacos de vidros sobre o muro, cães de guarda (desde que não sejam treinados para matar) e plantas com espinhos. Os ofendículos são aceitos em nosso ordenamento jurídico brasileiro, mas embora seja um tema doutrinário, existem divergências sob o campo de sua natureza jurídica.                                                                         

Veremos logo abaixo algumas interpretações doutrinárias referente aos ofendículos, mas além desses tipos mais comuns utilizados pela maioria, nada obsta que poderão, também, ser utilizados outras formas de defesas.                                                                                                                                                

Sobre o mesmo prisma, o renomado autor Julio Fabbrini Mirabete, de forma brilhante e didática define o que são os ofendículos:

são aparelhos predispostos para a defesa da propriedade ( arame farpado, cacos de vidros em muros, etc. ) visíveis e a que estão equiparados os “meios mecânicos”  ocultos ( eletrificação de fios, de maçanetas de portas, a instalação de armas prontas para disparar à entrada de intrusos etc.)

Ainda em referência ao tema, os ofendículos no entendimento do Ilustre Professor Fernando Capez é assim definido:

(...) significa obstáculo, obstrução, empecilho. São instalados para defender não apenas a propriedade, mas qualquer outro bem jurídico, como, por exemplo, a vida das pessoas que se encontram no local. Funcionam como uma advertência e servem para impedir ou dificultar o acesso de eventuais invasores, (...)

            Encontramos grande relevância no exemplo do professor Rogério Greco, entendendo que “os ofendículos não se prestam somente à defesa do patrimônio, mas também à vida, à integridade física, etc., daqueles que os utilizam como artefato de defesa”.                                                                                                              

                 2.NATUREZA JURÍDICA DOS OFENDÍCULOS

           2.1 Legítima defesa ou Exercício regular de direito

           Discute-se na doutrina e na jurisprudência a natureza jurídica dos ofendículos, alguns doutrinadores às defendem como forma de legítima defesa preordenada ou predisposta que é o tipo de defesa que atua no momento da agressão do agente ao bem jurídico tutelado, sendo que outros às defendem na forma de exercício regular do direito.

           Para que o agente se beneficie da legítima defesa preordenada ou predisposta, o proprietário do bem jurídico deverá tomar alguns cuidados ao instalar os ofendículos, não podendo este deixar de colocar um aviso de risco para todas as pessoas observarem que no local existam esses aparatos instalados. Para que os ofendículos possam de fato tornar-se um meio defensivo, também é preciso que essas defesas sejam moderadas, não deixando indícios de intenção de crime.

           Na ótica do exercício regular do direito, os ofendículos podem ser instalados em residências ou empresas visando a inibição de agressores, agindo assim, o proprietário estará exercendo a faculdade de direito prevista na lei penal e constitucional do nosso ordenamento jurídico.

           A predisposição dos mecanismos de defesa de acordo com a doutrina, constitui um exercício regular de direito, conforme também aduz o artigo 23 inciso III do código penal. O mais importante é ressaltar que a gravidade dos efeitos ocasionados em conseqüência aos ataques, não ultrapasse os limites da excludente da ilicitude penal.

       3. MODERAÇÃO E PROPORCIONALIDADE NA DEFESA

           A moderação e a proporcionalidade são requisitos imprescindíveis para tornar a proteção do patrimônio em plena conformidade com a lei. O uso moderado dos ofendículos destinar-se-á a afastar a ação agressiva e ilícita, ou seja, terá que ser suficiente para arrostar a agressão.

           A proporcionalidade deve ser sempre observada no que couber aos meios lesivos de proteção, sendo que por si só devem ser destinados a repelir a agressão injusta. O ilustre autor Luiz Régis Prado entende que “ é mister que exista uma certa proporcionalidade entre a agressão e a reação defensiva, em relação aos bens e direitos ameaçados”.

           Considera-se, assim, como formando parte da amplitude ou da delimitação da legítima defesa preordenada, a moderação e a proporcionalidade abarca o direito de proteção e da inviolabilidade do domicílio que é garantido constitucionalmente.

           Destarte, a não observância da moderação e proporcionalidade na repulsa, afasta por si só o equilíbrio existente entre a defesa e o ataque ocasionando muitas vezes o excesso punível, como veremos em seguida.

4. CÃES DE GUARDA E OUTROS ANIMAIS

         Os cães de guarda de diversas raças também são considerados de acordo com a doutrina, como ofendículos, quando os mesmos estão atuando em defesa do patrimônio, sendo que a sua presença nas residências ou empresas, por si só, já inibem a entrada de invasores, mas é preciso cautela para analisar cada caso concreto referente ao modo de criação desses animais.

                                                                                                                                                        

         A responsabilidade civil no caso de ataque de cães ou outros animais é objetiva conforme reza o art. 936 do código civil:

Art. 936 – O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior.

           O requisito importante será o proprietário manter esses animais fora das áreas de circulação de pessoas, obtendo certo controle sobre os mesmos, para que assim, se evite o excesso na defesa do bem a ser supostamente atacado.

           Vejamos à respeito do assunto,conforme ensina Guilherme de Souza Nucci:

Quanto aos animais, especialmente os cães de guarda, o proprietário tem menor controle sobre as suas reações, pois são seres vivos, que atuam por instinto de preservação do território e do dono. Não há regulagem, visto não serem aparelhos. Portanto, se um invasor for atacado por cães e terminar morrendo em virtude das lesões sofridas, trata-se de caso fortuito, não configurador de excesso.

           No direito civil, temos de levantar os casos de responsabilidade civil objetiva que recairá ao dono do animal que porventura lesionar um terceiro, mas aqui, trata-se da defesa do patrimônio prevista constitucionalmente, cabendo a cada um regular essas defesas. Aos cães de guarda caberá sempre ao seu dono a responsabilidade no que tange a segurança do bem, não podendo esses animais serem adestrados para matar uma pessoa por exemplo.

           Como mencionado anteriormente pelo renomado autor, o importante é deixar o cão trabalhar com seus próprios instintos, afastando assim, qualquer hipótese de excesso na defesa.                                                                                            

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           Na utilização de outros animais para a defesa do bem jurídico, seria inviável, por exemplo, a criação de cobras ou felinos selvagens para este fim, pois o controle do dono nestes casos seria reduzido em virtude da imoderação que poderia ocasionar o ataque desses animais a terceiros, configurando a imoderação da defesa.

           Por conseguinte, em conformidade com a realidade social, também pondera Guilherme de Souza Nucci sobre esses animais diferenciados, “ Por outro lado, se alguém preferir utilizar animais diferenciados para a proteção de sua propriedade, como cobras venenosas ou felinos selvagens, ( leões, tigres, etc.), teremos a possibilidade de levantar a imoderação do ofendículo”. (grifo nosso).

                                     5. EXCESSO PUNÍVEL

           O excesso na utilização é um dos maiores vilões para quem instala os ofendículos, isto porque, quase sempre quando acontece uma fatalidade devido à irregularidade na instalação, o agente sempre responde criminalmente, seja na forma dolosa ou culposa.

           O artigo 23 do código penal, em seu parágrafo único, diz que o agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo. Isto, de fato é o excesso punível que afasta a excludente de ilicitude independentemente da escolha dos meios utilizados para a defesa do bem jurídico.

           Como o excesso é um problema relevante, ele sempre causará desproporcionalidade afastando assim um dos requisitos da legítima defesa. O mais importante é que os riscos permitidos deverão ser utilizados de forma não abusiva e intencional, evitando que o agente responda criminalmente pelos resultados adversos.

           Importante deixar claro que, como dito anteriormente, no local da instalação dessas defesas, deverá também haver sinais de aviso de perigo iminente como placas contendo informação de alerta aos possíveis contatos humanos.

           Isso nos dá o entendimento dos meios necessários que poderão ser empregados em virtude da proteção do bem jurídico, pois a agressão injusta abrirá a possibilidade ao agredido de se defender legitimamente nos limites legais.

                                        6. CONCLUSÃO

           Para uma melhor compreensão e esclarecimento sobre a utilização de ofendículos, será imprescindível o emprego do bom senso na hora de sua instalação, sempre enfocando nos meios utilizados, ou seja, na observância a moderação e na proporcionalidade entre o ataque e a defesa. Uma das formas de proteção hoje em dia, são esses artefatos de defesas, sendo que a sua distinção depende de cada caso, conforme observado durante o texto.

           Com o crescimento social e a hipertrofia Estatal, a utilização desse meio de autodefesa é imprescindível, ainda sim, alguns cuidados deverão ser observados na hora de contratar uma empresa especializada para instalar esses mecanismos.

           É necessário observar se a empresa fornece e disponibiliza todos os meios para que o seu funcionário faça a instalação correta do ofendículo segundo as normas da ABNT, caso este não o faça, não poderá a empresa, ainda que haja a teoria da dupla imputação na seara ambiental, ainda sim, não se poderá de forma objetiva imputar qualquer prática do crime à empresa, pois a mesma só responderá por crime ambiental.

           O mesmo raciocínio será feito sobre o dono da propriedade, se ele contrata, ele acredita e confia que realmente o serviço será feito da forma correta, até porque, por não possuir conhecimento técnico sobre o assunto, não se poderá falar em dolo eventual, coisa que atualmente se fala para tudo.

    

                                        BIBLIOGRAFIA

ANDREUCCI, Antônio Ricardo. Manual de direito penal.São Paulo: Ed.Saraiva, 6º edição 2010.

BITENCOURT, Roberto Cezar. Tratado de direito penal.São Paulo: Ed.saraiva, 15º edição 2010.

CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal – Parte geral. São Paulo: Ed. Saraiva, 14º edição 2010.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro – Responsabilidade civil. São Paulo: Ed. Saraiva, 5ª edição 2010.

GRECO, Rogério. Curso de direito penal – Parte geral.Rio de Janeiro: Ed.Impetus, 10º edição 2008.

______________. Curso de direito penal – Parte especial.Rio de Janeiro: Ed.Impetus, 10º edição 2008

                                                                                                                                            

GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário técnico jurídico.São Paulo: Ed. Rideel, 9ª edição 2007.

MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal – Parte geral.São Paulo: Ed.Atlas, 25º edição 2009.

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal – Parte geral, Parte especial. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 4ª edição 2008.

PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro – Parte geral, VL.01, São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 9ª edição 2010.

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Sobre o autor
Douglas Mendes da Silva

Possui graduação em Direito pela Universidade de Guarulhos (2013). Especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho com capacitação para o Ensino no Magistério Superior pela Faculdade de Direito Damásio de Jesus (2014). Pós graduando em Direito Processual Civil pela Faculdade de Direito Damásio de Jesus (2015-2016). Tem experiência nas área de Direito do Trabalho e Direito Civil . Advogado Militante.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Publicação como requisito de aprovação pela banca de monografia em Curso de Direito da Universidade Guarulhos. Orientador Professor: Roberto Roggiero Júnior.

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