Conhecer é poder, desconhecer é suportar

04/01/2016 às 09:54
Leia nesta página:

No Brasil, a produção das leis que regem as relações humanas, está a cargo do poder legislativo brasileiro, no entanto estas leis são a personificação do poder que em sua origem é do povo. Assim para exercer de fato este poder é preciso conhecer as leis.

A República Federativa do Brasil, influenciada pela experiência norte-americana, de onde se extraiu a noção de “pacto federativo”, adota em seu modelo constitucional o que se denomina federalismo assimétrico, pois cada ente da federação possui características próprias, tais como a existência dos poderes executivo, legislativo e judiciário em cada um dos entes federados, ressalvada aqui a hipótese de os municípios brasileiros não possuírem poder judiciário, o que não retira a sua qualidade de ente federativo, observada em todos os casos a regra constitucional do art. 2°, onde se verifica que os entes federativos gozam de independência política, administrativa e financeira e são harmônicos entre si, harmonia esta extraída da teoria de Aristóteles e aplicada pelo Barão de Montesquieu, compreendida na tripartição dos poderes já citada.

Uma das funções de maior relevância do citado modelo constitucional, é dentre outras a do poder legislativo brasileiro, que tem por função típica, elaborar as leis atendendo a evolução da sociedade bem como fiscalizar e exercer o controle dos atos dos poderes executivos tanto no âmbito da União quanto no âmbito dos Estados, Municípios e Distrito Federal, representado este respectivamente pelo congresso nacional, assembleias legislativas, câmaras legislativas e câmara de vereadores, regulando as relações humanas com vistas à proteção dos bens, direitos e valores do ser humano, dentre os quais podemos citar, a vida, bem estar, dignidade, direitos sociais e individuais, segurança, a igualdade a justiça e consequentemente o Estado Democrático de Direito.

Essa proteção se dá por meio da criação de leis, compreendidas no devido processo legislativo, aqui tratadas por espécies normativas, tais como Emendas Constitucionais, Leis Complementares, Leis Ordinárias, Medidas Provisórias, Leis Delegadas, Decretos Legislativos e Resoluções.

Vale também ressaltar, a importância da compreensão destes instrumentos regulatórios das relações humanas, pela população brasileira, pois as espécies normativas se fazem presentes em todos os lugares e todos os momentos.

Deste entendimento, podemos extrair que as normas exercem influência direta na vida das pessoas, seja na majoração dos impostos e demais questões tributárias, criação ou extinção de tipos penais, relações civis das mais diversas, relações de trabalho, relações empresariais, de consumo, no esporte e principalmente nas relações políticas.

No Brasil para que a lei seja realmente eficaz deve estar apta a cumprir sua função social, ou seja uma lei que está apta a ser cumprida, não é necessariamente seguida, está é a diferença básica entre o ser e o dever ser.

Assim para que produza seus efeitos inovando taticamente o ordenamento jurídico, é preciso que a norma em questão cumpra todas as fases do processo legislativo bem como atenda aos elementos constantes da escada pontiana, de Pontes de Miranda, quais sejam, existência, validade, eficácia e efetividade.

Pelo exposto depreende-se que ainda que a lei ou ato normativo seja produzido sobre as regras constitucionais é preciso que os jurisdicionados (população) o aceite, pois se de fato não o aceitarem a norma padecerá de efetividade.

Estranho falar em aceitação, pois a Constituição Federal Brasileira é rígida, nosso sistema normativo é coercitivo, onde para o descumprimento da legislação há uma proporcional sanção aplicável, o que nos remete a pensar que nosso sistema normativo não é perfeito, pois em um processo de produção legislativo tão complexo e tão amarrado como o brasileiro, em alguns casos não possuir efetividade pela não aceitação dos jurisdicionados é no mínimo estranho.

Para entender essa questão que parece tão complexa, basta que nos reportemos ao preceito constitucional abarcado pela constituição federal como princípio fundamental em seu art. 1° parágrafo único, que diz o poder emanar do povo exercido por seus representantes eleitos democraticamente.

O poder é do povo, assim de nada adianta todos os procedimentos de alta complexidade para produzir uma norma se a população brasileira não concordar com ela.

Mas para tanto, é preciso conhecer o processo legislativo, a função da lei, suas consequências, quem pode produzi-las e por que, sobre tudo o que se modifica na esfera política com a edição de nova lei.

Esse e o ponto principal deste artigo cientifico, demonstrar com o máximo de clareza possível o funcionamento e os responsáveis pela produção das leis que regulam as relações humanas e jurídicas dos brasileiros, pois somente conhecendo o funcionamento e seus responsáveis e que poderemos criticar com fundamento, cobrar das pessoas certas, ou mesmo recusar o cumprimento de uma lei que que julgarmos injusta, aliás como muitas hoje vigentes.

Assim pode o Presidente da República, autoridade máxima do poder executivo federal, sancionar e publicar uma nova lei, todavia, se os brasileiros tiverem conhecimentos suficientes para compreender a importância da lei e criticá-la, poderá sim, recusar seu cumprimento, vez que o poder estará de fato nas mãos do povo.  

Tenho convicção de que esse é um fato que se aplica ao Brasil como um todo, pois não há interesse algum da população em entender o funcionamento político do país bem como das leis que o regem, obviamente em função da baixa capacidade de compreensão que se abarca na verdadeira ruína que se encontra a educação brasileira, que mais parece estacionada no período em que o Brasil ainda era colônia de Portugal.

Essa prática atribui-se principalmente a corrupção e as injustiças das mais diversas ordens aqui existentes. É claro que não é de interesse dos políticos ao menos em sua maioria, que se crie uma geração pensante pronta a criticar e lutar por um país melhor mais justo e igualitário, pois se assim fosse não haveria espaço para corrupção.

Ha também que se relevar a importância da questão econômica, pois sabendo que o Brasil não possui um sistema educacional adequado para formar um cidadão crítico, ou mesmo um cidadão consciente do país em que vive, é obvio que aqueles que detêm maior poder econômico, representada pela minoria da população, proporcionará a seus filhos uma educação de qualidade, encontrada no Brasil nas redes privadas de ensino, ficando os economicamente desfavorecidos a mercê do poder público.

A solução de longo prazo para essa questão obviamente está na educação, como por exemplo, a revisão da grade escolar de ensino fundamental e médio, incluindo nas aulas a exemplo, noções básicas de direito constitucional, direito do consumidor, normas de transito, direito ambiental, política etc., levando em consideração a idade adequada e maneira de inserção destas disciplinas. O aperfeiçoamento dos professores e condições de trabalho condignas com o valor da profissão que exercem.

Já a solução “prática”, está na reforma política, na extinção de tantos privilégios parlamentares, na inserção de requisitos mínimos plausíveis para o exercício de função de direção do país, no fim da impunidade, em fazer valer verdadeiramente os valores e princípios constitucionais de legalidade, impessoalidade, moralidade, probidade, eficiência, proporcionalidade etc. 

Acredito que essas são condições mínimas para que um dia tenhamos uma população capaz de compreender e criticar as leis os políticos e os rumos de nosso país.

O brasileiro precisa acordar para a realidade, o poder sempre esteve em nossas mãos com uma condicionante para utilizá-lo, conhecê-lo.  

Bibliografia

ALVES, José Carlos Moreira. A evolução do controle de constitucionalidade no Brasil. In Documentação e Direito Comparado. Lisboa: Procuradoria Geral da República, 1997.

ARISTÓTELES. A política. 1ª ed. Brasileira. Trad. Roberto Leal Ferreira. São Paulo: Martins Fontes, 1991.

ÁVILA, Humberto Bergmann. Medida provisória na constituição de 1988. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1997.

BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito constitucional. 18a. ed., São Paulo: Ed. Saraiva, 1997. Elementos de direito constitucional. 2ª. Ed., São Paulo: EDUC, 1976.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

BONAVIDES, Paulo.  Curso de direito constitucional. 7ª ed., São Paulo: Malheiros, 1998. 

CAGGIANO, Mônica Herman Salem. Emendas em medidas provisórias. Revista de Direito Público. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, nº 93, 1990.

CAMPANHOLE, Adriano; CAMPANHOLE, Hamilton Lobo. Atos Institucionais Atos Complementares Leis Complementares. 1ª ed., São Paulo: Editora Atlas S.A., 1971.

CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da    constituição. 3ª ed. , Lisboa: Livraria Almedina, 1999.

CANTIZANO, Dagoberto Liberato.  O processo legislativo nas Constituições Brasileira e no direito comparado. Rio de Janeiro: Forense, 1985.

CAPPELLETTI, Mauro.  O controle judicial de constitucionalidade das leis no direito comparado. 2ª ed. Trad. Aroaldo Plínio Gonçalves. Porto Alegre:Sérgio Antonio Fabris, 1992.

COELHO, Fábio Ulhoa. Direito e poder: ensaio de epistemologia jurídica. São Paulo: Ed. Saraiva, 1992.

DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos da teoria geral do Estado. 6ª ed., São Paulo: Saraiva, 1979.

FERRAZ, Ana Cândida da Cunha. Conflito entre poderes: o poder congressual de sustar atos normativos do poder executivo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1994. __________.  Poder constituinte do Estado-Membro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1979.

FERREIRA, Pinto. Curso de direito constitucional. 10a. ed., São Paulo: Ed. Saraiva, 1999.

FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves.  Curso de Direito Constitucional. 26ª ed., São Paulo: Ed. Saraiva, 1999.

COCUZZA, Franco Oliveira. O Controle de Constitucionalidade das Medidas Provisórias como Garantia dos Direitos Fundamentais, Dissertação de Mestrado, Centro Universitário Fieo – UNIFIEO, 2005.

GEBRAN NETO, João Pedro. A aplicação imediata dos direitos e garantias individuais: a busca de uma exegese emancipatória. São Paulo: RT, 2002.

MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva. O Ordenamento jurídico brasileiro. Regras de Elaboração, Redação, Alteração e Consolidação das Leis. São Paulo: Ed. Saraiva, 2000.

MELLO. José Luiz de Anhaia. Da separação de poderes à guarda da Constituição. São Paulo: RT, 1968.

MELLO FILHO, José Celso de. Constituição Federal anotada. 2a. ed. ampliada, São Paulo: Ed. Saraiva, 1986.

MENDES, Gilmar Ferreira.  Controle de constitucionalidade: aspectos jurídicos e  políticos. São Paulo: Saraiva, 1990.

MONTESQUIEU, Charles de Secondant. O espírito das leis. 4ª ed. Melhorada, Trad. Pedro Vieira Mota, São Paulo: Saraiva, 1996.

MONTORO, André Franco.  Introdução à ciência do direito. 12ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1985.

MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 11a. ed., São Paulo: Ed. Atlas, 2002.

NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Manual da monografia jurídica. São Paulo: Saraiva, 2003.

PINHEIRO, Carla. Direito internacional e direitos fundamentais. São Paulo: Atlas, 2001.

QUEIROZ FILHO, Gilvan Correia de. O controle judicial de atos do poder legislativo. Brasília: Brasília Jurídica, 2001.

REALE, Miguel. Aplicações da constituição de 1988. Rio de Janeiro: Forense, 1991.

SAMPAIO, Nelson de Souza.  O processo legislativo. 2ª ed., Belo Horizonte: Del Rey, 1996.

SOARES, A. Direito Constitucional. São Paulo: Atlas, 2000.

SOUZA JUNIOR, Cezar Saldanha. O tribunal constitucional como poder. Porto Alegre: Memória Jurídica, 2002.

Temer, Michel.  Elementos de direito constitucional. 7a ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990.

Conhecer é poder desconhecer é suportar

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Filipe Ferreira da Silva

advogado, militante na advocacia generalista a mais de três anos, pós-graduando em direito público pela UNIASSELVI - Centro de Estudo Leonardo da Vinci.Currículo Resumido

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos