Guarda compartilhada e psicanálise: uma análise do Direito de Família sob o enfoque da psicanálise

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O presente estudo tem a finalidade de fazer uma abordagem sobre as contribuições da Psicanálise ao Direito das Famílias, mais especificamente no instituto da Guarda Compartilha.

Resumo. O presente estudo tem a finalidade de fazer uma abordagem sobre as contribuições da Psicanálise ao Direito das Famílias, mais especificamente no instituto da Guarda Compartilha, no intuito de demonstrar que, com a ajuda da Psicanálise, o Magistrado pode melhor discernir sobre a viabilidade de adoção da Guarda Compartilhada em dado caso concreto. Nesse intuito, iniciarei este trabalho com um enfoque em alusão ao Direito das Famílias, da evolução histórica das famílias, do casamento, da separação, a situação dos filhos na separação, o conceito e tipos de guarda, bem assim a importância no que se refere à problemática da separação dos pais para a criança ou adolescente, inclusive ao aspecto da afetividade e o melhor interesse do filho, para conseguir vislumbrar a relação multidisciplinar destas matérias. Perpassada aquela fase, aprofundarei o estudo para as amplas problemáticas acerca do tema, tendo em vista que hodierna, a ciência jurídica timidamente se lança ao debate acerca da importância da psicanálise na resolução de contendas jurídicas de natureza familiar, debates esses que a cada dia abiscoitam destaque, diante das persistentes decisões que abarcam toda a sociedade bem como a “psique” social. Entrementes, esses debates ainda são acanhados, daí o imperativo de destacarmos a importância da psicanálise como um instrumento palpável para uma tentativa de pacificação social em sua origem, em outras palavras, dentro das relações familiares. Sendo assim, há algum obste legal para a adoção da interdisciplinaridade entre o Direito das Famílias e a Psicanálise? Creio que não. Como a Psicanálise pode contribuir para o magistrado decidir a favor ou contra a adoção da guarda compartilhada? Creio que por meio de uma análise objetiva da estrutura da família em tela. Como saber qual dos pais está em melhores condições de gerar o melhor interesse da criança? Através de uma perspectiva psicanalítica. Este é o tema proposto para uma discussão relevante para a sociedade.

           

Palavras-chave: Direito das famílias, Guarda Compartilhada e Psicanálise.

Abstract. This study aims to make an approach to the contributions of psychoanalysis to the Law on Family, more specifically in the institute Guard shares in order to demonstrate that, with the help of psychoanalysis, the Magistrate may best discern the feasibility of adopting Shared Guard in particular case. To that end, I will begin this paper with a focus in allusion to the law of the Families of the historical evolution of families, marriage, separation, the situation of children in separation, the concept and types of custody, as well as the importance regarding the problem of separation of the parents to the child or adolescent, including the aspect of affectivity and the best interest of the child, to get a glimpse of the relationship of these disciplinary matters. Permeated that phase aprofundarei the study to the broad issues concerning the subject, given that today's, legal science shyly launches the debate on the importance of psychoanalysis in the resolution of legal disputes any family, these debates that every day abiscoitam Featured in the face of persistent decisions covering the whole society as well as the "psyche" social. Meanwhile, these debates are still shy, hence the need to stand out the importance of psychoanalysis as an instrument for a palpable attempt to pacify social in origin, in other words, within family relationships. Thus, there is some legal stymie the adoption of interdisciplinarity between law of Families and Psychoanalysis? I think not. How can psychoanalysis contribute to the magistrate to decide for or against the adoption of joint custody? I believe that through an objective analysis of family structure on the screen. How to know which parent is better able to generate the best interest of the child? Through a psychoanalytic perspective. This is the theme for a discussion relevant to society.

Keywords: Law of families, Shared Guard and Psychoanalysis.

Introdução

Este estudo tem como objetivo abordar a Guarda Compartilhada, instituto do Direito das Famílias, sob o enfoque da Psicanálise, como forma de dirimir conflitos familiares em nossa sociedade.

Resumidamente, buscamos demonstrar que o Direito das Famílias, sob o enfoque da interdisciplinaridade com a Psicanálise, acarreta o surgimento de novos paradigmas a serem considerados quando do seu estudo. Em particular, a Família adquiri importância sob a ótica da teoria lacaniana, que define sua composição como uma estrutura psíquica, onde cada um dos seus membros tem lugar assentado bem como, atribuição competente, a ser desempenhada dentro da estrutura familiar.

Ramo do direito, o Direito das Famílias possui normas jurídicas que dizem respeito a estrutura, organização e proteção da família, bem assim cuida das relações familiares e dos direitos e obrigações advindas dessas relações.

Por via de consequência, as demandas advindas das separações, sentido lato sensu, estão normatizadas pelo Direito das Famílias.

O Código Civil estipulava como modalidade legal a guarda unilateral, ou seja, a guarda dos filhos caberia ou a mãe, quase como regra, ou ao pai, em menor percentual.  Com a Lei Federal nº 11.698/2008, Lei da Guarda Compartilhada, que entrou em vigor a partir de agosto de 2008, passou a existir uma nova regra jurídica, a guarda compartilhada, como uma opção a ser adotada e incentivada em prol do interesse, principalmente da criança.

A ruptura do casal gera redefinição de papéis no seio familiar. A guarda compartilhada, onde ambos os pais partilham em igualdade de condições a convivência com seus filhos, vem suprir a lacuna deixada por um dos pais pela guarda exclusiva. Sua proposta é manter os laços de afetividade e, consequentemente, minimizar os efeitos danosos que a separação dos pais gera nos filhos.

            Por fim, atingiremos a polêmica na matéria, demonstrando que o magistrado ao proferir uma decisão sobre guarda das crianças pautado nas contribuições da psicanálise cumpre com sua função axiológica de preservação da dignidade da pessoa humana, através do favorecimento de um ambiente familiar permeado com a afeição e o amor.

2 DAS FAMÍLIAS

2.1 Direito das Famílias

            Este estudo trata da conceituação e evolução do Direito das Famílias e suas interfases com a psicanálise.

Clóvis Belviláqua[1] definiu o Direito das Famílias de maneira perene: Direito de Família é o conjunto das normas, que regulam a celebração do casamento, sua validade e os efeitos, que dele resultam, as relações pessoais e econômicas da sociedade conjugal, a dissolução desta, as relações entre pais e filhos, o vínculo de parentesco e os institutos da tutela e da curatela.

A nossa Carta Magna de 1988 ampliou o conceito de família para reconhecer “como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes”, bem como a “união estável entre homem e mulher” (parágrafos 3º e 4º, do artigo 226 da Constituição Federal).

Os direitos das famílias são aqueles advindos do fato de uma pessoa pertencer a uma dada entidade familiar, na qualidade de pai, filho, cônjuge etc. Portanto, constitui ramo do direito civil que disciplina as relações entre pessoas unidas pelo casamento, pela união estável ou por vínculo de parentesco além dos institutos da curatela e da tutela.

Em seguida, será abordada a evolução das famílias.

2.2 Evolução das famílias

Sabemos que as relações sociais sofrem modificações com o tempo. A adaptação ao meio é um dos fatores que favorecem a evolução do ser humano. As relações de família talvez sejam as que mais sofrem mutações. A família, ao longo do tempo, sofreu inúmeras mudanças em consonância com o desenvolvimento sociocultural decorrente da evolução social. Base da sociedade, considerada com instituto da maior relevância dentre os povos antigos, como por exemplo, na Grécia e na Roma antigas.

O Código Civil de 1916 definia família como aquela formada por laços de sangue, conforme aponta Francisco Pontes de Miranda[2] sob o viés biológico, família é o grupo de pessoas que descendem de tronco ancestral comum, e os elos que os unem são os elos sanguíneos. Em sentido estrito, a família representa o grupo formado por pais e filhos.

Por força constitucional, atualmente a família deve ser analisada sob dúplice óptica: como estrutura e na qualidade de função. Para Guilherme Gama[3] “a grande função da família atual é a de servir aos seus integrantes, de maneira harmônica e coordenada, sem que o exercício dos direitos de um integrante viole ou afaste os direitos e os interesses dos demais”.

O Código Civil de 2002 trouxe a consagração de toda mudança principiológica estatuída pela Magna Carta de 1988 em relação à entidade familiar. Valendo-se do princípio da igualdade (artigo 5º da Constituição Federal), como fundamento para equiparar homem e mulher, como também, a filiação. O pátrio poder (artigo 379 do Código Civil de 1916), outrora nas mãos do pai, agora, passa a ser poder familiar (artigo 1.630 do Código Civil de 2002), um poder-dever.

Ísis Boll de Araujo Bastos[4] afirma: “É importante destacar que a Constituição Brasileira de 1988 teve as maiores transformações, no sentido de proteção estatal à família, dentre todas as Constituições do direito comparado”.

Sobre a família Rodrigo da Cunha Pereira[5] enfatiza que “a família é uma construção cultural. Dispõe de estruturação psíquica na qual todos ocupam um lugar, possuem uma função – lugar do pai, lugar da mãe, lugar dos filhos”.

A família, concebida na perspectiva atual, existe em função da pessoa humana. Buscam-se relações familiares alicerçadas no amor e na compreensão, voltada para a promoção da felicidade de todos os seus membros. Daí verifica-se que a família que detém a proteção do Estado é a família eudemonista[6].

Portanto, resta claro que os atuais modelos de convivência familiar foram moldados pouco a pouco, de acordo com a evolução histórica, social e cultural por que passou a sociedade e, que foram influenciando a formação das famílias bem como, sua organização.

Tratarei, em seguida, acerca da conceituação e evolução da separação.

2.3 Separação

            O casamento foi concebido como algo eterno e indissolúvel, a possibilidade do fim só se dava nos casos de morte de um dos cônjuges, no entanto, nada é estático na sociedade.

A possibilidade do “desquite” surgiu no Código Civil de 1916 e só autorizava o término da sociedade conjugal, não o vínculo. Assim, o vínculo só se extinguia com o falecimento de um dos cônjuges e a sociedade brasileira perpetuou o principio da indissolubilidade do casamento por um longo período.

Surge a Lei Federal n° 6.515, de 26 de dezembro de 1977, que alterou o artigo 175 da Constituição Federal de 1967, eliminando a indissolubilidade do casamento e instituindo a Lei do Divórcio e a separação judicial.

            O divórcio, previsto no parágrafo 6º do artigo 226 da Constituição Federal, trás a dissolução da sociedade conjugal em definitivo, o que faz com que o casal possa reiniciar sua vida. É o fim do desquite. Surge a separação judicial, prevista no artigo 1.574 do Código Civil. A separação mantém os impedimentos de novas núpcias e os deveres de mútua assistência.

Na visão de Caio Mário Pereira da Silva[7] “a lei do divórcio deu um passo na marcha evolutiva do nosso direito de família, procurando solucionar problemas que a vida conjugal originou”.

A Lei Federal n.º 11.441/2007, regulou a separação e divórcio extrajudiciais. Possibilita ao casal, sem filhos incapazes, lavre uma escritura pública de divórcio ou separação em qualquer Tabelionato do país.

A emenda n.º 66/2010, elimina a obrigatoriedade da separação como condição ao divórcio, caracterizando a inexistência de qualquer prazo.      

O divórcio surge a partir de uma evolução social que clama por reconfigurações familiares e impedem que as famílias recompostas fiquem sem proteção jurídica. A ideia indissolubilidade do casamento cai por terra.

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Entretanto, esta espécie jurídica resolve o problema dos cônjuges, mas e os filhos advindos daquela relação? Este será o assunto tratado em seguida.

2.3.1 Os filhos na separação

            A tutela dos filhos diante de uma separação judicial é uma preocupação estatal e, por isso, possui um protecionismo por parte do Estado.

Em caso de divórcio ou separação, há a preocupação dos pais com o bem-estar do filho ou, o filho se torna um meio para atingir o seu antigo companheiro. Não raro se deve recorrer ao acompanhamento psicológico.

            O importante é manter uma convivência sadia com os filhos. Os pais devem demonstrar o afeto e não tentar remediá-lo com o aspecto financeiro.

Fora o aspecto afetivo, os pais devem se preocupar com os deveres advindos do poder familiar, conforme o artigo 1.634 do Código Civil, ou seja, não devem ver os filhos como um patrimônio, mas, sim, como sujeitos em formação que necessitam de auxílio e carinho. A falta de diálogo torna ainda mais delicada à recepção de integração de dois sistemas – pai-filho e mãe-filho.

Cabe ao Poder Judiciário impor um limite e impor uma conduta sadia na relação, daí advém à necessidade de uma abordagem multiprofissional. O magistrado deve ter uma formação psicanalítica e se utilizar das mais diversas áreas de conhecimento para prevenir ou remediar situações traumáticas.

À medida que será adotada deve contemplar o interesse dos filhos e não o de seus pais, logo, qual a melhor forma de guarda? Esta será a próxima etapa deste estudo.

3. DA GUARDA COMPARTILHADA

3.1 Conceito e tipos de guarda

            Juridicamente, a guarda incide no direito legal atribuindo aos titulares do pátrio poder ou aos terceiros, a gerência da vida de menores ou maiores incapazes, a fim de conduzir a formação moral e intelectual, prover as necessidades materiais e imateriais, guia-los para a vida. Consiste na efetivação do pátrio poder, no dever dos pais em promover assistência, sustento e direção no processo de formação da personalidade dos filhos.

            Havendo a dissolução da sociedade conjugal ou a rescisão da união estável é estabelecida uma das seguintes modalidades de guarda: guarda dividida, única ou exclusiva; guarda alternada; aninhamento ou nidação ou a guarda compartilhada.

Neste trabalho falaremos especificamente sobre a guarda compartilhada, a mais moderna, na qual um dos pais mantém a guarda física do filho, enquanto partilham a sua guarda jurídica. Os filhos permanecem sob a autoridade isonômica de ambos os pais, que tomam decisões importantes em conjunto. Esse tipo de guarda visa assemelhar as relações mãe/filho, pai/filho mantidas antes da dissolução da covivência, da melhor forma possível.

A Lei Federal nº 11.698/2008, estabelece que a guarda compartilhada poderá se dar por consenso dos pais na ação de separação, na de divórcio, na de dissolução de união estável ou na de medida cautelar, ou ainda, decretada pelo juiz atendendo aos interesses do menor. A lei ainda impõe a obrigatoriedade de o juiz informar os pais a respeito do instituto, dando prioridade a este, em face dos demais tipos de guarda.

A guarda compartilhada possibilita ao filho o contato com ambos os pais, o que promove o desenvolvimento regular e sadio não havendo a instabilidade familiar ou o rompimento de relações parentais.

 Esse instituto tutela o direito do filho ao desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social completo, além da referência masculina/paternal, mas também o direito do pai de desfrutar a convivência assídua com o filho.

Transcorrida esta etapa passarei a abordar os principais pontos de relevância para este estudo, a interface entre a psicanálise e o direito.

4. O OLHAR DA PSICANÁLISE SOB A GUARDA COMPARTILHADA

4.1 A Psicanálise e Guarda

As disputas no âmbito jurídico nas matérias de família se mostram cada vez mais acirradas, no que diz respeito aos divórcios e separações que envolvem a guarda dos filhos, a situação é mais grave.

Os conflitos familiares geram traumas nos envolvidos de difícil solução e, quando se trata de crianças e adolescentes os traumas aumentam.

A psicanálise freudiana enfatiza a relação do bebê com seus pais, discute o triangulo edipiano, complexo de Édipo, formado pela criança, a mãe e o pai. Para Sigismund Schlomo Freud, Jacques-Marie Émile Lacan e seus seguidores, a fase edipiana é aonde o sujeito irá se estruturar. Nesta fase é traçado a sina psíquica do adulto. Se algo restar mal resolvido nessa fase, estará aberta a porta de entrada para se instalar a psicose.

O Édipo intervém determinando o tipo de escolha de objeto, a identidade do sujeito, como este e o seu desejo se constituem, seus mecanismos de defesa[8].

Melanie Klein defende as relações de objeto, parcial e total, seio bom e seio mau, destacando até na metáfora, a importância da relação entre mãe e filho[9]. As teorias de Melanie Klein[10] servem de base para todo um campo, o psicanalítico, na compreensão da mente e na análise, a criança de um ano de idade já pode e deve afastar-se do lar, ter outras relações, frequentar jardins de infância, criar outros vínculos. É importante afastar-se da mãe, pois é assim que a criança consegue saber internamente que as situações boas e ruins desaparecem e voltam: pernoitar em outra casa, ficar todo o dia numa escolinha.

 Carter e Mc Goldrick[11] apontam que a separação conjugal é um dos eventos mais estressantes da vida familiar. Desse modo, se verifica a importância de não deixar relegado ao segundo plano os aspectos emocionais das pessoas que integram aquela família. A psicologia e a psicanálise também se preocupam com essas modificações, diversas teorias da personalidade buscam referência na relação entre pais e filhos para explicar a formação e o desenvolvimento do psiquismo individual[12].

            O distanciamento da criança por um período de tempo prolongado de qualquer um dos pais poderá propiciar a rompimento do processo do vínculo afetivo o que gera traumas futuros.

Arminda Aberastury[13] entende que “quando se separa um filho de um dos pais, algo pode perder-se definitivamente”.

                A psicologia e a psicanálise confirmam que a separação ou divórcio constitui uma crise emocional que pode acarretar em uma desestabilização das famílias, o que produz, normalmente, prejuízos emocionais aos filhos. Verifica-se que, dentre os membros dessa família que passa por essa situação aflitiva, as crianças menores são as que mais sofrem. Isso ocorre em função de que qualquer evento que atinja algum membro do sistema familiar, acarretará efeitos sobre os demais e sobre o grupo como tal[14].

Evandro Luiz Silva[15] entende que a guarda compartilhada comina como uma opção mais apropriada à saúde psíquica da criança. Com a maior presença de ambos os pais na vida da criança, pois, o tempo em que o pai ou a mãe ficam separados da criança diminui sensivelmente em relação a outros tipos de guarda, permite à presença de pai e mãe, simultaneamente, na vida de seus filhos, evitando sentimento de desamparo e o desapego na qual se originam os sintomas, como por exemplo: dificuldades cognitivas acompanhadas de declínio do rendimento escolar, ansiedade, agressividade e depressão. Sintomas, esses comuns em crianças de pais separados.

Alguns alegam que a guarda deve ser concedida a apenas um dos pais, sob pena da criança perder o referencial do lar. Creio que muito mais importante para a criança é manter o referencial do pai e da mãe. A intimidade entre pais e filho é que irá garantir à segurança o que permitirá uma adaptação adequada com sua nova vida.

A psicanálise poderia ser fundamental, pois, por meio dela, poderia ser revelada a razão da dificuldade de muitos casais em seguir adiante após a separação ou divórcio, o que traz danos aos seus filhos.

A psicanálise pode restabelecer os lugares simbólicos de cada membro dentro de uma entidade familiar, tendo em vista que, as funções só podem ser bem desempenhadas quando os lugares estão claros e ajustados. Um pai só é pai porque existe uma mãe e um filho. Portanto, deve ter uma consideração recíproca entre os membros da família, não importando qual seja a sua estrutura, para que cada um possa ser o que é e exerça o seu papel.

Em seguida, será tratada a interface entre o direito e a psicanálise.

4.2 Direito e a Psicanálise

O Direito é imprescindível para a vida em sociedade promovendo o controle de pulsões. A existência do Direito se encontra diretamente condicionada há proibições e as sanções. Considera-se como sendo a primeira lei organizadora das relações sociais uma lei de Direito das Famílias, conhecida como Lei-do-pai, ou Lei do incesto. Com essa primeira lei foi possível passar do estado da natureza para o estado cultural. O homem passou do estágio instintivo para um estágio de aculturação. Isso ocorre no desenvolvimento de todo e qualquer ser humano, quando a criança passa pelo estágio de desenvolvimento. Ocorre quando o pai intercepta o desejo da mãe, colocando-se entre ela e o filho, fazendo um corte naquela simbiótica relação. Com esta interrupção, ocorre a separação mãe-filho e surge a possibilidade de existir um “sujeito”, ou, em linguagem no campo jurídico, a “pessoa”. Esta lei simbólica é o que Sigmund Freud chamou de interdição do incesto, cujo representante é o pai e os seus mecanismos e estruturação estão descritos em um de seus textos mais conhecidos, totem e tabu[16].

O Direito possui como função e causa de existir, evitar a tendência do ser humano em fazer do outro o objeto de dominação ou de suas pulsões destrutivas.

Para Jacques Lacan o gozo possui apetite de morte, e a lei jurídica se inclui com o gozo na medida em que ela vem limitar os exageros gozosos.

A subjetividade na operacionalidade do Direito recebeu impulso a partir das décadas de 60 e 70, por meio de Jacques Lacan, que desenvolveu sua teoria tomando por base observações realizadas em processos judiciais. 

            O Direito é uma operação do discurso, e a normatividade só funciona se este discurso for apropriado na forma dogmática. Forma dogmática do discurso é aquele que diz sempre a verdade. Sendo isto uma ficção, o dogmatismo jurídico fica estremecido quando se descobre que a verdade normativa é apenas uma verdade. Há a subjetividade e o sujeito do inconsciente. Legendre, em L’amour du censeur, nos diz que a Psicanálise, ou melhor, Freud “lesou a majestade”.

Uma das mais importantes contribuições da Psicanálise no campo do Direito é a compreensão da subjetividade nos conflitos que nos deparamos no âmbito do judiciário. O verdadeiro interesse é resolver a demanda. Para isto é necessário compreender a subjetividade. Evita-se que nos processos judiciários os filhos sejam usados como moeda de troca quando da ruptura da relação do casal.

No âmbito do Direito das Famílias, a Psicanálise ao revelar o sujeito do inconsciente, estará apresentando à consciência o verdadeiro motivo de uma demanda. Conhecer o sujeito do inconsciente pode ainda revelar múltiplos porquês de litígios judiciais, que são caminhos de sofrimento. O sujeito do inconsciente se encontra presente nos atos e fatos jurídicos e judiciais e intervém despontando uma “face oculta” e aparecendo, frequentemente, um desejo recalcado.

Com auxílio da Psicanálise e da Psicologia, o Direito procura prosseguir no desenvolvimento de nossa sociedade, cada vez mais plural, dinâmica e que carece incessantemente de respeito às diferenças. O nascimento da Psicanálise e o estudo do inconsciente acarretaram influencia nas ciências sociais e humanas e, consequentemente, no Direito.

Nesse sentido, Rodrigo da Cunha Pereira[17] faz a seguinte afirmação: “o inconsciente produz efeitos e é exatamente a partir desses efeitos que ele é reconhecido – lapso, ato falho (...). Efeitos que, embora inconscientes, repercutem no Direito”.

Existe uma relação estreita entre Direito e Psicanálise, pois, ambos estão presentes em todos os momentos da vida do ser humano. O Direito atua a partir do fato gerado pelos atos do homem e de sua consequente repercussão na sociedade da qual faz parte. A Psicanálise busca descobrir os impulsos que precedem aos atos para alcançar o motivo que deu origem aos mesmos.

Nas palavras de Giselle Groeninga[18], “cabe aos psicanalistas sensibilizar os que lidam com o Direito para as questões de família, permitindo uma compreensão mais ampla dos conflitos e do sofrimento”.

Não raro, são levadas a pleito jurídico demandas objetivas, como por exemplo, o divórcio consensual ou mesmo o litigioso, a pensão alimentícia, a guarda dos filhos, sistema de visitas, a partilha de bens competindo ao Estado Juiz achar uma solução para regulamentar à convivência familiar. A psicanálise, nesta conjuntura, possibilita um tipo de escuta que leva o indivíduo a conjecturar sobre suas queixas, e a se responsabilizar por elas, deixando de projetar ao outro aquilo que é seu.

Conclusão

            No mundo atual não cabe mais se ter uma visual de guarda do filho com as limitações do passado, naquela época havia uma divisão rígida de tarefas entre a mulher e o homem. Nesse tipo de sociedade, onde a mãe se dedicava exclusivamente as tarefas domésticas, era plausível que a guarda do filho fosse a ela confiada.

            Ocorre que esse mundo não mais subsiste e, necessário se faz haver uma adequação aos novos modelos de constituição familiar. O modelo tradicional de guarda, característicos das lides judiciais, ensejava uma verdadeira guerra entre os pais. Até nos casos em que se homologava um acordo, não raro, anos depois, davam origem a nova lide judiciária.

            Com o incremento da multidisciplinaridade no judiciário, com o auxílio da Psicanálise como instrumento de resoluções de conflitos, em especial, nas questões que versam sobre a ruptura da sociedade conjugal, houve uma mudança de paradigmas. Atualmente, a atuação do psicólogo e do psicanalista no processo judiciário, possibilita uma escuta diferenciada do sujeito.

A psicanálise surge para auxiliar os sujeitos a procurarem novas formas de suportar a ruptura. O processo de separação conjugal significa desmontar uma estrutura e também implica em perdas.

É sabido que a interface entre a psicanálise e o direito, possibilita a solução do conflito de forma mais humana. A psicanálise faz com que os ex-parceiros dialoguem constantemente sobre quem eles são, ou estão se tornando, e quais os termos devem ocorrer o fim de sua ligação.

A Psicanálise e o Direito das Famílias se tornam parceiros necessários para tratar do divórcio, da peleja pela guarda dos filhos, das pensões alimentícias e das partilhas de bens, tarefas penosas que necessitam da interdisciplinaridade, a fim de evitar maiores sofrimentos das partes envolvidas.

A Guarda Compartilhada pode ser de grande valia, pois carreia em seu cerne a filosofia que orienta a ideias do convívio, estímulo à participação dos pais na vida de seu filho, apoio ao melhor desenvolvimento da criança e do adolescente, promove estímulo ao convívio pais-filho e ao cuidado da prole por parte de ambos os pais sempre dentro de um enfoque socioafetivo.

A Guarda Conjunta deve ser recebida, como um conceito, uma postura diante do filho de pais separados, distinguindo suas necessidades de um relacionamento continuado com ambos os pais que se acham numa posição central e igualitária para o desenvolvimento da saúde física e psicológica de seus filhos.

O instituto da guarda compartilhada necessita ser aceita, antes de qualquer coisa, como uma atitude, advindo da representação de uma mentalidade segundo a qual o pai e a mãe são igualmente importantes para o filho de qualquer idade e, por conseguinte, essas relações devem ser preservadas para a garantia de que o adequado desenvolvimento fisioquímico da criança ou adolescente venha a ocorrer.

Para a adoção da guarda compartilhada, necessário se faz, proceder uma prévia avaliação objetiva da sua aplicabilidade em relação as condições e circunstâncias de cada caso.

Nesse aspecto, é incontroverso o valor do pai e da mãe na vida do filho: provocar a lacuna de um deles é delinear o pior dos prognósticos para uma criança. Portanto, é primordial manter a criança em contato com ambos os pais, e permitir adaptação à realidade do seu mundo externo, das necessidades dos pais, da escola, enfim, da possibilidade que o momento apresentar. A criança amada, que confia nos pais, consegue administrar bem a sua nova rotina, e tem condições internas suficientes para esta adaptação, pois o seu ego já está devidamente estruturado.

Cabe, assim, aos operadores, sendo estes psicólogos, psicanalistas, advogados, assistentes sociais, juízes ou legisladores, levarem em consideração, como papel principal, o crescimento e o interesse da criança, quando se referir às questões de guarda.

Por fim, este trabalho é uma tentativa de situar uma vinculação frutífera entre o Direito e a Psicanálise de modo a comover advogados, juristas, psicólogos, psicanalistas, a perquirir, com muita perspicácia e sensibilidade, famílias que se desintegram causando sérios transtornos na formação de uma criança.           

Referências:

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Sobre os autores
Leonardo Barreto Ferraz Gominho

Graduado em Direito pela Faculdade de Alagoas (2007); Pós-Graduado em Direito Processual Civil pela Universidade do Sul de Santa Catarina (2010); Especialista e Mestre em Psicanálise Aplicada à Educação e a Saúde pela UNIDERC/Anchieta (2013); Mestre em Ciências da Educação pela Universidad de Desarrollo Sustentable (2017); Foi Assessor de Juiz da Vara Cível / Sucessões da Comarca de Maceió/AL - Tribunal de Justiça de Alagoas, por sete anos, de 2009 até janeiro de 2015; Foi Assessor do Juiz da Vara Agrária de Alagoas - Tribunal de Justiça de Alagoas, por sete anos, de 2009 até janeiro de 2015; Conciliador do Tribunal de Justiça de Alagoas. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito das Obrigações, das Famílias, das Sucessões, além de dominar Conciliações e Mediações. Advogado. Professor da Faculdade de Ciências Humanas e Exatas do Sertão do São Francisco - FACESF -, desde agosto de 2014. Professor e Orientador do Núcleo de Prática Jurídica da Faculdade de Ciências Humanas e Exatas do Sertão do São Francisco - FACESF -, desde agosto de 2014. Responsável pelo quadro de estagiários vinculados ao Núcleo de Prática Jurídica da Faculdade de Ciências Humanas e Exatas do Sertão do São Francisco - FACESF - CCMA/FACESF, em Floresta/PE, nos anos de 2015 e 2016. Responsável pelo Projeto de Extensão Cine Jurídico da Faculdade de Ciências Humanas e Exatas do Sertão do São Francisco - FACESF, desde 2015. Chefe da Assessoria Jurídica do Município de Floresta/PE. Coautor do livro "Direito das Sucessões e Conciliação: teoria e prática da sucessão hereditária a partir do princípio da pluralidade das famílias". Maceió: EDUFAL, 2010. Coordenador e Coautor do livro “Cine Jurídico I: discutindo o direito por meio do cinema”. São Paulo: Editora Lexia, 2017. ISBN: 9788581821832; Coordenador e Coautor do livro “Coletânea de artigos relevantes ao estudo jurídico: direito civil e direito processual civil”. Volume 01. São Paulo: Editora Lexia, 2017. ISBN: 9788581821749; Coordenador e Coautor do livro “Coletânea de artigos relevantes ao estudo jurídico: direito das famílias e direito das sucessões”. Volume 01. São Paulo: Editora Lexia, 2017. ISBN: 9788581821856. Coordenador e Coautor do livro “Coletânea de artigos relevantes ao estudo jurídico: direito das famílias e direito das sucessões”. Volume 02. Belém do São Francisco: Editora FACESF, 2018. ISBN: 9788545558019. Coordenador e Coautor do livro “Cine Jurídico II: discutindo o direito por meio do cinema”. Belém do São Francisco: Editora FACESF, 2018. ISBN: 9788545558002.

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