A TUTELA MONITÓRIA
Rogério Tadeu Romano
Procurador Regional da Repúbica aposentado
1. OS PRINCÍPIOS BÁSICOS E SUA EVOLUÇÃO CONCEITUAL
1.1. A sumariedade da cognição na tutela monitória e a outorga antecipada da eficácia sentencial
Estudando o processo injuncional, ou monitório, sustentam Luiz Guilherme Marinoni[1] e Ovídio A. Baptista da Silva[2] que há para ele dois princípios básicos: o princípio da sumariedade da cognição (summaria cognitio) com base em que o juiz emite um preceito liminar, e a outorga antecipada da eficácia sentencial, que provoca inversão de contraditório, obrigando o réu a comparecer e defender-se, sob pena de transformar-se a decisão liminar em sentença condenatória final, dando ensejo a execução forçada.
Estava a tutela monitória albergada por Chiovenda, nos processos de conhecimento com prevalente função executiva com estrutura de medida antecipatória, tal como uma parte do processo que se desprega, deslocando-se para o início.
A cognição sumária, em tese de tutela monitória, como ato de analisar e valorar as alegações e as provas produzidas é verticalmente sumária, pelo grau mínimo da profundidade do juiz quando defere o mandado monitório.
Será essa cognição, plena, horizontalmente, quanto a extensão do conhecimento.
Por pressupor a urgência, tal medida não se coaduna com uma cognição exauriente face a demora que se quer evitar.
Sob essa tutela de urgência, a tutela monitória, soma-se à tutela de aparência (cautelar) e à tutela antecipada, também satisfativa, como se vê nas tutelas de urgência satisfativas provisionais.
Essa estrutura antecipatória vista na decisão que determina a expedição do mandado monitório é encontrada, outrossim, nas liminares satisfativas, de que são exemplo, a existente na reintegração de posse ou na ação preventiva de nunciação de obra nova, ou ainda cautelar como na liminar de arresto, sempre antecipando-se efeitos jurídicos práticos da tutela final, sem cunho qualquer de pronunciamento de certeza quanto ao acertamento da relação jurídica.
Em verdade, são inconfundíveis as liminares satisfativas, em que se destacam as possessórias (execução – para-segurança) e as liminares cautelares.
Há absoluta similitude entre a proteção liminar possessória e a tutela do tipo injuncional (monitória), que, não pressupõe perigo de demora e se constitui em procedimento autônomo em que se efetiva a inversão do contraditório e se verifica uma primeira fase destinada à cognição sumária baseada em juízo de verossimilhança.
A tutela monitória é executiva lato sensu, pois é cognição e execução no mesmo processo.
Temos na expedição do mandado monitório a concessão de uma providência de caráter antecipatório, satisfativa, do provável direito do autor.
Tal ocorre na tutela monitória, como nas liminares de ações preventivas, como no interdito proibitório (art. 461, § 3.°), na liminar de nunciação de obra nova, nas liminares de interdição e demolição de obra previstas no art. 302 do Código de Processo Civil de 1939.
1.2. A experiência brasileira
Em nossa experiência processual, essa tutela de urgência[3] tem origens nas Ordenações Manuelinas, seguindo pela Ordenações Filipinas, de 1603, sob o título “ação decendiária”, sem contar disciplina trazida pelas novas ordens do Juízo do Senhor Rei D. João III de 05.11.1526 e a do Senhor D. Sebastião de 18.11.1577.
Prosseguiu, sob o Regulamento n.° 737, de 1850, e chegou aos Códigos Estaduais de São Paulo, Bahia, Rio de Janeiro, Pará.
O Código de 1939 não o recepcionou, ficando o instituto sob um “limbo” até 1995, quando, sob a égide da reforma processual, chegamos a Lei n.° 9.079/95.
Sua falta foi imensa nesse período em nosso ordenamento processual, na medida em que se, a ofensa de princípios, abdicando-se da boa técnica processual, consagrou-se a duplicata sem aceite, condicionando sua função de título executivo extrajudicial, legem habermus, consoante a Lei n.° 6.458, de 01.11.77, que deu nova redação ao art. 15 da Lei n.° 5.474, de 18.07.68, no da duplicata não aceita.
Ora, o protesto não depende de anuência do devedor e é ato eminentemente destinado a documentação de uma declaração de vontade do credor. Como condicionar um título executivo ao protesto e como condicionar a comprovação, no limiar da execução, a comprovação da recusa do aceite?
Tudo isso porque deu-se a execução forçada uma via extremamente ampla em detrimento a institutos próprios de tutela sumária de urgência de cunho satisfativo.
Conseqüência disso, foi tentar impor ao processo de execução um contraditório, que não se adequa a ele.
Essa tendência de tornar efetiva a tutela monitória não é nova, tendo os principais códigos europeus, diante da situação de um credor munido de relativa certeza de seu direito, mas privado de título executivo, numa summaria cognitio, sem contraditório do devedor, com base em prova documental do credor, permitir a obtenção de imediato pronunciamento de uma decisão, suscetível de constituir título executivo[4].
1.3. A posição de Carnelutti
Para Carnelutti[5] a injunção executiva é um tertium genus, que se coloca como intermediário entre a cognição e a execução forçada.
No procedimento de injunção, onde há ordem, imposição, o credor, sem título executivo provoca a abertura de execução forçada, tornando o contraditório apenas uma eventualidade, cuja iniciativa é do réu. Não se pede a condenação do devedor, mas a expedição de uma ordem, desde logo, para que a dívida seja saldada, notando-se que a oposição do réu se dá por embargos, em prazo peremptório.
1.4. A posição de Chiovenda e a experiência italiana
Chiovenda estudando as declarações com predominante função executiva, onde o conhecimento do juiz é distinto do conhecimento pleno e completo, conhecimento ordinário, que precede a sentença de condenação e pode opor-se a este com o nome genérico de conhecimento sumário, que nada tem de similitude a procedimento sumário[6].
Tal situação ocorreria quando:
a) em consideração à prova particularmente certa do direito (por estar escrito) ou a necessidade de favorecer de maneira especial determinadas obrigações (mercantis), a lei admite que o juiz, mediante resolução especial, possa declarar provisoriamente executiva uma sentença submetida a apelação;
b) em favor do título cambial, a lei admite que o juiz possa pronunciar condenação com reserva de determinadas exceções que terão de se fazer valer na continuação do procedimento; ou, para favorecer os créditos resultantes de prova escrita, admite-se que o juiz pode pronunciar condenação de pagamento com reserva de exceção de compensação; (Código de Comércio Italiano, art. 324, Lei Cambial Italiana de 14.12.33, art. 65);
c) para favorecer determinados créditos, ou certas pessoas de credores, a lei admite um pagamento sem citação do devedor e com anterioridade ou oitiva de suas razões, com base no exame superficial de algumas condições da ação, dando-se ensejo a posterior oposição do devedor.
A execução provisória, em nosso direito, tem base no artigo 588 do Código de processo Civil de 1973, com alterações, inclusive, da Lei n.° 10.444, de 2002, e se aplica a sentenças condenatórias não transitadas em julgado e sujeitas a recurso sem efeito suspensivo. É o exemplo do art. 520, do CPC, de segunda sentença de ações de divisão e demarcação na sentença que ratifica liminar possessória, nos despejos (Lei do Inquilinato), na busca e apreensão na alienação fiduciária, no mandado de segurança, no habeas data e na ação discriminatória. Afastamo-nos da Novela Alemã, de 1924 e da Legislação Italiana de 1990
No passado, no Brasil, o agravo de instrumento, que não tem efeito suspensivo, foi utilizado como recurso cabível contra algumas sentenças definitivas (art. 842, incisos XV e XVII, do Código de 1939)[7]. Da mesma forma, alguns códigos estaduais de processo, como do Estado da Bahia (art. 1.325, inc. 24); o do Estado de Minas Gerais (art. 1.484, inc. 49) e do Estado de São Paulo (art. 1.094, § 4.° , inc. XIX) admitiam, dentro do contexto da execução provisória, para o atentado, na visão do processo incidente, o recurso de agravo de instrumento para a sentença que indefere liminarmente o pedido ou o que o resolve definitivamente.
A execução provisória está submetida à concessão de caução de direito completo (art. 588, § 2.° do CPC), que apenas será dispensada nos créditos alimentares até 60 vezes o salário mínimo, e que é condição para levantamento de depósito em dinheiro e a prática de atos que importem alienação de domínio e se faz da mesma forma da definitiva.
Com relação a condenação com reserva, o mestre da Universidade de Roma[8] entendia que, por ela se derrogava o princípio de que o juiz deve conhecer todas as exceções do demandado antes de ditar a sentença, se admitindo a separação de uma ou de várias exceções da ação, pronunciando-se definitivamente sobre as exceções não reservadas, deixando-lhe a salvo do direito de provar a exceção ou exceções reservadas na continuação do juízo e eventualmente de suscitar repetição de pagamento.
Tal situação foi regulada, na Alemanha (Baden, §§ 646, 652; Oldenburgo, art. 322; Würtemberg, art. 866) com a reserva determinada e, após, a reserva indeterminada (Regulamento Processual de 1877). Na Itália, foi destacado o sistema de reserva indeterminada, que se encontrava na Lei Toscana de 28.11.1918 (art. VI) e adotado o da reserva determinada, que se encontrava no Código de Comércio Albertino de 1843 (art. 162), de onde deixou o Código de Comércio de 1865 e o art. 324 do Código de Comércio de 1882, produzindo execução e efeito secundário da hipoteca judicial.
Chegamos ao processo monitório, que Chiovenda[9] divisa para certos créditos determinados, ainda que não resultassem de documentos (monitório puro) que se estabeleceu no direito medieval, no uso de não citar em juízo o devedor, senão obtendo-se, diretamente, do juiz, a ordem da prestação que abriria a execução (mandutum ou preceptum de Solvendo), distinto do mandado do processo executivo e documental, na execução parada.
De toda ordem, Chiovenda deixa claro que tal mandado era ditado inaudita altera pars, e sem conhecimento completo, se dirigindo a preparar a execução.
2. HISTÓRICO
2.1. Os interditos romanos
O processo monitório não é criação lusitana com a experiência das ações decendiárias.
Suas origens estão nos interditos no direito romano e na sumarização executiva do direito germânico, no ano 1000.
O espírito criativo e pragmático romano autorizou o pretor a exercer poder de imperium, que, ao contrário da iurisdictio, consista num poder genérico e indefinido, em que a autoridade judicial expedia ordem a pedido de um particular para que o outro particular fizesse (interdito restitutório e exibitório) ou deixasse de fazer algo (interdito proibitório).
A sumariedade da cognição pretoriana é a raiz da tutela de urgência sumária, da qual temos a tutela cautelar, a tutela de urgência satisfativa provisional[10] e a tutela monitória. Essa sumariedade impedia que o interdito se tornasse definitivo. Caso não fosse cumprida a ordem, instaurava-se o procedimento por via ordinária.
Na concepção de Ebert Viana Chamoun[11] eram manifestações de imperium acentuando que se de não fazer, interdictum, espécie daquele gênero, se consistia em fazer, chamava-se decreto.
Temos no comando expedido na tutela monitória, a emissão de uma ordem que tem por base juízo de verossimilhança.
2.2. A experiência medieval
Mas, é no direito medieval, que a sumarização do processo atinge maiores patamares.
É exemplo dessa experiência a eficácia da execução aparelhada aos instrumentos de dívida lavrados perante o tabelião, equiparando tais documentos à sentença. Era a instrumenta guarentigiata.
Tal execução deve ser considerada como algo distinto dos processos monitórios, pois se iniciava com a prática de atos constritivos sobre o patrimônio, ao contrário do monitório, onde tal execução não existe, desde o início.
Aliás, essa característica era própria do direito germânico, que passou a prevalecer após a queda do Império Romano. Era o inverso do que se fazia em Roma: antes de provocar qualquer apreciação judicial, antes de fazer reconhecer o seu direito por uma sentença do juiz, o credor lançava mão dos meios executivos, penhorando por sua própria força e autoridade, os bens do devedor[12]. A cognição era provocada em etapa posterior ou em incidente suscitado dentro do procedimento executivo.
Isso aconteceu, nos séculos IX e X, com a larga profusão da penhora privada.
Tudo isso era tradicionalmente oposto à prática da actio iudicati, onde só a autoridade judicial fazia a execução[13], quando o próprio magistrado que havia proferido a sentença se encarregava de julgá-la, de tal forma que essa consistia no mecanismo das condenações em dobro, como instrumento de coação para levar o devedor a confessar a dívida ou pagar.
As origens da tutela monitória estão, pois, na Idade Média. É o uso de não citar em juízo o devedor, mas de obter diretamente do juiz a ordem de prestação que dá ensejo à execução (mandatum de solvendo cum clausula iustificativa).
2.3. O direito suíço
Extraordinária foi a experiência do Rechtsbot, tida como instituição antiquíssima, na Suíça Oriental, do que se lê na Lei Federal Suíça sobre execução e quebra (Bundesgezge setz über Schuldbetreibung und Konkuns) de 11 de abril de 1889. Ali se diz que se ao mandado, o devedor quer fazer oposição, deve apresentá-la por escrito ou oralmente, dentro de dez dias da notificação dele (art. 74). A oposição suspende a execução (art. 78), devendo se seguir a via ordinária.
O Rechtsbot suíço não requeria que o devedor apresentasse documentos.
2.4. O direito italiano
A matéria foi objeto, naquele País, das Constituições Piamontesas, livro III, tít. XXX, cause ingiunzionali; o processo por via executiva do Código Estense de 1852, art. 441, y ss, derivado das Constituições, livro I, tít. VIII.
A Lei de 9 de julho de 1922, n.° 1.035, e o Real Decreto de 24 de julho de 1922, n.° 1.036, disciplinaram o instituto. Após, tal Decreto foi alterado, em 1936, pelo Decreto Real n.° 1.396.
A tutela é disciplinada nos artigos 693 e seguintes do Código de Processo Civil Italiano.
A tutela monitória foi prevista no Projeto Orlando, apresentado à Câmara dos Deputados, em 24 de maio de 1909, para dívidas em dinheiro, líquidas e exigíveis por quem tivesse prova escrita (salvo os créditos não superiores a 100 liras, nos quais o crédito pudesse ser provado de outra maneira).
É o monitório documental que foi aceito em nosso ordenamento jurídico.
Eram condições para tal:
a) dívida de dinheiro, mercadorias, ou outras coisas fungíveis;
b) crédito líquido e exigível;
c) fundado o crédito em prova escrita.
Eram casos previstos:
a) créditos a favor de advogados, procuradores, peritos, relatores, agentes para obter pagamento de honorários dos clientes por serviço prestado e com prestação possível;
b) notificação para desocupar imóveis por cumprimento do arrendamento (Lei de 24 de dezembro de 1896, n.° 547, modificada pelo Real Decreto de 20 de setembro de 1922, n.° 1.316, art. 18), historicamente ligado a experiência austríaca, de 1725, como no Estado Lombardo-Veneziano e no ducado de Módena;
c) cobrança de taxas de registro e sucessões;
d) cobrança de receitas patrimoniais do Estado, dos Municípios, de instituições de benemerência.
Na Itália, a conversão do decreto injuntivo em título executivo tem o caráter de sentença, inclusive para efeito de recursos.
Os embargos suspendem ou não a execução provisória do decreto injuntivo, dando-se a suspensão quando por motivos sérios.
O sistema italiano unitário requer título injuntivo.
2.5. A experiência inglesa
Existia para dívidas em quantidade determinada, resultante de contratos escritos, letras de câmbio, cheques, arrendamentos cumpridos, tendo a demanda de cumprir todas as indicações para conhecimento imediato, sendo acompanhado de juramento do autor de que o demandado não possui defesa (regras da Alta Corte de Londres, Ord. III, regra Sexta, Ord. XIV, regra primeira).
2.6. As experiências na Alemanha e Áustria
O Mandatsverfarhren austríaco e alemão requeria que o direito do autor seja fundado em documentos, monitório documental, enquanto que o Mahnverfahren alemão e o austríaco não, pois são monitório puro.
Encontra-se ainda na história do processo monitório, na Áustria, forma especial para entrega de imóveis arrendados, para o caso de arrendamento cumprido: Bastandsverfahren, §§ 500y ss).
Soma-se a eles um monitório para dívidas de quantidades ou coisas fungíveis (Mahnverfahren, Mandatsverfahren); alguns eram admitidos para débito de qualquer valor (Mahnverfahren alemão); outros somente para pequenas dívidas (Mandatsverfahren austríaco).
No Mandatsverfahren austríaco a base é constituída nos atos públicos ou escrituras privadas autenticadas, ao contrário do sistema italiano onde vale qualquer prova escrita.
Os processos civis austríacos e alemão conhecem o procedimento monitório puro e o documental.
Na Alemanha, o procedimento monitório procede do Bedingter Mandatsfozess do Direito Comum, o que por sua vez tem seus antecedentes nos praecepta (mandata) de solvendo um clausula iustificativa italianos.
Não se utiliza tal remédio, hoje, com a mesma freqüência que na época da guerra, uma vez que foram derrogadas as disposições que a impuseram como obrigatório para as ações suscetíveis de nele haver tal debate (D. D. de 9 de setembro de 1915).
O § 688 estabelece como requisitos:
a) ação deve perseguir a entrega de quantidade determinada de coisa fungível, particularmente de uma soma em dinheiro, requisito que existe para o chamado processo documental, onde, com raízes no processo italiano, procura-se facilitar ao demandante a obtenção de um título executivo mediante exame sumário da questão, com a reserva de um exame mais completo no procedimento ordinário;
b) o direito em discussão deve ser exigível e incondicionado, e, não depender de contraprestação;
c) a notificação do mandato de pagamento não pode ocorrer no estrangeiro nem por editais.
Cumpridos os requisitos, o credor pode pedir a expedição de um mandado de pagamento condicionado (§ 668, I, item 1).
O § 690 deixa claro que o requerimento não é de uma sentença, senão da expedição de um mandado de pagamento.
No mandado de pagamento ordena-se ao devedor que pague ao credor, no prazo de uma semana, a contar da notificação, o importe da reclamação, os juros e as custas, sob a cominação de execução imediata.
Se a oposição for apresentada, tempestivamente, o procedimento monitório passa a ser ordinário.
Se o pedido da oposição é julgada improcedente, declara-se executivo por meio de um mandado de execução que se estende sobre o de pagamento pela secretaria (§ 699, I, itens 1-3).
Se o devedor for citado para jurar não comparece, sem estar impedido por caso fortuito inevitável, ou, tendo comparecido, nega-se a jurar, o Tribunal, à petição do credor, por escrito, está obrigado a decretar a detenção do mesmo para compelir-lhe a juras (§ 901). Contra tal mandado de detenção, o devedor poderá lhe interpor queixa urgente.
Em benefício da segurança do crédito, os Tribunais obrigam-se a ter uma “lista negra” das pessoas que prestaram o juramento nos cinco últimos anos ou sofrido prisão de seis meses pela negativa (§ 915). Todos os cidadãos podem ter acesso a lista. Por Decreto de 9 de maio de 1914, na Prússia, permitiu-se a expedição da lista para as representações do comércio.
A inscrição na lista negra não é a conseqüência da prestação de juramento, senão da infrutuosidade da execução (§ 867, I e § 866, I). Tal lista indicará o importe de créditos não pagos e da quota recebida pelos credores. O devedor, quando pagar, tem direito a que seja cancelada sua inscrição na mesma (§ 867, I, 2, e II, 1).
3. A ação decendiária no direito português, no Regulamento n.° 737 e nos Códigos de Processo dos Estados
Fala-se, no direito português, na ação decendiária, antiga assinação de dez dias, que é uma ação sumária, pela qual se ajuizavam obrigações, às quais era devida pronta execução.
Estudando a lição de Pereira e Souza, J. E. Carreira Alvim[14], à luz da Ordenação Manoelina, Liv. 3.° Tít. 66, informou que o procedimento tinha por base as escrituras públicas, os alvarás particulares de pessoas privilegiadas. Eram igualadas às escrituras públicas, para fins de assinação de dez dias, os termos judiciais e os escritos particulares reconhecidos pessoalmente pela parte ou em caso de revelia[15].
As escrituras públicas deviam ser: a) solenes e feitas por tabeliães; b) conter obrigação líquida e certa; c) estar nos originais e não em translado.
No processo da assinação de dez dias, o réu era citado para, nesse termo, pagar ou apresentar quitação da dívida ou apresentar embargos que relevasse a condenação. A citação era pessoal, por carta citatória (hoje, precatória), se ausente em lugar certo; ou por edital, se ausente ou em lugar incerto.
A ação de assinação de dez dias era intransmissível.
Do recebimento dos embargos nesta ação, sem condenação, ou com ela, cabia agravo de petição ou de instrumento, sem suspensão.
A parte derrotada era condenada em dobro.
A assinação de dez dias foi prevista, outrossim, nas Ordenações Filipinas, em seu Livro III, sob o título XXV.
As escrituras públicas teriam de ser solenes e prever obrigação certa, pura e incondicionada.
O caráter personalíssimo foi mantido. Havia, como nas Ordenações anteriores, regras atinentes ao reconhecimento do de documento particular não firmado por pessoa que conferisse ao ato fé de escritura pública, com limite até 60.000 réis.
Excluíam-se as obrigações de fazer, admitindo as Ordenações Filipinas, de 1603, bens infungíveis e fungíveis (incluindo dinheiro), levando-se em conta a necessária certeza e liquidez. A lição de Teixeira de Freitas e de Pereira e Souza era contrária a tal posição, no entendimento de que a escritura de obrigação de fazer poderia ser usada, como se lê em Talamini[16]
O Regulamento n.° 737, de 25.11.1850 (art. 296 e seguintes) seguido pela Consolidação Ribas (1876), com o Brasil independente, autorizou o emprego da ação decendiária nos instrumentos de contratos comerciais, letras de câmbio e títulos comerciais (apólices de seguro, faturas, notas promissórias), reduzindo o caráter personalíssimo da demanda.
Com a Constituição de 1891, tivemos os Códigos da Bahia, São Paulo, Pará e Rio de Janeiro estabelecendo processos decendiários.
O Código do Processo da Bahia, dando continuidade as linhas do Regulamento n.° 737, afastou o caráter personalíssimo da ação.
O Código do Processo Civil e Comercial de São Paulo, disciplinando tal ação (art. 761-771) definiu o mesmo elenco de títulos fixados no Reg. n.° 737 e seu cunho, já agora, não personalíssimo. Na linha do Processo Civil Italiano previu condenação provisória quando os embargos não trouxessem prova de plano.
Próximo da ação decendiária e com sua estrutura estão as ações cominatórias, para deveres de fazer e não fazer, de nítido caráter condenatório, ao contrário do interdito proibitório, de eficácia mandamental e natureza interdital.
O réu nessas ações cominatórias exerce embargos à primeira, antes de cunho interdital, qual nas Ordenações Afonsinas (1446), chegando a Consolidação Ribas (1876), pessoal e possessória, e, após aos Códigos Estaduais de São Paulo (art. 795 a 800) em hipóteses taxativas, assim como o Código do Ceará, de 1921 e o Código de Processo Civil de 1939 (art. 302). No entanto, revelam-se ineficazes com relação a tutela dos direitos da personalidade, sendo remédio menos eficiente que a ação inibitória, por seu caráter mandamental, notável instrumento nos casos de tutela na concorrência desleal, direitos de marcas e patentes, etc.
4. A Ação Monitória e seu papel no direito brasileiro atual
Vem a Lei n.° 9.079, publicada em 17.07.95, e ressuscita a ação monitória no direito processual pátrio.
Seu conceito é proposto por Nelson Néry Júnior e Rosa Maria de Andrade Néry[17], de tal forma: instrumento processual colocado à disposição do credor de quantia certa, de coisa fungível ou de coisa móvel determinada com crédito comprovado por documento escrito sem eficácia de título executivo, para que possa requerer em juízo a expedição de mandado de pagamento ou de entrega da coisa para satisfação do seu crédito, por questão de política legislativa.
Estão fora da tutela, em nosso sistema, os imóveis por natureza ou por força de lei, e as obrigações de fazer e não fazer.
Adotou-se o monitório documental e não o documental puro, onde não há necessidade de documento e a alegação do réu em oposição, é óbice à continuidade do feito.
No monitório documental, exige-se esteja ele aparelhado com documento comprobatório.
Necessário, pois, estudarmos, algumas questões, quais sejam:
a) a isenção do réu, em honorários advocatícios, se cumpre o mandado, é constitucional?
b) não apresentados embargos ou adimplida a obrigação, haverá coisa julgada?
c) qual a natureza dos embargos ajuizados?
d) é possível a citação ficta?
e) a prova documental poderá ser lato senso?
f) qual a prova documental exigida? Exige-se certeza e liquidez do título?
g) aplica-se o art. 520 do CPC para efeito de recurso de apelação da decisão que julga os embargos?
h) é cabível ação monitória contra a Fazenda Pública?
Aproximou-se a Lei n.° 9.079 do monitório documental italiano, onde o procedimento injuntivo reclama título especial não havendo o monitório puro. À falta dos embargos o decreto injuntivo transforma-se em título executivo independente de sentença condenatória.
Se ocorre embargos, surge um contencioso que se encerra por uma sentença, que substitui o mandado monitório para reformá-lo ou confirmá-lo.
Melhor assim: no monitório puro, demanda-se sem prova. Em compensação, a simples oposição do réu faz cair a ordem judicial, pois apresentados os embargos o mandado perde sua eficácia e desaparece o procedimento.
5. Condições da ação monitória
Afirma-se que a ação monitória é distinta e independente da ação de conhecimento ou da ação executiva.
Para tanto, necessário a reunião de condições de ação para ajuizamento da referida demanda (ação processual).
Na verdade, a ação estudada não se prenderia a condição alguma, entendido o art. 5.°, inciso XXXV da Constituição Federal, visto a garantia ali instituída.
Sabe-se que a ação, para sua existência, não depende de que o autor tenha direito (razão), pois tanto tem ação quem apresenta demanda infundada como, ao contrário, procedente. É a ação vista sob o enfoque meramente instrumental.
Importa que se diga, à luz de Enrico Tulio Liebman[18], que o direito de ação é o direito à decisão sobre o mérito. Assim, quando o processo não puder ser julgado no mérito, não haverá ação. A ação é direito à sentença de mérito e o sujeito passivo é o Estado.
Se isso ocorre, existem requisitos ou elementos necessários à decisão final. Tais elementos são as condições da ação, vista a ação como garantia constitucional, uma vez proibida que a lei exclua a apreciação judiciária de lesões a direitos.
Tem-se o direito de estimular o Estado ao exercício da função jurisdicional. Pode-se exigir o provimento final do processo ao Estado, sendo dever do órgão jurisdicional pronunciar-se sobre a existência das condições de ação.
5.1. Possibilidade jurídica
Afirma-se como a admissibilidade, em abstrato, do provimento desejado ou sua existência no ordenamento jurídico, como diz Cândido Rangel Dinamarco[19].
Assim seria caso de carência de ação, por falta de possibilidade jurídica, a cobrança, por monitória, de dívida de jogo. Digo isso porque a moral, no entendimento de Gustav Radbruch[20], é capaz de servir de fundamento à força obrigatória do direito, só se podendo falar em validade jurídica, norma jurídica, dever-ser, quando o imperativo jurídico for dotado de força obrigatória do dever moral. Quando se fala em impossibilidade jurídica não é apenas aquela com relação ao pedido, mas, outrossim, a causa petendi (dívida do jogo). É a tendência natural do direito em apenas reconhecer obrigações surgidas por atos de boa fé.
A doutrina entende que o juiz deixa intacta a situação jurídica entre as partes, ao pronunciar a carência de ação por impossibilidade jurídica da demanda, sem afirmar ou negar o direito substancial alegado pelo demandante[21].
Mais importante é falar em impossibilidade jurídica nos casos de monitória contra a Fazenda Pública, recomendando-se que, à luz do princípio da instrumentalidade das provas, o juiz adeque o pedido a uma ação ordinária de cobrança.
5.2. Interesse de agir
É lição de Chiovenda[22] que o interesse de agir consiste em que, sem a intervenção dos órgãos jurisdicionais, o autor sofreria um dano. É a necessidade do recurso aos órgãos jurisdicionais para a tutela de um direito. Falar-se-ia em necessidade somada a utilidade final no provimento perquerido.
Superior é o conceito de interesse de agir ao de razão jurídica ou causa jurídica, exposta por Invrea, que vê na noção de interesse superfluidade. Ocorre que tal razão consistiria no fato de o réu haver violado o direito, devendo suportar as conseqüências de sua violação. Ora, só pode haver recurso ao Judiciário se a parte responsável não quiser reparar o direito do autor. Isso é interesse de agir.
Tal momento em que deve existir o interesse subsiste no tempo em que o provimento jurisdicional é proferido. Se ele existia no início e desapareceu naquele fase, a ação deve ser rejeitada por falta desse interesse.
Para Dinamarco[23], a utilidade é que caracteriza o interesse, pois é o meio para debelar a situação anti-jurídica mediante a aplicação do direito e que somaria à adequação do provimento e do procedimento desejados.
Exige o artigo 572 do Código de Processo Civil a prova do implemento da condição ou ocorrência do termo, sem falar no necessário vencimento do débito.
Carece de ação monitória aquele que não tiver a prova da contraprestação (art. 615, IV, do CPC).
Momento do vencimento da dívida, escolha do bem nas obrigações alternativas são conceitos de direito material. Assim, será o caso de notificação do obrigado para efeito de exigibilidade, conceito diverso de inadimplemento, conceito que diz respeito a extinção da obrigação (mérito).
Fala-se em adequação, que corresponde ao documento escrito que tem aptidão para o provimento monitório.
A esse respeito não falamos em título executivo, em títulos de restrita interpretação na Lei Processual.
É dada ampla generalização a esses documentos escritos.
Mas, para tanto, é necessária a liquidez. Sendo quantificável o objeto do direito a que se refere o documento, este há de conter a indicação de uma quantidade determinada de bens, ao menos determinável.
A liquidez do crédito se contenta com a determinabilidade do quantum debeatur. Assim, uma elementar operação de diminuição da parcela determinada, mostra o quantum devido.
Toda essa preocupação é porque não há no monitório uma liquidação de sentença.
5.3. Legitimidade ad causam
Legitimidade é a qualidade do sujeito em função de ato jurídico realizado ou a realizar.
Poderá falar-se em legitimidade ordinária ou extraordinária. De ordinário, a legitimidade pertence aos titulares da relação jurídica litigiosa, assim o de credor e devedor figurantes no documento.
Cabível, na forma da lei, a legitimidade extraordinária autônoma ou subordinada, havendo a circunstância de se tratar sempre de situações referentes a pessoas que não são sujeito das relações jurídicas substanciais sub judice. A legitimação extraordinária autônoma será exclusiva, se perder o titular da relação jurídica substancial a qualidade de parte, e concorrente, em contrário.
Aceita-se a presença de assistente (legitimação extraordinária subordinada), que venha, com interesse jurídico, ajudar ao interesse de uma parte no feito, já que trata-se de intervenção de terceiro.
No entanto, inaceitável, no monitório, o chamamento ao processo ou a denunciação da lide. A uma, porque o procedimento sumário aqui estudado não o permite; a duas, porque, tal como na execução, inexiste a sentença do art. 80 do CPC, a permitir ao réu a obtenção de título executivo que lhe permita a execução sobre o patrimônio daquele por cuja obrigação venha a ser condenado; a 3(três) porque não se fala em regresso, nessas ações.
No chamamento ao processo, seja como forma de ampliação subjetiva da relação processual, litisconsórcio passivo, ou na forma de ação condenatória, inadequado é a tutela monitória, assim como na execução[24].
6. A cognição sumária do juiz na concessão da tutela monitória e sua provisoriedade
Costuma-se dizer que o procedimento monitório deve ser reservado para títulos que revelem obrigação líquida, certa e exigível sem terem a forma executiva[25], onde se busca tutela executiva lato sensu.
A cognição que o juiz faz sobre esse título é de aparência, cognição sumária, menos aprofundada em sentido vertical, própria dos juízos de probabilidade.
Tal cognição é vista como característica da tutela cautelar e da tutela sumária antecipatória[26], algo próprio das situações de urgência onde é inadmissível uma cognição exauriente que leve a coisa julgada.
Afasta-se, em tal cognição sumária, a certeza no plano processual.
Bem explicita Talamini[27], ao dizer que o juiz, quando analisar o pedido de expedição do mandado, há de fazê-lo ciente de que deve verificar se há boa chance de os fatos constitutivos terem ocorrido. É um exame de aparência de veracidade, tendo inclusive seu próprio condão de provisoriedade.
Há, na tutela monitória uma flexibilidade quanto a prova escrita, de tal forma a ser acolhida com ampla largueza, admitindo uma presunção de veracidade, de certeza.
Pode o documento advir do próprio autor, como a duplicata sem aceite e não protestada. Pode vir de terceiro, ser prova indireta, como os recibos de pagamento de consórcio e de um conjunto de provas.
No entanto, não há espaço para nenhum procedimento de liquidação, razão pela qual deve vir acompanhado com o demonstrativo de cálculo da quantia devida (TARS-Ap. Civil n.° 196.108.492, 6.ª Câm. Civ., j. 08.08.1996).
Conseqüência do que foi dito:
{C}a) {C}não há coisa julgada da concessão da tutela monitória não embargada;
{C}b) {C}há ampla flexibilidade na admissão de documentos escritos como base da tutela monitória;
{C}c) {C}necessário que se demonstre a liquidez do débito, ou, no máximo, sua apuração por simples operação matemática, quando requerida a atualização monetária, e juros, pois impertinente a liquidação.
Ouso, pois, discordar do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, no REsp n.° 437.638, em que se admitiu que o fato do aceitamento de parcela correspondente ao débito principal e ainda acessórios, não inibe o emprego do processo monitório (DJ de 28.10.2002, p. 327, Rel. Barros Monteiro).
7. A inexistência da coisa julgada com relação a decisão quanto a mandado monitório não embargado
Como falar em preclusão pro iudicato, se a preclusão se opera exclusivamente dentro do processo, no qual ela se verifica?
Como falar em preclusão pro iudicato ou ainda coisa julgada do mandado monitório não embargado, diante de decisão puramente de cognição sumária?
Autores do nível de Nelson Néry Jr.,[28] Cândido Rangel Dinamarco[29] sustentam haver coisa julgada com a decisão concessiva da tutela monitória, não embargada.
É a linha adotada por Edoardo Garbagnati, que segue Chiovenda, Salvatore Satta, diante do art. 656 do CPC Italiano, onde se lia que o “decreto d’ingiuzione” tornado ‘título executivo’, por falta de embargos seria impugnável pelos mesmos instrumentos destinados a combater provimentos revestidos pela coisa julgada, tais quais a revocazioni e a opposizione di terzo.
Não há, no direito brasileiro dispositivo semelhante.
Dir-se-á que a coisa julgada, se aplica às decisões que envolvem cognição plena, exauriente, o que não acontece quanto a cognição puramente sumária do mandado monitório.
Na Itália, corrente abalizada disse que tal preclusão pro iudicato ocorreria, por exemplo, nos casos de decreto d’ingiuzione, licenza per finita e locazione.
Doutrina Theodoro Jr. com relação ao pensamento de Redenti[30], que o réu não poderia mais se opor à execução nem pleitear repetição de indébito, se não embarga. Seria a preclusão pro iudicato que protegeria o bem conseguido ou a conseguir-se na execução, diverso, pois, da coisa julgada, algo que se expandia para além do processo. Como preclusão para algo que fora do processo? A preclusão é fenômeno endoprocessual, já dizia Chiovenda[31], não algo que produza resultado prático igual ao da autoridade da coisa julgada.
Como ter-se coisa julgada sob juízo sumário?
Data venia, correta a conclusão de Eduardo Talamini[32].
Com o silêncio do réu, forma-se ope legis, título executivo.
Mas, se diria, que o título executivo em tela não é sentença transitada em julgado? Ora, títulos executivos há, como o formal de partilha que não são sentenças condenatórias transitadas em julgado, mas cartas de sentença. A lei pode e deve criar títulos executivos judiciais em hipóteses taxativas.
Descartada, pois, estaria a ação rescisória, como ação autônoma de impugnação, como instrumento para desconstituir o mandado não embargado.
8. Natureza da decisão que concede o mandado e a hipoteca judiciária
Não é sentença tal ato, pois não extingue o feito, mas é decisão interlocutória, sendo dele cabível o recurso de agravo (art. 522 do CPC)?
Seja como for, não há interesse recursal, no ajuizamento de agravo, uma vez que pode ajuizar embargos[33], já que, exige-se, à luz de requisito intrínseco recursal a utilidade e a necessidade do remédio recursal.
Conseqüência da concessão do mandado é a hipoteca judicial, efeito anexo, já visto por Chiovenda, em provimento de eficácia lato senso executiva, cujos efeitos começariam da não interposição dos embargos ou sua rejeição.
Dizia Chiovenda[34] que transcorrido o prazo sem que tenha sido proposto embargos, a tutela produz: coisa julgada, execução e hipoteca judicial.
Com a formação do título judicial, surge o efeito anexo, secundário, pois o decreto de injunção uma vez declarado executivo, serve de título para a hipoteca, direito real de garantia.
Isso se dá, ao contrário da hipoteca judicial da sentença condenatória, que surge daquele provimento.
Constituído o crédito ocorre preclusão, ficando os embargos à execução que, porventura, forem ajuizados, limitados a matéria superveniente ao título (art. 741 do CPC).
9. Da isenção de custas e honorários
Diz o art. 1.102 c, § 1.°, do CPC, que “caso o réu cumpra o mandado de pagamento ou entrega da coisa, ficará isento de custas e honorários advocatícios”.
Afronta-se o art. 20 do CPC que identifica o princípio da causalidade. Ora, o fato da sucumbência demonstra resistência injustificada à pretensão da parte contrária: aquele a quem o juiz acabou por não dar razão pode, de ordinário, ser considerado o responsável pela instauração do processo, e, assim, a posteriori, ser condenado nas despesas[35], como alude Said Cahali.
Estaria ferida a eqüidade? Não, pois o réu causou a lide, levando o autor a defesa de seus interesses em juízo.
Ora, o dispositivo em discussão afronta as garantias de igualdade e de inafastabilidade da tutela que, em confronto com a facultividade da via (art. 1.102 a do CPC), devem ser levadas em conta, face a sua maior ponderação.
Pensar que o autor arque com a isenção é ferir a ética do razoável.
10. Os documentos escritos que se prestam a tutela monitória
Em estudo sobre o novo processo monitório[36], J. E. Carreira Alvim afirmou que a prova escrita compreende tanto as provas preconstituídas quanto as casuais. A primeira é aquela cuja criação a lei ordena com anterioridade à existência de um direito ou de uma obrigação, até o ponto em que a exibição é necessária à sua prova preservação e as provas casuais são aquelas que não são feitas com a intenção direta por parte de seu autor de serem empregadas como prova jurídica.
A doutrina admite, à luz de Carreira Alvim[37], que ficam excluídas do âmbito da monitória: a prova documental latu senso, como a fita gravada, em fita cassete, vídeo-tape e o escrito que emanado da pessoa contra quem se faz o pedido ou de quem a represente, o começo de prova por escrito, onde há necessidade de prova testemunhal que a complementa.
Admitem-se, pois, os seguintes documentos:
a) escritura pública;
b) }anotações de escrita mercantil;
c) duplicata sem aceite;
d) cheque prescrito (TAMG, RT 739/411; TJDF, 3.ª t., Ap. Civ. 43.965, DJU de 06.08.97, TACIVSP, 10.ª Câm., j. 29.08.2001);
e) compra e venda mercantil;
f) despesas comprovadas de condomínio;
g) {C}contrato de abertura de crédito (Súmula n.° 297 do STJ);
h) contrato de parceria agrícola;
i) declaração de venda de veículo;
j) documento ológrafo assinado pelo devedor;
k) instrumento de contrato de consórcio para aquisição de bem, os recibos de pagamento de prestação, e documento de desistência do consórcio.
l) síngrafos assinados pelos contratantes sem testemunhas;
m) assentos de escrituração mercantil do credor;
n) prova emprestada, mesmo que envolvendo depoimento pessoal, pode vir ao processo sob a forma de documento examinável de plano, tendo a doutrina alemã posição contrária.
O Superior Tribunal de Justiça negou eficácia executiva ao contrato de abertura de crédito (REsp 90.114-PR, 3.ª turma, rel. Min. Costa Leite, j. 26.06.1996, v.u., DJU de 25.08.96, p. 296.837; REsp 66.304-0-PR, 3.ª turma, rel. Min. Eduardo Ribeiro, j. 06.08.96), na linha do mestre Cândido Rangel Dinamarco[38]. O remate na matéria está em que se o banco dispuser de um contrato escrito (consubstanciado em documento) e em outros documentos indicativos do valor do crédito, o caso é de tutela monitória.
11. A pretensão na tutela monitória. A coisa fungível
O art. 1.102 a, como já visto, prescreve que a ação monitória compete a quem pretender entrega de coisa fungível.
O que é coisa fungível?
Não se deve confundir fungibilidade jurídica com fungibilidade econômica. Na linha de Fábio Konder Comparato[39], tem-se que aquele se assenta na falta de individualização da coisa, enquanto esta decorre tão-só de uma equivalência de valor ou de funções.
Seriam fungíveis as ações ao portador sob o aspecto jurídico? Parece-nos que não, pois que é individuada pelo seu número de ordem, diverso e inconfundível com a numeração do certificado respectivo. Ela é infungível.
O dispositivo deve ser entendido a albergar bem fungível, juridicamente considerado.
De toda forma, será processualmente inviável a demanda quando o documento apresentado por título executivo (art. 1.102 a, do CPC), a teor do art. 267, VI, do CPC.
12. A citação por edital na tutela monitória
Penso ser inadmissível a citação por edital na tutela monitória.
Bem acentuou o Tribunal de Alçada de Minas Gerais, 3.ª Câm., Ag. 2.291/48-2, rel. Duarte de Paula, que é mister a efetiva manifestação de vontade do demandado, ultrapassando os poderes de curador especial a resposta a citação por edital.
Essa a o posição de Ernani Fidélis dos Santos{C}[40] de que o curador não teria interesse a demonstrar nos embargos.
A formação do título executivo exige, em sua forma rápida, ato de disposição do réu, que ocorrerá com efetiva ciência dele.
13. DOS EMBARGOS
13.1 Natureza jurídica
Estamos diante de remédio específico de impugnação ao título apresentado pelo autor.
Nelson Néry Jr.é contrário a tese. Ora, os embargos monitórios inauguram um procedimento incidente de cognição exauriente, uma demanda nova como falaram o Prof. Rangel Dinamarco e Ernane F. dos Santos[42], um processo autônomo, encerrando pedido de que não seja constituído pedido o título executivo judicial, ajuizados no prazo peremptório de 15 dias, contados da juntada da citação.
Data venia do Prof. Carreira Alvim trata-se de ação e não de contestação. Nessa linha, Celso Agrícola Barbi em pronunciamento, em fevereiro de 1995, em seminário promovido pelo Tribunal de Alçada de Minas Gerais, considerando serem os embargos forma de defesa.
Forma incidental, nova demanda, para desconstituir provimento inicial (art. 1.102 c) essa a posição de Talamini[44].
Dessa forma, dir-se-á que os embargos, devem ter o valor da impugnação da exordial, sob conseqüência de ajuizamento de ação incidental própria.
Ajuizados os embargos, suspensos estão o efeito do mandado (art. 1.102 c do CPC).
Da decisão sentencial cabe apelação. Em que efeitos?
Cândido Rangel Dinamarco Sérgio Bermudes[46] e ainda Luiz Guilherme Marinoni[47] entendem pela aplicação do art. 520, V, do CPC.
Ocorre que não estamos diante de embargos para desconstituir título executivo sendo o art. 520, V, matéria de exegese restrita, pois de ordem pública do processo. Correto, pois, Cássio Scarpinella Bueno[48], seguindo a posição de Talamini, Nelson Néry Jr., dentre outros, para quem a hipótese não reclama tal incidência, não sendo caso de execução provisória, como já entendeu a 5.ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo[49]. Para isso, necessário assegurar concretamente o uso da tutela, aplicando-se o art. 273 do CPC, para que se tenha em concreto, execução provisória.
Outros são os embargos (os à execução), desta feita para desconstituir o título executivo judicial já formado. Aplica-se o art. 741 do CPC, considerando-se preclusas as questões já decididas ou não apresentadas nos embargos ao mandado. Quer-se dizer que os embargos são aqueles do art. 741, com matérias novas, exceto para o art. 741, I, do CPC.
O Superior Tribunal de Justiça, por diversas vezes, entendeu que a via dos embargos é a correta para discussão de liquidez do débito, em amplo contraditório (REsp n.° 296.044, 4.ª t., rel. Sálvio de F. Teixeira, DJ de 02.04.2001); e ainda: REsp n.° 437.638, rel. Barros Monteiro (DJ de 28.10.2002, p. 327).
Mesmo com a desistência do autor, permanece o interesse do réu, na continuidade dos embargos ajuizados, visando a decisão de mérito quanto a inexistência do crédito, a não ser que queira desistir dos embargos.
Os embargos, em verdade, são ação constitutiva negativa, via própria para desconstituir o mandado monitório, em que o devedor requer ao Estado-Juiz abertura de contraditório com relação ao título que dá azo ao pedido de injunção.
13.2 Ausência de impugnação aos embargos
Se o autor não apresenta contestação? A matéria tem sido estudada na execução forçada. Sabe-se que reputa-se revel aquele que, no prazo assinado, não apresenta contestação.
Ora, se há revelia, presumem-se verdadeiros os fatos alegados (art. 319 do CPC), acelerando-se o procedimento.
Divide-se a doutrina na execução[50].
Contra a tese, na execução forçada, da revelia nos embargos, elencando-se: a falta de advertência do art. 285, segunda parte do CPC, a posição especial do embargado perante o título executivo e o descabimento da invocação dos artigos 319 a 322 com apoio no art. 598 do CPC.
Ao contrário, outra corrente levanta a tese de que a certeza, reconhecível no título executivo, é relativa e mesmo a falta do aviso de que cogita o art. 285, segunda parte, do CPC, não existe na reconvenção (art. 316 do CPC) e, ainda assim, se produz tal efeito da revelia.
Ora, não estamos, na tutela monitória diante de título executivo, elencado taxativamente na legislação. Há nova demanda com o ajuizamento dos embargos e a conclusão é de que há revelia se o embargado não contesta.
Os fatos modificativos, extintivos e impeditivos do pretenso crédito, se não forem impugnados levam a presunção de verdade (art. 302 e 319 do CPC), adiantando-se que tais questões não foram discutidas antes do ajuizamento dos embargos. E se os embargos versam sobre a negação do fato constitutivo? Da mesma forma, no mesmo raciocínio da revelia na reconvenção.
Se os embargos forem parciais, constituir-se-á, de logo, o título executivo com relação a parte não embargada.
Se os réus forem vários, o litisconsórcio for unitário, e um ou alguns embargarem não se constituirá “título executivo” em relação aos demais. Do mesmo modo com relação à obrigação solidária, uma vez que as alegações são eficazes para os demais litisconsortes. Suspendo a execução em relação aos que não impugnarem ao mandado, porque a matéria lhes serve.
13.3 Reconvenção
Assim como no processo de execução, não comporta o procedimento monitório a reconvenção.
Na matéria, Clito Fornaciari Jr.[51] arrola obstáculos à reconvenção nos embargos, que se aplicam no instituto em estudo: o procedimento; a falta de matéria conexa; falta de interesse processual, pois a reconvenção traria óbice ao processo sendo mais útil ao embargado veicular seu direito por meio de ação autônoma com cognição plenária sem falar nos inconvenientes de reconventio reconventionis (reconvenção da reconvenção).
13.4 Ação Declaratória Incidental
E quanto a ação declaratória incidental prevista no art. 5.° do CPC, pode-se dizer que se aplica a tutela monitória? Parece-me que não estamos em sede de sumarização do processo, nos embargos. Necessário, entretanto, que se verifique prejudicialidade, que importa em anterioridade lógica, necessariedade e autonomia da questão prejudicial, determinando, influenciando a questão de fundo. Não ocorre nos embargos ou pelo menos sua prática se encontra de difícil configuração na tutela estudada assim como na execução.
A sentença dos embargos, quando apreciar o mérito do pedido do embargante, fará coisa julgada material.
13.5 Conseqüência da decisão desfavorável ao réu nos embargos
Constituído o título com a improcedência do pedido nos embargos, assim como com o seu não ajuizamento, por força da natureza executiva lato sensu da monitória, ingressa-se, sem solução de continuidade, na fase executiva do processo sem nova demanda (petição inicial de formalidades), pois ocorre no mesmo processo em que se autorizou a execução. Assim o ato que dá ciência do mandado agora executivo, dando oportunidade para pagar ou oferecer bens a penhora é a intimação (art. 1.102 c), feita no curso do processo.
Poderá o devedor alegar, em embargos de devedor, as matérias do art. 741 do CPC.
14. MONITÓRIA CONTRA FAZENDA PÚBLICA
Pela admissibilidade: STJ, 4.ª t., REsp 196580-MG, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, j. 17.10.2000, DJU de 18.12.2000, p. 2000.
A doutrina nacional se divide, admitindo-a: Rangel Dinamarco[52], Nelson Néry Jr. e Rosa Maria A. Néry[53]. Contra: Talamini[54] e Rogério Cruz e Tucci[55], dentre outros.
Ora, a Emenda Constitucional n.° 30 fala em execução contra Fazenda Pública por sentença condenatória transitada em julgado, vinculada ao precatório (art. 100, § 3.° da Constituição Federal).
No caso, impõe-se contra a Fazenda Pública sempre o processo de conhecimento face a indisponibilidade do interesse público.
A Fazenda Pública não pode dispor de seu direito algo inerente a tutela monitória.
A execução contra Fazenda Pública pressupõe sentença condenatória transitada em julgado.
15. VIABILIDADE DE PROPOSITURA DE DEMANDA AUTÔNOMA CASO NÃO HAJA EMBARGOS AO MANDADO MONITÓRIO E SE FOR CONCLUÍDA A EXECUÇÃO
Aqui, lembro que entendemos não haver coisa julgada material, como qualidade dos efeitos da sentença, se o réu da ação monitória, citado, não embarga.
Poderá ele ajuizar ação declaratória de inexistência do crédito (art. 4.°) ou poderá pedir repetição do indébito, mesmo que a fase executiva já se tenha finalizado.
Na linha traçada por Humberto Theodoro Jr.[56], entendemos que nosso sistema jurídico se afasta do entendimento dos que só por meio de tempestivos embargos poderia o devedor opor-se à eficácia da execução (Redenti, Minoli, Micheli, Carnelutti). Em frontal discordância, entendemos que, quando a execução for injusta, mesmo depois de encerrada, haverá sempre a possibilidade de o devedor acionar o credor pela repetição do pagamento indevido, usando uma ação de enriquecimento sem causa, isto porque não ocorre o fenômeno da preclusão in iudicato, não sendo lógico que o mero encerramento da execução, sem interposição de embargos, seja causador de efeitos análogos aos que provêem da sentença de mérito transitada em julgado. Assim se entendeu no AI n.° 88.551-58, Reg. 95.544.164, DJU de 02.04.96, pg. 10.215.
16. A TUTELA MONITÓRIA E OS JUIZADOS ESPECIAIS
A ampla necessidade de efetividade do processo com a proliferação de providências de cognição sumária, mesmo diante de inconvenientes procedimentais da Lei n.° 9.099/95, permite o uso da tutela monitória nos juizados especiais, estabelecendo-se limites: valor da causa; observância da oralidade e conciliação; aplicação de regras procedimentais, ressalvado o caráter facultativo do processo monitório.
17. INTERVENÇÃO DE TERCEIROS
Precisamos analisar a utilização da intervenção de terceiros na tutela monitória.
Pergunta-se se é cabível toda forma de intervenção de terceiros numa tutela em que não há lugar para o julgamento do mérito. Ora, sabe-se que em sua primeira fase, o procedimento desse processo comporta apenas a concessão ou negação do mandado de pagamento ou entrega postulado pelo autor (Código de Processo Civil, art. 1.102-6). Na segunda fase, omitidos ou rejeitados os embargos tem-se pura execução do mandado, sem exame do mérito (art. 1.102-6).
Observa-se que estamos diante de tutela diferenciada que não se confunde com o processo de conhecimento. Por essa razão as necessárias reservas com relação a utilização de todos os institutos da intervenção de terceiro na tutela estudada.
Não se perderá de vista a natureza constitutiva dos embargos.
17.1 Da assistência
No passado, o Regulamento n.° 737, na fonte doutrinária de Mello Freire, definia a figura do assistente como “aquele que intervém no processo para defender um direito próprio conjuntamente com o direito do autor ou réo”.
Sabemos que o assistente defende de maneira direta um direito alheio (da parte assistida), em situação diversa do litisconsorte, parte, que participa do processo na defesa de seu próprio direito.
O pressuposto fundamental da assistência é o de que venha a ser proferida sentença de mérito (97).
Parece-me que tal qual, na execução, só se admitirá tal intervenção quando ocorrer a oposição de embargos, momento em que se abre um bolsão de cognição no processo de execução, um processo incidente, tal qual os embargos ao mandado monitório, um processo novo uma forma autônoma.
A jurisprudência permitia assistência na execução quando propostas embargos (TARJ – 2.ª Câmara – Agr. de Instrumento 18.685 – v.u. j. 26.10.78).
Todavia, na tutela monitória sem embargos, não há admissibilidade da assistência, como vemos em Humberto Theodoro Jr.[57], a não ser ajuizado processo incidente de embargos.
17.2 OPOSIÇÃO
17.2.1 Conceito
Aqui identificamos uma forma de intervenção, criada no direito intermediário, em que alguém (opoente) deseja propor seu pedido contra autor e réu, numa forma facultativa que depende da vontade de terceiro, numa clara forma de conexão.
17.2.2 Modalidades de oposição
Poderá ser autônoma, quando a oposição será julgada com a causa principal, dado que ambas integram um processo só (art. 59), um incidente do processo ou, como processo incidente, quando será autônoma, quando será julgada em conjunto com a causa principal, sobrestando-se no andamento desta no aguardo da instrução daquela (art. 60).
No Brasil, não seguimos o exemplo alemão, onde se desconhece a oposição interventiva, pois lá, a intervenção é autônoma (§ 64 do L.P.O.). Também não seguimos o modelo exclusivo de Portugal, onde se segue a oposição exclusivamente interventiva, incidentes da instância (art. 342-350 do Código).
17.2.3 A natureza da demanda
Trata-se de pedido feito por oposto contra o opoente, de natureza bifronte, forçando um litisconsorte necessário, não unitário, entre autor e réu em que o objeto mediato é o bem da vida em disputa entre os demandantes do processo original.
Forma-se uma causa prejudicial, influente porque há necessariedade, anterioridade lógica, sobre o julgamento da pretensão do autor em face do réu.
17.2.4 Admissibilidade na tutela monitória
Em excelente estudo acerca da intervenção de terceiros, Cândido Rangel Dinamarco[58] entende que poder-se-ia cogitar da oposição no processo dos embargos do executado (art. 736 §§) ou dos embargos ao mandado monitório (art. 1.102-c), pois são processos de conhecimento, vendo-se, no caso da tutela monitória, o demandado resistir a um mandato, pedindo a inexistência da obrigação afirmada pelo autor.
Pode, sem dúvida, um terceiro alegar ser o verdadeiro titular do direito de crédito posto em litígio entre as partes.
Fora isso, a linha é do Regulamento n.° 737 o entendimento é de que a oposição teria lugar nas instâncias ordinárias (Processo de conhecimento)[59].
17.2.5 Nomeação à autoria
Da redação dos artigos 62 e 63 do Código de Processo Civil, que têm forte influência no Código de Processo de Portugal, art. 320, e L.P.O. alemão, § 76, e Ordenança Austríaca (§ 22), só poder-se-ia pensar em tal hipótese, para corrigir o pólo passivo da relação processual, no caso da ação de indenização intentada por dano causado por proposto quando a prova for escrita, estabelecendo-se o contraditório via embargos, sendo dever do réu (art. 69) sujeita a sanção (art. 69, I) tal nomeação, no âmbito de uma ação que não é executiva, como o modelo do art. 62 do CPC, na hipótese do detentor.
Mesmo com a recusa do nomeado, a eficácia da sentença contra ele inclui também a executividade.
17.3. DENUNCIAÇÃO À LIDE
17.3.1 Origens e natureza do instituto
Aparece o instituto sob o nome de laudatio auctoris, no processo formulário, com a conexão entre os interesses da denunciação ao vendedor ao juízo do comprador, ligado à evicção e associado a mancipatio, forma de transferência da propriedade de pessoas ou coisas, nos negócios do ius civile.
Nas Ordenações Afonsinas, Manoelinas e Filipinas[60] tinha uma estranha característica mista (civil-penal), onde havia alusão o furto praticado pelo reu, que podia, unicamente ele, denunciar a lide ao alienante, sem que ele tivesse obrigação de vir aos autos.
No Regulamento 737, de 1850, falava-se em chamamento à autoria (art. 111-117) assim como no Código de 1939 (art. 97): “vindo a juízo o chamado à autoria, com ele prosseguirá a causa, sem que seja lícito ao autor a escolha de litigar com o réu principal ou com o chamado a autoria”.
Nosso modelo processual de 1973 é amplo, permitindo ampliação das hipóteses de sua admissibilidade e cumulação da ação regressiva contra o litisdenuncado, seguindo o modelo português (art. 325).
O art. 70 do CPC deve ser interpretado na parte do encargo como ônus da parte, não uma obrigação processual[61], que é uma situação jurídica passiva, ao contrário do ônus, situação jurídica ativa.
17.3.2 Inadequação à tutela monitória
Aqui não há julgamento algum de mérito a ser proferido.
Trata-se de instituto do processo de conhecimento onde se buscará uma sentença condenatória, algo que inocorre na tutela monitória.
São as hipóteses da denunciação fundada em evicção (art. 70, I), onde se estabelece tal ônus causativo, da denunciação ao proprietário ou ao possuidor indireto (art. 70, II), deixando o denunciado como assistente litisconsorcial, qualificado, e abrindo uma segunda causa (ação de garantia).
Essa prejudicialidade entre a relação existente entre as 2(duas) causas pendentes no processo em que se fez a denunciação da lide, algo inadequado na tutela monitória, onde não há sentença condenatória, nos moldes do art. 76 do CPC.
17.3.3 Chamamento ao processo
Tal instituto previsto no art. 77 é oriundo do modelo português, art. 330 do CPC, em que há o ônus do réu de chamar ao processo os terceiros face ao nexo obrigacional com o autor, excluindo-se, para nós, apenas a hipótese dos cônjuges (art. 330, letra “d”).
Bem afirma Cândido Rangel Dinamarco[62] que não há como produzir, no processo monitório, uma sentença como a do artigo 80 do Código de Processo Civil, porque, aqui, não há tal sentença ser dada entre o autor e todos os litisconsortes integrantes da relação processual a partir do chamamento.
Não serão, pois, razões pragmáticas como as que levaram uma vez o Supremo Tribunal Federal, em sede de execução, a considerá-lo e, após, revê-lo (RE n.° 89.142, de 15.12.79, DJU de 17.08.79).
18. CONCLUSÕES
a) tecnicamente, o correto seria utilizar a duplicata não aceita que, em qualquer hipótese, seria documento hábil para a tutela monitória;
b) o nosso sistema aderiu ao monitório documental italiano, exigindo-se documento que retrate dívida líquida e exigível e entrega de coisa móvel determinada;
c) o juízo de cognição com relação ao mandado monitório é sumário, aplicando-se juízo de verossimilhança;
d) não há coisa julgada nos casos de mandado monitório não embargado;
e) há flexibilização com relação a documentação escrita que dá base ao monitório, não se admitindo documento despido de liquidez;
f) não se aplica o começo de prova por escrito na tutela monitória;
g) os embargos têm natureza de ação e da sentença cabe apelação no duplo efeito;
h) a sentença nos embargos, no mérito, faz coisa julgada material;
i) não cabe ação monitória contra a Fazenda Pública;
j) não cabe reconvenção na tutela monitória nem ação declaratória incidental;
k) é possível o ajuizamento de ação monitória, nos juizados especiais civis, estabelecida a possibilidade de harmonia com as regras e princípios da Lei n.° 9.099/95.