Exame psicotécnico em concurso público

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A matéria é complexa e comporta árdua discussão. O exame psicotécnico foi há muito considerado um requisito legítimo pela jurisprudência. Os exames psicológicos hão de ser utilizados para examinar a higidez mental dos candidatos concorrentes.

DO EXAME PSICOTÉCNICO 1 Considerações preliminares

A matéria é complexa e comporta árdua discussão. O exame psicotécnico foi há muito considerado um requisito legítimo pela jurisprudência. Os exames psicológicos hão de ser utilizados para examinar a higidez mental dos candidatos concorrentes, para identificar e inabilitar pessoas cujas características psicológicas revelem traços de personalidade incompatíveis com o desempenho de determinadas funções. Os testes psicológicos têm se realizado principalmente nos concursos públicos realizados para ingresso em cargos de Polícia, Corpo de Bombeiros e Forças Armadas.

Há de se fazer registro de alguns Tribunais que consideram inconstitucional qualquer norma de edital de concurso público, ao conferir índole eliminatória a exame psicotécnico (corrente minoritária), alegando, em síntese, que não sendo a Psicologia ciência exata, expondo-se a interpretações, variando segundo a linha de formação do psicólogo. Outros Tribunais, em sentido contrário, entendem ser cabível, mas com ressalvas. É a posição majoritária, mais adequada.

O exame psicotécnico impõe a verificação de equilíbrio emocional dos candidatos, evitando o ingresso, por exemplo, de psicopatas, de certas pessoas portadoras de anomalias psíquicas para o exercício da função pública. Nada mais do que isso pode ser objeto de avaliação.

O exame psicotécnico não se confunde com inteligência, bastando lembrar que os anais da criminologia registram numerosos casos de delinqüentes de altíssima inteligência, mas infelizmente direcionada para condutas anti-sociais.

O exame psicotécnico constitui uma fase do concurso seletivo. Apesar de aprovado em todas as outras fases do concurso, o candidato pode ser reprovado e, conseqüentemente, excluído da competição.

Se o exame psicotécnico, como condição para ingresso no serviço público, decorre de lei, não pode ser dispensado, sob pena de ofensa a Constituição, art. 37I, daCRFB/88.

Não obstante ser legal a exigência desse exame, não pode a Administração, sob argumento de sigilo, posto que norteada pelos princípios da legalidade, moralidade e, mormente, publicidade, negar ao candidato o conhecimento da decisão que o reprovou no citado exame, devidamente fundamentado porque, agindo desta forma, a Administração estaria enveredando nos caminhos nebulosos da ilegalidade. Portanto, o que é ilegal é o sigilo da decisão, de que, pelo menos o candidato de ser cientificado a fim de que lhe seja assegurado o direito de recurso, para que lhe permita exercer o contraditório e a ampla defesa. E ainda tem mais: o profissional de psicologia deve manter o sigilo sobre a decisão, atendendo à ética de sua profissão, em relação a terceiros, mas não em relação ao candidato a quem deve ser exibida a decisão aprovatória ou reprovatória.

Na mesma linha de argumentação, as conclusões que reprova o candidato não podem ser desmotivadas e, quanto ao perfil profissiográfico, cabalmente há que ser demonstrado o porquê do candidato ser considerado inapto no teste psicotécnico ou seja, o exame tem de apurar características de personalidade incompatíveis com o cargo público. Caso contrário, à inexistência do perfil psicológico vai de encontro ao que preconiza a doutrina moderna: o exame não pode possuir critério subjetivo, anti-científico e arbitrário.

Tem-se admitido a exigência da aprovação em exame psicotécnico no edital de concurso público para provimento de cargos, com vistas a avaliação do temperamento do candidato ao exercício das atividades inerentes à categoria funcional a que concorrer, desde que prevista em lei. O requisito de exame psicológico deverá estar previsto obrigatoriamente na lei que fixar os requisitos a serem atendidos pelos postulantes ao cargo, como estabelece o artigo 37I, daConstituição da República. A presença de tal requisito somente em edital se configurará em inconstitucionalidade.

Este é o entendimento em nossos Tribunais:

"EMENTA: CONCURSO. OFICIAL DE SAÚDE DA POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE MINAS GERAIS. EXAME PSICOTÉCNICO. RESOLUÇÃO Nº 3.034/94, DO COMANDANTE-GERAL.

A exigência do exame psicotécnico, prevista em simples resolução como condição para ingresso na carreira de Oficial de Saúde da Polícia Militar do Estado de Minas Gerais, malfere a Constituição Federal.

Ora, a resolução não é lei em sentido formal exigida pelo inciso I do artigo 37 da Carta, porquanto se trata de ato normativo inferior, que não supre a omissão legal.

(RE nº 228356-MG, STF, Primeira Turma, Rel. Min. Ilmar Galvão)"

O Supremo Tribunal Federal também entendeu que, não ofende o princípio do direito adquirido (artigo XXXVI, da CF), a exigência de submissão de candidatos em concurso público a exame psicotécnico previsto em edital quando, antes da realização do concurso sobrevêm lei prevendo o mencionado exame:

"EMENTA: ESTADO DE MINAS GERAIS. CONCURSO PARA SERVIDORES PÚBLICOS. EXAME PSICOTÉCNICO. LEI Nº 6.833/95, § 1º, REDAÇÃO DADA PELA LEI Nº 6.939/95.

Exigência estabelecida na conformidade do disposto no art. 37I, da CF.

Lei editada antes da realização do concurso, não se podendo falar em direito adquirido.

(RE nº 230197-MG, STF, Primeira Turma, Rel. Min. Ilmar Galvão)"

Ocorrendo a ausência de um dos requisitos de validade dos atos administrativos, ou seja, a motivação do que inabilitou o candidato a permanecer no certame, torna o ato inválido, por ser requisito indispensável para averiguação. Vislumbra-se clara imprecisão do ato administrativo, o qual não especifica os motivos da reprovação, não restando apto a produção seus efeitos, de forma que deve ser oportunizado ao candidato a continuar a participar do concurso.

A simples menção apto ou inapto é arbitrária e poderia agasalhar interesses escusos da Administração, o que não se coaduna com os princípios administrativos da moralidade e impessoalidade. Por fim, ao candidato deve ser garantida a transparência do julgamento que não pode ser sigiloso e, muito menos, secreto e irrecorrível.

Não se admite, em hipótese alguma, reprovar o candidato em entrevistas, feitas, em salas fechadas, sem fundamentação de rigor científico, reduzindo a singela entrevista, dotada de subjetivismo, com forte possibilidade de arbítrio, efetuado sob sigilo. A sua validade está adstrita a testes psicológicos escritos, de caráter objetivo e de aplicação coletiva. Laudo constando aspectos subjetivismo da personalidade do candidato, apenas com descrições aleatórias, não demonstrativas de fatos objetivos e de dados concretos conclusivos de inaptidão, marcado pela ausência de fundamentação, é arbitrário.

A valoração da entrevista, constante do edital, por si só, não pode eliminar candidato considerado apto nas demais provas do certame, vez que mencionado exame de natureza subjetiva, torna-se potencialmente discriminatório e arbitrário.

É consabido que, no exame dos atos administrativos, o judiciário se limita a considerá-los sobre o estrito ponto de vista de sua legalidade, assim estando o exame psicotécnico sujeito ao controle jurisdicional não se pode permitir é que o candidato seja alvo de decisões desconhecidas em avaliações de moldes sigilosos.

A entrevista em clausura, de parâmetros técnicos de valor desconhecido, sem rigor científico, não merece o nome de exames, tornando a entrevista com possibilidade discriminatória.

A psicologia é matéria complexa e o exame das características da personalidade de uma pessoa não estaria completo com um simples teste subjetivo. Somente um estudo aprofundado, do laudo dos peritos poderá definir a adequação do concursado ao trabalho que desempenhará.

Destarte, fere o princípio da impessoalidade o teste subjetivo, sigiloso, irrecorrível e que se nega ao candidato o conhecimento da avaliação quanto aos motivos de sua eliminação, mormente se o concursado havia obtido classificação nas provas escritas.

Impede ressaltar que a avaliação psicológica, para assegurar a igualdade de condições a todos os candidatos e transparência na realização do concurso, deve submeter-se a parâmetros de natureza objetiva. Procedimento seletivo marcado pelo subjetivismo conduz á arbitrariedade, em desrespeito ao próprio interesse público.

Não se pode, pois, impedir a Administração Pública de inserir nos editais de concurso público a exigência do exame psicotécnico e, por conseqüência, não pode o judiciário dispensar o candidato da realização do exame, sob pena de ofensa aos princípios da moralidade, da isonomia, de justiça, de eqüidade, de imparcialidade, sendo certo que a realização de um novo exame de psicotécnico é de caráter obrigatório.[1] Também não se pode dispensar de tal exame o candidato que a ele já se submeteu em concurso anterior, pois cada concurso se afere a aptidão para um cargo diverso.

Impede salientar que o exame psicotécnico não pode alterar a nota final do candidato, ou seja, alterar a ordem geral de candidatos considerados aptos.

O edital jamais poderá informar o nome dos testes a serem aplicados. Se assim o fizer, tais exames perderão sua validade, pois possibilitarão que os candidatos se preparem, ante o conhecimento prévio das questões a que serão submetidos.

Os tipos de teste psicológicos são de acesso exclusivo dos psicólogos examinadores e a eles deverão ser restritos.

2. Critérios

É pacífico o entendimento de que a aferição psicológica dos candidatos deverá revestir-se de critérios científicos e objetivos. A Administração Pública deverá estabelecer quais são os critérios pelos quais os candidatos serão avaliados, permitindo assim, que os critérios sejam conhecidos e que os resultados dos testes possam ser avaliados pelos próprios candidatos.

Insta salientar que reprovação em exame psicotécnico, para revestir de legalidade, há de conter motivação expressa quanto à reprovação do candidato, além de justificativa quanto aos métodos objetivos e científicos adotados para a conclusão obtida pelos examinadores.[2]

O candidato privado de tais informações não tem como verificar a sua adequação ao exercício profissional do cargo ambicionado, e nem poderá questionar judicialmente se o exame psicotécnico restringiu-se em averiguar suas características psicológicas no que se refere à sua adequação ao exercício da função pretendida.

Tal caráter sigiloso dado aos critérios de avaliação e ao resultado dos exames não atende aos requisitos de objetividade na apuração do resultado e de publicidade exigidos pelo artigo 37, incisos I e II, da Carta Vigente, além de ofender o artigo 5º, incisos XXXIII ("todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular...") e XXXV ("a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito"), também da Lei Magna.

Nesse sentido, os julgados:

"EMENTA: Concurso público. Exame psicotécnico.

- O acórdão recorrido, em última análise, decidiu que a avaliação do candidato, em exame psicotécnico, com base em critérios subjetivos, sem um grau mínimo de objetividade, ou em critérios não revelados, é ilegítimo por não permitir o acesso ao Poder Judiciário para a verificação de eventual lesão de direito individual pelo uso desses critérios.

- Ora, esta Corte, em casos análogos, tem entendido que o exame psicotécnico ofende o disposto nos artigos XXXV, e 37, caput e incisos I e II, da Constituição Federal.

(RE nº 243926-CE, STF, Primeira Turma, Rel. Min. Moreira Alves)"

"EMENTA:

I-...

II- Concurso Público: exame psicotécnico: inadmissibilidade da oposição do sigilo de seus resultados ao próprio candidato em conseqüência declarado inapto.

A oposição ao próprio candidato a concurso público do resultado dos elementos e do resultado do exame psicotécnico em decorrência dos quais foi inabilitado no certame viola, a um só tempo, o"direito de receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular"(CF, art. XXXIII), como também de submissão ao controle do Judiciário de eventual lesão de direito seu (CF, art. ,XXXV).

(RE nº 265261-PR, STF, Primeira Turma, Rel. Min. Sepúlveda Pertence)"

"EMENTA: Exame psicotécnico, com trâmite decisivo na realização de entrevista.

Direito de acesso aos cargos públicos, cuja satisfação está a depender de um grau mínimo de objetividade na realização do concurso e de publicidade dos atos em que se desdobra, de modo a permitir o acesso, ao Poder Judiciário, de eventual lesão de direito individual.

Recurso extraordinário provido por contrariedade ao disposto no art. XXXV e no art. 37, caput, e incisos I e II, da Constituição Federal.

(RE nº 201575-DF, STF, Primeira Turma, Rel. Min. Octavio Gallotti)"

Por estas razões tem sido criticada a realização de exames psicotécnicos, na totalidade ou como uma de suas partes, que utilizem entrevistas, dissertações orais, diálogos, sem que seja possível ao candidato ou ao Poder Judiciário, ter parâmetros para verificar a legalidade do resultado.

Em caso decidido pelo Supremo Tribunal Federal esse entendimento foi averbado:

"Quando a lei do Congresso prevê a realização de exame psicotécnico para ingresso em carreira de servidor público, não pode a Administração travestir o significado curial das palavras, qualificando como exame a entrevista em clausura, de cujos parâmetros técnicos não se tenha notícia. Não é exame, nem pode integrá-lo, uma aferição carente de qualquer rigor científico, onde a possibilidade teórica do arbítrio, do capricho e do preconceito não conheça limites.

(RE nº 112676-MG, STF, Segunda Turma, Rel. Min. Francisco Rezek)"

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3. Requisitos de validade

O Supremo Tribunal Federal tem decidido, por reiteradas vezes, que são três os requisitos indispensáveis para que o exame psicotécnico sejam exigidos em concursos públicos, a seguir enumerados, cumulativamente:

a) “somente por lei, ato normativo primário, pode estabelecer requisitos para o ingresso no serviço público – CF, art. 37I. Se o exame psicotécnico estiver previsto em ato administrativo apenas, ocorre ilegalidade” (RE nº 232.571-7-RS, 2ª Turma, Rel. Ministro CARLOS VELLOSO).

Neste tópico, o STF editou a Súmula 686:

¨Só por lei se pode sujeitar a exame psicotécnico a habilitação de candidato em cargo público¨

b) ”..., e que tenha por base critérios objetivos de reconhecido caráter científico – (RE nº 188.234. DF, Rel. Ministro Néri da Silveira). Logo, métodos cientificamente reconhecidos.

c) Possibilidade de recursos administrativos ou do Judiciário. Logo, os candidatos podem, conhecendo os motivos de sua contra-indicação, submetê-los à tutela jurisdicional.

4 Dispensabilidade

Registre-se que, parte da doutrina, vem admitindo, na hipótese do candidato já ter sido submetido a exame psicotécnico e sendo aprovado, por exemplo, para policial, ao se submeter a novo concurso com muitas semelhanças, e da mesma natureza, não é plausível a exigência de novo exame. Então, tem-se considerado desnecessário que, o servidor que já tenha sido submetido a exame psicotécnico e tenha sido aprovado, quando em participação em novo concurso público, na mesma pessoa federativa, e concorrendo a cargo de funções idênticas ou semelhantes ao que já ocupa, realize novo teste psicotécnico, uma vez que anteriormente não se lhe tenha atribuído nenhuma avaliação psicológica negativa.

Esta foi a conclusão do Supremo Tribunal Federal:

"EMENTA: ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. POLÍCIA CIVIL DO DISTRITO FEDERAL.

- Exame psicotécnico. Desnecessidade quando atendida a exigência pela submissão e aprovação em exame anterior da mesma natureza.

(RE nº 24558-DF, Segunda Turma, Rel. Min. Américo Luz)"

"EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. Exame psicotécnico em concurso para provimento de cargo de Procurador da República. Sendo o candidato Procurador da Fazenda Nacional, com cinco anos de exercício, e tendo obtido excelente classificação nas provas intelectuais do concurso, demonstrando perfeita adequação às funções do cargo pretendido, perde relevo o resultado do exame psicotécnico, que o Plenário do Supremo Tribunal Federal entende só ser exigível mediante lei.

(MS nº 20972-DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Madeira)"

Observe-se, por fim, que existem cargos e empregos aos quais são atribuídos funções tão específicas, que a Emenda Constitucional nº 19/98 acrescentou ao artigo37 da Constituição, o parágrafo 7º, segundo o qual será editada lei que disporá sobre os requisitos e as restrições ao ocupante de cargo ou emprego na Administração Pública direta ou indireta, que quando no exercício de suas funções possuir acesso à informações privilegiadas.

O legislador constituinte foi oportuno em tal providência, pois determinados agentes públicos, no exercício de certos cargos ou empregos, têm acesso a informações consideradas privilegiadas, e até sigilosas, capazes de possibilitar a obtenção de vantagens pessoais, depois de seu afastamento da função pública.

Convêm frisar que a matéria não é pacífica nem nos Tribunais. O Relator Ministro Félix Fischer, REsp. 296.034/PR, teve o entendimento, afirmando que o candidato que participa do concurso para o cargo de Delegado da Polícia Federal, por exemplo, deve submeter-se ao exame psicotécnico, mesmo que já tenha realizado esse teste em concurso anterior para o cargo de Agente. Então, pela impossibilidade de se aproveitar tal habilitação em processo seletivo distinto daquele em que foi realizada a avaliação, por força do disposto no art. 10, parágrafo único, do Decreto-Lei 2.320/87, que dispõe sobre o ingresso nas categorias funcionais da Carreira Policial Federal, verbis:

“A habilitação em qualquer dos requisitos exigidos para matrícula em curso de formação não poderá ser aproveitada em processo seletivo distinto”.

Os argumentos contrários a aprovação prévia em similar exame, quando se ingressou na polícia são: a) a finalidade do exame psicotécnico é a avaliação psíquica do candidato, a fim de aferir sua compatibilidade com o cargo a que pleiteia e não para o anterior ocupado, cujas atribuições são totalmente distintas; b) a aprovação obtida a anos, com certeza, foi pautada com base em sistemática seletiva adequada à época, não guardando similitude com a atual. Logo, não há como se aproveitar o exame psicotécnico anterior, sendo este o entendimento do STF.

5 Visão do nosso Tribunal

A Décima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro já se manifestou favoravelmente, com brilhante argumento, sobre a validade da exigência de exame psicotécnico, assim como sobre a possibilidade deste reprovar candidato em concurso público, quando houver no edital a expressa menção da exigência deste exame e a sua descrição como classificatório. Segue a Ementa, com os nossos grifos sobre o texto original.

EMENTA: AÇÃO ORDINÁRIA. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. PROVA PSICOTÉCNICA. POSSIBILIDADE. RECURSO NAO PROVIDO.

1. Concurso para o ingresso no curso de formação de soldado da PMERJ. Candidato reprovado no exame psicotécnico.

2. A exigência prevista no edital com caráter desclassificatório é ato legal, desde que a avaliação se dê mediante os critérios objetivos.

3. Edital que estabeleceu critério de aferição das características básicas compatíveis com as atribuições da função de polícia militar.

4. Sentença de improcedência que se mantém.

5. Recurso não provido.

(AC Nº 2008.001.44334-RJ, Décima Primeira Câmara Cível, Relator Des.: Benedicto Abicair)

Conforme se constata na Ementa, trata-se de contenda levada a juízo por meio de ação declaratória promovida por candidato ao ingresso no curso de formação de soldado da PMERJ, reprovado em prova psicotécnica regularmente prevista no edital do concurso, e que buscou em juízo a nulidade do ato administrativo que o eliminou.

Registramos que o juízo de primeiro grau proferiu sentença julgando improcedente o pedido, e que o recorrente apelou da decisão, argumentando que o exame psicotécnico não possui caráter técnico ou objetivo necessário à prova, mas sim subjetivo, e que o edital que regulamenta o concurso não pode se sobrepor ao Ordenamento Jurídico Pátrio, sendo flagrante a sua ilegalidade.

Foi, contudo, o entendimento da Décima Primeira Câmara Cível que o edital previa como requisito para ingresso nos quadros da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro a aprovação em todos os exames do concurso, entre eles o psicotécnico.

Ilustrou ainda a sua decisão trazendo à leitura dispositivo da Lei 443/81, que é o Estatuto dos Policiais Militares do Estado do Rio de Janeiro, que bem explica em seu art. 11 os requisitos necessários ao candidato que deseja ingressar na PMERJ, incluindo-se entre estes a capacidade física e mental, o que foi frisado:

Lei 443/81 (...)

Art. 11. Para a matrícula nos estabelecimentos de ensino policial-militar destinados à formação de oficiais, de graduados e de soldados, além das condições relativas à nacionalidade, idade, aptidão intelectual, capacidade física e mental e idoneidade moral, é necessário que o candidato não exerça, nem tenha exercido, atividades prejudiciais ou perigosas à Segurança Nacional.

Entendeu, ainda, que a edital continha entre os seus itens o referente aos “critérios objetivos de aferição das características básicas compatíveis com as atribuições da função de polícia militar”, tendo sido, com isso, atendido o critério de objetividade do concurso, o que faz cair por terra o argumento usado pelo recorrente.

Ademais, reitera o relator da Décima Primeira Câmara Cível em seu voto que a matéria referente à admissibilidade de exame psicotécnico de caráter eliminatório já se encontra pacificada tanto no Tribunal do Estado do Rio de Janeiro como nos Superiores.[3]

6 Do Prazo

O exame psicotécnico que elimina o candidato, querendo recorrer da decisão administrativa, opta-se pelo mesmo prazo de validade do concurso ao qual se submeteu o concursado. Portanto, não há possibilidade de insurgir-se contra sua eliminação no certame somente após o término de validade do concurso público a que se submetera.

Nesse contexto, há equívocos de alguns precedentes e julgados contrários dos que entendem cabível questionar a eliminação do candidato após término da validade do concurso, partindo do raciocínio que, quanto aos atos administrativos ilegais podem ser submetidos ao controle pelo Poder Judiciário, sendo estipulado, para tanto, o lapso prescricional de 5 (cinco) anos. Há divergência entre alguns poucos julgados dos nossos Tribunais no sentido de que o controle judicial dos atos administrativos praticados no decorrer do processo seletivo não se sujeita à limitação temporal no edital, devendo obedecer às normas legais que regem a matéria. Filiamo-nos à corrente majoritária de que, de acordo com o art. 37III, da Constituição Federal, “o prazo de validade do concurso será de até 2 (dois) anos, prorrogável uma vez por igual período”, em homenagem ao princípios da segurança jurídica, legalidade interesse público.

Ora, o prazo e validade do concurso é mais do que suficiente para que a parte interessada possa invalidar os atos nascidos com a mácula da ilegalidade, não se admitindo, hoje, quando já ultrapassado o lapso temporal de validade do concurso é que o candidato venha a se insurgir contra o ao ato que o eliminou, o que seu direito estaria extinto pela decadência. Exemplificando, o concurso sendo realizado em agosto do ano de 2006, a data do ajuizamento da ação seria até agosto de 2008, caso o prazo de validade do concurso público fosse de até 1 (um) ano, prorrogado, uma vez, por igual período.

Nesse sentido, citamos os julgados do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais:

“O direito de referência do Apelante a uma vaga, acaso se declarasse a ilegalidade do exame psicotécnico, perdura enquanto for válido o próprio concurso, e nada além deste prazo."(Apelação Cível nº 1.0024.03.024792-8/001, Relator Desembargador Jarbas Ladeira)

A este respeito, em página de inegável clareza, o eminente Desembargador citado, assim finaliza:

"o Apelante decaiu do direito de postular a garantia de uma vaga, com estribo em ilegalidade do exame psicotécnico. Deveria ter suscitado a matéria alusiva à sua pretensão, quando ainda se fazia viável a sua convocação e investidura no cargo, ou seja, dentro do prazo de validade do concurso. Assim, transcorrido tal prazo, não há mais como determinar sua convocação e posse."

"ADMINISTRATIVO. CURO TÉCNICO EM SEGURANÇA PÚBLICA DA PMMG. EXAME PSICOLÓGICO. PREVISÃO LEGAL. DECADÊNCIA. - O exame psicológico para ingresso nos quadros da PMMG que elimina candidato sem oportunidade de recorrer reveste-se de ilegalidade, contudo, se o candidato reprovado deixa de recorrer no tempo oportuno opera-se a preclusão máxima administrativa."(Embargos Infringentes nº 1.0000.00.319074-1/002, Desemb. BELIZÁRIO DE LACERDA).

"Processual Civil. Ação Anulatória e Cautelar. Curso para Ingresso na PMMG. Candidato Inapto. Exame Psicotécnico. Perda do Objeto. Extinção do Processo. In casu, o Curso de Formação de Soldados, para o qual o autor prestou concurso, havia expirado, não sendo possível determinar a sua matrícula em curso diverso daquele para o qual prestou concurso, sendo necessário que se submeta a novo certame."(Apelação Cível nº 1.0024.02.742853-1/001, Desemb. PINHEIRO LAGO).

" ADMINISTRATIVO - CONCURSO PÚBLICO - CARÊNCIA DE AÇÃO –INOCORRÊNCIA - DECADÊNCIA - PRAZO DE VALIDADE EXPIRADO. "O interesse de agir é, por conseguinte, a necessidade de se valer do Poder Judiciário para a solução de um conflito de interesses entre as partes." Pedido juridicamente possível é aquele que, em tese, é reconhecido no ordenamento jurídico brasileiro. O prazo de validade de concurso público se submete às regras contidas no artigo 37, inciso IIIda Constituição da República. Implementado o prazo extintivo imposto pelo legislador ou constante no edital, opera-se a decadência do direito, que produz efeitos de modo absoluto, vez que o prazo decadencial não pode ser objeto de renúncia nem ser invocado pela via de exceção. A ação ajuizada após o escoamento do prazo do concurso encontra óbice na decadência do direito, sendo circunstância impeditiva de conhecimento de outras alegações dos postulantes."(Apelação Cível nº 1.0024.03.941417-2/001, Desemb. GOUVÊA RIOS).

"Concurso público - PMMG - Exame psicotécnico - Incidência do art. 37III IVdaCF/88 - Decadência - Candidato que ajuizou a ação quando expirado o prazo de validade do concurso. Decorrido o prazo de validade do concurso público, que pode ser de até dois anos, prorrogável por igual período, não é mais possível a suscitação de inconformidade com o seu resultado por candidato reprovado em exame psicotécnico, procurando alterá-lo, uma vez que se trata de prazo decadencial. Sentença mantida."(Apelação Cível nº 1.0024.03.024792-8/001, Desemb. JARBAS LADEIRA).

7 Estudo de Caso Prático - Prova para Procurador do Estado[4]

ELZO SILVA foi eliminado no concurso público de acesso à carreira de policial militar do Estado do Rio de Janeiro, por contra-indicação em exame, eliminatório, de avaliação psicológica, que constava de bateria de testes objetivos. Irresignado, o candidato ingressou com mandado de segurança que foi denegado. Em sede de apelação, o autor sustentou que a exigência da avaliação psicológica não se concilia com os princípios constitucionais da igualdade e da impessoalidade, que devem se fazer presentes nos concursos para o provimento de cargos públicos.

Responda de forma fundamentada:

a) Edital de concurso público que atribua caráter eliminatório à avaliação psicológica de candidatos ao provimento de cargo público afronta as garantias constitucionais dos candidatos?

b) Como se justifica o contexto do art. 37, inciso II, da CRFB/88, no que se refere ao provimento de determinados cargos públicos através de concursos, como, por exemplo, o descrito neste caso concreto?

A matéria em questão comporta árdua discussão em tese, sendo freqüente visita dos Tribunais Superiores, inclusive da Corte Suprema, pois se trata da conciliação, com as garantias constitucionais, do caráter eliminatório que edital de concurso atribua à avaliação psicológica de candidatos ao provimento de cargo público, encontrando-se decisões que se inclinam pela inconstitucionalidade de qualquer lei ou norma editalícia de concurso público que confira índole eliminatória a exame psicológico e outras que a admitem com ressalvas.

Isto porque, em princípio, não sendo a Psicologia ciência exata, expondo-se a interpretações que variam segundo a linha de formação do psicólogo, admitir-se caráter eliminatório a exame psicológico é emprestar-lhe índole totalitária, avessa ao controle e eventualmente comprometedora das franquias democráticas do Estado de Direito, porquanto atribuiria valor absoluto e incontrastável a opinião técnica que passa a atuar como discrímen, com possível violação do princípio da isonomia.

Todavia, a isonomia convive com o fator discriminador quando este inequivocadamente contribua para o superior atendimento a razões de interesse público. Assim, no campo dos concursos para provimento de cargos e empregos públicos, haverá critérios de aferição (fator discriminante) compatíveis ou incompatíveis com o princípio da igualdade que deve prevalecer entre os candidatos. O discrímen será inconciliável com a isonomia quando submeter os candidatos a critério diferenciador irrelevante para o fim de interesse público que, no caso dos concursos, será o adequado desempenho das funções inerentes ao cargo ou emprego que se quer prover. O discrímen compor-se-á com a isonomia quando estabelecer critério imprescindível ao exercício adequado dessas funções, daí o Supremo Tribunal Federal reiterar, em uma messe de julgamentos, que, em matéria de concurso público, há de medir-se a legitimidade de fatores discriminantes de acordo com a razoabilidade, a cada caso.

No caso em foco, inevitável é a adoção de discrímen que instrumentalize o Estado a selecionar candidatos especificamente aptos ao desempenho da função de policial militar, que exige equilíbrio emocional e autocontrole da agressividade, em combinação proporcional à intrepidez e à energia que desafiam o cotidiano desses agentes da segurança pública, sob pena de comprometerem-se o próprio desempenho da função e a finalidade pública a que deve servir. Tal perfil de personalidade não se afere, sendo curial, por meio de provas intelectuais, de aptidão física ou de saúde orgânica dos candidatos.

A propósito, há de se observar que o perfil aferido pela avaliação psicológica não se confunde com caráter ou inteligência. Ainda que se trate de pessoa suficientemente apta do ponto de vista de inteligência, o fato não assegura ao candidato melhores condições para servir adequadamente ao interesse público e, no caso, na função policial, basta lembrar que os anais da criminologia registram numerosos casos de delinqüentes de altíssima inteligência, infelizmente direcionada para condutas anti-sociais, o que, decerto, não é o da hipótese ilustrada, mas a verdade científica é que não há nexo necessário entre inteligência e vocação para tal ou qual atividade específica. Por isto mesmo, a Administração deve dispor de discrição para estabelecer os critérios de admissão a certos cargos públicos e, para aferi-los segundo métodos cientificamente reconhecidos, como o é o da avaliação psicológica da personalidade, inviável que esses critérios, desde que fixados no edital de modo impessoal e isonômico, possam ser revistos em sede de controle judicial, posto que pertinentes ao mérito do ato administrativo.

A avaliação psicológica é indispensável, portanto, e deve, mesmo, ser eliminatória, para que se reduza o mais possível o risco social e pessoal que representam policiais despreparados emocionalmente para os misteres de seu peculiar ofício, ou dotados de perfil de personalidade (profissiográfico) com estes inconciliável. Daí o art. 37II, da Constituição Federal, com a redação que lhe veio imprimir a Emenda Constitucional no 19/98, ressalvar que a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas, “de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego [...]”.

Compatibilizado com o princípio da isonomia, o exame psicológico eliminatório, para revestir-se de legalidade, deve estar expressamente previsto no edital, que é a lei interna do concurso a que se destinam suas regras e se acha no ato convocatório sob exame. E há de ser ensejada ao candidato eliminado a ciência pessoal e reservada dos fundamentos de sua contra-indicação psicológica, a qual também ali se encontra prevista, íntegro, destarte, o respeito devido ao direito fundamental inscrito no art. 5oXIV, da Constituição da República.

Conhecidos os motivos da contra-indicação, através de laudo atinente à avaliação psicológica individual do candidato à policial militar, ditos motivos são idôneos para a produção do resultado, o que afasta sua invalidade e a ilicitude do ato administrativo eliminatório. Nada impede, porém, que o candidato, ao conhecer os motivos de sua contra-indicação, submetê-los à tutela jurisdicional, a qual se inviabiliza à falta deles. A presença do exame psicotécnico, ainda que de caráter eliminatório, não constitui, por si só, violação do princípio da igualdade se o candidato, tendo acesso assegurado às razões da eliminação, puder provocar o controle judicial, certo que, para terceiros, impõe-se o sigilo dos motivos da inaptidão por razões de ordem ética e que preservam o próprio candidato.

Percebe-se, por fim, que o caso concreto sequer tangencia os vícios arrolados, que apontam no sentido de invalidar o exame psicológico, cuja presença, com caráter eliminatório, em concurso público de acesso à carreira de policial militar do Estado do Rio de Janeiro, admite, desde que não se reduza a simples entrevista, marcada pelo subjetivismo, efetuado sob sigilo, com forte possibilidade de arbítrio.

Referência Jurisprudencial que suporta a conclusão:

APELAÇÃO. Concurso público para ingresso na Polícia Militar. Avaliação psicotécnica com caráter eliminatório, assegurada ao candidato, no edital, a ciência dos motivos de sua inaptidão, apurada por meio de bateria de testes objetivos. Legitimidade em face da Constituição da República e da legislação estadual. O exame de razoabilidade e o art. 37II, da CF/88, com a redação da EC nº 19/98. Desprovimento do recurso contra sentença que denegou a segurança ( APELAÇÃO CÍVEL Nº 2005.001.28899, (Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do R

Sobre os autores
José Maria Pinheiro Madeira

Mestre em Direito do Estado, Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais, Doutor em Ciência Política e Administração Pública. Curso de pós-graduação no exterior. Procurador do Legislativo (aposentado). Parecerista na área do Direito Administrativo. Examinador de Concurso Público. Membro Integrante da Banca Examinadora de Exame da Ordem dos Advogados do Brasil. Membro de diversas associações de cultura jurídica, no Brasil e no exterior. Professor Emérito da Universidade da Filadélfia. Professor-palestrante da Escola da Magistratura do Rio de Janeiro - EMERJ - Professor Coordenador de Direito Administrativo da Universidade Estácio de Sá. Professor da Fundação Getúlio Vargas. Professor integrante do Corpo Docente do Curso de Pós-Graduação em Direito Administrativo da Universidade Cândido Mendes, da Universidade Gama Filho e da Universidade Federal Fluminense. Membro Titular do Instituto Ibero-Americano de Direito Público. Membro Efetivo do Instituto Internacional de Direito Administrativo.

Luiz Paulo Figueiredo de Araújo

Bacharelando em Direito pela Universidade Estácio, Autor de Artigos Jurídicos, Cursando Pós-Graduação em Direito Público na Acadêmia Nacional de Juristas e Doutrinadores ANAJ. Kim Reis Gusmão Soares Bacharel em Direito pela Universidade Estácio, Autor de Artigos Jurídicos, Cursando Pós-Graduação em Direito Público e Penal. Frederico Rezende Bilheri, Especialização em Direito Público: Constitucional, Administrativo e Tributário, Especialização, MBA em Marketing Político e Comunicação Eleitoral, Doutor Honoris Causa pela Academia Nacional de Juristas e Doutrinadores.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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