Responsabilidade tributária dos sócios-gerentes e administradores e a aplicação do instituto da desconsideração da personalidade jurídica à luz do artigo 135, III, do CTN

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22/01/2016 às 15:12
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O presente artigo aborda a responsabilidade tributária do sócio-gerente e do administrador à luz do artigo 135, inciso III, do Código Tributário Nacional, bem como sobre a aplicação do instituto da desconsideração da personalidade jurídica tributária.

1 INTRODUÇÃO

Versa o presente trabalho sobre o tema da responsabilidade tributária dos sócios-gerentes e administradores, com ênfase no artigo 135, inciso III do Código Tributário Nacional. Além disso, procura analisar a aplicação do instituto da desconsideração da personalidade jurídica no direito tributário com fundamento no dispositivo legal supracitado.

Acerca da temática apresentada, infere-se que a pessoa jurídica, que adota a forma limitada, possui personalidade jurídica distinta dos seus sócios e administradores, pois, em regra, possuem patrimônio inconfundível e incomunicável. Ocorre que, o Código Tributário Nacional elenca algumas possibilidades em que poderá ser responsável pela obrigação tributária uma terceira pessoa, que não o contribuinte, mas que esteja diretamente vinculada ao fato gerador ou possua vínculo com a obrigação por expressa disposição legal.

Para o Código Tributário Nacional, são três as espécies de responsabilidade tributária, quais sejam: responsabilidade por sucessão, responsabilidade de terceiros e responsabilidade por infrações.

Nesse sentido, pretende-se demonstrar o alcance da responsabilização tributária de terceiros, especificamente dos administradores, observando-se casos em que os sócios e/ou administradores podem ou não ser responsabilizados pela dívida tributária da empresa.

Ainda em relação ao artigo 135, III, do CTN, importante salientar que, no âmbito do direito tributário, a aplicação do instituto da desconsideração da personalidade jurídica é objeto de divergência doutrinária e jurisprudencial. Assim, denota-se a existência de uma corrente que defende a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica com base no artigo 135, inciso III, do CTN, e outra corrente que defende a tese de que o referido artigo não se relaciona com o instituto da desconsideração da personalidade jurídica, pois trata de responsabilização direta e exclusiva de terceiro.

Assim, analisar-se-á, neste estudo, a responsabilidade de terceiro descrita no artigo 135, inciso III, do CTN, bem como os requisitos e pressupostos constantes neste dispositivo para que tais figuras venham a ser responsabilizadas pessoalmente no âmbito tributário, os quais nem sempre são observados nos julgamentos pelo Brasil a fora.

2 RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA

 A responsabilidade tributária nasce de uma obrigação tributária, que por sua vez, origina-se de uma relação jurídica estabelecida entre o Estado e o particular, a qual objetiva, uma prestação de cunho patrimonial, ou seja, o pagamento do tributo ou da penalidade pecuniária, bem como a realização de deveres instrumentais administrativos relativos à arrecadação e a fiscalização de tributos.[1]

A relação jurídica tributária é constituída pelos sujeitos ativo e passivo. Por sujeito ativo entende-se o ente público – União, Estados, Municípios e Distrito Federal, nos termos do artigo 119 do CTN:

Art. 119. Sujeito ativo da obrigação é a pessoa jurídica de direito público, titular da competência para exigir o seu cumprimento.[2]

Entende-se por sujeito passivo da obrigação tributária a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou da penalidade pecuniária. É a pessoa determinada pela lei como devedora de uma prestação pecuniária, conforme o artigo 121 e seguintes do CTN:

Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária.

Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se:

I - contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador;

II - responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei.

Art. 122. Sujeito passivo da obrigação acessória é a pessoa obrigada às prestações que constituam o seu objeto.

Art. 123. Salvo disposições de lei em contrário, as convenções particulares, relativas à responsabilidade pelo pagamento de tributos, não podem ser opostas à Fazenda Pública, para modificar a definição legal do sujeito passivo das obrigações tributárias correspondentes.[3]

Nesse sentido expressa Eduardo Sabbag:

Em princípio, o tributo deve ser cobrado da pessoa que pratica o fato gerador. Nessas condições, surge o sujeito passivo direto (“contribuinte”). Em certos casos, no entanto, o Estado pode ter a necessidade de cobrar o tributo de uma terceira pessoa, que não o contribuinte, que será o sujeito passivo indireto (“responsável tributário”).

Em sentido estrito, é a sujeição passiva indireta a submissão ao direito de crédito do Fisco, em virtude de expressa determinação legal, de pessoa diversa do contribuinte, desde que tenha um vínculo indireto com a situação que corresponda ao fato gerador (art. 128 do CTN).[4]

Além disso, tem-se que a responsabilidade poderá ser por substituição ou por transferência.

A responsabilidade por substituição se dá “quando terceira pessoa substitui o contribuinte no cumprimento das obrigações, sendo diretamente exigido pela autoridade administrativa a realização do cumprimento das obrigações, podendo atribuir ao contribuinte, apenas de forma supletiva, a responsabilidade tributária[5]”.

Já a responsabilidade por transferência, conforme se extrai da doutrina de Eduardo Sabbag, se dá:

Quando, por expressa previsão legal, a ocorrência de um fato, posterior ao surgimento da obrigação, transfere a um terceiro a condição de sujeito passivo da obrigação tributária, que até então era ocupada pelo contribuinte. Nesse caso, ‘o contribuinte não é ignorado, havendo a mudança do sujeito passivo em momento posterior’. Essa transferência poderá excluir a responsabilidade do contribuinte ou atribuí-la em caráter supletivo. Esta comporta três situações possíveis: a responsabilidade por solidariedade, a responsabilidade dos sucessores e a responsabilidade de terceiros[6].

Nesse diapasão, passar-se-á a estudar, brevemente, as principais espécies de responsabilidade tributária.

2.1 ESPÉCIES DE RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA

O Código Tributário Nacional, sem seus artigos 128 a 138[7], elenca as hipóteses de responsabilidade tributária, as quais são: responsabilidade dos sucessores, responsabilidade de terceiros e responsabilidade por infrações, como a seguir demonstrado.

2.1.1 Responsabilidade por Sucessão

A responsabilidade por sucessão está disciplinada nos artigos 129 a 133 do CTN[8]. Extrai-se destes dispositivos que o responsável será outra pessoa que não a que realizou o fato gerador, podendo referida responsabilidade ocorrer antes ou depois da constituição do crédito tributário, na qual o sucessor passa a ocupar a figura do antigo devedor, no estado em que a obrigação se encontra.

Eduardo Sabbag assim explica:

A responsabilidade de devedores sucessores ou, simplesmente, responsabilidade dos sucessores está disciplinada nos arts. 129 a 133 do CTN. Aqui a obrigação se transfere para outro devedor em virtude do ‘desaparecimento’ do devedor original. Esse desaparecimento pode ser, v.g., por morte do primeiro devedor, recaindo o ônus sobre os herdeiros, ou por venda do imóvel ou estabelecimento, incidindo o importe tributário sobre o comprador. Nessa toada, dois tipos de transferência podem se dar:

I Transferência causa mortis: a transmissão do ônus ocorre para os herdeiros, havendo a sua responsabilidade pessoal (art. 131, II e III, CTN);

II Transferência inter vivos: a obrigação se transfere para o adquirente em quatro hipóteses:

1ª hipótese: transmissão de imóveis (sucessão imobiliária, art. 130, CTN);

2ª hipótese: transmissão de bens móveis (sucessão inter vivos; art. 131, I, CTN);

3ª hipótese: transmissão de estabelecimento comercial, industrial ou profissional (sucessão comercial; art. 133, CTN);

4ª hipótese: transmissão decorrente de fusão, incorporação, transformação ou cisão (sucessão empresarial; art. 132, CTN).[9]

Nessa esteira, Aliomar Baleeiro acrescenta:

Bem se vê que a responsabilidade por sucessão não configura sanção jurídica. O fato jurídico que desencadeia a responsabilidade é a sucessão, fato lícito, não se revestindo, portanto, a consequência da norma secundária de caráter sancionatório. Por tal razão, ela se estende a todas obrigações nascidas anteriormente à data da sucessão, ainda que não formalizadas pelo lançamento, e ainda que não tenham sido descumpridas previamente pelo sucedido. Podem ser apenas obrigações surgidas,mas ainda não vencidas ou não exigíveis a data da sucessão.[10]

Destarte, observa-se que o artigo 130 do CTN dispõe da responsabilidade por sucessão na aquisição de bens imóveis, onde os compradores estão obrigados a pagar os débitos fiscais de seus sucedidos (ora vendedores), salvo quando conste no título a prova de sua quitação. Já o artigo 131 do CTN consta o rol dos responsáveis por sucessão.

De outra banda, os artigos 132 e 133 do CTN discorrem sobre a responsabilidade dos agentes empresariais, ou seja, a sucessão tributária que ocorre em virtude de fusão, transformação ou incorporação[11]. Logo, a pessoa jurídica de direito privado que resultar de uma dessas três hipóteses será responsável pelos tributos devidos até a data do ato pelas pessoas jurídicas de direito privado que foram fusionadas, transformadas ou incorporadas.

A sucessão empresarial ocorre na hipótese de extinção de pessoa jurídica que continua sendo explorada por qualquer sócio remanescente ou seu espólio, nos termos dos artigos 132 e 133 do CTN, a qual transfere a responsabilidade pelo pagamento do tributo aos continuadores da atividade, eis que estes serão considerados sujeito passivo da obrigação tributária.

2.1.2 Responsabilidade de Terceiros

O Código Tributário Nacional dispõe sobre a responsabilidade de terceiros nos seus artigos 134 e 135, os quais expressam:

Art. 134. Nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem solidariamente com este nos atos em que intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis:

I - os pais, pelos tributos devidos por seus filhos menores;

II - os tutores e curadores, pelos tributos devidos por seus tutelados ou curatelados;

III - os administradores de bens de terceiros, pelos tributos devidos por estes;

IV - o inventariante, pelos tributos devidos pelo espólio;

V - o síndico e o comissário, pelos tributos devidos pela massa falida ou pelo concordatário;

VI - os tabeliães, escrivães e demais serventuários de ofício, pelos tributos devidos sobre os atos praticados por eles, ou perante eles, em razão do seu ofício;

VII - os sócios, no caso de liquidação de sociedade de pessoas.

Parágrafo único. O disposto neste artigo só se aplica, em matéria de penalidades, às de caráter moratório.

        

Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos:

I - as pessoas referidas no artigo anterior;

II - os mandatários, prepostos e empregados;

III - os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.[12]

Como prescrito no artigo 134 do CTN, na hipótese de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal por parte do contribuinte, os representantes – pais, tutores e curadores, inventariante, síndico da falência, os sócios nas sociedades de pessoas quando liquidadas, tabeliães, entre outros, se tornarão solidariamente obrigados pelos débitos fiscais, se tais pessoas intervierem no ato tributado ou cometerem omissões. Em que pese o texto legal mencionar a palavra “solidariamente”, trata-se de responsabilidade subsidiária.

Sobre o assunto, Kiyoshi Harada dispõe:

Por se tratar de responsabilidade solidária, alguns autores entendem que a responsabilidade das pessoas enumeradas nos incisos I usque VII independe da verificação de impossibilidade de cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte. O certo é que a própria norma condiciona a responsabilidade solidária de terceiros aí referidos a dois requisitos impostergáveis: a impossibilidade de o contribuinte satisfazer a obrigação principal e o fato de o responsável solidário ter uma vinculação indireta, através de ato comissivo ou omissivo, com a situação que constitui o fato gerador da obrigação tributária. Quis o legislador, na verdade, referir-se à responsabilidade subsidiária, porque a solidária não comporta benefício de ordem (parágrafo único do art. 124 do CTN). Acrescenta o parágrafo único desse artigo que a responsabilidade solidária, em matéria de penalidades, só tem aplicação em relação às de caráter moratório[13].

Denota-se que o artigo 135 do CTN estende e agrava a regra do artigo anterior, trazendo a baila outros responsáveis (mandatários, prepostos e empregados, diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado), atribuindo a responsabilidade pessoal, plena e exclusiva aos terceiros, quando verificado excesso de poder ou infração de lei, contrato social ou estatutos.

Aduz Sacha Calmon que o dispositivo em análise tem razão em ser rigoroso, já que ditos responsáveis terão agido sempre de má-fé, merecendo, por isso mesmo, o peso inteiro da responsabilidade tributária decorrente de seus atos, desde que tirem proveito pessoal da infração, contra as pessoas jurídicas e em detrimento do Fisco[14].

Nesse sentido, expressa Marciano Seabra de Godoi (apud Beraldo):

Na sistemática do Código Tributário Nacional, existem dois tipos de devedores ou sujeitos passivos do tributo: contribuinte é o sujeito passivo que pratica efetivamente o fato gerador do tributo; responsável é o sujeito passivo que não tem relação pessoal e direta com o fato gerador, mas a lei tributária o coloca mesmo assim na posição de devedor (solidário ou não) do tributo. Figuremos um exemplo: a empresa X era proprietária de um imóvel urbano no dia 1º de janeiro de 2006 e no dia 30 de março de 2006, a empresa X foi incorporada pela empresa Y. A empresa X é contribuinte do IPTU de 2006 e a empresa Y, com a incorporação, tornou-se responsável pelo imposto[15].

O artigo 135 do CTN trata da obrigação pessoal e exclusiva do responsável, motivo pelo qual ocorre a exclusão do contribuinte do polo passivo da obrigação. Assim, não se está diante de responsabilidade subsidiária de terceiro nem de responsabilidade solidária, pois somente o terceiro responderá pessoalmente pelas obrigações tributárias.

Nessa esteira, Eduardo Sabbag[16] distingue os artigos 134 e 135 do CTN com o seguinte quadro mnemônico:

                                                      QUADRO MNEMÔNICO

Ar. 134 do CTN

Art. 135 do CTN

Responsabilidade subsidiária

Responsabilidade pessoal

Depende da insolvência do contribuinte

Não depende da insolvência do contribuinte

Responsabilidade por transferência

Responsabilidade por substituição

O responsável incorre em omissão, ausente o

O responsável age com excesso de poder ou

excesso de poder e a infração de lei

infração de lei, contrato ou estatutos

Assim, tem-se que o artigo 134 do CTN trata de reponsabilidade de terceiro com atuação regular, já o artigo 135 dispões acerca da responsabilidade de terceiro com atuação irregular.

2.1.3 Responsabilidade por Infrações

Os artigos 136 e 137[17], do Código Tributário Nacional, referem-se à prática de infrações tributárias e reportam-se ao descumprimento do dever de pagar o tributo bem como às infrações apuradas em autuações, pouco importando a intenção do agente.

Nesse contexto, explica Caio Bartine:

Podemos identificar em matéria tributária duas espécies de infrações: infrações administrativas, sendo aquelas decorrentes do não cumprimento da obrigação tributária, quando não conceituadas como crime; e aquelas infrações definidas em lei como crimes contra a ordem tributária, previstos e definidos pela Lei 8.137/1990.

No primeiro caso (infrações administrativas), o sujeito passivo responderá por seus atos independentemente de sua intenção e da efetividade, natureza e extensão dos efeitos. Trata-se de uma responsabilidade objetiva em matéria tributária.

No entanto, em se tratando dos crimes contra a ordem tributária, exige-se a necessidade, para sua definição, da ocorrência de dolo específico. Inexiste crime culposo em matéria tributária, admitindo-se a possibilidade apenas de crime doloso, sendo tal conduta específica.[18]

Assim, a responsabilidade do agente será pessoal quando as infrações decorram de dolo específico. Os artigos 135 e 137 do CTN têm em comum a questão da pessoalidade, a retirada da solidariedade e a necessidade de comprovação do dolo.

Entretanto, na hipótese prevista no artigo 138[19] do CTN, esta responsabilidade poderá ser excluída pela denúncia espontânea da infração, havendo neste caso a confissão e consequentemente a desistência do proveito da infração. A denúncia deverá vir acompanhada pelo pagamento do tributo e juros de mora, se for o caso.

Por fim, cabe lembrar que não será considerada denúncia espontânea àquela apresentada após o início do procedimento administrativo ou medida fiscalizatória referente à infração.

Expostos os tipos de responsabilidade elencados pelo Código Tributário Nacional, passa-se a análise da responsabilidade tributária do sócio e do administrador à luz do artigo 135 do CTN.

3 RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DO SÓCIO E DO ADMINISTRADOR E O ARTIGO 135 DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL

A responsabilidade tributária dos sócios e administradores está presente na legislação tributária no artigo 135, inciso III, do Código Tributário Nacional e decorre de obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos.

Nesse sentido esclarece Aliomar Baleeiro, ao afirmar que o terceiro que age com dolo, contrariando a lei, mandato, contrato social ou estatuto, torna-se, no lugar do contribuinte o único responsável pelas obrigações decorrentes daquela infração, por ter agido contra os interesses do próprio contribuinte[20].

Logo, além da solidariedade, aplicar-se-á a responsabilidade por substituição, onde evidenciada a má-fé e o intuito doloso do terceiro, ser-lhe-á atribuído toda a responsabilidade.

Nessa esteira, aduz Kiyoshi Harada:

O art. 135 dispõe sobre a responsabilidade pessoal do agente no que tange às obrigações resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos, relativamente às pessoas anumeradas no artigo anterior (inciso I), aos mandatários, prepostos e empregados (inciso II) e aos diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado (inciso III). Nessas hipóteses, ocorre a responsabilidade por substituição e não apenas responsabilidade solidária estritamente no caso de impossibilidade de cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, como nos casos elencados no artigo antecedente. Essa responsabilidade por substituição, outrossim, inclui quaisquer penalidades, bem como as obrigações acessórias. (grifo nosso).[21]

Nesse sentido, denota Marciano Seabra de Godoi:

A literalidade do caput do artigo 135 parece englobar tão-somente situações específicas em que as pessoas arroladas em seus três incisos praticam atos que prejudicam ou traem a confiança de outras pessoas privadas, e, portanto, essas outras pessoas seriam retiradas da condição de sujeito passivo do tributo, passando a figurar como responsável ‘exclusivo’ o terceiro mencionado num dos três incisos do artigo 135. Se um diretor pratica operações em nome de uma empresa, mas segundo os estatutos sociais não tem poderes para tanto, os tributos resultantes de tais operações seriam de responsabilidade ‘pessoal’ do diretor, excluindo-se a responsabilidade da empresa. O mesmo poderia ocorrer com um síndico em relação a massa falida. Somente esse tipo de situação se encaixaria perfeitamente à literalidade da previsão legal de ‘obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração a lei, contrato social ou estatutos[22]’.

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A jurisprudência do STJ – a nosso ver de forma correta – não se prende à literalidade do artigo 135 do CTN, e aplica a seu inciso III em basicamente dois tipos de situação: o inadimplemento fraudulento de obrigações tributárias mediante participação do diretor, gerente ou representante da sociedade (sejam sócios ou não) e a dissolução irregular da sociedade.[23]

A responsabilidade tributária do artigo 135 do CTN requer interpretação stricto sensu, ou seja, somente os casos contemplados expressamente na legislação permitem a exigência do tributo de terceiro.

Acerca do tema, Sacha Calmon Navarro Coêlho denota:

Nas hipóteses do artigo, tributo e multa são transferidos aos terceiros responsáveis. Os empregados, só por serem tais, jamais poderão se responsabilizados por tributos devidos pela sociedade, eis que sujeitados ao poder hierárquico e aos jus variandi dos patrões. O empregado em condições de ser responsável tributário é aquele possuidor de mandato e de poderes de gestão, ou então o que entra em conluio para lesar o Fisco e o empregador, tirando vantagem pessoal. Ao tratarmos do pagamento do crédito tributário, retornaremos ao assunto. A regra, pois, há de ser entendida cummodus in rebus. Este artigo, sua aplicação, depende muito do caso concreto. Ele se presta a encobrir intuitos evasivos das próprias empresas, supostamente lesadas e que como vítimas se apresentarão aos tribunais e, por outro lado, é eficaz instrumento para proteger as pessoas jurídicas de diretores e de empregados espertalhões. Veja-se, v.g., o caso de um contador-empregado que todo mês solicita cheque, com declaração no verso de que é emitido para pagar imposto, mas não efetiva o pagamento. Obtém de assecla seu, gerente do banco recebedor que tem contrato com o Estado para receber em seu nome, documento falso do depósito, e com isso lesam a empresa e o Fisco. Ora, a infração fiscal é objetiva, não porém a responsabilidade tributária. Caso contrário, o artigo 135 sob comento não faria sentido. A empresa deve ser excluída. Os empregados, responsabilizados. O banco deverá indenizar o Estado e regressar contra seu funcionário.[24]

Importante lembrar o que dispõe o artigo 110 do CTN:

Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.[25]

Ora, a teor do dispositivo supra, a lei tributária deverá respeitar os institutos e princípios de direito civil e direito comercial (princípio da separação patrimonial versus princípio da responsabilidade limitada dos seus sócios), pelos quais existe a personalidade jurídica, especialmente o que expressa que a pessoa jurídica não se confunde com as pessoas naturais que a compõem.

 Em razão desse princípio, os sócios não respondem, em regra, pelas obrigações da sociedade.

Da definição de sociedade empresária como pessoa jurídica derivam conseqüências precisas, relacionadas com a atribuição de direitos e obrigações ao sujeito de direito nela encerrado. Em outros termos, na medida em que a lei estabelece a separação entre pessoa jurídica e os membros que a compõem, consagrando o princípio da autonomia patrimonial, os sócios não podem ser considerados os titulares dos direitos ou os devedores das prestações relacionados ao exercício da atividade econômica explorada em conjunto. Será a própria pessoa jurídica da sociedade a titular de tais direitos e a devedora dessas obrigações. [26]

Assim, da personalização da sociedade empresária segue-se a separação dos patrimônios desta e de seus sócios. Os bens integrantes do estabelecimento empresarial, e outros eventualmente atribuídos à pessoa jurídica, são de propriedade dela, e não de seus membros.

Deste modo, conclui-se que respondem pelas obrigações da sociedade, em princípio, apenas os bens sociais. Sócio e sociedade não são a mesma pessoa, e, como não cabe, em regra, responsabilizar alguém (o sócio) por dívida de outrem (a pessoa jurídica da sociedade), a responsabilidade patrimonial pelas obrigações da sociedade empresária não é dos seus sócios.

Em outros termos, a garantia do credor é representada pelo patrimônio do devedor; se a devedora é a sociedade empresária, então será o patrimônio social (e não o dos sócios) que garantirá a satisfação dos direitos creditícios existentes contra ela. Somente em hipóteses que excepcionam a regra da autonomia da pessoa jurídica poder-se-á executar o patrimônio do sócio, em busca do atendimento de dívida da sociedade. [27]

Infere-se, portanto, que a responsabilidade tributária diverge do instituto da desconsideração da personalidade jurídica contemplada pelo Código Civil, haja vista o artigo 135, do CTN, imputar a responsabilidade diretamente ao terceiro responsável. Desse modo, não basta o terceiro ser sócio da sociedade devedora para que seus bens particulares possam ser excutidos em prol da Fazenda Pública, é necessário que essa pessoa tenha praticado atos de administração dentro da sociedade, ou seja, o sócio tem que ter efetivamente agido nos comandos e administração da sociedade. Além disso, deve o sócio ter agido com excesso de poderes ou infração a lei, contrato social ou estatutos. Com a ocorrência desses requisitos e a devida apuração e comprovação de que o sócio ou administrador agiu com dolo e má-fé, será este o responsável direto.

3.1 VERIFICAÇÃO DA RESPONSABILIDADE

Como acima exposto, observa-se para que seja o sócio responsável pessoalmente pelos débitos tributários é preciso que este tenha praticado atos com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos, mas no que consistem tais atos?

O doutrinador Eduardo Sabbag melhor explica as expressões “excesso de poder” e “infração de lei, contrato social ou estatuto”:

Excesso de poderes: o terceiro age por conta própria, além dos poderes que a norma legal, contratual ou estatutária lhe conferem, isto é, subvertendo as atribuições que lhe  foram outorgadas. Diferentemente das hipóteses do art. 134, neste artigo temos nítido comportamento comissivo. Exemplo: diretor de sociedade que adquire imóvel, sabendo que, pelo estatuto social, estava impedido de fazê-lo sem a anuência de todos os sócios. A dívida de ITBI, desse modo, recairá pessoalmente sobre ele;

Infração de lei, contrato social ou estatutos: é importante enfatizar que o descumprimento da obrigação tributária principal (não pagamento de tributo), sem dolo ou fraude, apenas representa a mora da empresa, e não ‘infração legal’ deflagradora de responsabilidade pessoal. É imprescindível para a responsabilização pessoal a atuação dolosa do gerente ou diretor, devendo ser cabalmente provada. O não pagamento, isoladamente analisado, é ‘mera presunção’ de infração à lei pelo gestor da pessoa jurídica. Ademais, a infração a que se refere o art. 135 é subjetiva (e não objetiva), isto é, dolosa, e é sabido que o dolo não de presume. (grifo nosso).[28]

A expressão “excesso de poderes” é utilizada para indicar atos praticados fora da outorga ou autoridade conferida ao terceiro.

Hugo de Brito, ao comentar o artigo 135 do CTN, explica:

A referência a atos praticados com excesso de poderes indica muito claramente que a atribuição de responsabilidade tributária a terceiros diz respeito aos créditos tributários originados de atos abusivos, não aos créditos tributários em geral não quitados por simples insuficiência da capacidade econômico-financeira da pessoa jurídica[29].

O contrato social e os estatutos são termos utilizados para designar atos constitutivos das pessoas jurídicas de direito privado, que atuam através de representantes que recebem poderes.

 José Otávio de Vianna Vaz ao falar da infração do contrato social ou estatutos, assim expõe:

Poder-se-ia afirmar que a “infração do contrato social” seria uma espécie de “excedimento de poderes”. Entretanto, como acima afirmado, os representantes das pessoas jurídicas recebem seus poderes diretamente do contrato social. Assim, qualquer “excesso de poderes” por parte do representante caracteriza “infração ao contrato”. Daí entendermos ter a lei se utilizado das duas expressões, para abranger categorias diferentes de pessoas que agem em nome da sociedade[30].

Em relação às infrações à lei, Kiyoshi Harada destaca:

Na prática é comum o equívoco na interpretação do inciso III, imputando-se a responsabilidade tributária aos sócios, gerentes e diretores de pessoas jurídicas de direito privado pelo não-recolhimento de créditos tributários regularmente constituídos, inclusive os escriturados pelo contribuinte-pessoa jurídica. Trata-se de rave equívoco. Nos expressos termos do caput do artigo 135, somente obrigações tributárias resultantes de atos praticados com infração de lei, como, por exemplo, contrabando ou descaminho, acarretam a responsabilização pessoal do sócio ou administrador. O atraso no pagamento de crédito fiscal regularmente constituído não configura infração do art. 135, III, do CTN, pois esse crédito não resulta de infração legal, contratual ou estatutária, nem de ato praticado com excesso de poderes.[31] (grifo nosso).

Leandro Paulsen, nesse diapasão, expressa:

Se, e somente se os dirigentes, controladores ou representantes das empresas houverem agido de modo estritamente ilícito no trato da matéria em questão, afrontando a lei, o contrato social ou estatuto – cometendo fraudes ou sonegação fiscal em termos claros e estritos – serão eles igualmente responsáveis por tais débitos. Para isso, ao autuar a sociedade, o credor tributário deve necessariamente estender a autuação aos seus dirigentes, se sinais houver desde logo desses ilícitos, de modo a que no ensejo do procedimento administrativo – que ao final vai conceder poder de inscrição e título executivo ao credor fiscal – essa responsabilização fique apurada[32].

Conclui-se, portanto, que, para que haja a responsabilização do administrador, é necessário que este esteja na administração da empresa ao tempo dos fatos geradores, e tenha praticado atos alheios aos interesses empresariais.

Infere-se ainda que, a má-fé e o dolo devem ser comprovados, ou seja, não podem ser presumidos. Não havendo provas da ilicitude, os sócios não poderão ser responsabilizados pessoalmente, conforme os ditames do artigo 135, inciso III, do CTN. Assim, ausente o requisito subjetivo dolo da conduta do sócio e/ou do administrador da pessoa jurídica, não há que se falar em responsabilidade pessoal e exclusiva.

José Soares de Melo elenca os elementos necessários para a caracterização da responsabilidade a qual trata o dispositivo em análise:

1) Elemento pessoal – refere-se ao sujeito responsável pelo crédito tributário: executor material partícipe ou mandante da infração. É o administrador da sociedade, podendo ser sócio, acionista, mandatário, preposto, empregado, diretor, gerente ou representante. Não deverão ser incluídas nesse conjunto pessoas sem poderes para decidir sobre a realização de fatos jurídicos, ou se com poderes, que, no caso concreto, não tiveram qualquer participação no ilícito;

2) Elemento fático – refere-se às condutas reveladoras de infração que exija dolo; excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatuto[33].

Hugo de Brito complementa:

Sendo assim, a violação a lei societária pode ocorrer, dando azo à responsabilização do sócio-gerente ou diretor, em dois momentos distintos. O primeiro, quando o fato gerador é praticado pelo diretor ou sócio-gerente fora de suas funções, extrapolando os limites impostos pelos atos constitutivos ou pela lei societária. É o caso, por exemplo, do sócio-gerente que realiza operação mercantil vedada pelo contrato social. O segundo, quando embora o fato gerador tenha sido realizado pela pessoa jurídica, a dívida tributária não for adimplida em virtude de ato contrário à lei societária praticado pelo diretor ou sócio-gerente, como é o caso da liquidação irregular da sociedade, do desvio de recursos desta para a pessoa natural do diretor ou quaisquer outros atos que, no dizer de Misabel Abreu Machado Derzi, embora praticados em nome do contribuinte, são contrários aos seus interesses[34].

Nesse sentido, os limites da responsabilidade dos sócios e administradores foram fixados pelo STJ nos seguintes parâmetros:

TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. EXECUÇÃO FISCAL. RESPONSABILIDADE DE SÓCIO-GERENTE. LIMITES. ART. 135, III, DO CTN. PRECEDENTES.

1. Os bens do sócio de uma pessoa jurídica comercial não respondem, em caráter solidário, por dívidas fiscais assumidas pela sociedade. A responsabilidade tributária imposta por sócio-gerente, administrador, diretor ou equivalente só se caracteriza quando há dissolução irregular da sociedade ou se comprova infração à lei praticada pelo dirigente.

2. Em qualquer espécie de sociedade comercial é o patrimônio social que responde sempre e integralmente pelas dívidas sociais. Os diretores não respondem pessoalmente pelas obrigações contraídas em nome da sociedade, mas respondem para com esta e para com terceiros, solidária e ilimitadamente, pelo excesso de mandato e pelos atos praticados com violação do estatuto ou da lei (art. 158, I e II, da Lei nº 6.404/76).

3. De acordo com o nosso ordenamento jurídico-tributário, os sócios (diretores, gerentes ou representantes da pessoa jurídica) são responsáveis, por substituição, pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes da prática de ato ou fato eivado de excesso de poderes ou com infração de lei, contrato social ou estatutos, nos termos do art. 135, III, do CTN.

4. O simples inadimplemento não caracteriza infração legal. Inexistindo prova de que se tenha agido com excesso de poderes, ou infração de contrato social ou estatutos, não há falar-se em responsabilidade tributária do ex-sócio a esse título ou a título de infração legal. Inexistência de responsabilidade tributária do ex-sócio.

5. Precedentes desta Corte Superior.

6. Embargos de divergência rejeitados.[35] (grifo nosso).

TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. REDIRECIONAMENTO AO SÓCIOGERENTE. IMPOSSIBILIDADE NA ESPÉCIE. INADIMPLEMENTO DE TRIBUTO. NÃO CARACTERIZAÇÃO DE INFRAÇÃO LEGAL. MATÉRIA OBJETO DE RECURSO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA.

1. A Primeira Seção desta Corte, ao julgar o REsp 1.101.728/SP, mediante o procedimento descrito no art. 543-C do CPC (recursos repetitivos), ratificou o entendimento no sentido de que o simples inadimplemento da obrigação tributária não caracteriza infração legal para fins de responsabilização do sócio-gerente, cabendo ao Fisco provar que o sócio agiu com excesso de poderes ou infração à lei ou ao estatuto social da empresa a fim de responsabilizá-lo.

2. Recurso especial provido.[36]

Por fim, importante destacar as palavras de Hugo de Brito Machado acerca da responsabilidade do sócio que não é o administrador:

Destaca-se desde logo que a simples condição de sócio não implica responsabilidade tributária. O que gera a responsabilidade, nos termos do art. 135, III do CTN, é a condição de administrador de bens alheios. Por isso a lei fala em diretores, gerentes ou representantes. Não em sócios. Assim se o sócio não é diretor, nem gerente, isto é, se não pratica atos da administração da sociedade, responsabilidade não tem pelos débitos tributários desta[37]. (grifo nosso).

De outra banda, infere-se que a responsabilidade pessoal esculpida pelo artigo 135, inciso III do CTN, não pode decorrer da simples falta de pagamento do tributo, como demonstrado no item a seguir.

3.1.1 Responsabilidade pelo Inadimplemento Tributário

Doutrina e jurisprudência, na sua maioria, atualmente entendem que o não pagamento do tributo não configura uma infração a lei, e sendo assim, não caberia a responsabilização de terceiros, especialmente do sócio ou administrador, nos termos do artigo 135 do CTN, na ocorrência de inadimplemento da prestação tributária.

Nesse sentido, corrobora Hugo de Brito Machado, o qual dispõe:

Se o não pagamento do tributo fosse infração da lei capaz de ensejar a responsabilidade dos diretores de uma sociedade por quotas, ou de uma sociedade anônima, simplesmente inexistiria qualquer limitação da responsabilidade destes em relação ao fisco. Aliás, inexistiria essa limitação mesmo em relação a terceiros. As leis societárias, mesmo quando limitam a responsabilidade dos sócios, atribuem aos administradores responsabilidade pelos atos praticados com violação da lei, do contrato ou estatuto. E o próprio art. 135, inciso III do Código Tributário Nacional estabelece que os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado respondem pessoalmente pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos[38].

Para Machado, a regra é que as pessoas referidas no artigo 135, inciso III, não respondem pessoalmente pelos tributos devidos pelas pessoas jurídicas de direito privado as quais se encontrem vinculadas. A exceção é que permite essa responsabilização, desde que o crédito tributário seja comprovadamente decorrente de atos praticados na forma descrita no caput do artigo 135, eis que:

Não se pode admitir que o não pagamento do tributo configure a infração de lei capaz de ensejar tal responsabilidade, porque isto levaria a suprimir-se a regra, fazendo prevalecer, em todos os casos, a exceção. O não cumprimento de uma obrigação provocaria a responsabilidade do diretor, gerente ou representante da pessoa jurídica de direito privado inadimplente. Mas tal conclusão é evidentemente insustentável. O que a lei estabelece como regra, isto é, a limitação da responsabilidade dos diretores ou administradores dessas pessoas jurídicas, não pode ser anulado por esse desmedido elastério dado á exceção[39].

Outro não é o entendimento dos tribunais brasileiros. Nesse sentido, destaca-se o Agravo Regimental no Recurso Especial número 1.057.518 – RS, de relatoria da Ministra Denise Arruda, a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça:

TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. DISCUSSÃO ACERCA DA RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DOS SÓCIOS GERENTES DA PESSOA JURÍDICA EXECUTADA. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DOMINANTE DO STJ. DESPROVIMENTO DO AGRAVO REGIMENTAL.

1. A Primeira Seção desta Corte, na assentada do dia 11 de março de 2009, ao julgar o REsp 1.101.728/SP (Rel. Min. Teori Albino Zavascki), mediante a utilização da nova metodologia de julgamento de recursos repetitivos, prevista no art. 543-C do Código de Processo Civil (introduzido pela Lei 11.672/2008), enfrentou situação semelhante à dos autos. Nessa ocasião, por unanimidade, referendou o posicionamento já reiteradamente adotado pelas Primeira e Segunda Turmas no sentido de que "a simples falta de pagamento do tributo não configura, por si só, nem em tese, circunstância que acarreta a responsabilidade subsidiária dos sócios, prevista no art. 135 do CTN".

2. No caso em apreço, em sede de apelação cível interposta nos autos de embargos à execução fiscal, o Tribunal de origem, que é soberano no exame das provas, deu provimento ao mencionado recurso para excluir os sócios embargantes do pólo [sic] passivo da execução. Tendo o Tribunal de origem decidido pela não-configuração da hipótese prevista no art. 135, III, do Código Tributário Nacional, qualquer conclusão em sentido contrário, objetivando imputar responsabilidade tributária aos sócios gerentes da pessoa jurídica devedora, demandaria, necessariamente, o reexame dos elementos fático-probatórios da causa, o que se revela inviável em sede de recurso especial, por quaisquer das alíneas do permissivo constitucional, tendo em vista o disposto na Súmula 7 desta Corte.

3. Havendo, em sede de embargos à execução fiscal, conclusão pela ausência dos pressupostos configuradores da responsabilidade tributária, afasta-se a presunção juris tantum de legitimidade da CDA. Nesse sentido: REsp 623.926/RS, 1ª Turma, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 11.10.2004; REsp 803.651/RS, 2ª Turma, Rel. Min. Castro Meira, DJ de 9.3.2007.

4. Ao contrário do que pretende fazer crer a Procuradoria da Fazenda Nacional, no julgamento do recurso especial foi considerada a circunstância de que os presentes autos tratam de embargos à execução fiscal opostos pelos sócios-gerentes.

5. Agravo regimental desprovido.[40]

No mesmo sentido, segue o julgamento dos Embargos de Declaração no Agravo Regimental no Recurso Especial 1.095.672:

EXECUÇÃO FISCAL – REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO – FALTA DE PAGAMENTO DO TRIBUTO – AUSÊNCIA DE BENS – NÃO CONFIGURAÇÃO DA RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DOS SÓCIOS –PRECEDENTES.

1. Os embargos declaratórios são cabíveis para a modificação do julgado que se apresenta omisso, contraditório ou obscuro, bem como para sanar possível erro material existente na decisão.

2. In casu, constata-se a contradição diante da comprovação dos requisitos de admissibilidade recursal, pois houve efetivo esgotamento das instâncias ordinárias.

3. Conforme jurisprudência pacífica desta Corte Superior, o mero inadimplemento ou a não-localização de bens não justificam a responsabilização tributária dos sócios, sendo necessário a comprovação de ter agido com excesso de poderes ou infração de lei. Embargos de declaração acolhidos, com efeitos modificativos, para sanar a contradição apontada e prover o recurso especial da embargante, afastando a responsabilidade tributária determinada pelo juízo de origem.[41] (grifo nosso).

Com intuito de pacificar tal discussão, o Superior Tribunal de Justiça editou a súmula 430: “O inadimplemento da obrigação tributária pela sociedade não gera, por si só, a responsabilidade solidária do sócio-gerente[42]”.

Superado o assunto, tratar-se-á no item seguinte sobre a aplicação do instituto da desconsideração da personalidade jurídica com fulcro no artigo 135, III, do CTN.

4 O INSTITUTO DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA TRIBUTÁRIA COM BASE NO ARTIGO 135, INCISO III, DO CTN

O instituto da desconsideração da personalidade jurídica é, atualmente, um instrumento de suma importância para o combate de condutas fraudulentas e abusivas que têm se tornado comum no contexto nacional, especialmente no que tange as relações jurídicas tributárias. Entretanto, não se pode perder de vista a excepcionalidade que envolve a sua aplicação, visto que somente se legitima quando devidamente comprovadas as circunstâncias autorizadoras previstas na legislação material.

No âmbito do direito tributário, a aplicação desse instituto é objeto de divergência tanto na doutrina como na jurisprudência, havendo uma corrente que defende a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica com base no artigo 135, inciso III, do CTN, e outra corrente que defende a tese de que o referido artigo não se relaciona com o instituto da desconsideração da personalidade jurídica, pois trata de responsabilização direta de terceiro.

Nesse diapasão, Eduardo Sabbag, ao abordar o tema, expõe:

O art. 135, III, do CTN permite atingir a pessoa do diretor, gerente ou representante da empresa à luz da ´teoria da desconsideração da pessoa jurídica´. No entanto, a regra é a personificação jurídica da sociedade e, por isso, esta é quem deve responder pelas obrigações sociais. Assim, a indagada teoria, prevista no art. 50 do Código Civil, deve suscitada em caráter excepcional, ou seja, apenas no caso de o administrador (sócio-gerente) se valer do véu da personalidade jurídica para, agindo com má-fé, prejudicar credores da sociedade.[43] (grifo nosso).

Assim, entendendo que o artigo 135, III, do CTN, reporta-se à desconsideração da personalidade jurídica, destacam-se alguns julgados:

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO - INOCORRÊNCIA DE LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO - VÍNCULO FAMILIAR - DESCONSIDERAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA.

1. As hipóteses de configuração de litisconsórcio necessário estão no artigo 47 do CPC, o qual exige imposição de lei, ou a existência de vínculo natural, pela natureza da relação jurídica.

2. A base fática da demanda descarta a existência de liame entre os litisconsortes, de relevância para o desfecho da causa, sendo certo que o fato de pertencerem os litisconsortes a uma só família não os coloca na mesma relação jurídica discutida nos autos.

3. Examinada a lei aplicável à espécie, o CTN, o primeiro diploma do direito pátrio a consagrar a teoria da desconsideração da pessoa jurídica, não se encontra, nas hipóteses do artigo 134 do CTN, determinação legislativa justificadora do litisconsórcio.

4. Recurso especial provido.[44] (grifo nosso)

TRIBUTÁRIO – CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA DEVIDA PELO TOMADOR DE SERVIÇO – ART. 22, IV DA LEI 8.212/91 – VIOLAÇÃO DO ART. 135 DO CTN: INOCORRÊNCIA.

1. O legislador, ao exigir do tomador do serviço contribuição previdenciária de 15% (quinze por cento) sobre o valor bruto da nota fiscal ou fatura de prestação de serviços que lhe são prestados por cooperados por intermédio de cooperativa de trabalho, nos termos do art. 22, IV da Lei 8.212/91 (com a redação dada pela Lei 9.876/99), em nenhum momento valeu-se da regra contida no art. 135 do CTN, que diz respeito à desconsideração da personalidade da pessoa jurídica para que seus representantes respondam pessoalmente pelo crédito tributário nas hipóteses que menciona.

2. A referência a "cooperados" contida no art. 22, IV da Lei 8.212/91 diz respeito tão-somente ao fato de que, embora firmado o contrato com a cooperativa de trabalho, o serviço, efetivamente, é prestado pela pessoa física do cooperado.

3. Inexistência de ofensa ao art. 135 do CTN.

4. Recurso especial improvido.[45] (grifo nosso).

AGRAVO DE INSTRUMENTO - REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO FISCAL CONTRA O SÓCIO GERENTE - "EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE" NÃO ACOLHIDA - DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA SOCIEDADE - RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA - PRESCRIÇÃO - INOCORRÊNCIA - RECURSO IMPROVIDO. O encerramento das atividades empresariais sem a devida comunicação ao órgão estadual competente e o não pagamento dos tributos devidos constituem forte indício de infração à lei, autorizando a desconsideração da personalidade jurídica da executada e o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente, eis que preenchidos os requisitos mencionados para ocorrer a responsabilidade tributária prevista no art. 135, III do Código Tributário Nacional, daí porque cabe a rejeição da chamada "exceção de pré-executividade" em que se discute essa circunstância. "A prescrição, em se tratando de redirecionamento da execução fiscal contra o sócio-gerente, aperfeiçoa-se no prazo de cinco anos, computados entre a citação da pessoa jurídica e a do sócio, no afã de mitigar a regra do art. 40 da Lei n. 6.830/80, harmonizando o aludido instituto com as hipóteses previstas no art. 174 do CTN, de modo a não tornar imprescritível a dívida fiscal (...)" (TJSC, AC n. , de Itajaí, Rel. Des. Vanderlei Romer, julgada em 12/12/2008).

(TJ-SC - AI: 683750 SC 2008.068375-0, Relator: Jaime Ramos, Data de Julgamento: 22/02/2012, Quarta Câmara de Direito Público, Data de Publicação: Agravo de Instrumento n. , da Capital)[46] (grifo nosso).

De outro lado, entendendo de maneira contrária ao acima exposto, defendem alguns juristas que o art. 135, III, do CTN não possui a capacidade de permitir formas de desconsideração da personalidade jurídica, razão pela qual tal dispositivo não de relaciona com este instituto.

Nesse sentido, Tôrres registra:

[...] este não diz mais do que uma forma de atribuição de responsabilidade pessoal a determinados sujeitos pelos créditos de obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos, mas não perante o Fisco, e sim perante aquelas pessoas que eventualmente os representem, a saber: i) por uma das pessoas referidas no artigo 134 (contra aquelas por quem respondem os terceiros responsáveis constantes do referido artigo); ii) pelos mandatários, prepostos e empregados (contra seus mandantes, preponentes ou empregadores). Ou iii) os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado (contra as pessoas jurídicas de direito privado das quais são diretores, gerentes ou representantes). Ilude-se quem pense que este artigo justifica alguma condição de procedibilidade para a desconsideração de atos, negócios ou pessoas jurídicas, e do mesmo modo aqueles que julgam ser uma atribuição de responsabilidade perante o Fisco. É certo que este artigo supõe o cumprimento das obrigações tributárias, para que posteriormente tais pessoas possam questionar o que pagaram a mais ou indevidamente não do Fisco, posto o limite do art. 118 do CTN, mas sim diretamente de tais pessoas que deram causa àquela cobrança a mais, por atos negociais. E para o caso de eventuais multas aplicáveis, o art. 137, III, não reserva distinta sorte, se não o mesmo tratamento aplicável aos tributos devidos, nos moldes do art. 135 do CTN, tal como mencionado acima[47]. (grifo nosso).

Confirmando a tese, expressa Silva:

Não se pode deduzir do art. 135, III, do CTN que este encerre a teoria da desconsideração da personalidade jurídica pois apenas cuida da responsabilidade pessoal daqueles que representam a pessoa jurídica quando agem com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos.[48]

Nestes termos, tem-se que a responsabilidade tributária esculpida pelo artigo 135, III, do CTN, é atribuída exclusivamente aos terceiros responsáveis, sendo desnecessária a suspensão temporária da eficácia dos atos constitutivos da pessoa jurídica, para desconsiderando a separação patrimonial existente entre essa e seus sócios ou administradores, responsabilizar esses, de forma ilimitada, pelas obrigações tributárias da pessoa jurídica.

Corrobora, assim, Luciano Amaro:

O Código Tributário Nacional (CTN) prevê, no art. 135, situações em que, por abuso do representante legal da pessoa jurídica, ele é pessoalmente responsabilizado por obrigações tributárias que, formalmente, seriam da empresa. Exemplos de responsabilidade subsidiária são dados pelos arts. 133, II, e 134.

[...]

Portanto, quando a lei cuida de responsabilidade solidária, ou subsidiaria, ou pessoal dos sócios, por obrigações da pessoa jurídica, ou quando ela proíbe que certas operações, vedadas aos sócios, sejam praticadas pela pessoa jurídica, não é preciso desconsiderar a empresa, para imputar as obrigações aos sócios, pois, mesmo considerada a pessoa jurídica, a implicação ou responsabilidade do sócio já decorre de preceito legal.[49] (grifo nosso).

Acrescenta, no mesmo norte, Heleno Taveira Tôrres:

Como visto, o art. 135 não resguarda qualquer equivalência com controle sobre simulação, interposição fictícia de pessoas ou de fraude à lei, que podem se alegadas a qualquer tempo (art. 149, VII, do CTN), como justificativa para o auto de infração ou lançamento sobre os sócios de pessoas simuladas ou sujeitos interponentes, quando provada a simulação ou a fraude. Nestes termos, o art. 135, do CTN, ao não se prestar como mecanismo de superação do modelo de separação patrimonial adotado pela legislação mercantil, não pode ser alegado para tais fins.[50] (grifo nosso).

Do último entendimento elencado, extrai-se que o artigo 135 do CTN, não guarda semelhança com o instituto da desconsideração da personalidade jurídica, uma vez que tal dispositivo implica na aplicação da responsabilidade por substituição e de modo pessoal e exclusivo ao terceiro (sócio-gerente ou administrador) que agiu com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos. Assim, desnecessário desconsiderar a personalidade jurídica autônoma do ente coletivo para promover essa responsabilização.

Ademais, as hipóteses do artigo 135, III, do Código Tributário restringem-se a responsabilidade por obrigações tributárias que resultem de ato praticado pelos dirigentes ou representantes legais das empresas quando atuam com excesso de poderes ou quando suas deliberações não estão em consonância com o objeto do contrato ou do estatuto social em prejuízo dos credores. Já a desconsideração da personalidade jurídica, instituída no Código Civil, poderá ter um alcance mais amplo, pois abrange todas as relações jurídicas em que tenha havido desvio de finalidade, confusão patrimonial ou abuso de direito através da manipulação indevida da pessoa jurídica.

Importante salientar que, autores como Leandro Paulsen, defendem que a desconsideração da pessoa jurídica deve ser aplicada no direito tributário com base no artigo 50 do Código Civil Brasileiro[51], que estabelece uma regra geral de conduta, rechaçando a aplicação do artigo 135, III, do CTN. Assim, o referido autor expressa:

A dissolução irregular tem sido considerada como causa para o redirecionamento porque se presume, em tal caso, a confusão de patrimônios, com locupletamento dos sócios. Não seria o caso, contudo, de invocação do art. 135, III, do CTN, porquanto o crédito tributário não decorre da dissolução irregular. Mais pertinente é o art. 50 do Código Civil de 2002: ‘Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica’.[52]

Da mesma forma, Ricardo Mariz de Oliveira:

“No passado, vários casos tributários levados ao julgamento dos tribunais foram decididos através da desconsideração de personalidades jurídicas, mesmo sem lei expressa, ao passo que o novo art. 50, acima referido, iguais soluções poderão ser proferidas com fundamento mais sólido.”[53]

Colaciona-se abaixo, julgados que enquadram o artigo 135, III, como hipótese de responsabilidade tributária por substituição, e não como desconsideração da personalidade jurídica:

PROCESSO CIVIL E RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DO SÓCIO-GERENTE (ART. 135, CTN). DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO LEGAL: OMISSÃO NO RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS. RESPONSABILIDADE PESSOAL E SOLIDÁRIA DO SÓCIO-GERENTE. INDEVIDA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. LEGITIMAÇÃO AD CAUSAM PASSIVA. CONFIGURAÇÃO. PRECEDENTES DA CORTE (AC 96.01.49173-2/PI E AC 93.01.35326-1/MG) E DO STJ (RESP 7387/91, PR). 1. O descumprimento de obrigação legal relativa a fatos geradores contemporâneos à gerência do sócio, torna-o legitimado passivamente para a execução, ante a configuração de sua responsabilidade pessoal e solidária, decorrente da infração à lei (art. 135, CTN). 2. Título executivo, não impugnado, usufrui da presunção de certeza e liquidez, somente passível de afastamento mediante prova robusta, em sentido contrário, a cargo da parte executada. 3. Configuração da legitimidade passiva ad causam do sócio-gerente. 4. Provimento do apelo. Reforma da sentença. 5. Remessa prejudicada. (TRF-1 - AC: 63018 BA 1997.01.00.063018-1, Relator: JUIZ CANDIDO RIBEIRO, Data de Julgamento: 14/09/2000, TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: 15/12/2000 DJ p.48).[54]

Destarte, observa-se que jurisprudência e doutrina não são pacificas a respeito da aplicabilidade do instituto da desconsideração da personalidade jurídica no direito tributário, em especial ao artigo 135 do CTN. Como mencionado, há quem sustente a impossibilidade de sua aplicação em face do princípio da tipicidade que rege o direito tributário, outros afirmam que a existência de regra genérica consagrando o instituto permite sua aplicação também no que tange ao direito tributário, o que gera relevante instabilidade nas relações jurídicas.

Nesse condão, infere-se que, a ausência de patrimônio da sociedade, por si só, não é motivo suficiente para ensejar a aplicação da superação da autonomia patrimonial da pessoa jurídica bem como a responsabilização dos seus sócios ou administradores pelas obrigações sociais.

Entretanto, não é o que se vê na prática forense, uma vez que podemos encontrar decisões de toda sorte nos tribunais brasileiros, haja vista que o próprio Superior Tribunal de Justiça e parte considerável dos outros tribunais têm se manifestado, equivocadamente, no sentido de que o artigo 135, III, do Código Tributário Nacional corresponde à consagração do instituto da desconsideração nesse ramo do direito.

5 CONCLUSÃO

O artigo 135 do Código Tributário Nacional prevê a possibilidade de ser responsável pela dívida tributária de uma sociedade, o sócio ou o administrador, desde que este tenha praticado atos de gerência com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos.

A simples falta de pagamento do tributo não enseja a responsabilização do administrador, sendo indispensável que tenha este agido dolosamente, com ilegalidade ou infração de lei.

Em relação à responsabilidade do sócio, denota-se que para que seja a ele imputada a responsabilidade tributária, preponderante que esteja revestido na condição de administrador da empresa à época do fato gerador, pois a simples condição de sócio não é o suficiente para caracterizar a responsabilidade disposta no artigo 135 do Código Tributário Nacional, como disposto no próprio texto de lei.

Uma vez comprovado o ato praticado com excesso de poderes ou infração à lei, contrato social ou estatuto, o agente causador do dano (terceiro responsável) deve ser pessoalmente e exclusivamente responsabilizado no que tange a totalidade da obrigação tributária, podendo inclusive ser atingido seu patrimônio pessoal para o adimplemento da dívida fiscal da sociedade. Assim, será mantido no polo passivo da demanda apenas a figura do responsável, que substituirá o contribuinte.

Ainda, como exposto no decorrer deste trabalho, observa-se que parte da doutrina e da jurisprudência manifesta-se no sentido da aplicação do instituto da desconsideração da personalidade jurídica com fulcro no artigo 135, do CTN. De outra banda, há quem defenda que o referido dispositivo em nada se relaciona com o instituto da desconsideração da personalidade jurídica, pois o Código Tributário Nacional, ao determinar a responsabilidade tributária dos administradores e sócios, estabelece de modo expresso, a responsabilidade a terceiro, ou seja, não está desconsiderando a personalidade jurídica e sim elegendo legalmente e diretamente o responsável pela obrigação tributária.

Diante desta divergência, hodiernamente, no cotidiano forense, encontram-se, facilmente, entendimentos conflitantes, o que traz insegurança e instabilidade às relações jurídicas, especialmente aos que litigam nesta matéria.

REFERÊNCIAS

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Sobre a autora
Silvia Avila Nunes

Advogada. Bacharel em Direito e Relações Internacionais, especialista em Direito Tributário, pós-graduanda em Direito Constitucional.

Informações sobre o texto

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