Estatuto do idoso

27/01/2016 às 23:42

Resumo:


  • O Estatuto do Idoso, instituído pela Lei nº 10.741 de 2003, foi um marco legal para a proteção dos direitos dos idosos no Brasil, estabelecendo medidas para garantir sua dignidade e bem-estar.

  • Entre os direitos assegurados pelo Estatuto estão a prioridade no atendimento, a garantia de vagas em transportes coletivos e a proibição de discriminação em planos de saúde por faixa etária.

  • A legislação também contempla a possibilidade de ações coletivas para a defesa dos interesses dos idosos, atribuindo ao Ministério Público e a outras entidades legitimidade para atuar nesse sentido.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

A legislação brasileira apesar de, aparentemente, proteger e proporcionar melhor qualidade de vida ao idoso, podendo, inclusive, ser tida como uma das melhores do mundo, na sua prática, não condiz com a realidade apresentada.

  1. ESTATUTO DO IDOSO

A Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003, publicada em Diário oficial da União do dia 03 de outubro de 2003, que instituiu o Estatuto do Idoso, foi um projeto de Lei de autoria do Senador Paulo Paim.

Como instrumento de cidadania e pontapé inicial de formação consciente da dignidade dos integrantes da terceira idade, o Estatuto do Idoso foi fundamental para traçar e fornecer os meios de controle do Poder Público em relação ao melhor tratamento do idoso, e verdadeira educação cidadã, tornando-se um marco histórico-social, no sentido de que os idosos alcancem a posição efetiva na sociedade.

O advento do Estatuto do Idoso representou uma mudança no paradigma de toda legislação existente até o momento, já que caracterizou a igualdade material em prol da ampliação do sistema protetivo dos que fazem a Terceira Idade.

De acordo com Uvo e Zanatta (2005):

 O Estatuto do Idoso constitui um marco legal para a consciência idosa do país, já que a partir dele, os idosos poderão exigir a proteção aos seus direitos.[1]

Na mesma linha doutrinária, Neri (2005) ressalta que políticas de proteção social, baseadas em suposições e generalizações indevidas, podem contribuir para o desenvolvimento ou a intensificação de preconceitos negativos e para a ocorrência de práticas sociais discriminatórias em relação aos idosos.

Para Ceneviva (2004), o Estatuto do Idoso, estabelece prioridade absoluta às normas protetivas ao idoso, elencando novos direitos e estabelecendo vários mecanismos específicos de proteção os quais vão desde precedência no atendimento ao permanente aprimoramento de suas condições de vida, até a inviolabilidade física, psíquica e moral. Corroborando essa assertiva, Uvo e Zanatta (2005), ressaltam que o Estatuto constituiu um marco legal para a consciência idosa do país, já que a partir dele, os idosos conseguiram uma legislação que garante os seus direitos.

Apresentando o conceito de direito e ao mesmo tempo visualizando a fórmula apresentada pelo filósofo do Direito Miguel Reale. O conceito analítico de Direito, Segundo Miguel Reale:

“pressupõe três elementos, que são fato, valor e norma, que se analisa por meio de três aspectos inseparáveis e distintos entre si: o axiológico - que envolve o valor de justiça, o fático - que trata da efetividade social e histórica e o normativo - que compreende o ordenamento, o dever-ser”. [2]

Tais elementos se relacionam em harmonia, em coordenação, produzindo resultados concretos e visíveis no meio social.

No Estatuto do Idoso aplica-se a teoria tridimensional. Por exemplo: o fato trata de questões relacionadas à saúde pública e atentados reiterados à dignidade da pessoa idosa; o valor do reconhecimento de que o idoso contribuiu para a formação dos mais jovens e do País, bem como na indignação diante da discriminação, que justifica a produção e a aplicação da norma, enunciada no Estatuto do Idoso; por último pela norma que é levada por meio de vários instrumentos em nosso Direito, sendo a Lei o veiculo primordial.

Em nosso ordenamento jurídico os poderes constituídos e os membros da comunidade política somente podem interferir nos comportamentos individuais e coletivos se forem previamente autorizados pela vontade geral, enunciada por representantes do povo, ou seja, membros do Poder Legislativo. Essas interferências visam sempre o bem da vida, aqui entendidos de forma ampla, englobando não só os bens de ordem material, mas outros como a dignidade, a honra, a privacidade, etc. e são impostas de forma geral. O legislador, ao criar o Estatuto do Idoso teve interesse em tutelar o bem da vida, demonstrando a sua proteção por norma expressa no Artigo 99 do referido estatuto:

EI – Art. 99 - Expor a perigo de vida, a integridade e a saúde, física ou psíquica, do idoso, submetendo-o a condições desumanas ou degradantes ou privando-o de alimentos e cuidados indispensáveis, quando obrigado a fazê-lo ou, ainda,sujeitando-o a trabalho excessivo ou inadequado.

O Estatuto do Idoso faz parte do sistema normativo e por sistema entende-se o conjunto de elementos que interagem de forma coordenada entre si e com o todo em que se implantam. Em nosso sistema jurídico, convivem normas de hierarquia e densidade diversas. A Lei Maior, a Constituição Federal de 1988, ocupa a posição mais destacada, lançando as normas fundamentais do sistema: princípios e regras que orientam a produção, a interpretação e a execução das leis que tratam da matéria. Subordinados à Constituição estão os demais textos de caráter normativo. O Estatuto do Idoso é Lei Ordinária e assim é chamado em razão do procedimento de sua elaboração, sendo este procedimento destinado à elaboração da maior parte das leis e também o mais demorado, pois permitir vários reexames.

As normas devem conviver em harmonia para compor um sistema equilibrado e eficaz de proteção do bem jurídico, que no caso estudado é a dignidade do idoso.

Hans Kelsen, jurista austríaco que revolucionou a ciência do Direito ao definir este como um sistema de normas de estrutura hierarquizada e piramidal afirma que:

A estrutura lógica da ordem jurídica é piramidal, uma vez que as normas, que são os seus elementos constitutivos, são colocadas pela ciência do direito sob a forma de uma pirâmide, estabelecendo uma hierarquia, uma relação de subordinação, de tal modo que a norma do escalão inferior se harmonize com a que lhe seja imediatamente superior. Logo, o fundamento de validade de uma norma apenas pode ser a validade de uma outra, figurativamente, designada como norma superior, por confronto com uma norma que é, em relação a ela, a norma inferior.[3]

Os princípios constitucionais são os norteadores do Direito e nesses princípios estão inseridos o principio da dignidade da pessoa humana e o da igualdade. Esses princípios impulsionaram os legisladores para a construção de diplomas legais como o Estatuto do Idoso.

Até a implantação do Estatuto do Idoso somente contávamos com a Lei nº 8.842/94, que traçava apenas diretrizes de política em relação ao idoso, deixando muito a ser regulamentado. O Estatuto do Idoso, com 118 artigos em seu bojo, introduziu algumas novidades almejadas há tempos pela sociedade, como por exemplo, o salário mínimo mensal aos cidadãos com 65 anos de idade. O Estatuto não trouxe apenas benefícios, mas também o tratamento adequado que deve ser prestado pelos seus familiares para com elas.

Na sua totalidade, o Estatuto pode ser considerado um microssistema jurídico, já que possui normas que levam em conta as peculiaridades do grupo, permitindo uma visão em conjunto dos aspectos de proteção aos idosos.

Observa-se que a Lei nº. 8.842/94 instituiu a Política Nacional do Idoso, com diretrizes de atuação do Poder Público no atendimento aos direitos sociais das pessoas que vivem a chamada Terceira Idade, porém, a regulamentação das disposições constitucionais, princípios e regras, advieram com a aprovação do Estatuto do Idoso.

A função primordial do Estatuto do Idoso foi funcionar como carta de direitos, fornecendo meios de controle do Poder Público em relação ao melhor tratamento do idoso e demonstrar que a pessoa com mais idade em nosso país também tem direito ao respeito e a dignidade.

Do ponto de vista legal, é um relevante instrumento normativo, pois foi criado visando disciplinar os direitos desta importante parcela da população que cresce dia a dia, considerando o aumento da expectativa de vida.

Apesar das repetições de normas existentes no Estatuto do Idoso, este não deixa de ser um diploma legal moderno e em conformidade com as mudanças históricas, políticas e sociais pelas quais estamos passando.

  1. Resgate da Dignidade Perdida

No momento atual, a dignidade humana é o principal alicerce de qualquer ordenamento jurídico; é a finalidade da criação do direito, o ponto de partida e de chegada do Principio Geral do Direito.

Assíduo em todas as Constituições, na Constituição Brasileira se encontra como um de seus fundamentos, prevista n o artigo 1°, inciso III:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

 I - a soberania;

 II - a cidadania

 III - a dignidade da pessoa humana;

IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

V - o pluralismo político.

Percebe-se que a dignidade da pessoa humana foi elencada pelo legislador constituinte no mesmo patamar que a soberania e a cidadania. A dignidade, assim, é mais do que uma questão legal, é uma questão de princípios, é uma questão social e cultural. Através dos níveis de dignidade que uma sociedade oferece aos seus cidadãos, particularmente neste caso, aos idosos, é que se revela sua maturidade e evolução.

Aduz-se que a dignidade não só do idoso, mas de todo ser humano, se faz pela interação entre leis, governo, sociedade e família.

Com um prolongado tempo de tramitação, como se a matéria não fosse de urgência, no dia 1º de Outubro de 2003, foi promulgado o Estatuto do Idoso, vindo resgatar a dignidade perdida do idoso que, até 1994, com a Política Nacional do Idoso, estava esquecido em algumas páginas da nossa Constituição, fazendo dessa, não a Magna Carta, mas apenas uma Carta de Intenções.

O lançamento da Política Nacional do Idoso já se fazia anúncio de que algo deveria ser feito pela dignidade do idoso no nosso país.

Apesar de que muitos autores e políticos discordem e preceituem que tal dignidade teria que ser algo natural, em países como o nosso isso se torna uma utopia, necessitando, sim, da imposição de leis e de fiscalização e, todas as vezes que precisamos de lei, para efetivar o Direito Constitucional, é sinal de que o país não respeita a sua Constituição.

Acredita-se que a dignidade do idoso se faz necessária para o desenvolvimento do país, sua história, seus costumes e seus valores.

Reconduzir ao idoso a sua dignidade é dar ao jovem de hoje a certeza de uma vida digna amanhã. A partir do Estatuto, a dignidade do idoso, passou a ser um compromisso civilizatório do povo brasileiro, assim afirmado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no ato de sua promulgação.

Percebe-se que existe uma divergência entre dignidade e caridade, bem como solidariedade e assistência, que trazem em si um conteúdo pejorativo de hipossuficiência. Como ressalta a professora Dayse Coelho de Almeida:

A velhice não torna o ser humano menos cidadão que outro, ou menos importante para a sociedade, a experiência galgada pela vivência é algo que não se aprende em bancos universitários, algo que não se alcança com vigor físico. Garantir dignidade aos idosos é ao mesmo tempo humanístico e egoístico. Humanístico por que a humanidade tem muito a aprender com eles e necessita de sua experiência, e egoístico, porque, só assim podemos garantir a dignidade para nós mesmo, porque os sobreviventes da adolescência certamente irão tornar-se idosos e, é este o nosso futuro.[4]

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Para o idoso, a demora do trâmite legislativo do Estatuto foi muito tempo, mas isso pode ser ainda mais agravante se pensarmos que tal Estatuto pode ser apenas um paliativo para a situação do idoso no país.

  1. Competência

Considerando o idoso autor ou réu, o artigo 80 do Estatuto do Idoso estabelece, de forma absoluta, que, nas ações civis, o foro da demanda será o domicilio deste. O Legislador buscou, com essa medida, propiciar ao idoso uma maior proteção, facilitando-lhe o acesso. Mas, em muitos casos pode ocasionar-lhe prejuízos, pois, sendo competência absoluta, não se prorroga, e a causa poderia trazer ao idoso maiores benefícios se, por exemplo, ocorresse no domicílio do réu. Ora, embora seja de se presumir que o aforamento da demanda seja mais benéfico ao idoso se for feito no foro de seu domicílio, isso não pode ser tido como uma verdade absoluta. É perfeitamente possível imaginar que um idoso prefira aforar a demanda no foro do domicílio do réu ou no local do fato, por ser, dessa forma, mais fácil a colheita da prova, por exemplo ou oitiva de testemunhas e, portanto, mais célere o processo.

Outra indagação angustiante, que logo irá exigir um posicionamento do Supremo Tribunal Federal diz respeito ao conflito de competências quando estiverem envolvidos interesses de idosos e menores numa mesma causa, sendo estes últimos prontamente tutelados pelo texto constitucional no seu artigo 227, que dispõe:

Artigo 227 - É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

  1.  Avanços e retrocessos do Estatuto do Idoso

O Estatuto do idoso vem legislar com prodigalidade em benefício do cidadão idoso, concedendo proteção e direitos a pessoa idosa, promovendo a fiscalização do cumprimento desses direitos. No que diz respeito a legislação, o idoso no Brasil está bem amparado, entretanto não é correto pensar que todos os problemas relacionados aos idosos estão resolvidos. Embora com todo esse aparato jurídico, são poucas as ações postas em prática e efetivamente em vigor.

1.3.1 Enfoques Positivos

A legislação vigente no Brasil é considerada uma das mais atuais e modernas em todo o mundo. Dentre vários aspectos positivos na proteção da velhice, disciplinada pelo Estatuto do Idoso, ressaltamos:

a) Adequação das empresas prestadores de serviços, para abrigar pelo menos 20% do seu quadro com pessoas maiores de quarenta e cinco anos;

b) Atendimento Preferencial e Imediato, junto a órgão públicos e privados;

c) Fornecimento pelo Estado de medicamentos e instrumentos de reabilitação e tratamento;

d) Vagas em estacionamento;

e) Vagas de transportes coletivos gratuitos;

f) Vedação de reajuste de plano de saúde, em razão de faixa etária;

g) Salário Mínimo mensal, aos idosos com mais de sessenta e cinco anos, dois anos a menos que a Lei Orgânica da Assistência Social; e

h) Sistema de cotas: no percentual de 3% (três, por cento) nas moradias construídas com recursos federais;

Percebe-se que esse rol não é taxativo, mas apenas algumas das principais vantagens que, no dia-a-dia, o idoso pode fazer uso para melhorar sua condição de vida e de saúde.

1.3.2 Enfoques Negativos

Com a publicação do Estatuto do Idoso, a principal crítica recai sobre a alteração que o instituto fez, ao se referir ao artigo 182 do Código Penal, no artigo 183, III do mesmo diploma legal. Segundo a doutrina pátria, tal alteração aparece como uma forma de discriminação, pois, com o intuito de proteger o idoso, retira-lhe a opção de representar contra o agente nos crimes patrimoniais, mesmo que esses venham a ser cometidos por filho ou outro parente próximo. Entende-se tal disposição como discriminatória porque não dá ao idoso condições de exercer a sua vontade, representando, ou não, como melhor lhe aprouver.

Art. 182/CP - Somente se procede mediante representação, se o crime previsto neste título é cometido em prejuízo:

I - do cônjuge desquitado ou judicialmente separado;

II - de irmão, legítimo ou ilegítimo;

III - de tio ou sobrinho, com quem o agente coabita.

 Art. 183/CP - Não se aplica o disposto nos dois artigos anteriores:

III – se o crime é praticado contra pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos.

Por outro lado há critica de que, caso a pessoa, sujeito passivo de delito contra o patrimônio, tenha cinqüenta e nove anos, não será beneficiada.

1.4 Tutela Coletiva

A previsão da possibilidade de propositura de ações coletivas no Brasil é recente. A Lei da Ação Civil Pública, de 1985, foi a primeira a tratar efetivamente do tema, inaugurando uma nova fase do processo civil, em que se começa a abandonar a visão individualista do processo e passa-se a vê-lo como apto a tutelar também interesses coletivamente considerados.

Todavia, tal ação não era suficiente para assegurar uma efetiva tutela dos interesses coletivos; primeiro, porque o seu objeto era limitado, se restringindo, naquela época, às matérias concernentes ao patrimônio público e à moralidade administrativa (não podendo, por conseguinte, a ação ser utilizada para proteção da infância e da juventude, dos direitos dos consumidores, de classes de trabalhadores, entre outros); e,segundo,porque o cidadão geralmente se encontrava em situação de desvantagem perante os entes públicos réus na ação popular, que invariavelmente possuíam melhores recursos para se defender adequadamente em juízo.

Destaca-se que, o Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003) criou uma série de normas protetivas às pessoas maiores de sessenta anos, bem como regulamentou o uso da ação civil pública para a defesa dos interesses desses indivíduos.

Este Estatuto é extremamente inovador. Pela 1ª vez se define com precisão a figura do idoso, se disciplinam de maneira sistemática os seus direitos, e principalmente, a forma de garantia, tanto individual como coletiva, no plano civil, administrativo e criminal de todos os direitos titularizados por idosos.

No capítulo III, especificamente no título V, situamos geograficamente a proteção coletiva no Estatuto do Idoso.  No título adiante mencionado (que trata do acesso à justiça) dispomos do capítulo I com as disposições gerais, do capítulo II tratando do papel do Ministério Público atuando no Estatuto do Idoso e, por fim, do capítulo III que cuida do procedimento coletivo.

Antes de entrar no tema proteção coletiva propriamente dita, devemos fazer alguns comentários sobre os capítulos I e II desse título. O legislador, a partir do artigo 69 do Estatuto do Idoso, estabelece as disposições gerais com relação à proteção do idoso.

Idoso, esclareça-se, na forma do artigo 1º, é todo aquele que tem idade igual ou superior a 60 anos.

No capítulo I do título V encontramos duas grandes garantias para o idoso. A primeira está no artigo 70, que determina a criação, sempre que possível, de varas especializadas para o atendimento do idoso, assim como nós já temos as varas especializadas de proteção à infância e à juventude, as varas especializadas para proteção do consumidor, em alguns lugares as varas especializadas para proteção do meio ambiente, nós teremos agora varas especializadas para proteção do idoso. E, vale dizer, essa determinação, por via de consequência, atinge também o Ministério Público. É extremamente saudável que sejam criadas Promotorias especializadas na defesa dos direitos dos idosos.

A segunda garantia está prevista no artigo 71, e consiste no direito de prioridade para todos os processos que versem sobre direitos de pessoas consideradas idosas.

Essa prioridade é assegurada no caput do artigo 71 e é ainda resguardada nos quatro parágrafos que acompanham esse mesmo dispositivo.

Art. 71. É assegurada prioridade na tramitação dos processos e procedimentos e na execução dos atos e diligências judiciais em que figure como parte ou interveniente pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos, em qualquer instância.

        § 1º O interessado na obtenção da prioridade a que alude este artigo, fazendo prova de sua idade, requererá o benefício à autoridade judiciária competente para decidir o feito, que determinará as providências a serem cumpridas, anotando-se essa circunstância em local visível nos autos do processo.

        § 2º A prioridade não cessará com a morte do beneficiado, estendendo-se em favor do cônjuge supérstite, companheiro ou companheira, com união estável, maior de 60 (sessenta) anos.

        § 3º A prioridade se estende aos processos e procedimentos na Administração Pública, empresas prestadoras de serviços públicos e instituições financeiras, ao atendimento preferencial junto à Defensoria Publica da União, dos Estados e do Distrito Federal em relação aos Serviços de Assistência Judiciária.

        § 4º Para o atendimento prioritário será garantido ao idoso o fácil acesso aos assentos e caixas, identificados com a destinação a idosos em local visível e caracteres legíveis.

Essa prioridade não cessa com a morte do beneficiado; ao contrário, se perpetua para que também sejam atendidos os interesses do seu cônjuge ou de seus herdeiros; se aplica a todo e qualquer procedimento administrativo ou judicial, em qualquer esfera que se encontre.

Os órgãos judiciários terão que promover dentro dessas varas especializadas, condições apropriadas para que o idoso possa ter acesso. Isso porque, muitas vezes a pessoa idosa já conta com uma deficiência visual, auditiva ou locomotora, o que demanda a utilização de métodos audiovisuais e treinamento específico dos serventuários.

Não por acaso, entre o capítulo I, que trata as disposições gerais do acesso à justiça, e o capítulo III que trata do procedimento e da defesa dos interesses coletivos, encontramos, no capítulo II, o Ministério Público.

Desde a Constituição de 1988 a defesa dos interesses coletivos sempre esteve intimamente relacionada com a instituição do Ministério Público. Basta mencionar que o único dispositivo da Constituição que trata especificamente de ações civis públicas não está no artigo 5º. A ação civil pública no texto constitucional está inserida no artigo 129, inciso III, o que denota claramente a intenção do legislador em atrelar o Ministério Público à defesa dos interesses coletivos.

Posteriormente, o legislador ao editar o Estatuto do Idoso, confirma essa postura.

Existem alguns pontos nesse capítulo II que chamam a atenção; uns por demonstrar que o legislador está ratificando a opinião que havia expressado em outros diplomas legais, e outros por gerar uma verdadeira inovação.

Encontramos, por exemplo, no artigo 74, inciso II, que compete ao Ministério Público promover a acompanhar ações de alimentos e interdição total ou parcial, com a designação de um curador especial em circunstâncias que justifiquem a medida.

Sempre houve uma discordância enorme da doutrina brasileira quanto à possibilidade do Ministério Público ajuizar uma ação de alimentos. Por outro lado, sempre houve consenso de que ele funcionaria como fiscal da lei, na tutela dos interesses do alimentando, mas não que o Ministério Público pudesse ajuizar uma ação de alimentos.

Já em relação ao § 1º do artigo 74 repete a redação constitucional; a legitimidade do Ministério Público para as ações civis não impede a de terceiros.

A regra do direito brasileiro é sempre a legitimidade concorrente para as ações civis; a figura da legitimidade privativa do Ministério Público fica restrita a área penal, ressalvadas obviamente as hipóteses de ação penal privada.

Outras observações: trata-se do §2º do artigo 74 dispõe que essas atribuições aqui elencadas não excluem outras que possam surgir e sejam com elas compatíveis, e que, por fim, o membro do Ministério Público tem livre acesso a qualquer entidade de atendimento ao idoso.

É importante ressaltar aqui que o legislador não fez distinção entre ser uma instituição pública ou privada; se ela abriga idosos, se ela tem essa finalidade, ela está automaticamente sob a supervisão do Ministério Público e o ingresso do membro do Ministério Público, obviamente no exercício de suas funções, não pode ser embaraçado em hipótese alguma.

No capítulo III do título V, que se inicia no artigo 78 e vai até o artigo 92 da Lei nº 10.741/93, Estatuto do Idoso retrata da proteção judicial dos interesses difusos, coletivos, individuais indisponíveis ou homogêneos.

O Estatuto do Idoso vai além e prevê a legitimidade para a defesa de um direito individual indisponível, que não seja homogêneo; em outras palavras, um direito essencialmente individual.

Isso se dá pela relevância do direito e pela presumida incapacidade da parte, o que nos remete ao conceito já tradicional do artigo 82, inciso I, do CPC, e aplicável às hipóteses de intervenção do Ministério Público no processo civil tradicional.

Art. 82/CPC - Compete ao Ministério Público intervir:

I - nas causas em que há interesses de incapazes;

A partir do artigo 78, o legislador começa a regulamentar as ações coletivas para proteção desses direitos. A primeira observação que se faz, no âmbito processual, diz respeito à legitimidade.

A grande inovação fica por conta da legitimidade atribuída à OAB para a defesa desses direitos, onde o seu ingresso fora extremamente louvável.

No mais, se mantém no Art. 81, § 1º a figura do litisconsórcio facultativo entre Ministérios Públicos, e no § 2º regra também já conhecida há muito, qual seja, que o Ministério Público assume a ação no caso de desistência ou abandono pela associação legitimada.

Norma interessante e útil é a prevista no artigo 82; para defesa dos interesses e direitos protegidos pelo Estatuto são admissíveis todas as espécies de ação pertinentes. O legislador quer deixar bastante claro que está disposto a defender o interesse dos idosos a qualquer custo. Não se deve obstar, portanto, com o amparo nesse dispositivo legal, qualquer argumento formal ou de natureza procedimental, devendo o Juiz fazer uso do princípio da fungibilidade em prol do idoso. E mais, havendo qualquer dúvida, a interpretação deve ser sempre favorável ao idoso.

Cabe registrar também, a figura da multa, conhecida em processo civil como astreintes, meio de coerção indireta, ou meio de convencimento para que o demandado cumpra os preceitos a que está obrigado.

O cabimento dessa sanção, no Estatuto, pode ser visualizado claramente no seguinte exemplo: imagine que um determinado estabelecimento, que se propõe a guarda e o cuidado de idosos, está fora das condições apropriadas de higiene e não dispõe dos meios materiais necessários; o Ministério Público ajuíza uma ação de interdição, requer uma obrigação de fazer para que sejam cumpridas todas as disposições da vigilância sanitária; o juiz fixa um dia a partir do qual vai se contar aquela multa pelo descumprimento e o valor, de modo a incentivar o voluntário cumprimento da decisão.

Obviamente, a sanção deve ser cuidadosamente pensada, a fim de que não se possibilite um retardamento no cumprimento da decisão judicial, o que poderia colocar em risco a própria vida do(s) lesado(s), por conta de sua idade avançada.

Complementando esse dispositivo, o artigo 84 prevê que toda e qualquer multa deve ser revertida para o fundo do idoso. Se não houver esse fundo do idoso, cria-se o fundo municipal de assistência social e após o 30º dia do não recolhimento dessa multa abre-se um processo de execução que vai ser movido pelo Ministério Público com o objetivo de garantir que esses recursos sejam trazidos ao fundo e, portanto, aplicados corretamente na proteção dos idosos.

Ou seja, em relação ao Ministério Público, o legislador deixa bem claro que este deve funcionar como um agente facilitador do acesso à justiça para os idosos, utilizando-se do instrumental da ação coletiva, de suas prerrogativas funcionais e das regras excepcionais criadas pelo próprio Estatuto, mesmo quando a hipótese for de direito individual indisponível.

O Estatuto do Idoso, no tocante aos direitos coletivos, reafirmou todo o tratamento já dispensado pela Lei de Ação Civil Pública. Entretanto, nas palavras de Junior Alexandre Moreira Pinto (2005, p. 59), “a busca pelo cumprimento dos direitos do idoso, com seu diploma específico, pode assumir novos contornos, amparados por uma gama de leis aptas a promover, no país, um avanço nas relações sociais entre os indivíduos”.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALMEIDA, Dayse Coelho de. A fundamentalidade dos Direitos Sociais no Estado Democrático de Direito. In: Mundo Jurídico. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4402>. Acesso em 30.07.2015.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF; Senado, 1988.

BRASIL. Código Civil. Obra coletiva de autoria da Editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz dos Santos Windit e Lívia Céspedes. 5. ed. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2008.

BRASIL. Lei nº 8.842, de 4 de janeiro de 1994. Dispõe sobre a política nacional do idoso, cria o Conselho Nacional do Idoso e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8842.htm>. Acesso em: 20 jan. 2015.

BRASIL. Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003. Dispõe sobre o Estatuto do Idoso e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/L10.741.htm>. Acesso em: 20 jan. 2015.

CENEVIVA, W. Estatuto do Idoso, Constituição e Código Civil: a terceira idade nas alternativas da lei. A Terceira Idade, v.15, n.30, 2004.

KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 6 ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

NÉRI, A. L. As políticas de atendimento aos direitos da pessoa idosa expressa no Estatuto do Idoso. A Terceira Idade, v.16, n.34, 2005.

REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. 16 ed. Saraiva: São Paulo, 1988.

UVO, R. T.; ZANATTA, M. de L. A.L. O Ministério Público na defesa dos direitos do idoso. A Terceira Idade, v.16, n.33, 2005.


[1] UVO, R. T.; ZANATTA, M. de L. A.L. O Ministério Público na defesa dos direitos do idoso. A Terceira Idade, v.16, n.33, 2005.

[2] REALE, Miguel. Lições preliminares de direito, 16a ed. Saraiva: São Paulo, 1988. p. 64 e 65.

[3] KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 6 ed. São Paulo:Martins Fontes, 1998.

[4] ALMEIDA, Dayse Coelho de. A fundamentalidade dos Direitos Sociais no Estado Democrático de Direito. In: Mundo Jurídico. Disponível em<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4402>. Acesso em 30.07.2015.

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