“... a grandeza sabe se reconhecer.” Shakespeare, Henrique IV.
A Amazônia é grande em todos os sentidos. Territorialmente, mais de 60% do território brasileiro é ocupado pela Amazônia Legal. Isso é meia Europa. Ambientalmente, 42% da Amazônia brasileira é área protegida (onde o desmatamento é menor; por isso criar áreas de proteção tem sido estratégia eficaz para reduzir o desmatamento), o que representa 2,15 milhões km².
Embora diminuindo nos últimos 10 anos, o desmatamento histórico também impressiona. Em 1994, o número do desmatamento foi de 14.896 km2 ;e, em 1995, esse número foi de 29.059 km2. Nesses dois anos, mais de uma Suíça foi desmatada.
Todos esses números nos remetem a algumas questões: como os números acima se relacionam com a melhoria de vida da população amazônica? Para que tem servido o desmatamento na Amazônia?
O Censo de 2000 mostrou que os indicadores sociais melhoram com o desmatamento. Todavia, os ciclos de desenvolvimento não duram mais que 15 anos. Assim, os municípios com área desmatada – excetuando-se os destinados à soja (agricultura mecanizada) –, tendem aos mesmos índices sociais dos que iniciam o processo de colonização. Ou seja, social, ambiental e economicamente, a exploração é pouco sustentável.
Para entender isso, é preciso compreender a dinâmica das principais commodities amazônicas, a saber, madeiras, grãos, com destaque para soja e carne. Obviamente, essa análise é impossível de ser realizada aqui.
Analise-se, porém, o ciclo da madeira. Extrai-se madeira da Amazônia há mais de três séculos; e, intensivamente, desde 1970. Hoje, a Amazônia é uma das principais fontes brasileiras de produtos florestais. Isso se explica, dentre outras razões, pelo baixo preço da madeira amazônica; pela extração de madeiras de áreas públicas; pela existência de menos madeiras em outras regiões brasileiras.
De modo geral, o caráter predatório predomina na exploração florestal amazônica. Na prática, isso significa abrir pequenas estradas no meio da mata, permitindo explorar determinada área. A seguir, essa área é exaurida por meio do corte raso das árvores, e impossibilitada a recomposição da área florestal desmatada.
O desperdício alcança 40%, e ele seria muito maior com a inclusão no cálculo de árvores desnecessariamente destruídas devido à insustentabilidade da própria extração (potencial futuro de extração). Eis aí um grande contraste amazônico: de um lado, a riqueza amazônica; de outro, o desperdício dessa riqueza.
Outro contraste: a falta de maximização de lucros diante de um sistema econômico, o capitalista, cuja maximização é a regra. Prova disso são os impressionantes 6,9 milhões de hectares de terras produtivas sem utilização na Amazônia (desperdício de capital).
Embora pouco difundidos, contrastes também existem entre diferentes atividades econômicas. Assim, enquanto grãos são produzidos num modelo empresarial associado à tecnologia e produtividade em regra, a pecuária não segue similar padrão produtivo, acelerando desmatamentos desnecessários.
Isso se reflete nos índices de ocupação da terra. Assim, 4,8% dos estabelecimentos amazônicos são ocupados por agricultura, representando 5,75 milhões de hectares, enquanto as pastagens totalizam 42,3% da área dos estabelecimentos, ou seja, 51,15 milhões de hectares.
Isso significa que a área ocupada pela pecuária é quase 9 vezes a área ocupada pela agricultura. Logo, a pecuária impacta 9 vezes mais sobre o meio ambiente que a agricultura.
Outro contraste: o PIB e o IDH da maioria dos Estados da Amazônia Legal estão abaixo da média nacional. Numa terra farta de recursos naturais, incluindo alimentos, comprar comida é caro (na Amazônia). De 70 à 80% da renda da população pobre é gasta na alimentação.
Se é reconhecida a grande riqueza amazônica, grande também são os seus contrastes a serem corrigidos.