Acerca da história do direito do trabalho, vale mencionar que o Direito tem uma realidade histórico-cultural. Assim, não se admite o estudo de quaisquer de seus ramos sem que tenha noção de seu desenvolvimento dinâmico no transcurso do tempo.
Desse modo, é importante citar que a palavra trabalho vem do latim tripalium, que era uma espécie de instrumento de tortura de três paus ou uma canga que pesava sobre os animais.
Em relação à primeira forma de trabalho, a escravidão, ressalta-se que o escravo era considerado apenas uma coisa, não tendo qualquer direito, muito menos trabalhista. Portanto, não era considerado sujeito de direito, pois era propriedade do dominus, ou seja, tinha apenas o direito de trabalhar.
Contudo, alguns doutrinadores sustentam que os primeiros trabalhos foram os da Criação. Sendo que tal informação estaria presente no livro de Gêneses, que se infere ao Pentateuco, que narra a origem do mundo. O trabalho, aqui, não teria conotação de fadiga e o repouso seria desprovido do sentido de recuperação de esforços gastos.
Pode-se considerar, então, que o homem está condenado a trabalhar para remir o pecado original e resgatar a dignidade que perdera diante de Deus. O trabalho assumiria um sentido reconstrutivo.
Na Grécia, Platão e Aristóteles entendiam que o trabalho tinha sentido pejorativo, uma vez que envolvia apenas a força física. A dignidade do homem consistia em participar dos negócios da cidade por meio da palavra. Os escravos faziam o trabalho duro, enquanto os outros poderiam ser livres.
Nesse período da história, o trabalho não tinha significado de realização pessoal. As necessidades da vida tinham características servis, sendo que os escravos é que deveriam desempenhá-las, ficando as atividades mais nobres destinadas às outras pessoas, como a política. Hesíodo, Protágoras e os sofistas mostram o valor social e religioso do trabalho, que agradaria aos deuses, criando riquezas e tornando os homens independentes. A ideologia do trabalho manual como atividade indigna do homem livre foi imposta pelos conquistadores dóricos (que pertenciam à aristocracia guerreira) aos aqueos. Nas classes mais pobres, na religião dos mistérios, o trabalho é considerado como atividade dignificante.
Seguindo essa linha histórica, em Roma, o trabalho era feito pelos escravos, que eram considerados coisas, uma vez que o trabalho era visto como desonroso. A locatio conductio tinha por objetivo regular a atividade de quem se comprometia a locar suas energias ou resultado de trabalho em troca de pagamento.
Com efeito, nessa época, os nobres não trabalhavam e o trabalho era considerado um castigo.
Vale mencionar, que se o trabalho por conta própria, realizado para fins de sobrevivência, já tinha em si a ideia de pena, o trabalho por conta alheia impôs um sentimento bem mais negativo, lembrando que as ideias mais remotas em torno do assunto sempre relacionaram o trabalho à dor e ao sofrimento. São recentes as concepções do trabalho como atributo de dignidade.
No século XIV surgiram as corporações de ofício, em que existiam três personagens: os mestres, os companheiros e os aprendizes.
Destaca-se, que com a Revolução Francesa, as corporações de ofício foram suprimidas em 1789, pois foram consideradas incompatíveis com o ideal de liberdade do homem. Na época, dizia-se que a liberdade individual repele a existência de corpos intermediários entre indivíduos e Estado. Ademais, existiram outras causas para a extinção das corporações de ofício, como a liberdade de comércio e o encarecimento dos produtos das corporações.
Foi a Revolução Industrial que acabou transformando o trabalho em emprego. Relata-se, que os trabalhadores, de maneira geral, passaram a trabalhar por salários.
Entretanto, o sentido da expressão emprego se transformou não para apenas alcançar o restabelecimento de um estado natural, mas também a conquista de valores que os novos tempos sempre trazem. Dessa forma, era perfeitamente concebido o sentido da referida expressão nos movimentos sociais e políticos ocorridos nos Estados Unidos (1770-1783) e na França (1789-1799), por força dos quais se evidenciava a intenção de conquistar novos instrumentos de liberdade.
Dessa forma, a conscientização coletiva, que fora despertada pelo instinto de autoproteção, gerou profundas modificações em plano secundário. Ainda, emergia dos processos revolucionários políticos, sociais e econômicos da época outra revolução, mas desta vez, promovida pelo proletariado contra a burguesia e que se ligava diretamente a uma ideologia socialista, de fundo comunista, cujo maior expoente foi Karl Marx.
Segundo Karl Marx, o movimento histórico que transformou os serviços e artífices em operários assalariados, se apresentou explicitamente como suposta libertação da servidão e da coerção corporativa, embora, implicitamente, fosse na verdade, um processo por meio do qual os recém-libertos apenas se tornaram vendedores de si mesmos, depois de terem sido espoliados de todos os seus meios de produção e de todas as garantias para sua existência, antes oferecidas pelas antigas instituições feudais.
Continuando com a história do direito do trabalho, a Carta Encíclica Rerum Novarum, do Sumo Pontífice Leão XIII, tratou especialmente da condição de trabalho do proletariado, justificando a intervenção com base no argumento de que a Igreja desejava a solução dos litígios havidos entre capital e trabalho, segundo as exigências da verdade e da justiça.
A citada Carta tratou, então, de temas que diziam respeito ao socialismo, ao exemplo dado pela Igreja, aos deveres do Estado e às atividades desenvolvidas pelas associações de empregados e de empregadores. Com fulcro nesses fundamentos e baseada nos escritos do Apóstolo São Paulo (1 Cor. 13, 4-7), concluiu que a solução definitiva estaria na caridade, o mais seguro antídoto contra o orgulho e o egoísmo do mundo.
Ainda, durante o transcurso do século XVIII, justamente no período em que apareceram as primeiras normas protetivas laborais, confluíram, quase que simultaneamente, fatos históricos de relevante importância para o fortalecimento do movimento operário.
Contudo, a partir do término da Primeira Guerra Mundial, surge o que pode ser chamado de Constitucionalismo social. Constitucionalismo esse, que é a inclusão nas constituições de preceitos relativos à defesa social da pessoa, de normas de interesse social e de garantia de certos direitos fundamentais, incluindo o Direito do Trabalho.
Destarte, a Constituição que primeiro tratou do tema foi a do México, em 1917, na qual, em seu artigo 123, estabelecia: jornada de oito horas, proibição de trabalho de menores de 12 anos, a limitação da jornada dos menores de 16 anos a seis horas, a jornada máxima noturna de sete horas, o descanso semanal, a proteção à maternidade, o salário mínimo, o direito de sindicalização e o de greve, a indenização de dispensa, o seguro social e a proteção contra acidentes do trabalho.
Já a segunda Constituição a versar sobre o assunto foi a de Weimar de 1919, a qual buscou disciplinar a participação dos trabalhadores nas empresas, autorizando a liberdade de coalização dos trabalhadores, bem como criou um sistema de seguros sociais e também a possibilidade de os trabalhadores colaborarem com os empregadores na fixação de salários e de mais condições de trabalho.
Vale mencionar aqui, que o conflito entre o coletivo e o individual ameaçava a estrutura da sociedade e sua estabilidade. Surge daí a necessidade de um ordenamento jurídico comum, sentido mais justo de equilíbrio.
Daí em diante, as constituições dos países passaram a tratar do Direito do Trabalho e, portanto, a constitucionalizar os direitos trabalhistas.
Em 1919, surge o Tratado de Versalhes, prevendo a criação da Organização Internacional do Trabalho (OIT), a qual iria incumbir-se de proteger as relações entre empregados e empregadores no âmbito internacional, expedindo convenções e recomendações nesse sentido.
Já em dezembro de 1948, a Declaração Universal dos Direitos do Homem surge prevendo alguns direitos aos trabalhadores, como limitação razoável do trabalho, férias remuneradas periódicas, repouso e lazer, etc.
Percebe-se que o cunho humanitário da intervenção estatal refletiu-se no aparecimento do Direito do Trabalho de praticamente todos os povos.
Destaca-se que nessa fase, surge uma nova teoria pregando a necessidade de separação entre o econômico e o social, o que é verificado na Constituição de 1988, que não mais trata dos dois temas de forma reunida, mas separadamente. Sendo que, da mesma forma, preconiza-se um Estado neoliberalista, com menor intervenção nas relações entre as pessoas.
Aqui no Brasil, as Constituições, inicialmente, versavam apenas sobre a forma do Estado e o sistema de governo. Posteriormente, passaram a tratar de todos os ramos do Direito e, especialmente, do Direito do Trabalho, como ocorre com nossa Constituição atual.
Assim, a Constituição de 1824 apenas tratou de abolir as corporações de ofício (art. 179, XXV), pois deveria haver liberdade do exercício de ofícios e profissões.
No ano de 1871, tem-se um marco na história, uma vez que a Lei do Ventre Livre dispôs que os filhos dos escravos nasceriam livres, a partir de 28 de setembro de 1871. Já na data de 28 de setembro de 1885, foi aprovada a Lei Saraiva-Cotegipe, chamada de Lei dos Sexagenários, libertando os escravos com mais de 60 anos. Mesmo depois de livre, o escravo deveria prestar mais três anos de serviços gratuitos a seu senhor. Em 13 de maio de 1888, foi assinada pela Princesa Isabel a Lei Aurea, que abolia a escravatura.
A Constituição de 1891 reconheceu a liberdade de associação, em seu parágrafo 8º, do artigo 72, que tinha na época caráter genérico, determinando que a todos era lícita a associação e reunião, livremente e sem armas, não podendo a polícia intervir, salvo para manter a ordem pública.
Ainda, sobre a Constituição de 1891, esta garante, no caput do art. 72, a brasileiros e a estrangeiros residentes no País, a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade.
Ressalta-se que, no ano de 1919, as transformações que vinham ocorrendo na Europa em decorrência da Primeira Guerra Mundial e o aparecimento da OIT, incentivaram a criação de normas trabalhistas em nosso país. Ademais, existiam muitos imigrantes no Brasil que deram origem a movimentos operários reivindicando melhores condições de trabalho e salários. Começa a surgir uma política trabalhista idealizada por Getúlio Vargas, em 1930.
Seguindo com a história, no ano de 1934, tem-se a primeira constituição brasileira a tratar especificamente do Direito do Trabalho. É a influência do constitucionalismo social, que em nosso país só veio a ser sentida em 1934. Possuindo as seguintes garantias: liberdade sindical (art. 120), isonomia salarial, salário mínimo, jornada de oito horas de trabalho das mulheres e menores, repouso semanal, férias anuais remuneradas (§ 1º do art. 121).
Considerada uma norma democrática, a Constituição de 1946 rompeu com o corporativismo da Constituição anterior. Nessa Constituição encontra-se a participação dos trabalhadores nos lucros (artigo 157, IV), repouso semanal remunerado (artigo 157, VI), estabilidade (artigo 157, XIII), direito de greve (artigo 158) e outros direitos que se encontravam na norma constitucional anterior.
Vale citar que a Constituição de 1967 e a Emenda Constitucional n. 1, de 1969, introduziram a cogestão e o regime do FGTS que, de início, conviveu com o da estabilidade e o da indenização, competindo ao empregado a “opção” por um deles. O salário-família foi assegurado aos dependentes do trabalhador. A idade mínima para o trabalho foi reduzida para 12 anos, ao contrário dos outros textos.
Ainda, a Constituição de 1967, garantiu a aposentadoria da mulher aos 30 anos de trabalho, com vencimento integral. O trabalho na indústria insalubre, à semelhança das Constituições de 1934, 1937 e 1946, continuou sendo proibido à mulher. Assegurou, ainda, trabalho noturno com remuneração superior ao diurno, o que não é novidade, considerando que essa garantia já constava do texto constitucional de 1937.
A atual Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB), aprovada em 05 de outubro de 1988, trata de direitos trabalhistas nos artigos 7º a 11. Na Norma Magna, os direitos trabalhistas foram incluídos no Capítulo II, “Dos Direitos Sociais”, do Título II, “Dos Direitos e Garantias Fundamentais”, ao passo que nas Constituições anteriores os direitos trabalhistas sempre eram inseridos no âmbito da ordem econômica e social. Ademais, o artigo 7º da Lei Maior vem a ser uma verdadeira CLT, tantos os direitos trabalhistas nele albergados.
Diante de tais relatos, relevante se faz o direito do trabalho, uma vez que foi o primeiro dos direitos sociais a emergir e, sem dúvida, por conta de sua força expansiva, o estimulante da construção de tantos direitos sociais. Cita-se que entre tais direitos, existem os que dizem respeito à previdência social, à saúde, à assistência social, à educação, à segurança, à moradia e ao lazer.
Assim, percebe-se que o raciocínio formador dos grupos sociais, ao longo do tempo, de certa forma, impõe uma troca: vem a liberdade convencional em estrito, o compromisso de classe, a solidariedade e a proteção dos iguais, enquanto vai a liberdade civil em sentido lato, o descompromisso de classe, a solidão e a desproteção. Indicando, esse mecanismo, bem mais que uma simples troca, indicando uma passagem histórica do individualismo ao coletivismo.
Importante, para melhor entendimento, conceituar o Direito do Trabalho, que é o conjunto de princípios, regras e instituições atinentes à relação de trabalho subordinado e situações análogas, o qual visa assegurar melhores condições de trabalho e sociais ao trabalhador, levando em consideração as medidas de proteção que lhe são destinadas.
Dessa forma, os objetivos fundamentais da República e os fundamentos do Estado Democrático de Direito apontam para o conceito de justiça social. O valor social do trabalho, a dignidade da pessoa humana, a solidariedade social, o desenvolvimento, a erradicação da pobreza e da marginalização, a redução das desigualdades sociais e regionais e a promoção do bem de todos são os alicerces, os princípios e diretrizes norteadoras da elaboração, da interpretação e da aplicação do direito.
Portanto, o processo construtivo do direito do trabalho e, por consequência, dos demais direitos sociais, decorreu do conflito de classes. Sendo que, sua edificação e crescimento, de outro lado, provieram de uma pletora de acontecimentos historicamente favoráveis. Dessa forma, no que se refere à história constitutiva do direito do trabalho, pode-se dizer que é incrível o poder que as coisas parecem ter quando elas precisam acontecer.
Conclui-se que o ramo jurídico em análise parece efetivamente ter emergido pela força do inevitável, do inexorável. Destaca-se que múltiplos fatores alinharam-se e contribuíram para a edificação dos direitos sociais, especialmente para a construção de um sistema jurídico capaz de proteger os trabalhadores dos abusos perpetrados por seus patrões. Assim, se o direito do trabalho, como regulação normativa de origem estatal ou convencional, não tivesse acontecido, certamente a história que envolvia conflitos entre capital e trabalho seria diferente.
REFERÊNCIAS
BARROS, Alice Monteiro. Curso de Direito do Trabalho. 6. ed. São Paulo: LTr, 2010
MARTINEZ, Luciano. Curso de direito do trabalho. 2. ed. São Paulo: Saraiva. 2011
MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. 17. ed. São Paulo: Atlas. 2003
SANTOS, Marisa Ferreira dos. Direito previdenciário esquematizado. São Paulo: Saraiva. 2011