RESUMO
O trabalho em apreço tem por finalidade principal o estudo das consequências metajurídicas da inserção da mulher no cárcere determinando os fatos que precisam ser considerados quando da criação e manutenção da penitenciária feminina. Inicialmente, parte-se do histórico do sistema prisional brasileiro com destaque para o nascimento e desenvolvimento do sistema carcerário feminino. Num segundo momento, analisa aspectos relevantes acerca do desenvolvimento da mulher na sociedade, tendo em vista as alterações nas últimas décadas, principalmente quanto ao reconhecimento da mulher como sujeito na sociedade. Verifica-se que da mesma forma que as diferenças entre homens e mulheres vão se dissipando, o mesmo ocorre na criminalidade, ocorrendo o aumento do número de mulheres nas prisões, da mesma forma como ocorre o aumento de mulheres no trabalho ou na política.
Palavras Chaves: Cárcere. Criminalidade Feminina. Consequências metajurídicas.
ABSTRACT
This work´s main purpose is to study beyond the legal consequences of the insertion of women in prison, determining the facts that need to be considered about the creation and maintenance of female penitentiary. At first, is shown the history of the Brazilian prison system, highlighting the development of the female prison system. In a second moment, is analyzed relevant aspects about women's development in society, mentioning the changes in the last decades, especially when it comes to the recognition of women as individuals in society. It is verified that, in the same way that the differences between men and women will dissipating, the same happens in crime, occurring the increasing number of women in prisons, just as there is an increase of women in the workplace or in politics.
Keywords: Prison. Female Crime. Beyond The Legal Consequences.
INTRODUÇÃO
A evolução do tratamento dado à mulher parte de um momento histórico em que sua educação era somente voltada para tarefas do lar. Seu papel era o de estar submissa ao marido, que determinava tudo a ser seguido. Contudo, a sociedade vem sofrendo alterações nas últimas décadas, principalmente quanto ao reconhecimento da mulher como sujeito de direitos.
Houve uma aproximação entre o universo masculino e feminino no universo social, o que acarretou, por consequência, a mesma aproximação dentro do universo criminal. As oportunidades geradas, a inserção da mulher no mercado, a ânsia de seu crescimento cada vez mais aguçado, tudo ensejou, ainda que indiretamente, a cometimento de crimes pela mulher.
Houve um aumento considerável na população carcerária feminina, no entanto, mais uma vez o país não estava preparado para receber mais presos, e desta vez necessitando de condições especiais.
O primeiro presídio feminino de que se tem notícia data de 1645 em Amsterdã, na Holanda. A instituição era responsável por abrigar mulheres pobres, criminosas, bêbadas e prostitutas, além de meninas mal comportadas que não obedeciam a seus pais e maridos. Surgiram, na segunda metade do século XIX as casas de correção, onde as presas eram confinadas em espaços completamente iguais aos dos homens, as vezes em conjunto. O fato acarretava uma séria de complicações, vez que começaram a ocorrer abusos sexuais frequentes. Em razão da necessidade de reduzir as tensões existentes no ambiente de confinamento feminino, os governos do Canadá, da França, do Chile e da Argentina optaram por transferir o dever de criação de centros de detenção femininos à igreja católica, que já atuava neste ramo, livrando-se assim da responsabilidade de construir e administrar as instituições de correção para mulheres. Os baixos índices de criminalidade feminina levaram ao esquecimento da causa e ao abandono dos centros de confinamento. As instituições para detenção de mulheres funcionavam como entidades semiautônomas não sujeitas a supervisão ou regulação estatal, violando claramente a lei ao permitirem a reclusão de mulheres sem mandado judicial.
No Brasil, o cárcere feminino existiu desde que se tenha história, mas até o ano de 1940 o ordenamento jurídico do país nada regulamentava sobre o tema, muito embora já houvesse uma diferenciação mínima, conforme afirma Silva (2014), onde o encarceramento de mulheres se davam em salas, celas, alas e seções diferentes das masculinas, mas tal diferenciação não era regra: quem determinava a separação ou não entre mulheres e homens presos eram as autoridades responsáveis, que se baseavam, geralmente, nas condições físicas do local.
A primeira norma legal a tratar sobre o encarceramento feminino foram os códigos Penal e de Processo Penal, que vigoraram no ano de 1940, sobrevindo a Lei de Contravenções Penais, de 1941. Em suma, a leitura dos diplomas legais aduziam quase que o mesmo, conforme se lê no Artigo 29, parágrafo segundo do Código Penal de 1940: “as mulheres cumprem pena em estabelecimento especial, ou, à falta, em secção adequada de penitenciária ou prisão comum, ficando sujeitas a trabalho interno”. Até hoje, o sistema prisional feminino não se mostra adequado.
Frente aos problemas apresentados, questiona-se: quais são as consequências metajurídicas da inserção da mulher no cárcere, sem que haja as condições mínimas diferenciadas que esse sexo necessita? A mulher faz jus à manutenção de um sistema carcerário que contemple suas diferenças, como a gravidez, o comportamento emocional, entre outras características que necessitam ser respeitadas. Nasce, portanto, a necessidade de se elencar as consequências metajurídicas do cárcere para a mulher, determinando os fatos que precisam ser considerados quando da criação e manutenção de uma penitenciária feminina. Portanto, é forçoso demonstrar os fatores que distinguem mulheres e homens diante de suas sexualidades biologicamente diversas, para que se entenda quais mudanças são necessárias a fim de que haja um sistema prisional adequado.
Neste enfoque, o objetivo geral do trabalho é analisar as consequências metajurídicas da inserção da mulher no cárcere, sendo necessária, em primeiro momento, que se faça um histórico acerca do sistema prisional, pondo em voga a criação dos primeiros presídios, a realidade dos estabelecimentos frente a evolução do Código Penal, bem como o nascimento e desenvolvimento do sistema carcerário feminino.
1. histórico do sistema prisional brasileiro
Cada época da história contou com mecanismos distintos de aplicação de punições àqueles que desobedeciam às regras. Mas é comum a todas as épocas que a função de tal instituto era o de devolver à sociedade um indivíduo cumpridor de leis, ainda que existisse, de fundo, um sentimento de vingança.
Há, na prisão, um caráter disciplinar, que buscam coagir os indivíduos lá inseridos, não para que retornem à sociedade como um bom cidadão, mas como um homem útil ao sistema. É o que entende Foucault (2008, p. 119) quando afirma que “a disciplina fabrica assim corpos submissos e exercitados, corpos dóceis. A disciplina aumenta as forças do corpo (tem termos econômicos de utilidade) e diminui essas mesmas forças (em termos políticos de obediência)”.
Para Goffman (2008, p.11), as prisões foram criadas para funcionar como verdadeiras “estufas para mudar pessoas, nas quais cada uma delas é um experimento natural sobre o que se pode fazer ao eu”, entendo haver um choque no indivíduo preso, que vê na prisão uma forma de sociedade inteiramente diferente. Mas, ainda, uma sociedade.
Apesar das intenções acima mencionadas, a realidade do sistema carcerário sempre era contraditória quando comparada à teoria. Carvalho Filho (2002, p. 21), em artigo publicado, constatou que o sistema prisional, no passado, fora marcado por penas alternativas à privação da liberdade, mas muito mais cruéis e desumanas. A tortura era meio legítimo de pena, que serviria para manter o acusado sob custodia enquanto esse aguardava o julgamento e a pena posterior.
No entanto, foi apenas no século XVIII que a pena privativa de liberdade passou a ser inserida no rol de punições existentes. A criação de tal pena caminhou em conjunto com as mudanças políticas ocorridas, onde, segundo Foucault (1988), a ascensão da burguesia fez com que acabassem os espetáculos públicos de tortura, fazendo nascer uma punição fechada, sem que houvesse tal incentivo à violência. Para o autor, mudou-se o meio de sofrer: deixou-se de punir o corpo para punir-se a alma.
Os primeiros projetos de penitenciarias surgiram a seguir, em virtude das mudanças então ocorridas. Foucault às compara com o que chama de modelo panóptico, termo que caracteriza a um modelo que aplica a disciplina de maneira severa, alimentação grosseira e vestimenta humilhante. Complementa o termo afirmando que não só as prisões derivaram do termo, mas também outras estruturas hierárquicas, como escolar e fabricas.
Os primeiros presídios que seguiam o sistema celular surgiram na Filadélfia, e, sobre eles, Di Santis (2012) afirma:
No final do século XVIII e início do século XIX surge na Filadélfia os primeiros presídios que seguiam o sistema celular, ou sistema da Filadélfia como também é conhecido, era um sistema de reclusão total, no qual o preso ficava isolado do mundo externo e dos outros presos em sua cela, que além de repouso servia para trabalho e exercícios.
Após o surgimento deste último modelo de penitenciária, o sistema chegou à Inglaterra e à Irlanda. Houveram adaptações na Irlanda, onde surgiu uma quarta fase do sistema, antes da liberdade condicional, que consistia na liberação do preso para o trabalho em ambiente aberto, mas apenas trabalho.
1.1. ORIGEM DO SISTEMA PRISIONAL
O Brasil não contava com um Código Penal próprio até 1830, por ser colônia de Portugal. Nessa época, a regularização dos crimes era baseada na legislação portuguesa, que previa pena de more, mutilação, queimaduras, confisco de bens e multa, além de penas como humilhação pública (Di Santis, 2012). Apesar de nos demais países já existir a pena de privação de liberdade, no Brasil o sistema ainda era baseado na violência pública.
Foi somente com 1824, com a Constituição da República, que o sistema prisional começou a se modificar. Baniram-se as penas de tortura, ferro quente e outras cruéis, houve a inserção da humanização das penas, com a criação de cadeias e a determinação de que as mesmas fossem limpas, seguras e arejadas, com a existência de casas para a separação dos réus, de acordo com a circunstância e natureza do crime (Constituição da República de 1824).
Seis anos depois surge o Código Criminal do Império, com a pena de prisão legislativamente introduzida no Brasil pela prisão simples ou prisão com trabalho, com a possibilidade de perpetuidade. A prisão passou a ser predominante quando comparada às outras penas, mas ainda existiam pena de morte e trabalhos forçados (Código Penal de 1830).
A situação naquela época se mostrava precária, e assim se retira da leitura do artigo 49 da referida Constituição:
“Art. 49. Emquanto se não estabelecerem as prisões com as commodidades, e arranjos necessarios para o trabalho dos réos, as penas de prisão com trabalho serão substituidas pela de prisão simples, acrescentando-se em tal caso á esta mais a sexta parte do tempo, por que aquellas deveriam impôr-se.”.
A disponibilização da prisão com trabalho substituindo a carcerária demonstra a precariedade desta em aceitar os réus.
Salla (2006, p.178) afirma, no entanto, que a realidade carcerária se difundia profundamente da lei, dando o exemplo do ano de 1906, quando foram condenados 976 presos em São Paulo, mas existiam apenas 160 vagas, fazendo com que quase 90 por cento dos presos cumprissem suas penas em condições diversas das legalmente previstas.
Iniciou-se, então, um movimento para a modernização de todo o sistema penitenciário, não só dos estabelecimentos, mas também das leis e a “criação de várias instituições que comporiam uma rede de prevenção e repressão ao crime e de tratamento ao criminoso” (Salla, 2006, p. 154). O responsável pelo projeto era o Senador Paulista Paulo Egydo, visando modificar todo o sistema penitenciário estadual “previa a construção, ou adaptação quando já existentes, de casas de prisão preventiva em cada uma das circunscrições judiciárias em que se dividia o estado”, criação de novos cargos para a administração penitenciária, criação de prisões no interior, “determinava uma distribuição geográfica na administração das penas” (condenados com pena de prisão celular por um tempo menor de oito anos cumpririam a mesma no interior, caso fosse maior, cumpririam na própria capital) (Salla, 2006, p. 164). No entanto, não houve aprovação do prjeto por ser considerado muito caro.
Foi apenas em 1905 que foi aprovada lei para a substituição da antiga penitenciária e construção de uma nova, com oficinas de trabalho, 1.200 vagas, celas adequadas e boa ventilação e iluminação, sendo inaugurada em 1920.
1.2. SISTEMA PRISIONAL FEMININO
Bruna Soares, em dissertação de mestrado, relata que o primeiro presídio feminino de que se tem notícia data de 1645 em Amsterdã, na Holanda. A instituição era responsável por abrigar mulheres pobres, criminosas, bêbadas e prostitutas, além de meninas mal comportadas que não obedeciam a seus pais e maridos. As presas praticavam o tear e a costura nos referidos estabelecimentos. Esse modelo foi copiado posteriormente na Inglaterra. Já nos Estados Unidos, segundo a pesquisadora, a primeira penitenciária feminina surgiu em Nova York em 1835, sendo a única do gênero até 1870. A partir desse período foram inaugurados os chamados reformatórios, que visavam “ensinar” às presas o comportamento e posturas femininas, os afazeres do lar, entre outros hábitos domésticos comuns à época. No entanto, em um verdadeiro declínio, muitas dessas casas de correção obrigavam as mulheres aprisionadas a se prostituírem por imposição dos próprios administradores de tais estabelecimentos, sendo completamente avessas à função a qual se propunham.
Maia (2009, p.50) complementa a ideia afirmando que surgiram na segunda metade do século XIX as casa de correção, onde as presas eram confinadas em espaços completamente iguais aos dos homens, as vezes em conjunto. O fato acarretava uma séria de complicações, vez que começaram a ocorrer abusos sexuais frequentes. Em razão da necessidade de reduzir as tensões existentes no ambiente de confinamento feminino, os governos do Canadá, da França, do Chile e da Argentina optaram por transferir o dever de criação de centros de detenção femininos à igreja católica, que já atuava neste ramo, livrando-se assim da responsabilidade de construir e administrar as instituições de correção para mulheres.
Maia conclui, ainda, que os baixos índices de criminalidade feminina levaram ao esquecimento da causa e ao abandono dos centros de confinamento. Carlos Aguirre (2009, p.51) afirma que “as instituições para detenção de mulheres funcionavam como entidades semiautônomas não sujeitas a supervisão ou regulação estatal, violando claramente a lei ao permitirem a reclusão de mulheres sem mandado judicial”. Para Aguirre:
As prisões e casas de correção de mulheres se guiavam pelo modelo da casa-convento: as detentas eram tratadas como se fossem irmãs desgarradas que necessitavam não de um castigo severo, mas de um cuidado amoroso e bons exemplos. A oração e os afazeres domésticos eram considerados fundamentais no processo de recuperação das delinquentes. As detentas eram obrigadas a trabalhar em tarefas “próprias” de seu sexo (costurar, lavar, cozinhar) e, quando se considerava apropriado, levavam-nas para trabalhar como empregadas domésticas nas casas de famílias decentes, com a finalidade de completar sua “recuperação” sob a supervisão dos patrões. Na década de 1920, pouco a pouco, o Estado passaria a exercer uma maior autoridade sobre as mulheres presas, mas, ainda assim, em algumas ocasiões, as prisões femininas foram postas sob a administração de ordens religiosas. A discussão sobre a quem estas criminosas pertencem continuaria até boa parte do século XX (AGUIRRE, 2009, p. 51).
Aguirre ainda conclui afirmando que tais práticas, infelizmente, ainda são presentes em determinados estabelecimentos prisionais.
No Brasil, o cárcere feminino existiu desde que se tenha história, mas até o ano de 1940 o ordenamento jurídico do país nada regulamentava sobre o tema, muito embora já houvesse uma diferenciação mínima, conforme afirma Silva (2014), onde o encarceramento de mulheres se davam em salas, celas, alas e seções diferentes das masculinas, mas tal diferenciação não era regra: quem determinava a separação ou não entre mulheres e homens presos eram as autoridades responsáveis, que se baseavam, geralmente, nas condições físicas do local.
Existia, também, à época, a ideia de que a mulher que praticava um crime fugia da sua natureza dócil, conforme será explicitado mais a frente, não sendo, por consequência, uma criatura normal. Por isso, as cadeias isoladas seriam uma espécie de ambiente de purificação daquela mulher, conforme afirma Jorge Pinheiro (2012, p. 50). Asseverando o mencionado, Lima (1983) afirma que o papel da pena de prisão em ambientes separados era, em realidade, a de domesticação das mulheres criminosas e a de vigilância de sua sexualidade, para que ela retomasse aos seus papeis de origem na sociedade: mãe e esposa.
Espinoza (2003, p. 39) afirma que a educação penitenciária pretendia restaurar o sentido de legalidade e de trabalho entre os homens presos, enquanto que, às mulheres, a intenção era reinstalar o sentimento de pudor.
O histórico do encarceramento feminino demonstra sua forte relação com a moralidade e a religiosidade, fatores que não são relacionados ao cárcere masculino. O motivo é a legitima discriminação da mulher e as formas que a sociedade impõe de dominá-las, suprimindo sua liberdade até os dias atuais.
2. ASPECTOS RELEVANTES ACERCA DO DESENVOLVIMENTO DA MULHER NA SOCIEDADE
A evolução da mulher parte de um momento histórico em que sua educação era somente voltada para tarefas do lar. Seu papel era o de estar submissa ao marido, chefe da casa, que determinava tudo a ser seguido (LOBATO). Para Favaretto (2000, p.16), inclusive, tal papel da mulher à época foi responsável por solidificar sua função como responsável pela conservação e manutenção de determinados valores sociais, já que seu campo de atuação era intimamente ligado à entidade familiar. É dentro da família, até, que as mudanças começam a acontecer.
Diante da sociedade antes existente, Beauvoir (1949, p. 13) afirma que, até então, a sociedade era responsável por moldar a mulher como ela era conhecida: sexo frágil, subordinada ao gênero masculino. Para Beuvoir, não se nasce mulher, torna-se. A sociedade impõe características às pessoas que são resistentes, assimilados como padrões naturais e inalteráveis, e qualquer atuação que vá contra a “normalidade” vai se encontro a manifestações preconceituosas.
Thaíse, em artigo publicado, afirma que os valores atribuídos pelo histórico cultural das pessoas interferem diretamente na realidade do ser humano, produzindo rótulos difíceis de se alterar, influindo na ideia de que cada indivíduo já nasce predestinado a viver naquele papel. A imagem da mulher foi reproduzida, durante muitos anos, como a de um sujeito sem direitos, ficando condicionada ao desejo do marido, sem vontade própria.
2.1 NOVOS PAPÉIS ADQUIRIDOS E AS MUDANÇAS OCASIONADAS
Cumpre mencionar, de início, que a sociedade vem sofrendo alterações nas últimas décadas, principalmente quanto ao reconhecimento da mulher como sujeito da sociedade. O Código Civil de 1916 previa em seu art. 6º que “são incapazes, relativamente a certos atos (art. 147, n. 1), ou à maneira de os exercer: II - As mulheres casadas, enquanto subsistir a sociedade conjugal”.
Outro fator importante para o crescimento da mulher foi o surgimento da pílula contraceptiva nos anos 60, que possibilitou uma distinção entre o sexo feminino e a obrigação em procriar (BIANCHINI).
Hoje, a mulher represente 52% da população economicamente ativa, e o número de mulheres que exercem apenas a função de donas de casa caiu para 25% do total. Houve, também, o aumento da participação das mulheres em altos cargos, tanto na iniciativa privada quanto no poder público (SESC, 2010). A aproximação do sexo masculino e feminino ocorrida no universo social acarretou também a proximidade dos sexos nas práticas dentro do universo criminal.
2.1.1 A Inserção Da Mulher Na Criminalidade
Aquele modelo tradicional de família patriarcal foi se dissipando, nascendo de tais mudanças a necessidade de que a mulher tivesse sua própria identidade e buscasse atingir seus próprios objetivos. Para Lobato, as consequências desse processo foram drásticas diante de toda a dinâmica gerada pelo trabalho feminino.
Faria, em artigo publicado, menciona que as oportunidades geradas, a inserção da mulher no mercado, a ânsia de seu crescimento cada vez mais aguçados, tudo ensejou, ainda que indiretamente, a cometimento de crimes pela mulher, que antes adentravam em áreas da criminalidade específicas, mas que hoje a realidade se mostra diferente.
No entanto, deve-se ter cautela quando do relacionamento direito do crescimento do trabalho da mulher e o aumento da prática delitiva. Voegelli (2003, p. 30) inclusive afirma que o fato de a mulher não ter sido sempre inserida na sociedade, ou seja, o preconceito antes existente relativo ao trabalho da mulher, foi o primeiro passo para que a prática delitiva objetivamente ocorresse.
O crime deve ser analisado como uma questão social de grande relevância, um verdadeiro problema público, nascendo a necessidade de se aprofundar nas pesquisas que contribuam para a melhoria e real conhecimento do sistema. Apesar de o número de pesquisas não ser tão ínfimo, Magalhães afirma que pouquíssimas delas incluem a mulher como sujeito da criminalidade, sendo a apreciação do fato muito rara.
O histórico aponta que, por muito tempo, os crimes praticados pelas mulheres eram relacionados apenas à promiscuidade, prostituição e delitos relacionados à sexualidade, haja vista a mulher ter sido tida como um mero objeto de prazer sexual ao homem. Afirma Foucault (1988, p. 121) que o dispositivo da sexualidade feminina vai se dissipando no âmbito familiar. Surge a figura da mulher como chefe de família e, junto com ela, novas personagens além daquelas relacionadas à sexualidade: “a mulher nervosa, a esposa frigida, a mãe indiferente (...)”.
2.2.2 A Lei De Execução Penal
A execução penal é a fase processual onde há a efetiva punição, vez que o Estado, por meio do seu “Poder de Império”, satisfaz a pretensão punitiva impondo uma pena ao indivíduo que viola as regras sociais. Nesse sentido, afirma Capez:
Pena é a sanção penal de caráter aflitivo, imposta pelo Estado, em execução de uma sentença, ao culpado pela prática de uma infração penal, consistente na restrição ou privação de um bem jurídico, cujas finalidades são aplicar a retribuição punitiva ao delinquente, promover a sua readaptação social e prevenir novas transgressões pela intimidação dirigida a coletividade. (CAPEZ, 2007, p. 17).
A partir daí é que nasce o poder de punir, devendo derivar e uma sentença penal transitada em julgado, que cumpriu o devido processo legal, e impôs a pena a um fato típico e ilícito, conforme aduz a Lei de Execução Penal.
A lei 7.210 foi instituída em 11 de julho de 1984 com o fim de proporcionar a reintegração do criminoso à sociedade. Apesar de sua legislação utópica, a sua aplicação deixa a desejar, e vários são os motivos, incluindo a falta de políticas prisionais para a recuperação do indivíduo.
Segundo o STF, em julgamento:
A Lei de Execução Penal – LEP é de ser interpretada com os olhos postos em seu art. 1º. Artigo que institui a lógica da prevalência de mecanismos de reinclusão social (e não de exclusão do sujeito apenado) no exame dos direitos e deveres dos sentenciados. Isso para favorecer, sempre que possível, a redução de distância entre a população intramuros penitenciários e a comunidade extramuros. Essa particular forma de parametrar a interpretação da lei (no caso, a LEP) é a que mais se aproxima da CF, que faz da cidadania e da dignidade da pessoa humana dois de seus fundamentos (incisos II e III do art. 1º). A reintegração social dos apenados é, justamente, pontual densificação de ambos os fundamentos constitucionais." (HC 99.652, Rel. Min. Ayres Britto, julgamento em 3-11-2009, Primeira Turma, DJE de 4-12-2009).
É de se observar que a real intenção da lei é a reinclusão do sujeito na sociedade, tendo um verdadeiro condão educativo, e não punitivo. No entanto, não é essa realidade que prevalece.
A constituição Federal garante a proteção do apenado durante o cumprimento da pena. O texto Constitucional e de Tratados Internacionais de proteção aos direitos humanos ratificados pelo Brasil são protegidos no parágrafo 2º do art. 5º, da Constituição Federal, e possuem, inclusive, hierarquia constitucional conforme dispõe o parágrafo 3º do art. 5º, da mesma Carta Magna, senão vejamos segundo o posicionamento do STF:
Neste contexto a execução da pena privativa de liberdade deve ter por base o princípio da humanidade, sendo que qualquer modalidade de punição desnecessária, cruel ou degradante será de natureza desumana e totalmente contrária ao princípio da legalidade, pois tanto a “(...) após o advento da EC 45/2004, consoante redação dada ao § 3º do art. 5º da CF, passou-se a atribuir às convenções internacionais sobre direitos humanos hierarquia constitucional (...). Desse modo, a Corte deve evoluir do entendimento então prevalecente (...) para reconhecer a hierarquia constitucional da Convenção. (...) Se bem é verdade que existe uma garantia ao duplo grau de jurisdi- ção, por força do pacto de São José, também é fato que tal garantia não é absoluta e encontra exceções na própria Carta.” (AI 601.832-AgR, voto do Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 17-3-2009, Segunda Turma, DJE de 3-4-2009) Vide: RE 466.343, Rel. Min. Cezar Peluso, voto do Min. Gilmar Mendes, julgamento em 3-12-2008, Plenário, DJE de 5-6-2009.”
Da jurisprudência extraída, observa-se a existência do princípio da humanidade, que veda a pratica de qualquer modalidade de punição desnecessária, cruel ou degradante.
No entanto, apesar das regras e princípios supracitados, cada vez amis se verifica uma constante violação dos direitos e a total inobservância das garantias legais previstas na execução das penas privativas de liberdade, vez que, hoje, a ocorrência de punições desumanas nos cárceres é patente, o que impede o devido cumprimento da LEP, que se mostra eficiente na teoria, mas com resultados práticos ineficientes.
O Capítulo II da Lei de Execução Penal versa sobre a assistência ao preso, sendo que o artigo 12 faz previsão de fornecimento de elementos que possibilitem não só a sobrevivência, mas a dignidade, devendo serem fornecidas alimentação suficiente, vestes adequadas e condições de higiene.
Apesar de a legislação penal ser expressa nesse tema, e em demais temas a seguir analisados, a realidade das penitenciárias não faz jus à norma em apreço. Na realidade das prisões, gestantes e parturientes dividem a cela com outras detentas, não gozando dos benefícios a elas garantidos pela lei. No entanto, a legislação expressa se torna o primeiro passo à melhoria. Cada especificidade da Legislação no tocante às prisões femininas serão minuciosamente analisadas, com o condão de demonstrar a importância das diferenças entre o sistema masculino e feminino e, também, de se mencionar o quão tais normas são importantes a mulher, a fim de que se verifique a sua real necessidade de concretização dentro dos cárceres.
3 A mulher e a Lei de Execução Penal: Especificidades
O advento da Lei de Execução Penal, conforme mencionado, trouxe ao cenário do sistema prisional a necessidade de se respeitar a dignidade dos condenados. Mas não só isso. O diploma dispõe de inúmeras regras próprias, ou seja, específicas a determinado gênero, idade ou pessoa. É uma forma de cumprimento da determinação constitucional que visa o tratamento dos diferentes, de maneira diferente, na medida da sua diferença.
A primeira das especificações trazidas pela lei consta no seu artigo 82, que garante que a mulher e o maior de 60 (sessenta) anos, separadamente, serão recolhidos em estabelecimento próprio e adequado a sua condição pessoal. O artigo 88 complementa a ideia determinando que o condenado deverá ser alojado em cela que contenha dormitório, aparelho sanitário e lavatório, sendo requisitos do ambiente que este seja salubre, contendo todos os fatores de aeração, isolação e condicionamento térmico adequado à existência humana, além de determinar uma área mínima de seis metros quadrados.
As referidas medidas surgiram com o intuito de assegurar às crianças o direito ao convívio familiar, medidas estas necessárias, já que grande número de presas são grávidas e mães. Com isso, foi respeitado o princípio da Humanização das penas, sendo fator relevante para a motivação da mudança de comportamento.
O artigo 37 do Código Penal ainda dispõe que “as mulheres cumprem pena em estabelecimento próprio, observando-se os deveres e direitos inerentes à sua condição pessoal (...)”.
Quanto à condição pessoal, Mirabete (2000, p. 232) a interpreta como “o sexo, as condições fisiológicas e psicológicas da mulher”, ou seja, fazendo valer a frase de Boaventura que afirma “o direito à diferença quando a igualdade nos descaracteriza e o direito à igualdade quando a diferença nos inferioriza”.
O artigo 19 da LEP ainda garante que “o ensino profissional será ministrado em nível de iniciação ou de aperfeiçoamento técnico. Parágrafo Único: a mulher condenada terá ensino profissional adequado à sua condição”.
Para Mirabete (2000, p. 249) a regra expressa seria apenas uma faculdade. Mas, à luz dos direitos não atingidos pela pena privativa de liberdade, não se mostra razoável que tal disposição será mera faculdade, devendo prevalecer a obrigatoriedade de assegurar nas penitenciárias femininas serviços de atendimento à gestante, à parturiente, bem como berçário e creche.
A LEP ainda afirma:
Art. 117. Somente se admitirá o recolhimento do beneficiário de regime aberto em residência particular quando se tratar de:
III - condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental;
IV - condenada gestante.
Para Espinoza (2010, p.107), a redação do artigo identifica e valoriza o papel de mãe, concedendo direitos à mães em razão do melhor desenvolvimento de seus filhos, função, esta, necessária não só para as partes, mães e filhos, mas para a sociedade como um todo, haja vista que a criação interfere diretamente na forma como aquele indivíduo se comportará perante a sociedade.
3.1 Possibilidades de garantir os direitos fundamentais dos filhos das mulheres privadas de liberdade
Conforme pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa e de Cultura Luiz Flávio Gomes (IPC-LFG), os homens compõem 93,4% de detentos do país. Muito embora o número seja assustadoramente superior à população carcerária feminina (6,6%), a população de mulheres presas segue em constante crescimento, haja vista que de 2000 à 2011 a quantidade de homens presos cresceu 116%, enquanto que o número de mulheres presas aumentou 234%.
Segundo dados do Ministério da Justiça, disponíveis em seu sítio na internet, a população carcerária feminina no Piauí era de 99 mulheres, número ínfimo quando comparado aos 2.615 homens presos na mesma época. No entanto, conforme mencionado, o número de mulheres presas segue em constante aumento.
Outro ponto a se destacar é que, segundo os mesmos dados, os crimes que levaram às mulheres à penitenciária são, em sua maioria, furto, roubo ou tráfico, sendo patente a mudança ocorrida desde os últimos tempos, quando, conforme já mencionado, as mulheres eram presas por “crimes passionais” ou ainda à crimes relacionados à prostituição, aborto e infanticídio, todos relacionados com a ideia de “natureza da mulher”.
O que chama a atenção, no entanto, é que, apesar de quase cem mulheres estarem presas, os dados demonstram que no Estado do Piauí não existe sequer um módulo de saúde feminino, voltado à saúde das gestantes e parturientes. Dado espantoso, vez que pesquisa realizada por Malu Amorim (2012, p.4) constatou que, em sua maioria, as detentas se arrependiam da prática dos crimes principalmente por almejarem serem bons exemplos aos filhos e oferecerem à esses os cuidados que elas não tiveram.
Dos dados supramencionados, resta notória a fala do Estado em cumprir a lei e garantir estabelecimentos penais adequados às mulheres grávidas ou em período de amamentação. É possível que, sem o módulo de saúde feminino, as mulheres fiquem sem o devido acompanhamento médico que tanto necessitam, além de serem separadas do filho logo após o nascimento, que ficam privados da amamentação e do afeto materno.
No ano de 2009 foi aprovada a Lei nº 11.942, que previu a possibilidade de os filhos permanecerem com as mães, em creches na penitenciária, até os sete anos de idade. Diante de tal legislação, Vanessa Simões, em artigo publicado, comparou o direito dos filhos das mulheres encarceradas com os filhos das mulheres em liberdade, concluindo que aqueles, confrontados a esses, têm menos oportunidades e mais direitos violados.
Segundo ela, apesar de a legislação visar a proteção dos direitos fundamentais dos filhos, a vida diárias nas prisões não reflete essa proteção como prioridade. Há uma grande divergência entre o texto legal e a prática dentro dos estabelecimentos.
Vanessa então decidiu por categorizar sua pesquisa, visando responder as seguintes perguntas: “há alguma situação em que a criança deve acompanhar a mãe na cadeia? O fato de estar amamentando pressupõe o direito da mãe de ficar com seu filho na cadeia? Como os agentes do sistema penal tratam o tema? O legislador brasileiro produziu leis suficientes para oferecer a proteção que se pretende?”.
Em conclusão à tais questionamentos, foi sugerido que o tempo de permanência das crianças nos presídios seja determinado não pelas direções das penitenciárias, como ocorre hoje, mas por decisões judiciais, onde o juiz poderá analisar o caso com todos os fatos inerentes e, assim, determinar de forma mais acertada a duração da “moradia” do filho na prisão.
Em verdade, deve-se mencionar que existe Resolução do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, datada de julho de 2009, determinando critérios para o processo de separação acima mencionado, definindo que a idade da criança quando da separação deve ser de 1 ano e 6 meses, dentre outras normas. A Resolução, no entanto, foi verdadeiramente ignorada no país.
3.2 As consequências metajurídicas do cárcere para a mulher
Além da maternidade, existem vários outros fatos que precisam ser considerados quando da criação e manutenção de uma penitenciária feminina. Isso se dá diante do comportamento emocional característico das mulheres, que podem, por muitas vezes, ser o responsável pelo cometimento de tais crimes.
Segundo Malu Amorim (2012, p.3) o comportamento emocional feminino resulta em carências afetivas, que podem ensejar um estado de dependência, sujeitando a mulher a se ajustar ao que outra pessoa espera dela, geralmente pelo medo do abandono. No entanto, não se pode confundir essa carência afetiva com a falta de autonomia da mulher na sociedade, vez que, apesar da existência da carência, as mulheres atingem postos cada vez mais altos.
Para Amorim, tudo resulta de uma análise da teoria comportamental. Para ela, o comportamento emocional é aquele responsável pela realização de atos que visem, simplesmente, agradar as pessoas. Skinner dá um exemplo de comportamento emocional afirmando que:
“Tudo o que os amantes fazem no sentido de ficarem juntos ou de evitarem a separação é reforçado por essas consequências, e é por isso que eles passam juntos o maior tempo possível. Nós descrevemos o efeito interno de um reforçador quando dizemos que ele ‘nos dá prazer’ ou ‘faz com que nos sintamos bem’ e, nesse sentido, ‘Eu te amo’ significa ‘você me dá prazer ou me faz sentir-se bem’” (SKINNER, 2013, p.16)
O reforço positivo que advém do comportamento emocional é tão poderoso que, uma vez obtido, fará com que o indivíduo se comporte da mesma maneira repetidas vezes, a fim de produzir o mesmo prazer. Mas, para Martin e Pear (2009), a reiteração do comportamento pode ensejar a pratica de atos indesejados, tudo em virtude da atenção social fornecida.
No caso específico da mulher, esse reforço positivo seriam a sua aceitação na sociedade, aceitação em um grupo específico, passar a imagem de liderança ou até mesmo agradar um companheiro. Foi nesse sentido que a psicologia verificou o aumento de crimes cometidos pela mulher: as mulheres acabam cometendo crimes na convicção de que tais atos sejam recompensados com um dos reforços positivos acima mencionados.
Além do reforço positivo pela aceitação, também se verificou o cometimentos de atos delituosos pelas mulheres em razão de respostas emocionais à certos episódios ocorridos em suas vidas. De acordo com Moreira e Medeiros (2007, p.59), a forma como a mulher se sente diante de um rompimento de namoro ou uma exclusão na sociedade é encarada de maneira infinitamente excessiva quando comparada ao comportamento masculino. O fato pode resultar em uma modificação comportamental apta a ensejar o cometimento de um crime, por exemplo.
Além de ensejar a pratica dos delitos, o comportamento emocional também irá interferir diretamente na forma como as presas irão lidar com a convivência no cárcere. Afirma Diógenes (2007, p.48) que “além das sequelas gerais da prisionalização sofridas pelos presidiários de um modo geral, independentemente de sexo, a mulher sofre com outras consequências mais específicas”. Diógenes complementa afirmando que as mulheres se preocupam mais com a família. Tanto é que, nos dias de visita em presídios masculinos, é maior a quantidade de mulheres que os visitam, assumindo o papel de mães, esposas, filhas, entre outras. Ao contrário, nos dias de visita em presídios femininos, a quantidade de visitantes do sexo masculino, ou visitantes em geral, é visivelmente menor.
O fato merece atenção especial do governo, vez que as políticas específicas às mulheres presas em nenhum momento buscam formas de se minorar a ocorrência da depressão. Ademais, mais de 80% da população carcerária feminina tende a ter tal problema de saúde, que pode acarretar em consequências mais graves, como o suicídio.
Lima (et al, 2013), em artigo publicado e em consonância com o supramencionado, adverte a necessidade de se conceder às apenadas, ainda, cursos profissionalizantes, cuidados psicológicos, haja vista a tendência feminina à depressão, conforme já citado, não descartando, também, a necessidade de cuidados com a condição física feminina. Menciona, ainda, a autora, que a elaboração de estratégias de maior convivência das detentas com os filhos também é de prática indispensável nas penitenciarias femininas, assim como a garantia do direito à visita intima e intimidade de visita às mulheres, o que o sistema brasileiro adota apenas aos homens encarcerados, sem visar que as mulheres possuem necessidades iguais.
Os cárceres femininos urgem, também, a existência de espaços que visem capacitar as detentas, como oficinas de trabalho, por exemplo. É assim que entende Sabroza (et al, 2009), em artigo publicado. A mesma autora ainda fala da importância de se inserir programas de atendimentos psicossociais que busquem a integração da mulher na sociedade quando deixarem o cárcere. A criação de bibliotecas, salas de leitura e espaços multimídias também são relevantes, ainda no entendimento da autora, haja vista que são uma porta de acesso à cultura, alem de contribuírem para o desenvolvimento de raciocínio e conhecimento, além de se mostrarem uma boa válvula de escape ao aglomerado de sentimentos que as levam à decisões impensadas.
Outro projeto pensado por Sabroza foi o de ampliar a oferta de cursos de capacitação, usando-os como uma forma de crescer dentro do presídio e incentivando, por consequência, a segurança emocional entre as mulheres detentas. Os cursos de capacitação cumpririam uma agenda de educação básica e capacitação profissional, “visto que tais ferramentas também abrem novos horizontes para a vida extramuros”.
Há, portanto, a necessidade de que o governo adapte o sistema carcerário feminino para lidar com tal questão, tão recorrente, e não tão verificada nos presídios masculinos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Cumpre lembrar que a evolução da mulher parte de um momento histórico em que sua educação era somente voltada para tarefas do lar. Seu papel era o de estar submissa ao marido, que determinava tudo a ser seguido. Mas a sociedade vem sofrendo alterações nas últimas décadas, principalmente quanto ao reconhecimento da mulher como sujeito de direitos.
Nasceu uma aproximação entre o universo masculino e feminino no universo social, o que acarretou, por consequência, a mesma aproximação dentro do universo criminal. As oportunidades geradas, a inserção da mulher no mercado, a ânsia de seu crescimento cada vez mais aguçado, tudo ensejou, ainda que indiretamente, a cometimento de crimes pela mulher.
Houve um aumento considerável na população carcerária feminina, no entanto, mais uma vez o país não estava preparado para receber mais presos, e desta vez necessitando de condições especiais.
Frente aos problemas apresentados, questiona-se: quais são as consequências metajurídicas da inserção da mulher no cárcere, sem que haja as condições mínimas diferenciadas que esse sexo necessita? A mulher faz jus à manutenção de um sistema carcerário que contemple suas diferenças, como a gravidez, o comportamento emocional, entre outras características que necessitam ser respeitadas. Nasce, portanto, a necessidade de se elencar as consequências metajurídicas do cárcere para a mulher, determinando os fatos que precisam ser considerados quando da criação e manutenção de uma penitenciária feminina. Portanto, é forçoso demonstrar os fatores que distinguem mulheres e homens diante de suas sexualidades biologicamente diversas, para que se entenda quais mudanças são necessárias a fim de que haja um sistema prisional adequado.
Para o entendimento do acima mencionado, apresentou-se um breve histórico acerca do sistema prisional, determinando sua criação através do mundo e no Brasil, destacando o nascimento do sistema prisional feminino. Foi visto que o sistema prisional brasileiro era tido como decadente, havendo uma melhoria somente em 1906, com a construção de um presídio projetado para garantir uma dignidade aos presos.
Em seguida, discorreu-se sobre a evolução da mulher na sociedade, apresentado a relação existente entre as conquistas da mulher e o aumento da criminalidade feminina, estando esses fatores diretamente ligados, haja vista que, com o aumento da atividade feminina e a semelhança de papeis entre homens e mulheres, é consequência que haja também uma semelhança na prática de crimes entre homens e mulheres, haja vista que, hoje, ambos dividem das mesmas necessidades.
Foi visto, também, que, por vezes, a pratica de crimes pela mulher vai além dos motivos divididos pelos homens, haja vista que seu sistema biológico interfere diretamente na prática de delitos, seja por sentimentos ou por necessidades distintas das dos homens.
Para que se atingisse o objetivo do trabalho, qual seja, demonstrar as consequências metajurídicas do cárcere para a mulher, foi necessária uma análise da lei de execução penal, sendo destacadas as normas que são aplicadas diretamente à mulher em razão de suas diferenças, demonstrando, ainda, que a sua aplicação na prática não é eficaz, e que o sistema prisional feminino deixa a desejar.
Assim, com base no estudo feito, verificou-se que a mulher sobre consequências diferentes quando dentro do cárcere. Verificou-se que a quantidade de visitas recebidas pelos mulheres é infinitas vezes menos que a dos homens, vez que as mulheres os visitam mas o contrário raramente acontece. O fato leva a uma depressão geral, vez que elas se veem como excluídas e esquecidas.
Outra importante verificação resultou da análise da gravidez no presídio. A norma determina que a grávida tem direito de amamentação de seu filho durante seis meses. No entanto, a separação de mão e filho ocorre de forma abrupta, trazendo graves consequências tanto à criança, que ficará com pessoa com quem nunca antes teve contato, e para a mãe, que se vê sem seu filho repentinamente.
Portanto, foi importante a realização do presente estudo, vez que demonstrou-se a realidade do sistema prisional feminino e das situações vivenciadas por cada uma delas, se verificando a necessidade de mudança nas políticas públicas a fim de se construir, por consequência, uma sociedade melhor.
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