Conteúdo do poder de direcção nas relações jurídico-laborais

23/02/2016 às 17:49
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Os limites do poder directivo laboral decorrem do conteúdo do próprio poder e dos direitos dos trabalhadores, nomeadamente do respeito pelos princípios basilares do direito no respeito à vida, integridade física, moral e patrimonial da pessoa.

Indice

1. Introdução 2 Definições e terminologias 2.1 Poder de direcção 2.2 Poder regulamentar  2.3 Poder organizativo e poder de vigilância 2.4 Poder disciplinar 3 Fundamentos do poder directivo 3.1 Fundamentos doutrinários 3.2 Fundamentos legais  4 Natureza juridica do poder de direcção 4.1 Concepção como direito potestativo 4.2 Concepção como direito subjectivo 4.3 Concepção como carácter senhorial  4.4 Concepção de poder de direcção como direito-função 4.5 Posição a adoptar 5 Conteúdo do poder de direcção 6 Limites do poder directivo 7 Conclusão 8 Referências 9 Bibliografia

1. INTRODUÇÃO   
 
O  poder  de  direcção  é  o  conjunto  de  prerrogativas  asseguradas  ao  empregador  para  oexercício no contexto da relação de emprego, conferindo ao mesmo enorme influência no âmbitodo  contrato  de  trabalho  e  da  própria  organização  empresarial.Segundo considerações de  vários autores,  a  relação de emprego constitui a  relação de  trabalhomais significativa do sistema económico, motivo pelo qual o conhecimento acerca do fenómenopoder de direcção é bastante relevante para o conhecimento da sociedade actual.Com  a presente apresentação,  propusemo-nos  tecer  algumas  considerações  acerca  doselementos  que  caracterizam  o  CONTEúDO  DO  PODER  DE  DIRECÇÃO  no  âmbito  das relações juslaborais.
A figura do poder de direcção timidamente tratada na nossa ordem jurídica revela-se hojede  uma  essencialidade  premente  na  concretização  dos  contratos  de  trabalho  mercê  dasubordinação  jurídica  que  lhes  é  inerente.  Contudo,  para  um  país  com  idiossincrasias  muitopróprias como Moçambique, o operador jurídico não pode estar atento tão-somente aos aspectostécnicos jurídicos, devendo também se ater às projecções e reflexos sociais não só na sociedade,mas  principalmente  dentro  da  própria  empresa,  onde  a  importância  de  tal  fenómeno  ainda  é desconhecida  por  muitos.  Na  realidade,  o  poder  de  direcção  quando  bem  aplicado  podetransformar a vida de uma empresa e dos empregados que nela  trabalham, vez que o ambientepode  ser  harmónico  e  direccionado  ao  crescimento  de  todos,  isto,  se  houver  um  excelente comando  da  prestação  pessoal  dos  serviços,  organização,  controle  e  punição  do  trabalhador
somente na hora certa e necessária.
É neste sentido que nos propusemos criticamente analisar o  instituto em apreço assenteno  seu  regime  jurídico  e  na  doutrina  de  interesse.  Trata-se  de  um  tema  central  do Direito  doTrabalho com  implicações práticas muito profundas mas cujo estudo doutrinário revela-se aindaincipiente.
A apresentação vai ter um enfoque teórico. Em 1º  lugar, proceder-se-á a uma definição do queseja o poder de direcção e o seu enfoque, em 2º os fundamentos do poder de direcção, em 3º asua natureza jurídica, em 4º o seu conteúdo, em 5º os seus limites e em 6.º as conclusões.
O trabalho segue uma metodologia expositiva apresentada de modo contínuo.

Ao  longo  da  exposição,  sempre  que  não  vier  indicada  a  lei  que  serve  de  suporte  aasseveração  feita,  deve-se  entender  que  pertence  a  Lei  de  Trabalho,  aprovada  pela  Lei  n.º23/2007, de 1 de Agosto.

2 DEFINIÇÕES E TERMINOLOGIAS
 
De modo geral, quando se fala de poderes do empregador, a doutrina permite identificaros seguintes vectores da posição jurídica do empregador: Poder de direcção. Poder organizativo,de vigilância e de controlo. Poder regulamentar. Poder disciplinar.  
Entretanto, é importante salientar que há uma tendência de proceder a uma classificaçãodesignando os poderes de direcção e disciplinar como modalidades específicas, isto, porque essasduas  dimensões  têm  alcançado  amplitude,  consciência  e  identidade  própria1.  No  tocante  aospoderes  regulamentar  e  de  controlo  há  questionamentos  acerca  da  real  identificação  comomodalidades  especificas,  sendo  que muitos  autores  preferem  concebê-los  como manifestaçõesconexas ou extensivas do próprio poder de direcção.

2.1 PODER DE DIRECÇÃO


O  poder  de  direcção  é  caracterizado  como  o  conjunto  de  prerrogativas  conferidas  aoempregador  para  dirigir  a  organização  da  estrutura  de  seu  empreendimento,  o  que  engloba  os espaços,  a  actividade  desenvolvida,  o  processo  de  trabalho,  a  estrutura  jurídica,  número  defuncionários,  cargos,  funções,  horários,  especificação  e  orientações  diárias  da  prestação  deserviços etc. Neste sentido, é definido como o poder atribuído ao empregador ou a pessoa por ele
designada:  “… de  fixar, dirigir,  regulamentar  e disciplinar os  termos e as condições  em que a actividade deve ser prestada” (artigo 60.º da LT).
Segundo Paula Ramalho2  o poder de direcção do empregador  tem como contrapartida odever de obediência do  trabalhador, princípio que, no nosso caso subsume-se no artigo 58.º, al.b) da LT.
As  regras de carácter predominantemente directivas que o  trabalhador deve observar nocumprimento da obrigação dá destino correcto às energias de trabalho que o mesmo é obrigado acolocar e a conservar a disposição da empresa da qual depende.
A  doutrina  dominante  defende  haver  necessidade  da  concentração  do  poder  deorganização na figura do empregador, isto, em virtude dos riscos do empreendimento que sobreele recai e do controle jurídico que necessita exercer sob diversos ângulos.

Por outro  lado,  segundo ainda Paula Ramalho3, nem  sempre  é possível determinar  comprecisão a prestação do  trabalho  subordinado. Diferentemente do que ocorre nos “contratos deprestação  de  serviço  em  que  a  prestação  já  aparece  determinada,  no  contrato  de  trabalho,atendendo ao facto de ele perdurar no  tempo, torna-se  inviável a determinação prévia de toda aactividade que tem que ser desempenhada pelo trabalhador, exigindo-se por isso a concretizaçãopelo empregador das tarefas concretas a desempenhar”.  
Essa  concretização  das  tarefas  pelo  empregador  decorre  ainda  segundo  a  doutrina  dePaula Ramalho de, pela natureza do contrato de  trabalho, caber ao empregador a definição dasactividades do  trabalhador, ao contrário do que ocorre no contrato de prestação de serviços emque  a  parte  aguarda  passivamente  o  resultado.  Pelo  poder  de  direcção  “garante-se  assim  ao empregador  o  pleno  aproveitamento  da  actividade  do  trabalhador  e  não  apenas  do  resultado dessa actividade”.
Ainda decorre de um princípio basilar do funcionamento da empresa como uma entidadeque  não  pode  funcionar  sem  uma  hierarquia.  O  poder  de  direcção  permite  uma  adequadaorganização da empresa, onde a autoridade sobre os membros é exercida num plano vertical.

2.2 PODER REGULAMENTAR


É  o  conjunto  de  prerrogativas  do  empregador  para  a  fixação  de  regras  gerais  a  seremobservadas  no  âmbito  do  estabelecimento  e  da  empresa. Neste  sentido, o Poder Regulamentarrecebe  grande  destaque,  sendo  afirmado  que:  “O  empregador  pode  elaborar  regulamentosinternos  de  trabalho  contendo  normas  de  organização  e  disciplina  do  trabalho,  os  regimes  deapoio social aos trabalhadores, a utilização de instalações e equipamentos da empresa, bem comoas  actividades  culturais,  desportivas  e  recreativas,  sendo,  porém,  obrigatório  para  as médias  e grandes empresas” (artigo 61.º, n.º 1 da LT).
 Para  Monteiro  Fernandes4   e  Romano  Martinez5,  o  poder  regulamentar  é  umamanifestação  do  poder  de  direcção  pois  não  seria  justificável  a  percepção  de  uma  identidadeprópria  no  chamado  poder  regulamentar.  Na  verdade,  este  seria  mera  expressão,  isto  é,manifestação exterior do poder directivo. É que o poder directivo somente poderia concretizar-se através  da  utilização  de  meios  informais  e  formais  de  comunicação  com  o  público  intra-empresarial.
Portanto, desde  instruções directas e pessoais a cada  trabalho até a expedição de  regrasgerais  e  regulamentos escritos,  circulares e ordens de  serviços. Noutras palavras,  a  linguagem,seja escrita ou verbal, seria  instrumento central de exteriorização do poder directivo, razão pelaqual não poderiam seus  instrumentos ser considerados dimensão própria e distinta do poder do empregador, mas mera manifestação do poder de direcção, a ver.  
A forma dessa manifestação, segundo Amauri Nascimento6, reveste-se de duas espécies:manifestações gerais e manifestações particulares, as primeiras consubstanciadas no regulamento
da empresa, aviso e circulares, as últimas nas ordens de carácter  individual. Nesse contexto, tais diplomas  (ordens de serviços, circulares e  regulamentos  internos) não se compreendem  fora do núcleo do fenómeno do poder directivo, nem se poderia compreender esse poder como limitado a mecanismo de natureza meramente pessoal (ordens directas etc.).
Em  resumo,  a  actividade  regulamentar  seria  apenas  o meio  de  concretizar  as metas  e intenções da direcção dentro do estabelecimento e da empresa, sendo  inegável o facto de que se não  existisse  linguagem  escrita  e  verbal  não  haveria  manifestação  do  poder  directivo  na concepção material e jurídica.

O  poder  regulamentar,  ensina-nos  Paula  Ramalho7,  “manifesta-se  na  possibilidade  de delimitação  das  regras  de  prestação  do  trabalho  e  de  disciplina  na  empresa  através  do
regulamento da empresa”. Através do regulamento da empresa, a entidade empregadora constitui um instrumento dedelimitação  das  regras  de  conduta  dos  trabalhadores  no  seio  da  organização,  regras  essas  que podem  dizer  respeito  à  prestação  do  trabalho  ou  respeitantes  aos  deveres  acessórios  dos trabalhadores, integrantes ou acessórios de independentes da prestação principal.
Entendemos  que  o  regulamento  de  empresa  é  essencial  ao  seu  bom  desenvolvimento, porquanto estabelece transparência na relação contratual. 

2.3 PODER ORGANIZATIVO E PODER DE VIGILÂNCIA

Segundo Palma Ramalho, o poder organizativo é eminentemente um poder de gestão que assiste  ao  empregador,  não  enquanto  tal mas  na  qualidade de  empresário. Traduz-se  no  poder conferido ao empresário de organizar as unidades produtivas, desde a criação da empresa até à sua extinção com recurso às regras de gestão.
Também  conhecido  como  poder  de  controlo,  caracterizado  como  o  conjunto  de prerrogativas  com  a  finalidade  de  propiciar  o  acompanhamento  contínuo  da  prestação  de trabalho,  vez  que  a  actividade  é  subordinada  à  direcção  do  empregador,  não  podendo  ser exercida do modo que o empregado pretende.
Manifestações do poder de controlo são medidas simples a serem observadas no decorrer do contrato, tais como controle do livro de ponto, prestação de contas, revistas, etc.
Relevante parte da doutrina conclui que o poder de controlo não é um poder autónomo e sim uma simples manifestação do poder directivo em geral realizado como pressuposto do poder disciplinar,  pois,  se  assim  se  manifesta  à  disciplina  do  poder  directivo,  tal  poder  continua  a realizar-se,  transformando-se  em  poder  de  controlo,  pela  vigilância  sobre  a  efectiva  e  regular actuação,  seja  da  organização  do  trabalho  estabelecida,  seja  pelas  funções  confiadas  a  cada trabalhador individualmente.
Certamente  há  limites  que  norteiam  o  poder  de  controlo.
Ordenamentos  jurídicos  mais  avançados  estabelecem  limites  em  benefício  da  protecção  à liberdade  e  dignidade  básicas  da  pessoa  do  trabalhador.  No  entanto,  apesar  do  ordenamento jurídico nacional não possuir definições tão claras e específicas, possui regras e princípios gerais capazes de orientar o operador do direito em face de situações concretas.
A Constituição da República nos seus artigos 40.º e 41.º rejeita condutas que agridam a liberdade e a dignidade da pessoa humana, buscando assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais. Na prossecução decorre dos artigos 70.º e seguintes do C. Civil o reconhecimento do direito de personalidade, ao bom nome, imagem e reputação.  
É  inegável que essas regras e princípios gerais criam uma fronteira ao poder de controlo na  relação  de  emprego,  tornando  notoriamente  ilegais  quaisquer  medidas  que  agridam  a liberdade e a dignidade do empregado.  
 
2.4 PODER DISCIPLINAR

É  o  conjunto  de  prerrogativas  concentradas  no  empregador  dirigidas  a  propiciar  a imposição de  sanções aos empregados em  face do  incumprimento culposo das  suas obrigações contratuais.
Embora possa também ser considerado como simples dimensão ou extensão do poder de direcção, esse poder disciplinar  tem sido  identificado como poder  independente, em virtude da existência  de  figuras  jurídicas  específicas  ao  seu  exercício,  como  as  noções  de  ilícito  laboral, sanção e procedimento punitivo.
No nosso quadro legal, o fundamento do poder disciplinar vem regrado nos artigos 62.º e seguintes  da  LT,  sendo  que  o  empregador  tem  poder  disciplinar  sobre  o  trabalhador  que  se encontre ao seu serviço, podendo aplicar-lhe as sanções disciplinares previstas na lei.
No geral a doutrina é unânime em  tratar como  realidades distintas,  embora  conexas, os poderes de direcção e disciplinar8. Não nos debruçaremos, em conformidade, a mais perorações em torno desta figura. 

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3 FUNDAMENTOS DO PODER DIRECTIVO
 
A análise acerca do fundamento jurídico do poder directivo divide-se em duas dimensões:a doutrinária e a legal.
A  legal está baseada nos textos legais que conferem o respaldo  jurídico ao fenómeno dopoder  directivo,  já  a  doutrinária,  busca  a  efectiva  fundamentação,  isto  é,  a  causa  ou  factor  daprópria existência do fenómeno.
 
3.1 FUNDAMENTOS DOUTRINÁRIOS

A  teoria  justrabalhista tem elegido algumas principais  interpretações acerca da origem eundamentação  do  poder  no  contexto  empresarial  interno.  Trata-se,  segundo  Amauri Nascimento9,  das  correntes  privatisticas,  que  se  remetem  à  ideia  de  propriedade  privada;  dacorrente  institucionalista,  que  se  reporta  à  ideia  de  empresa  como  instituição;  da  corrente publicística,  que  se  remete  à  ideia  do  poder  directivo  como  delegação  do  poder  público;  e
inalmente, das concepções contratualistas.

Assente  nesta  última, Paula Ramalho10  reconhece  a  importância  do  poder  directivo  em dois níveis. O primeiro, porque dele decorre a  legitimação da subordinação  jurídica, no sentido do  reforço da posição contratual de domínio do empregador. O  segundo, porque  “este poder  é sistematicamente reduzido à função de garante da eficácia dos comandos emanados do primeiro poder”. Seria pois  inconcebível o poder de direcção à margem de quaisquer  contratos entre os
dirigentes e os dirigidos.
 
3.2 FUNDAMENTOS LEGAIS

Estes  buscam  os  textos  normativos  que  vigoram  e  dão  suporte  à  presença  do  poder directivo no contexto do Direito,  entretanto, conforme  já esclarecido anteriormente, não há  no nosso  Direito,  regra  jurídica  expressa  que  faça  referência  ao  poder  directivo,  sendo  que  sua existência deriva da estrutura e dinâmica do próprio contrato de trabalho e ainda do conjunto de prerrogativas a ele inerente e distribuído entre contratante e contratado.

A  nossa  LT,  portanto,  por  vias  indirectas  ou  implícitas  é  que  tende  a  tratar  do  poder directivo,  estabelecendo  ou  limitando  prerrogativas  no  contexto  intra-empresarial.Entre as  referidas normas destaca-se o artigo 60.º que  faz  referência ao empregador no que dizrespeito à direcção da prestação dos serviços; o artigo 117.º que prevê  remuneração para quem exerce  cargo  de  direcção  ou  chefia;  artigo  38.º,  n.º  4,  al.  g)  que  obriga  a  forma  escrita  nas
comissões de serviço, entre outros.

4 NATUREZA JURIDICA DO PODER DE DIRECÇÃO
 
Na  doutrina  brasileira, Amauri Nascimento11   refere  que  a  pesquisa  acerca  da  natureza jurídica tem gerado algumas concepções distintas, havendo destaque para as seguintes:
 
4.1 CONCEPÇÃO COMO DIREITO POTESTATIVO
É  a  prerrogativa  que  assegura  ao  empregador  o  alcance  dos  interesses  por  exclusivoexercício de sua própria vontade.

4.2 CONCEPÇÃO COMO DIREITO SUBJECTIVO
Trata-se da prerrogativa conferida ao empregador para satisfação do interesse próprio emestrita conformidade com a norma ou cláusula contratual por esta protegida.
 
4.3 CONCEPÇÃO COMO CARÁCTER SENHORIAL
Concebido como situação hierárquica, embora admita o contrato como  título  jurídico dopoder, há uma estrutura rígida entre os contratantes.
 
4.4 CONCEPÇÃO DE PODER DE DIRECÇÃO COMO DIREITO-FUNÇÃO
Atribui ao empregador não somente prerrogativas  favoráveis, mas  também um dever deagir para tutela de direito alheio.
 
4.5 POSIÇÃO A ADOPTAR
Analisando as citações, percebe-se que as três primeiras muito têm em comum, sendo quea  quarta  é  a  mais  avançada,  visando  à  satisfação  do  interesse  não  do  empregador,  mas  da empresa.  Ressalte-se  ainda  uma  nova  concepção  de  poder  como  relação  jurídica  contratual complexa,  variável  entre  os  componentes,  considerando  sua  projecção  individual  e  colectiva,alcançando ou sancionando condutas no plano do estabelecimento e da empresa.
Entretanto  na  nossa  ordem  normativa,  assente  em  Paula  Ramalho12,  o  poder  directivo corresponde  a  um  direito  subjectivo  em  sentido  estrito,  na medida  em  que  tem  uma  estrutura compreensiva e que o seu conteúdo se reconduz à uma permissão normativa específica que tende ao aproveitamento de um bem, no caso a actividade laboral do trabalhador. O grande  interesse nesta matéria é  seguramente encontrar  fundamento que sustente, natitularidade de um ente do direito privado, de uma posição jurídica de domínio ou da supremacia de um ente sobre outro no domínio do direito privado.Para Paula Ramalho13,  não  obstante  algumas  variações  de  pormenor, o  poder  directivo justifica-se pela conjugação de dois argumentos fundamentais:

-  a  natureza  relativamente  indeterminada  da  prestação  laboral,  tendo  a  prestação  detrabalho  conteúdo  relativamente  indeterminado,  o  poder  directivo  é  essencial  para  a concretização ou especificação do objecto do contrato;
-  a  necessidade  de  coordenação  da  prestação  do  trabalhador  com  as  exigências  daorganização  produtiva  e  com  as  prestações  dos  demais  trabalhadores,  sendo  nesta  vertente  de organização da empresa o poder directivo a única  forma de coordenar o conjunto de prestações laborais  na  empresa  e,  nessa  medida,  é  reconhecido  como  o  sustentáculo  da  organização
empresarial.
 
5 CONTEUDO DO PODER DE DIRECÇÃO
 
Na sequência do mencionado no ponto 3, no conteúdo do poder directivo  incluem-se as faculdades de, em  função da categoria do  trabalhador,  lhe indicar a actividade a desenvolver, omodo como deve ser efectuada, o local onde será realizada, bem como as alterações à actividade,modo,  local,  etc.  desde  que  as mesmas  não  apresentem  qualquer  pressuposto  de mudança  de categoria, no seguimento do estatuído no artigo 59.º, als. f) e g) da LT.

Romano  Martinez   inclui  ainda  no  conteúdo  do  poder  directivo  a  fiscalização  da actividade, nos casos de se exigir ao trabalhador que assine o livro de ponto, as instruções quanto a sua realização ou a determinação do momento em que a tarefa deve ser desenvolvida.Para Paula Ramalho  são  três  as manifestações  essenciais que  exprimem  o  conteúdo  do poder directivo.
A primeira manifestação, que tem a ver com a determinação da função do trabalhador e que  passa  pela  integração  dessa  função  por  determinado  conjunto  de  tarefas  sendo  que  o empregador deve, sempre, procurar adequar a função do trabalhador à sua aptidão e qualificação profissional.
A segunda, respeitante a conformação da actividade laboral em concreto, ou seja, com o direccionamento do trabalhador quanto ao modo, tempo e local de desempenho do trabalho.
Por último, uma manifestação de acompanhamento, que se revela no já referido poder de vigilância  ou  de  controlo  do modo  de  cumprimento  da  prestação  de  trabalho  e  dos  deveres acessórios pelo trabalhador.

6 LIMITES DO PODER DIRECTIVO
 
O poder directivo,  traduzindo-se no poder do empregador de direccionar a prestação do trabalhador às suas necessidades concretas e conjugá-la com as restantes prestações de trabalho que se desenvolvem no seio da sua organização não pode ser exercido em termos absolutos. Há limites ao poder directivo. E estes  limites decorrem do conteúdo do próprio poder e dos direitos dos  trabalhadores,  nomeadamente  no  respeito  pelos  princípios  basilares  do  direito  no  respeito
pela vida, integridade física, moral e patrimonial da pessoa.  
Com  efeito,  o  trabalhador  não  deve obediência  sempre  que  as  ordens ou  instruções  de serviço se mostrem contrárias aos seus direitos e garantias. 
O trabalhador pode legitimamente recusar ordem recebida desde que esta atente contra as garantias que a  lei  lhe atribui, assim como na eventualidade de o cumprimento envolver perigo para a sua vida ou integridade física e ainda quando implicar a prática de um acto ilícito.

Sobre o que se pode entender por licitude há que visitar nos termos gerais o que postula o Código Civil. Com efeito, assente no

7 CONCLUSÃO
 
A essência do papel do empregador é a obtenção de resultados por meio de terceiros, do desempenho  dos  empregados  que  ele  supervisiona  e  coordena,  pois  o  trabalho  é  o  principal factor de produção de riqueza.
Considerando  o  que  foi  visto,  pode-se  partir  para  uma  definição  abrangente  do  poder directivo:  planear,  organizar,  liderar,  coordenar,  administrar  e  controlar  as  actividades de  uma empresa  ou  estabelecimento,  diagnosticando  suas  deficiências  e  identificando  seus  aspectos
positivos;  estabelecendo  metas,  planos  e  programas  para  sanar  as  deficiências  e  expandir  e desenvolver  os  aspectos positivos;  tomando,  dentro  do  seu  âmbito,  as  decisões  e  providências necessárias para  transformar  em acções e  realidade desses planos e programas,  controlando os seus resultados, com vista ao cumprimento das metas estabelecidas.
Apesar das separações teóricas, dos conceitos específicos e próprios da divisão do poder directivo,  na  prática,  há  uma  interacção  extremamente  forte,  fazendo  com  que  o  empregador assuma  o  papel  de  planear,  controlar,  organizar,  coordenar,  liderar  e  promover  recursos humanos, pois de nada adianta planear se não se controla o que  foi planeado, sendo  impossível controlar o que não foi planeado.
Se  o  trabalho  é  dividido  e  atribuído  a  mais  de  uma  pessoa  (organizar),  será  preciso coordenar os esforços para que eles  se efectuem  de  forma ordenada, pois de  nada adiantará osmelhores recursos humanos se não houver condução e liderança. Logo, um bom empregador queconsegue usar a prerrogativa do poder directivo é capaz de estabelecer  relações de  trabalho emque os recursos disponíveis sejam aplicados eficiente e eficazmente, a fim de que a empresa e os
seus  funcionários realizem os seus objectivos mútuos, pois o segredo do sucesso é  formar uma boa equipe e liderá-la, o resto é consequência.

8. REFERENCIAS

1 Nesta linha situa-se Romano Martinez, Direito do Trabalho, 5ª edição, 2010, pp. 667-668, para quem o poder de direcção, embora conexo com o poder disciplinar, não se confunde.   

2 Tratado do Direito do Trabalho, I, 3ª edição, 2012, p. 313

3 Tratado do Direito do Trabalho, I, op. cit., pp. 313-314. 

4 Direito do Trabalho, 16ª edição, 2012, p. 275

5 Direito do Trabalho, 5ª edição, 2010, p. 671

6 Compêndio de Direito do Trabalho, 1976, p. 376

7 Tratado de Direito do Trabalho, Parte II, 4ª edição, 2012, p. 613

8 Assim, Romano Martinez, Direito do Trabalho, 5ª edição, 2010, pp. 667-668.

9  Compêndio do Direito de Trabalho, op. cit., pp. 383 e segs.

10 Tratado…, II, op. cit., p. 623

11 Compêndio de Direito do Trabalho, op. cit., pp. 380-388

12 Tratado…, II, op.  cit. 623-624

13 Tratado…, II, op. cit., p. 624

14  Direito do Trabalho, 5ª edição, 2010, pp. 669-670

BIBLIOGRAFIA
 
FERNANDES, Monteiro, Direito do Trabalho, 16ª edição, Almedina, Coimbra, 2012
 
RAMALHO,  Paula,  Tratado  de  Direito  do  Trabalho,  Parte  I,  3ª  edição,  Almedina,
Coimbra, 2012
 
RAMALHO,  Paula,  Tratado  de  Direito  do  Trabalho,  Parte  II,  4ª  edição,  Almedina,
Coimbra, 2012
 
MARTINEZ, Romano, Direito do Trabalho, 5ª edição, Almedina, Coimbra, 2010.
 
NASCIMENTO,  Amauri  Mascaro,  Compêndio  de  Direito  do  Trabalho.  São  Paulo:
LTr/USP, 1976.

Sobre o autor
Carlos Pedro Mondlane

Juiz de Direito e docente universitário. Presidente do Tribunal de Polìcia da Cidade de Maputo. Presidente da União Internacional dos Juízes da CPLP. Membro do Conselho Superior da Magistratura Judicial. Formador no Centro de Formação Jurídica e Judiciária (CFJJ). Pós Doutorando em Direitos Humanos, Saúde e Justiça pela Universidade de Coimbra. Doutorado em Direito Privado pela Universidade Católica de Moçambique e Universidade Nova de Lisboa. Mestrado em Direito pela Universidade Católica de Moçambique. Licenciado em Direito pela Universidade Eduardo Mondlane. Prelector e autor de livros e artigos jurídicos publicados em revistas de especialidade. Autor, entre outros, de:- Comentário da Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos (Coord. Pinto de Albuquerque), Lei de Promoção e Protecção dos Direitos da Criança, Anotada e Comentada- Código de Processo Civil, Anotado e Comentado- Colectânea dos 15 Anos da Lei de Terras: Venda de Terra em Moçambique: Mito ou Realidade?- Manual Prático dos Direitos Humanos - Constituição de Moçambique Anotada (no prelo)

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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