DRU - Desvinculação de Receita da União.

Contornos da PEC nº. 87/2015

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Ante a iminente prorrogação da desvinculação das receitas da União pela PEC nº. 04/2015, apensadas as PECs nº. 87 e 112 de 2015, proponho uma reanálise de suas implicações sobre as normas de competência tributária e da destinação de sua arrecadação.

  1. INTRODUÇÃO

Para a análise da natureza das implicações da PEC nº. 04/2015, em apenso as PECs nº. 87 e 112 de 2015, em matéria tributária, se faz necessário estabelecer as premissas que serão adotadas, para assim nos debruçarmos no mérito da eficácia técnica das normas de desvinculação das receitas da União sobre as normas de competência tributária.

Motivo pelo qual, resta necessário perpassarmos sobre a semântica do conteúdo normativo de tributo, a fim de se construir as bases de nossa argumentação, e reduzir os ruídos comunicacionais de nossos conteúdos significativos.

Com o passar do tempo e a evolução dos estudos lógicos, verificou-se que as manifestações deônticas poderiam, mediante alguns ajustes dos modais e a função desempenhada pelo discurso jurídico, aproveitar-se das operações lógicas da definição e classificação.

A definição de um termo, na forma de uma categoria lógica, é o exercício de fixação de elementos conotativos ou denotativos em uma classe, que permita compreender seu aspecto semântico a fim de incluir objetos em seu conteúdo ou distingui-los dos demais que não apresentem as características fixadas, auxiliando o interprete na organização da realidade em que habita.

As definições representam a operação lógica que demarca os limites do campo de irradiação semântica de uma ideia, noção ou conceito, na qual o termo a ser definido ocupa a posição de sujeito e os elementos definitórios perfazem o predicado, que registram os cortes realizados para isolar o objeto.

Como qualquer sistema comunicacional, o direito dispõe dos mesmos elementos inerentes ao processo comunicativo, que nas palavras do linguista Roman Jakobson é afiguram-se “a transmissão por um agente emissor, de mensagem, veiculada por um canal, para o receptor, segundo um código comum e dentro de um contexto”[1].

Sendo assim, o direito encontra-se vulnerável a incidência de impropriedades do sistema comunicacional sobre qualquer um dos seis elementos destacados por Jakobson. Para estas, chamamos de ruídos comunicacionais que são os fatores que interferem negativamente no processo comunicacional, prejudicando a comunicação entre o emissor da mensagem com seu receptor, entre eles a vaguidade, ambiguidade e forte carga emotiva.

Tais vícios são completamente característicos da linguagem, nem mesmo a linguagem mais complexa consegue afastar por inteiro sua incidência. Entretanto no intuito de afastar tais vícios, utilizar-se o emissor de instrumentos que melhorem a precisão do discurso, se valendo de técnicas de definição denotativa e conotativa que contribuam ao processo de elucidação dos conceitos propostos.

Para enumerar os elementos, ou indivíduos que pertencem a uma classe, fala-se em extensão, ou denotação. Para falar das condições de pertinência à classe que abrange esses indivíduos, fala-se em intensão, ou conotação.

A eleição de critérios seguros para a construção de classes encontra dificuldade, porém, na ambiguidade e vagueza das palavras, o que deve ser superado através da elucidação, ou seja, elaboração do sentido e das definições de um termo de forma mais detalhada.

O Professor Paulo de Barros Carvalho[2], ao destacar a Plurissignificação do termo tributo, elencou seis acepções jurídicas do vocábulo “tributo”, são elas: a) como quantia em dinheiro; b) como prestação correspondente ao dever jurídico do sujeito passivo; c) como direito subjetivo de que é titular o sujeito ativo; d) como sinônimo de relação jurídica tributária; e) como norma jurídica tributária; f) como norma, fato e relação jurídica.

Isto porque, o conceito é uma entidade linguística constituída que determina a significação do signo, pela qual se perfaz a captação dos traços de unidade e permanência na linguagem edificadora da realidade humana, isolando-a dos outros elementos de linguagem que constroem uma ideia.

 A conceituação é um ato de classificação, intrínseco ao sujeito cognoscente, variável de acordo com o ponto de vista de que se faz a investigação. Mas não se deve confundir, todavia, as definições com os elementos que se pretende definir, pois aquilo que se se definem são os conceitos, nunca as coisas em si.

Neste diapasão, revela-se necessário diferenciar o conceito de um tributo de sua definição, visando ultrapassar a ideia ou a noção representativa do objeto tributo de forma geral e abstrata na forma de uma unidade semântica para fixar lhes elementos conotativos e denotativos que o categorizem logicamente na forma de distinguir sua classe de elementos discrepantes.

Neste sentido, restam as lições de Tárek Moysés Moussallem que assim leciona:

Definir é operação lógica entre dois conceitos, que consistem em indicar, por meio de linguagem, as características ‘essenciais’ ou definitórias que deve reunir a linguagem do objeto – definiens -, para que o termo definido (outro conceito) – definiendum – lhe seja aplicável.[3]

A atividade definitória atua ora pela extensão (denotação), ora pela intensão (conotação), sendo que numa ou noutra demarca-se uma classe. No campo do direito, as definições conotativas cuidam dos tipos, das previsões gerais e abstratas postas nas leis, enquanto as definições denotativas cuidam dos fatos jurídicos.

Geraldo Ataliba define tributo, como conceito básico, “instituto nuclear do direito tributário (entendido com sub-ramo do direito administrativo), como obrigação (relação jurídica)”. E define juridicamente “tributo como obrigação jurídica pecuniária, ex lege, que se não constitui em sanção de ato ilícito, cujo sujeito passivo é alguém nessa situação posto pela vontade da lei, obedecidos os desígnios constitucionais (explícitos ou implícitos)."[4]

Alfredo Becker define tributo como objeto da relação jurídica que satisfaz o dever jurídico tributário. Dizendo que:

A regra jurídica especificamente tributária é a que, incidindo sobre fato lícito, irradia relação jurídica em cujo pólo negativo situa-se, na posição de sujeito passivo, uma pessoa qualquer e em cujo pólo positivo, situa-se, na posição de sujeito ativo, um Órgão estatal de função executiva e com personalidade jurídica. A relação jurídica tributária (como, aliás, qualquer outra relação jurídica) vincula o sujeito passivo ao sujeito ativo, impondo ao sujeito passivo o dever de efetuar uma predeterminada prestação e atribuindo ao sujeito ativo o direito de obter a prestação. O tributo é o objeto daquela prestação que satisfaz aquele dever.[5]

Ao lado da definição alética, existe também a definição deôntica que decorre de um ato de vontade por parte de um sujeito competente, o que se chama de definição estipulativa, conforme se apresenta no enunciado do art. 3º do Código Tributário Nacional.

Na forma de definição estipulativa, o direito positivo preocupou-se o legislador em enunciar em seu art. 3º do CTN a aparente definição do objeto, versando; “Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada”, complementada pelo art. 5º do mesmo diploma “Os tributos são impostos, taxas e contribuições de melhoria”.

Entretanto, observa-se que esta definição de tributo se preocupa apenas em determinar as diferenças especificas que caracterizam o tributo, sem se preocupar em explorar uma conceituação especifica ao instrumento, complementada com elementos que compõe seu espectro significativo, mas mesmo assim, não exploram a amplitude semântica de todas as dimensões componentes do objeto a ser considerado, além das diferenças especificas elencadas no art. 3º do CTN, o tributo pode ser objeto de uma relação jurídica obrigacional ou até mesmo a própria relação jurídica, da qual cabe ao Estado a titularidade da competência tributária.

Sendo assim, para fins de prospecção acadêmica, o tributo será categorizado logicamente como norma jurídica tributária-matriz de incidência sobre um fato jurídico constitutivo sobre uma obrigação relacional.  

  1. CLASSIFICAÇÃO DAS ESPÉCIES TRIBUTÁRIAS
    1. Teoria das classes.

Ao construir conjuntos classificamos, e ao explicar aquilo que permitiu isolar o objeto definimos. Definição e classificação, portanto, são operações lógicas que em muito se aproximam e, muitas vezes, se implicam reciprocamente.

Classe é a palavra empregada para designar o conjunto que reúne elementos segundo um método, ou critério. Assim, a pertinência de um objeto a um dado conjunto é resultado de um juízo binário (pertence ou não pertence) sobre a propriedade em questão. Classificar é a operação que permite reunir em conjuntos certos elementos, pressupondo a diferença.

Quando o legislador estabelece fatos e condutas pertencentes ao direito, está segregando fatos jurídicos de fatos não jurídicos, condutas prescritas pelo direito e condutas não prescritas pelo direito, estabelecendo assim os fatos e condutas que produzem relevância jurídica como o campo de sua realidade de acordo com seus elementos estruturais.

Segundo a teoria das classes o interprete utiliza os recursos da classificação para reordenar sua realidade de acordo com sua necessidade, utilizando-se das semelhanças entre os objetos para separa-los em classes, para o estudo das normas jurídicas, quando o legislador estabelece fatos e condutas pertencentes ao sistema jurídico não esta fazendo nada mais do que dividir fatos jurídicos e fatos não jurídicos, condutas prescritas pelo direito e condutas não prescritas pelo direito, estabelecendo assim os fatos e condutas que produzem relevância jurídica como o campo de sua realidade.

Neste sentido, o ato de classificar é uma operação lógica realizada pelo homem, separando os objetos em classes de acordo com as semelhanças entre eles existentes. Nas palavras do Professor Paulo de Barros Carvalho “Classificar é distribuir em classes, é dividir os termos segundo a ordem da extensão ou, para dizer de modo mais preciso, é separar os objetos em classes de acordo com as semelhanças que entre eles existam, mantendo-os em posições fixas e exatamente determinadas com relação às demais classes.”[6]

O que define se um elemento pertence ou não a uma classe é a sua relação de pertinencialidade com a mesma, ou seja, se enquadrar ou não ao critério eleito pelo cientista para identifica-lo, nesse procedimento, como ensina RICARDO GUIBOURG “agrupamos os objetos individuais em conjunto ou classes e estabelecemos que um objeto pertencerá ou não a uma classe determinada quando reúna tais ou quais condições”.[7]

A definição se perfará de forma conotativa quando verificar a atribuição dos critérios de uso da palavra; por exemplo, mamífero é a palavra de classe que alberga todos os elementos que têm a característica de possuir glândula mamária. De outro lado, a definição será denotativa quando especificar todos os objetos do mundo que se subsumam a essa palavra, por exemplo, as palavras vaca, baleia e homem são denotações da palavra mamífero.

Já a classe é o conjunto de indivíduos que preenchem alguns requisitos de admissão e que fazem com que entre eles haja identidade em determinado aspecto. É uma entidade linguística, que aglutina um conjunto de objetos, em razão de reunirem tais ou quais características definitórias. E, por sua vez, todas as classes podem ser em outras classes, donde leciona PAULO DE BARROS CARVALHO:

Toda classe é suscetível de ser divida em outras classes. É princípio fundamental em Lógica que a faculdade de estabelecer classes é ilimitada enquanto existir uma diferença, pequena que seja, para ensejar a distinção. O número de classes possíveis é, por conseguinte, infinito; e existem, de fato, tantas classes quantos nomes, gerais e próprios. Porém, se examinarmos, uma a uma, as classes dos elementos químicos ou dos planetas, e se considerarmos em que particularidades os indivíduos de uma classe diferem dos que a ela não pertencem, encontraremos sob esse aspecto um diferença bastante nítida entre duas classes distintas.

Por outro lado, o expediente classificatório pode dar sentido artificial a uma palavra em decorrência da necessidade técnica de uma ciência particular. Isto porque cada gênero difere dos outros, não necessariamente por um só atributo, senão por número indefinido de atributos. [8]

As subclasses são os conjuntos insertos em outro conjunto de maior dimensão, conjunto maior esse que abrange todos os elementos do conjunto menor. Ou seja, as classes envolvem todos os elementos que compõem as subclasses nela insertas.

A afirmação no sentido de não haver classificações certas ou erradas, mas sim úteis ou inúteis não é de se aplicar às classificações jurídicas, tendo em vista que estas, conforme orientação de EURICO MARCOS DINIZ DE SANTI, têm em si finalidades eminentemente prescritivas. Ensina esse autor que existem dois níveis de classificações jurídicas:

a) aquelas construídas no Direito Positivo e b) as descritas na Ciência do Direito. As classificações no direito positivo têm cunho nitidamente prescritivo e o fim precípuo de outorgar regimes jurídicos e definir situações jurídicas específicas aos produtos dessa classificação. De outra parte, as classificações da Ciência do Direito caracterizam-se por se apresentar em linguagem descritiva e, justamente, têm por objeto descrever as proposições prescritivas do direito positivo. [9]

Logo, a classificação proposta pelo cientista do direito deve ser fiel aos comandos do direito positivo, sob pena de as proposições exaradas incorrerem no valor de falsidade. Já a utilidade não pode ser considerada critério jurídico para fins classificatórios, posto estar a descrição do objeto adstrita aos limites impostos pelo Direito Positivo.

Quanto ao critério classificador, as classificações podem ser dividas em intrínsecas, quando o critério que informa a classificação compõe a definição do objeto classificado, e extrínsecas, quando o critério diferenciador for externo à coisa classificada.

Referida divisão das espécies de classificação nos faz útil no presente estudo, posto que a diversidade das posições doutrinárias acerca do ato classificatório das espécies tributárias se dá, especialmente, em face da adoção exclusiva ou não de critérios internos a norma tributária stricto sensu.

A classificação das espécies tributárias depende da fixação de critérios seguros e uniformes para interpretar e, por conseguinte, aplicar as regras de cada espécie, consoante seu peculiar regime jurídico. Para a classificação, devemos ir além da simples leitura de um preceito isolado do texto constitucional, pugnando-se pelo conhecimento amplo das regras jurídicas atinentes à matéria, de forma a interpretá-las de forma harmônica e sistematizada.

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  1. Espécies de tributos

Instrumentalizando as lições formuladas mediante a Teoria das classes, impõe-se a discorrer acerca das espécies tributárias com base na diferenciação especifica que as divergem a fim de estabelecer paulatinamente o regime jurídico a qual cada uma encontra-se vinculado.

Partimos dessa forma do conceito tributo como nosso conjunto universo, como o conjunto que contém todas as unidades de nosso objeto de estudo, fala-se nessa propriedade lógica apenas para indicar o conjunto de entidades que interessam estudar num certo momento. Trata-se, portanto, da fixação de um universo que permite excluir elementos estranhos do campo de trabalho

Para isso, devemos observar as lições de LUCIANO AMARO ao qual o número de critérios escolhidos é o fator determinante a repercutir na classificação de um objeto. 

O grande divisor de águas das classificações dadas pela doutrina está em que alguns autores escolhem uma única variável como elemento distintivo, enquanto outros optam pela utilização de mais de uma variável.[10]  

Entretanto, as discussões doutrinárias a cerca das espécies tributárias projeta-se sobre outras divergências, as quais EURICO DE SANTI ensina que “qualquer característica pode servir de critério de uso na elaboração de uma classificação. Quanto à seleção do critério classificador, podemos divisar as classificações em relacionais e intrínsecas.”

Sobre suas lições, podemos frisar que existem duas modalidades de classificações das espécies tributárias, as classificações intranormativas e as internormativa.

A primeira é feita com base na diferenciação especifica sobre um dos critérios que integram a regra matriz de incidência tributária, na qual os tributos são diferenciados a partir do conteúdo semântico interno. 

Desse pressuposto, temos a diferenciação em tributos vinculados e não vinculados de suas materialidades a uma atuação estatal, seguidos pelo critério distintivo da referibilidade de sua materialidade a uma atuação estatal de forma direta ou indireta.

Seguindo essa corrente o Professor PAULO DE BARROS CARVALHO apresenta as louváveis considerações:

Será imposto (tributo não-vinculado) quando apresentar na hipótese de incidência, confirmada pela base de calculo, fato alheio a qualquer atuação do Poder Público. Estaremos diante de taxa (tributo diretamente vinculado) se o antecedente normativo mencionar fato revelador de atividade estatal, direta e especificamente dirigida ao contribuinte, exibindo, na correspondente base de cálculo a medida da intensidade da participação do Estado. E, por fim, reconhecemos contribuição de melhoria (tributo indiretamente vinculado) na norma jurídica tributária que ostentar, no suposto, um efeito da atividade do ente público, qual seja, valorização imobiliária decorrente de obra pública, mensurando-a na base de cálculo. Quanto aos empréstimos compulsórios, entendo que podem revestir quaisquer das formas que correspondam às três espécies do gênero tributo. (...) Do mesmo modo, as contribuições sociais não configuram, pelo ângulo intranormativo, espécie tributária autônoma, podendo assumir a feição de taxas ou impostos, consoante o fato tributado seja atividade estatal ou não.[11]  

Em divergência a corrente intranormativas, a corrente internormativa entende que a proposta classificatória em tributos não vinculados e vinculados, apesar de se encontrarem em consonância a teoria das classes, “não tem o condão de explicar e justificar todas as variáveis sistêmicas, decorrentes das particularidades do nosso direito positivo”[12]

Desta forma, observando as variações sistêmicas do direito positivo, em respeito as regras de formação de classes, a corrente internormativa elege a prospecção de variáveis de diferenciações especificas que estabeleçam as espécies tributárias de acordo com a relação “extranormativa”, ou seja, a relação das normas com outras normas em vínculos de coordenação e subordinação.

Assim, citando a contribuição de Paulo Ayres Barreto e Tárek Moysés Moussallem ao aperfeiçoamento da classificação de Geraldo Ataliba o Professor Fernando Favacho fixa as premissas necessárias ao estabelecimento de múltiplos critérios de diferenciação especifica que respeitem as regras de conformação de classes.

(i) Eleger um único fundamento para divisão em cada etapa do processo classificatório; (ii) as classes identificadas e em cada etapa deste processo devem esgotar a classe superior; e (iii) as sucessivas operações de divisão devem ser feitas por etapas , de forma gradual.[13] 

Partindo das premissas estipuladas ao norte, posicionando-se desde já pela preferência acadêmica pela corrente internormativa, cabe ao interprete eleger as variáveis que conformarão sua preferência.

Nosso entendimento, de acordo com as variações prescritas no ordenamento jurídico, ao qual elege-se 3 (três) diferenças específicas para classificar os tributos: (i) a exigência constitucional de previsão legal de vinculação entre a materialidade do antecedente normativo com uma atividade estatal, (ii) a exigência constitucional de previsão legal de destinação específica para o produto da arrecadação, (iii) a exigência constitucional de previsão legal de restituição do montante arrecadado ao contribuinte.

Seguindo as variáveis eleitas, temos as seguintes espécies do gênero tributo:

  1. Tributo com materialidade vinculada a uma atividade estatal, com previsão legal de destinação específica para o produto de arrecadação e com previsão legal de restituição.
  2. Tributo com materialidade vinculada a uma atividade estatal, com previsão legal de destinação específica para o produto de arrecadação e sem previsão legal de restituição.
  3. Tributo com materialidade vinculada a uma atividade estatal, sem previsão legal de destinação específica para o produto de arrecadação e com previsão legal de restituição.
  4. Tributo com materialidade vinculada a uma atividade estatal, sem previsão legal de destinação específica para o produto de arrecadação e sem previsão legal de restituição.
  5. Tributo com materialidade não vinculada a uma atividade estatal, com previsão legal de destinação específica para o produto de arrecadação e com previsão legal de restituição.
  6. Tributo com materialidade não vinculada a uma atividade estatal, com previsão legal de destinação específica para o produto de arrecadação e sem previsão legal de restituição.
  7. Tributo com materialidade não vinculada a uma atividade estatal, sem previsão legal de destinação específica para o produto de arrecadação e com previsão legal de restituição.
  8. Tributo com materialidade não vinculada a uma atividade estatal, sem previsão legal de destinação específica para o produto de arrecadação e sem previsão legal de restituição.

Analisando o sistema constitucional vigente, é possível fazer correlação das espécies tributárias com os elementos presentes na legislação pátria, ao qual, os impostos possuem relação de pertinencialidade com a classe “h”; as taxas possuem relação de pertinencialidade com a classe “b”, as contribuições de melhoria possuem relação de pertinencialidade com a classe “d”; os empréstimos compulsórios vinculados possuem relação de pertinencialidade com a classe  “a”; os empréstimos compulsórios não vinculados possuem relação de pertinencialidade com a classe “e”; e as contribuições possuem relação de pertinencialidade com a classe “f”; as demais classes são formadas por conjuntos vazios ante a inexistência de elementos correspondentes no sistema jurídico ao seu conteúdo.

Importante destacar que, a existência de conjuntos vazios não invalida o processo de classificação, o conjunto vazio consiste no inverso do conjunto universal, podendo-se definir como o conjunto que não possui qualquer extensão, ainda que tenha conotação. Não há, assim, nenhum elemento do universo do discurso que satisfaça o critério de pertinência à classe.

“Os elementos pertencem à classe na medida em que denotam as características por ela (classe) conotadas. De modo que é correto afirmar que o critério de pertinência a um dado conjunto consiste em ter uma certa característica (ou conjunto delas) ou não tê-la, sem que haja terceira possibilidade. Uma classe, portanto, é um modo de falar sobre um conjunto de elementos, quer eles existam como coletividade ou até mesmo quando não exista denotação alguma deles. Desse modo, pode existir classe sem a correspondente coletividade”. [14]

Segundo o exposto, as variáveis mencionadas, consideradas de forma sucessiva, permitem identificar as espécies tributárias, em conformidade com a relevância que fora estabelecido pelo texto constitucional para cada uma de suas particularidades.

  1. DRU – DESVINCULAÇÃO DAS RECEITAS DA UNIÃO

Reeditado pela EC nº.68/2011, a Desvinculação de Receita da União – DRU outorgava ao Chefe do Executivo a aptidão de desvincular um percentual da destinação do produto de arrecadação de impostos, contribuições sociais e contribuições de intervenção no domínio econômico das receitas originariamente previstas para aplicar os recursos a qualquer despesa considerada prioritária, assim como na formação de superávit primário e o manejo de recursos para o pagamento de juros da dívida pública.

Na forma do denominado Estado Democrático do Direito, o Poder Público atua positivamente para garantir o exercício dos direitos e garantias fundamentais aos cidadãos, oferecendo determinadas prestações positivas para sua fruição. Conforme lições de José Afonso da Silva, o Estado Democrático de Direito:

É um tipo de Estado que tende a realizar a síntese do processo contraditório do mundo contemporâneo, superando o Estado capitalista para configurar um Estado promotor da justiça social que o personalismo e o monismo político das democracias populares sob o influxo do socialismo real não foram capazes de construir.[15]

Assim, tratou o constituinte de preservar a garantia dos cidadãos em impedir que o Estado invada sua esfera individual (direitos e garantias fundamentais), sem deixar de incluir os denominados direitos fundamentais de segunda e terceira ordem (ou direitos sociais), que se revelam através de prestações estatais positivas necessárias à realização dos princípios e objetivos da República, tal como a igualdade e liberdade.

Neste ponto, as destinações constitucionais de arrecadação se mostram indispensáveis, por se tratar de um dos instrumentos que possibilitam dar suporte financeiro para custear essas intervenções estatais positivas. Ou seja, o próprio constituinte outorgou competência para instituição de tributos que têm como fator legitimador a afetação de seu produto de arrecadação ao financiamento dessas ações no campo dos direitos prestacionais.

Logo, de acordo com a Constituição, as contribuições se justificam juridicamente pela finalidade a que se destina, posto tratar de tributo que viabiliza o custeio das prestações estatais positivas, executadas para proteção de direitos fundamentais que garantam condições mínimas de existência e dignidade aos cidadãos.

Partindo dessa premissa, é possível estabelecer subclassificação desta espécie tributária, elegendo como critério diferenciador as diferentes finalidades (destino do produto de sua arrecadação) a que se propõe:

Assim, a competência outorgada pela Constituição Federal promove o delineamento da materialidade das espécies tributárias, e eventual desvinculação normativa de suas receitas importaria em violação frontal ao Estado Democrático do Direito, consubstanciado na proteção de direitos que garantam condições mínimas de existência e dignidade aos cidadãos.

Entretanto, em sede do julgamento do RE nº. 537.610, publicado no DJE de 18 de dezembro de 2009, restou convalidada a constitucionalidade da desvinculação sobre a relatoria do Min. Cezar Peluso, em que “não é inconstitucional a desvinculação de parte da arrecadação de contribuição social, levada a efeito por emenda constitucional. ”  

Ocorre que, a solidez destas normas impede até mesmo que o constituinte derivado promova alterações em seu conteúdo, (conforme interpretação do artigo 60, §4º, da Constituição Federal[16]), especialmente no que tange a vedação de deliberação de proposta de emenda constitucional tendente a abolir os direitos e garantias individuais, onde se incluiriam aqueles tendentes a proteger o particular contra a invasão do Estado em sua esfera particular, bem como aqueles que se revelam como prestações estatais positivas que visem a fruição de direitos, para consolidação dos valores de igualdade e liberdade.

A vinculação das receitas a uma destinação especifica de seu produto de arrecadação é instrumento de custeio da atuação estatal tendente a realização dos direitos sociais, é certo que as finalidades constitucionalmente previstas para esta espécie tributária não podem sofrer alterações que impliquem no comprometimento das prestações positivas a que se propõe o Estado Democrático de Direito.

Isto porque, preocupou-se o legislador constituinte originário não somente em prever os direitos sociais, mas também em dar instrumentos que possibilitem ao Estado realizar as ações necessárias para que os mesmos sejam implementados. Logo, o instrumento de arrecadação que possua a finalidade precípua de custear as atividades estatais que concretizem os direitos e garantias sociais somente se legitima através da vinculação de suas receitas e, assim sendo, não poderiam ser abolidos, nem mesmo através de norma com status constitucional.

Ocorre que, sob o argumento político da necessidade de flexibilização da atividade financeira do Estado, aliado à crescente arrecadação advinda das contribuições, restou editada a Emenda Constitucional nº 27, de 2000 que instituiu a figura da DRU – Desvinculação das Receitas da União, nos seguintes termos:

Artigo 76, do ADCT. É desvinculado de órgão, fundo ou despesa, no período de 2000 a 2003, vinte por cento da arrecadação da União de impostos, contribuições sociais da União, já instituídos ou que vierem a ser criados no referido período, seus adicionais e respectivos acréscimos legais.

Após, foram editadas as Emendas Constitucionais nos 42, de 2003, 56, de 2007 e 68 de 2011, com a finalidade de estender essa medida para além do período anteriormente estipulado, bem como para incluir a referida desvinculação para as receitas advindas da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico.

Essa medida de caráter financeiro fora editada sob o manto da melhor governabilidade e maleabilidade administrativa, na medida em que desvinculavam o percentual de 20% (vinte por cento) das receitas tributárias originariamente destinadas a uma despesa específica.

Atualmente, acompanhando a previsão de diversos juristas quanto ao intuito de perdurar o aninus de definitividade da medida, mesmo após expirado o prazo em 31 de dezembro de 2015 da EC nº. 68/2011, resta sobre análise a PEC nº. 04/2015, apensada a PEC nº. 87/2015 e 112/2015 e, no intuito de postergar sua extinção.

Ambas as propostas apresentam inovações semelhastes, divergindo somente quanto sua duração, a PEC nº. 87/2015 busca estender a DRU até 31 de dezembro de 2023, e a PEC nº.112/2015 até 31 de dezembro de 2016, enquanto que o governo sinaliza a extensão de seus efeitos em 31 de dezembro de 2019.

Referidas propostas pretende promover a (i) majoração do percentual dos recursos desvinculados de 20% (vinte por cento) para 30% (trinta por cento); (ii) exclui da DRU a arrecadação relativa a impostos e adicionais e acréscimos legais às espécies tributárias por ela abrangidas; (iii) relativiza a desvinculação das contribuições sociais, deixando clara a priorização do pagamento das despesas do Regime Geral da Previdência Social; (iv) inclui na DRU os recursos destinados aos Fundos Constitucionais de Financiamento ao Setor Produtivo das Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, as receitas provenientes de taxas e os recursos relativos às Compensações Financeiras pela Utilização de Recursos Hídricos e Minerais.

Após análise da CCJC (Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania), em parecer publicado em novembro de 2015, restou apresentada emenda supressiva da desvinculação dos recursos destinados aos Fundos Constitucionais de Financiamento ao Setor Produtivo das Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, garantidos na alínea “c” do inciso I do caput do art. 159 da Constituição Federal, por considerar afronta autonomia financeira das referidas regiões, visto o intuito do constituinte na edição desses fundos objetiva redução das “desigualdades sociais e regionais”.

Em suma, não é difícil perceber que a inclusão, na DRU, de significativa parcela dos recursos hoje destinados aos Fundos Constitucionais de Financiamento ao Setor Produtivo das Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste vulneraria o princípio federativo, tendendo a abolir a cláusula pétrea prevista no art. 60, § 4º, I, da Constituição da República.[17]

De acordo com o Ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, juntamente com a recriação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), a Desvinculação das Receitas da União (DRU) é essencial para impulsionar a arrecadação enquanto o governo discute reformas de longo prazo, como a da Previdência.

No entanto, a instituição da DRU impõe medida que, sob pretexto de regular uma questão financeira, restou por afetar a eficácia do regime jurídico de tributos com destinação específica, atingindo diametralmente a fonte de custeio das atividades estatais essenciais para fruição dos direitos fundamentais previstos na Constituição.

Para melhor compreensão, necessária a análise da natureza da referida norma constitucional, contrapondo-a as normas de competência relativas às contribuições e as normas instituidoras das mesmas.

O artigo 76, do ADCT ao desvincular o percentual das receitas das contribuições se revela como norma constitucional de comportamento, cujo antecedente corresponde ao fato da União Federal arrecadar valores à título de contribuições e a consequente desvinculação de parte de suas receitas.

Paulo de Barros Carvalho[18] define competência tributária como a aptidão de que são dotadas as pessoas políticas de direito constitucional interno para expedir regras jurídicas em matéria tributária, em termos inaugurais, inovando o ordenamento, e que se opera pela observância de uma série de atos, cujo conjunto caracteriza o procedimento legislativo.

A doutrina tem se posicionado no sentido de que o art. 76, do ADCT teria desnaturado a figura das contribuições, outorgando-lhes caráter exclusivo dos impostos.

Neste sentido, Fabiana Del Padre Tomé entende que:

ao transformar parte das contribuições sociais em impostos, mediante a desvinculação de 20% do produto da arrecadação, entretanto, a Emenda Constitucional 27/2000 permitiu a exigência de impostos com hipóteses de incidência e base de cálculo já discriminados na Constituição. E, no que se refere às contribuições sociais cuja materialidade não se confunde com a de qualquer imposto discriminado constitucionalmente, a referida Emenda, por via oblíqua, acaba por permitir a exigência de impostos não previstos para o exercício da competência residual.[19]

Sob outro enfoque, também acentuou Paulo Ayres Barreto, ao defender que a desvinculação de receitas das contribuições, por meio de emenda constitucional, violaria pelo menos duas garantias constitucionais individuais do contribuinte quais sejam:

(i) a garantia de que o montante dele (contribuinte) cobrado a título de contribuição seja exclusivamente aplicado nos fins que deram causa à instituição da contribuição; e (ii) a garantia de que novos impostos sejam não cumulativos e que não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos demais tributos discriminados na Constituição.[20]

Para ambos os autores, as emendas constitucionais em questão afetariam a norma de competência tributária, desnaturando a figura das contribuições.

Contudo, não obstante a posição dos doutrinadores acima destacados, entende-se que a problemática da DRU não se propõe a desnaturar os tributos sobre o qual se consuma, o legislador constitucional restou por regular um comportamento específico, qual seja, o destino do produto efetivamente arrecadado que não se confunde com a norma de competência tributária.

Deste modo, a princípio, não se verifica alteração no núcleo da norma de competência desta espécie tributária, posto que esta, diferente daquela (art. 76, do ADCT) figura como norma de estrutura que se limita a regular a forma de criação da norma instituidora da Regra-Matriz de Incidência Tributária. Assim, o legislador infraconstitucional continua comprometido a destinar mediante lei específica a integralidade dos recursos das contribuições à finalidade constitucional respectiva, sem que a desvinculação de receitas interfira em sua estrutura normativa.

Contudo, a indigitada DRU trouxe impactos a legislação infraconstitucional que institui as contribuições. Isto porque, a atividade do legislador, ao instituir as contribuições, está condicionada a edição de duas normas de comportamento: (i) a primeira que prevê a incidência tributária, com o apontamento dos respectivos critérios da Regra-Matriz de Incidência e, (ii) a segunda que dispõe sobre o destino do produto arrecadado.

Tácio Lacerda Gama aponta que, no caso das contribuições, é a norma de competência que faz surgir o vínculo existente entre a norma tributária e a norma financeira que prescreve a destinação do produto arrecadado. Neste caso,

(...) seria possível separar os enunciados que delimitam a criação de uma dessas contribuições em dois blocos distintos, mas inter-relacionados: de um lado, surgiria o conjunto de enunciados que delimitam a instituição da regra-matriz de incidência tributária possível; do outro, agrupar-se-ia o conjunto de enunciados que indicam finalidade especial que enseja a instituição do tributo.[21]

Neste cenário, tem-se que a norma que dispõe acerca da destinação do produto arrecadado sofre impactos diretos do art. 76, do ADCT, pois ambas regulam a mesma hipótese jurídica, qual seja, o destino do produto arrecadado das contribuições.

As indigitadas Emendas Constitucionais não revogaram ou alteraram os artigos 149 e 195 da Constituição, sem assim modificar a norma de competência de citados tributos, mas sim limitaram a eficácia técnica da legislação infraconstitucional editada sob seu fundamento.[22]

As normas, para se revestirem de eficácia técnica, devem ter a capacidade de jurisdicizar os acontecimentos previstos em seu antecedente, de modo que, ocorrido o seu consequente normativo produza os respectivos efeitos no sistema jurídico. Referida qualidade normativa pode ser obstada pela existência de outra norma válida que inibe a sua incidência.

No caso, a norma que destina a integralidade dos recursos das contribuições a uma finalidade constitucional específica estaria tolhida de parcela de sua eficácia, em razão da norma inibidora da eficácia técnica incidente sobre o percentual instituído pelo art. 76, do ADCT.

Quanto às receitas pretendidas pelas referidas PECs, o texto constitucional houve por bem determinar que a sua instituição estivesse sempre vinculada a uma finalidade específica, ou seja, a lei instituidora desta espécie tributária deve prever, além dos critérios inerentes a regra-matriz de incidência tributária (critérios material, temporal, espacial, pessoal e quantitativo), a destinação do produto de sua arrecadação, posto ser este, o fundamento jurídico que ampara a sua instituição.

Neste cenário, a desvinculação das receitas propostas pela PEC nº 04/2015 violaria, antes de tudo, toda racionalidade do ordenamento constitucional tributário, pois ignora o fato de que essas receitas são qualificadas pela sua finalidade que deve ser implementada de forma que o disposto na norma geral e abstrata que institua o tributo disponha também sobre sua destinação alcance os patamares da eficácia.

Referida irracionalidade se justifica no fato de que, não obstante a finalidade constitucional e a edição de norma infraconstitucional que destine o produto de sua arrecadação a uma despesa específica seria permitido, de forma temporária (até 31 de dezembro de 2015) a aplicação de seus recursos, de forma extraordinária, a outros fins, escolhidos de acordo com critérios de conveniência e oportunidade da Administração Pública Federal.

Este entendimento subverte a racionalidade do sistema constitucional tributário, pois compromete a eficácia plena da norma de competência tributária, indo de encontro a cláusulas pétreas que dispõe sobre os direitos sócias fundamentais, por comprometer os subsídios que seriam utilizados nas ações estatais para sua implementação e manutenção.

Quanto a este aspecto, aponta Fernando Favury Scaff:

“O aspecto fundamental é o da destinação, que as faz poder ser enquadradas como instrumentos de arrecadação de valores para cumprir as finalidades estatais no domínio econômico, dentre elas as sociais, de intervenção no domínio econômico e no interesse de categorias profissionais e econômicas. Ou seja, tais contribuições se caracterizam como um instrumento de arrecadação tributária com a finalidade específica de implementar os direitos humanos de segunda geração, quais sejam, aqueles que estabelecem prestações positivas a serem desenvolvidas pelo Estado, que se configuram como implementação do princípio da isonomia entre os homens, tratando-os de maneira desigual, na medida de suas desigualdades. Cumprem as contribuições, portanto, esta função específica no âmbito da arrecadação tributária. Dessa forma, não podem ser completamente entendidas de maneira apartada da destinação de sua arrecadação”.[23]

E continua, ao afirmar que a norma contida no artigo 76, do ADCT traria impactos diretos na concretização dos direitos fundamentais sociais, nos seguintes termos:

O procedimento adotado através destas Emendas Constitucionais acarretou a utilização de verbas vinculadas (afetadas) a uma destinação para outros fins que não aqueles constitucionalmente previstos, e que, in casu, afetaram vastamente a concretização dos direitos humanos (ou, como deseja parte da doutrina, dos direitos fundamentais sociais) por falta de recursos para sua implementação, destinados a outras finalidades.[24]

Sendo assim, infelizmente, provável será que a desejo do Ilustre Professor Regis Fernandes de Oliveira[25] de que “A partir de 2016, portanto, haverá investimento total dos recursos da educação nas políticas públicas a ela relativas, não mais havendo redução do percentual. Beneficia-se, pois, o serviço de educação de mais recursos que nele serão investidos. O Poder Executivo não mais terá tais recursos desvinculados do que é o maior valor constante da Constituição, qual seja, a educação.”  tende a não se concretizar.

Logo, a DRU se revela incompatível com o sistema constitucional, em face da violação a direitos fundamentais consubstanciados no dever do Estado em oferecer prestações positivas necessárias para a realização dos direitos sociais fundamentais, tais como: direito a seguridade social, direito a vida digna, saúde, isonomia, entre outros, não sendo possível limitar-se a eficácia técnica das normas que destinam o produto de arrecadação das contribuições a esses fins.

Justificando-se referidas receitas tributárias pela necessidade de se garantir eficácia às garantias esculpidas na Constituição, por meio de sua arrecadação, a alteração do destino de arrecadação configura-se violação frontal a cláusulas pétreas, que deveriam ser reprimidas através do controle de constitucionalidade exercido pelo Poder Judiciário.

  1. CONCLUSÃO

Dada a natureza dos tributos vinculados a uma finalidade específica, sua norma de competência tributária prescinde da instituição de previsão legal de destinação do produto de arrecadação ao custeio de uma atividade estatal positiva, que se prestam para custeio de metas fixadas na área social tais como, seguridade social, saúde, previdência, educação, desenvolvimento, cultura, meio ambiente entre outros.

Reduzindo o espectro semântico sobre a destinação de receitas para desenvolvimento do estudo proposto, expomos que o constituinte estabeleceu a atividade do legislador a edição de duas normas de comportamento distintas: (i) a primeira que prevê a incidência tributária, com o apontamento dos respectivos critérios da Regra-Matriz de Incidência e, (ii) a segunda que dispõe sobre o destino do produto arrecadado. Ao desvincular constitucionalmente as receitas por meio da DRU, não se desnatura as espécies de receitas propostas, tendo em vista que sua incidência normativa promove modificações sobre a segunda proposição.

Referida norma constitucional restou por limitar a eficácia técnica da legislação infraconstitucional que estabelece o destino do produto de arrecadação das contribuições, concedendo aptidão ao Executivo sobre o percentual determinado pelo art. 76 da ADCT para destinação do produto da arrecadação.

Contudo, tendo em vista que a instituição destas espécies de receita estarem vinculadas ao custeio de atividades estatais positivas que tem como finalidade disponibilizar o pleno exercício dos direitos sociais aos cidadãos, o comprometimento de sua destinação, mesmo que operada pelo legislador constitucional derivado e de forma parcial nos termos pretendidos, revela violação a cláusulas pétreas, passíveis de controle pelo Poder Judiciário.

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Sobre o autor
João Gabriel Casemiro Águila

Sócio Diretor do escritório Águila Advogados Associados, atuante no ramo de direito tributário, empresarial e operações financeiras, com vasta experiência em contencioso e consultivo. Professor Direito Tributário, com experiência em pós-graduação na Escola Paulista de Direito – EPD e outras instituições. Mestrando pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP, graduado UNAMA/PA - Universidade da Amazônia, Belém, Pós-graduado em Direito Tributário ("lato sensu") pela Pontifícia Universidade Católica – PUC/SP,Concluinte do Curso de Extensão em Teoria Geral do Direito ("lato sensu") pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET/SP. Curso de Extensão em Contabilidade Fiscal na Fundação Getúlio Vargas – FGV. Concluinte do Curso de Extensão em Contabilidade Tributária pela Associação Paulista de Estudos Tributários – APET. Membro da Ordem dos Advogados do Brasil.

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