Responsabilidade civil: acidente de trabalho

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Artigo jurídico no qual aborda-se, de forma sucinta, a questão da responsabilidade civil em casos que envolvem relações de trabalho.

INTRODUÇÃO 

Com o advento da evolução industrial e tecnológica ocorrida no último século, as atividades laborativas empregadas para obtenção do produto final da atividade empresarial, tornaram-se cada vez mais complexas, extenuantes e arriscadas para saúde e segurança do trabalhador urbano e rural.  

Por vezes, ocorre que, o trabalhador, que é sujeito da relação contratual, acaba sendo confundido com o próprio objeto da relação, sofrendo dano pelo simples fato de ser o executor da atividade.  

Não raro, o empregador, ambicionando maiores ganhos, inflige exorbitantemente seu poder de comando sobre o empregado, tratando-o como um simples objeto, o que, por diversas vezes, culmina em danos físicos e psíquicos ao empregado, como consequência de acidentes e doenças advindas da atividade laboral.    

 Via de consequência, pode o trabalhador sofrer lesão corporal ou perturbação funcional com repercussões não só na capacidade na esfera laborativa, mas também pessoal. 

 Nesse sentido, cabe ao direito resguardar a integridade de seus sujeitos, no caso, dos trabalhadores. Daí a presunção universal, de cunho social e moral, no sentido de que aquele que causa dano a outrem faz surgir para si o dever de repará-lo e, em contrapartida, o ofendido passa a ter o direito a uma compensação independentemente da reparação efetiva. 

  Em suma, trata-se de uma forma do ordenamento jurídico proteger a conduta idônea, ou seja, tutelar o lícito e reprimir o ato ilícito. 

 RESPONSABILIDADE CIVIL 

 Para um breve entendimento do instituto aludido, podemos nos acolher nas preleções de Maria Helena Diniz, no que tange, a responsabilidade civil tem por meta o restabelecimento do equilíbrio violado pelo dano. Na responsabilidade civil são a perda ou a diminuição verificadas no patrimônio do lesado ou o dano moral que geram a reação legal, movida pela ilicitude da ação do autor da lesão ou pelo risco. (DINIZ, 2005, p. 5). 

 De acordo com Alice Monteiro de Barros:  

A responsabilidade civil se aplica não só ao âmbito da respectiva disciplina, mas de todas as que derivam desse ramo, inclusive do Direito do trabalho. O dano a que alude o art. 186 do Código Civil de 2002 poderá ser material e/ou moral. Essa responsabilidade, por sua vez, poderá ser contratual ou extracontratual. A primeira configura-se quando uma das partes descumpre obrigação previamente contraída e a responsabilidade extracontratual se verifica quando o dano causado implica violação de um dever de não lesar, fora da relação convencional. (BARROS, 2009, p. 647) 

A responsabilidade civil pretende o restabelecimento da vítima da lesão à situação antecedente ao dano, o status quo ante, que será restaurado naquilo que for possível.  

No que concerne ao âmbito laboral, é possível inferir a patente responsabilidade civil decorrente de acidentes de trabalho, seja pelo direito civil, constitucional ou trabalhista. 

Por ora, cita-se o relevante dispositivo constitucional, esculpido no art. 7º, inciso XXVIII, que apregoa: 

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: 

XXVIII - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa; 

Deste modo e sucintamente, é possível inferir que a responsabilidade civil está também conectada com a esfera laboral, mormente diante da existência de acidentes trabalhos, o que se passa a analisar. 

ACIDENTE DE TRABALHO E RESPONSABILIDADE CIVIL 

Inicialmente, o acidente de trabalho era conceituado para casos de acontecimento súbito, traumático que decorresse do acaso e no ambiente de trabalho (decorrer do século XIX). 

Nessa toada, a Lei 6.367, de 1976, resguardou o artigo 2º para definir o acidente de trabalho como aquele que acontece pelo exercício do trabalho em função de serviços prestados à empresa, causando lesão corporal ou perturbação funcional levando a morte ou perda/redução, permanente ou temporária da capacidade laboral para o trabalho. 

Importante ressaltar que com a evolução da teoria da responsabilidade civil, houve uma ampliação legal do conceito do acidente de trabalho para resguardar também, as hipóteses de doenças ocupacionais e acidente de trajeto, além dos casos em que há culpa exclusiva da vítima.  

  O empregador é civilmente responsável pela segurança daqueles que compõem a sua força de trabalho. Tal responsabilidade decorre do dever de zelo que o empregador possui face aos seus empregados, posto que a manutenção constante do ambiente do trabalho é obrigação inerente ao contrato de trabalho firmado entre os polos financeiro e profissional. 

No entanto, que nem sempre foi assim, até a edição do Dec. 7.036/44, não havia sequer uma norma que tratasse do tema responsabilidade do empregador. Exatamente por esta lacuna normativa apontada, não se cogitava a responsabilidade do patrão face os acidentes ocorridos com seus empregados. Todavia, com a publicação do citado Dec. 7.036/44, passou- se a responsabilizar o empregador pelos infortúnios ocorridos com os obreiros que se ativavam no ambiente de trabalho, desde que aquele tivesse agido com dolo.  

Sob outro viés, o Supremo Tribunal Federal fez editou a Súmula 229, cujo teor passa-se a colacionar: Súmula nº 229, STF - Indenização Acidentária - Exclusão do Direito Comum - Dolo ou Culpa Grave do Empregador

Anteriormente à promulgação da Carta de 1988 o entendimento sedimentado do STF era a Súmula 229, que entendia que, a indenização acidentária devida pelo empregador ao empregado era obrigatória somente em caso de dolo ou culpa grave de quem cometeu a falta. 

 Com o advento da Constituição Federal de 1988, a simples culpa, ainda que ínfima, passou a ser suficiente para atender a este pressuposto da responsabilidade civil.  

Assim, atenuaram-se os requisitos necessários à configuração da responsabilidade do empregador, com o intuito de fazer prevalecer os direitos do empregado, que além de vítima do acidente ou doença, em si, é a parte hipossuficiente da relação. Tal prevalência encontra assistência tanto no direito trabalhista, que visa a proteção do trabalhado, quanto na norma constitucional, que determina, em seus fundamentos, que a ordem econômica deve estar fundada no valor social do trabalho e respeitar a dignidade da pessoa humana. 

 E posteriormente pelo advento do Código Civil de 2002 em seu parágrafo único do artigo 927:  

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. 

Parágrafo único. Haverá obrigação, de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. 

Deste modo, o Novo Código Civil trouxe para o ordenamento jurídico a possibilidade de aplicação da responsabilidade objetiva, mormente a implementação da Teoria do risco.  

 Além da cláusula geral de responsabilidade subjetiva elencada no seu artigo 186, o Código consagrou uma cláusula geral de responsabilidade objetiva, prevista no artigo 927, parágrafo único. Ao discorrer sobre a Teoria do Risco pelo Novo Código Civil, CARLOS ROBERTO GONÇALVES assevera que: 
 

A inovação constante do parágrafo único do artigo 927 do Código Civil será significativa e representará, sem dúvida, um avanço, entre nós, em matéria de responsabilidade civil. Pois a admissão da responsabilidade sem culpa pelo exercício de atividade que, por sua natureza, representa risco para os direitos de outrem, de forma genérica como consta do texto, possibilitará ao Judiciário uma ampliação dos casos de dano indenizável”. (...) “E que maior será o risco da atividade conforme o proveito visado. Ademais, se houve dano, poder-se-á entender que tal ocorreu porque não foram empregadas as medidas preventivas tecnicamente adequadas. 

Imperioso salientar que, em relação a constitucionalidade do parágrafo único do artigo supramencionado, a I Jornada de Direito do Trabalho ocorrida em 2007, no TST, com participação de ministros e magistrados de todo o Brasil, além de representantes dos advogados e procuradores trabalhistas, aprovou e editou o seguinte Enunciado nº 37: 

 Aplica-se o art. 927, p. único, do CC nos acidentes do trabalho. O art. 7º, XXVIII, da CF não constitui óbice à aplicação desse dispositivo legal, visto que seu caput garante a inclusão de outros direitos que visem à melhoria da condição social dos trabalhadores . Portanto, a regra geral, seria da responsabilidade subjetiva inscrita na Constituição Federal e a exceção seria a responsabilidade objetiva do Código Civil fundada no risco advindo da execução do serviço em atividade perigosa. 

Ainda na esteira da evolução legislativa, é de suma importância ressaltar que, em outrora, o direito acidentário não fazia previsão clara quanto à responsabilidade do empregador, pelo simples fato da legislação previdenciária, ao conferir o seguro pelo órgão público, já fazia parecer que os riscos relacionados à atividade laboral, estariam totalmente abarcados. 

O entendimento advinha da própria legislação que ao instituir expressamente a exclusão da responsabilidade civil do empregador, deixava uma lacuna protetiva, em relação aos danos sofridos pelo trabalhador. É o que se pode depreender do decreto nº. 24.637/1934, art.1, transcreve-se:  

“A indenização estatuída pela presente lei exonera o empregador de pagar à vítima, pelo mesmo acidente, qualquer outra indenização de direito comum”. 

Nesse diapasão, a lei especial da época restou por prejudicar o trabalhador ao invés de protegê-lo largamente na situação de perda, seja esta total ou parcial, da capacidade laborativa. Não se pode olvidar que, desde aqueles tempos até a data hodierna, o valor do auxílio acidentário pago ao segurado é derrisório diante das necessidades do sustento familiar que se presume de um trabalhador economicamente ativo, mostrando-se insuficiente para restauração do dano causado. 

As lições de Maurício Godinho Delgado, no âmbito da esfera trabalhista, ensinam ainda que: 

É do empregador, evidentemente, a responsabilidade pelas indenizações por dano moral ou à imagem resultantes de conduta ilícita por ele cometida ou por suas chefias, contra o empregado, sem relação com a infortunística do trabalho. (DELGADO, 2009, p. 578). Do mesmo modo, não apenas a conduta ofensiva direta cometida pelo empregador poderá ser passível de responsabilização: também será do empregador a responsabilidade pelas indenizações por dano material, moral ou estético decorrentes de lesões vinculadas à infortunística do trabalho, sem prejuízo do pagamento pelo INSS do seguro social, é claro . (DELGADO, 2009, p. 579) 

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Infere-se ainda que, se em um não tão remoto momento, existia uma irrisória responsabilidade, no que tange os danos causados pela atividade laboral, do empregador pela salubridade física dos seus empregados, modernamente é entendimento hialino e pacífico que é direito destes, serem indenizados por ações ou omissões, culposas ou dolosas, que lhes causem danos. 

Ademais, é relevante ressaltar que, a jurisprudência atual tem avançado no sentido de que, dependendo do caso concreto, sequer perquirir a existência ou não, de conduta dolosa ou culposa do empregador, como nos casos em que a atividade econômica seja de risco, aplicando-se a Teoria do risco, já elucidada anteriormente, de maneira sucinta. 

 Por relevante, o doutrinador Francisco Gonçalves Neto aborda o aspecto histórico da responsabilidade civil relacionado com o acidente de trabalho, apregoando que: 

 a raiz do nascimento da teoria da responsabilidade civil extracontratual objetiva, fundada no risco criado por alguém e exposto a outrem, independente da culpa demonstrara”.¹ 

 Insta mencionar a existência de algumas teorias que exemplificam a responsabilidade objetiva em relação aos acidentes de trabalho, dentre elas pode-se destacar a teoria do risco profissional, a teoria do risco de autoridade e a teoria do risco social. 

 A teoria do risco profissional aquele que cria o risco por meio de atividade industrial, perigoso por natureza, deve responder de forma independente de culpa pelos danos causados aos operários advento de acidente de trabalho. 

 A teoria do risco de autoridade responsabiliza com base no  exercício poder de comando em direção do empregador com a inclusão do empregador do comercio e da agricultura.  

Pela teoria do risco social, a responsabilidade do Estado em relação aos acidentes de trabalho com o direito de regresso contra o culpado direto para quem não adotar as medidas preventivas.  

CONCLUSÃO 

Diante da abordagem do presente trabalho, é possível inferir a patente aplicabilidade da responsabilidade civil aos empregadores no que concerne aos acidentes de trabalho. 

A responsabilidade civil consubstancia-se no fato de que todo aquele que causa dano a outrem é obrigado a repará-lo, o que fora evidenciado pela abordagem tanto civil, constitucional, jurisprudencial e doutrinária. 

 O empregador não pode se eximir de reparar os danos que causa aos empregados, posto que é civilmente responsável pela segurança daqueles que compõem a sua força de trabalho.  

Acrescente-se ainda que a responsabilidade decorre do dever de zelo que o empregador possui face aos seus empregados, além de disposições legais impostas e construções jurisprudenciais inerentes. 

A evolução legislativa caminhou bem ao resguardar os direitos dos trabalhadores diante de infortúnios, prevendo o dever de indenizar, sendo que a responsabilidade civil relativa aos acidentes de trabalho, concretizando inclusive a fórmula principiológica latina do neminem laedere, visto que a ninguém é facultado causar prejuízo a outrem. 

 
          REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS  

Congresso Nacional. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 05 de outubro de 1988. BRASIL.  

Código Civil (2002). 2 ed.. São Paulo: Rideel, 2005. BRASIL.  

Congresso Nacional. Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Consolidação das leis do trabalho. BRASIL. Congresso Nacional. Lei nº 8.213, de 24 de Julho de 1991. 

BARROS, Alice Monteiro. Curso de direito do trabalho. 5 ed. São Paulo: LTr, 2009.  

CAXITO, Alexandre. Notícias do Tribunal Superior do Trabalho 29/09/2009.  

DALLEGRAVE NETO, José Affonso. Responsabilidade civil no direito do trabalho. 3 ed. São Paulo: LTr, 2008.  

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. v. 7. 19 ed. São Paulo: Saraiva, 2005.  

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 8 ed. São Paulo: LTr, 2009. 

CAIRO JÚNIOR, JOSÉ – O acidente do trabalho e a responsabilidade civil do empregador, 2003.  

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Sobre os autores
Robson da Silva Delgado

Advogado. Possui graduação em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2016). Pós-graduando em Direito do Trabalho e Previdenciário, MBA, pela Faculdade Legale (2017-2019). Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito do Trabalho e Falimentar/Recuperacional.

Rafael Alves Lima

Estudante de Direito

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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