O PRINCÍPIO DA SOBERANIA
Segundo Jorge Miranda, só é considerado Estado Democrático de Direito aquele fundado sobre a soberania popular, na qual é possível que o povo utilizando dos métodos de soberania, tenham a possibilidade direta de influenciar o sistema jurídico.
Para lá da criação do Estado, só se deve falar em princípio democrático (distinto, por exemplo, do princípio monárquico) quando o poder é o titular do poder constituinte como poder de fazer, decretar, alterar a Constituição positiva do Estado. E só se deve falar-se em governo democrático, soberania do povo, soberania nacional ou soberania popular, quando o povo tem meios atuais e efetivos de determinar ou influir nas diretrizes políticas dos órgãos das varoas funções estatais (legislativa, administrativa, etc.); ou seja, quando o povo é o titular (ou o titular último) os poderes constituídos. (MIRANDA. Jorge. Ob. Cit. PP. 156-157)
No mesmo sentido, José Afonso da Silva traz como conceito de soberania:
[...] um tipo de Estado que tende a realizar a síntese do processo contraditório do mundo contemporâneo, superando o Estado capitalista para configurar um Estado promotor de justiça social que o personalismo e o monismo político das democracias populares sob o influxo do socialismo real não foram capazes de construir. (SILVA, 2008, p. 120.)
É importante salientar que o art. 1º da Carta Magna, na República Federativa do Brasil traz que, “[...] todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente [...]” nos lindes da Constituição Federal.
Neste dispositivo fica evidente que a proteção a soberania popular e a democracia, são consideradas leis máximas de um estado democrático de direito.
De acordo com Silva (2008), a concepção de estado democrático de direito vai muito além de um estado de direito, sendo as definições destes não apenas uma mera junção de conceitos de Estado de Direito e Estado Democrático, mas sim, no ideal de democracia que norteia os elementos construtivos do Estado e a ordem jurídica soberana.
Neste contexto, a soberania popular aparece em diversos aspectos da Constituição Federal, sendo a soberania dos veredictos umas das ferramentas de soberania do povo como forma de instrumento democrático de direito.
A soberania dos veredictos é umas das formas diretas de influência no âmbito jurídico, emanando diretamente do povo, nas decisões acerca de crimes dolosos contra a vida, sendo o povo soberano para decidir e julgar através do tribunal do júri. (NASSIF, 2008, cap. 2, pg. 33)
O IMPÉRIO DO PRINCÍPIO DA SOBERANIA DOS VEREDICTOS NO JULGAMENTO DO TRIBUNAL POPULAR COMO COROLÁRIO DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO
Neste contexto democrático, conforme Nassif (2008) é que se encaixa o princípio da soberania dos veredictos proferidos pelo Conselho de Sentença no Tribunal do Júri. Este axioma está previsto no artigo 5º, inciso XXXVIII, alínea c da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
Antes de adentrar ao mérito do princípio, é importante entender e esclarecer a sua origem. De acordo com Ansanelli Júnior (2005) a origem do Tribunal Popular do Júri é incerta. Azevedo (2011) acredita que sua origem tem seu berço no Tribunal dos Heliastas da Grécia Antiga, o primeiro que foi soberano em suas decisões.
Azevedo (2011) narra que, na opinião de outros estudiosos, a soberania dos veredictos surgiu em 1215, na Inglaterra, juntamente, com o nascer do Tribunal do Júri. Isso se deve ao fato de que, nos julgamentos do Júri, não havia recurso em face das decisões proferidas. Ansanelli Júnior (2005) acerva que, a Magna Carta não previa o duplo grau de jurisdição, o que consequentemente, concedia o caráter irrecorrível e imutável às decisões dos jurados.
Azevedo (2011) aduz que, no período da Revolução Francesa, o ideal de soberania das decisões estava atrelado à soberania popular. O autor assevera que os veredictos eram irrecorríveis, o Tribunal não poderia reformar a decisão do Júri, mas, reconhecida a procedência da apelação, onde seria realizado um novo julgamento. No mais, conforme bem atenta Ansanelli Júnior (2005), na segunda apreciação do caso, os jurados que atuaram anteriormente não poderiam julgar.
Fica claro que o instituto do Tribunal do Júri e sua soberania nos veredictos no Brasil, teve sua origem na concepção do ordenamento jurídico Frances, que vigorava no século XVIII.
[...] No Brasil, a soberania quase sempre acompanhou o Tribunal do Júri. [...] desde o seu nascimento até a edição do Decreto-Lei n. 167, de 05 de janeiro de 1983, as decisões do Tribunal Popular se caracterizavam pela soberania dos veredictos. A Constituição de 1946 incluiu a soberania dos veredictos no próprio texto constitucional. A Constituição outorgada através do Ato Institucional n. 1/69 não a mencionou expressamente, mas continuou se entendendo que a soberania dos veredictos continuava a existir, por ser um princípio implícito. A Constituição de 1988 voltou a mencioná-la expressamente. [...] (ANSANELLI JÚNIOR, 2005, p. 72)
Nucci (1999), esclarece que a constituição de 1988, tentou evitar que o legislador criasse dispositivos legais que atentassem contra a soberania a decisão do Júri Popular preferida no julgamento dos crimes dolosos contra a vida, significa dizer que esta não poderá ser alterada pelo juízo ad quem. Em síntese, “[...] pode-se dizer que a soberania dos veredictos reveste-se da característica de que os órgãos da magistratura togada não podem reformar as decisões do Tribunal Popular, substituindo a vontade dos juízes leigos. [...]”. (ANSANELLI JÚNIOR, 2005, p. 73)
Portanto, fica claro que a decisão proferida pelo instituto do Tribunal do Júri, é uma das formas de refletir o interesse social manifestado pela atuação do próprio povo, sendo a supremacia de suas decisões uma das formas de reafirmar a supremacia do princípio da soberania popular.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANSANELLI JÚNIOR, Ângelo. O Tribunal do Júri e a Soberania dos Veredictos. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2005.
MIRANDA. Jorge. Ob. Cit. PP. 156-157
CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 2ª Edição. Coimbra: Ed. Almedina, 1998. Ob. Cit. PP. 280-281.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Promulgada em 05 de outubro de 1988. Disponível em: Acesso em: 02 out. 2011. 250 Ibid.
NASSIF, Aramis. Júri: instrumento da soberania popular. 2. ed. rev. e amp. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. cap. 2, p. 33.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 30. ed. São Paulo: Malheiros, 2008. cap. 2, p. 119
RASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Promulgada em 05 de outubro de 1988. Disponível em: . Acesso em: 02 out. 2011.
NASSIF, Aramis. Júri: instrumento da soberania popular. 2. ed. rev. e amp. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. NUCCI, Guilherme de Souza. Júri Princípios Constitucionais. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999.
AZEVEDO, André Mauro Lacerda. Tribunal do Júri: aspectos constitucionais e procedimentais (atualizado de acordo com a Lei nº. 11.689/08). São Paulo: Verbatim, 2011.