Ocupações do solo sob a perspectiva do Direito Urbanístico

18/03/2016 às 09:48
Leia nesta página:

Este trabalho tem como objetivo fazer uma análise das formas de ocupação do solo, bem como a proteção do meio ambiente cultural, sob a perspectiva do Direito Urbanístico.

TUTELA DO MEIO AMBIENTE NA PERSPECTIVA DO DIREITO URBANÍSTICO


O poder público recebeu da Constituição de 1988 a responsabilidade de zelar pelo Meio Ambiente, com a colaboração da sociedade. Vale ressaltar, no entanto, que essa obrigação de zelar tem aspecto amplo, justificando-se axiologicamente por ser um bem difuso, coletivo, de cuja manutenção depende as presentes e futuras gerações para sobreviver. Ressalte-se que para fins de Meio Ambiente também é incluso o patrimônio histórico e cultural, reconhecidos através do tombamento.
O Tombamento é um instituto constitucional, tendo como finalidade assegurar a preservação de bem ou conjunto bens de valor cultural. Há uma celeuma na doutrina e jurisprudência, para que haja uma definição se o tombamento deve ou não gerar indenização, uma vez que se trata de ato administrativo restritivo, já havendo precedentes do STJ no sentido de cabimento quando restritiva da utilização da posse.
A atuação do Poder público na promoção da proteção do Meio Ambiente abrange todos os entes federados, o que não haveria de ser diferente, pois se trata de bem cujo interesse é de todos, não havendo que se restringir a determinados entes, dando margem aos demais para eximir da responsabilidade ambiental, sob a alegação de que não é da sua competência constitucional empreender esforços para garantir a preservação, sendo inclusive esse o entendimento do STF e STJ, conforme bem adverte Ana Maria Moreira, ao citar julgados das cortes.
A efetiva proteção do Meio Ambiente deve valer-se de todos os mecanismos que sejam possíveis para que não se cogite ausência de mecanismos capazes de inviabilizar a execução da política de proteção. Um mecanismo não muito utilizado no ordenamento brasileiro é o inventário, com previsão constitucional, expresso no artigo 216 da CF/88, porém pouco utilizado, regulado no Brasil pelo Decreto 3.551/00, no entanto, carece de regulamentação por lei para indicação da natureza jurídica desses bens. Há posicionamentos de tribunais brasileiros, conferindo aos entes federados o poder para essa regulamentação, sendo defendido por alguns doutrinadores, baseado no poder de tutela comum.
  O Estado dispõe de instrumentos urbano-ambientais para aplicar as garantias constitucionais pertinentes ao tema, destacando-se: desapropriação, zoneamento, transferência do direito de construir e direito de perempção. José Afonso da Silva traz, ao falar do regime jurídico da urbanização, o instrumento do parcelamento urbanístico do solo, bem como as formas em que se dá esse parcelamento.

 

PARCELAMENTO URBANÍSTICO DO SOLO

A definição de parcelamento urbanístico, utilizada nesse artigo, será aquela dada por José Afonso da Silva, sendo a divisão e redivisão da gleba em parcelas destinadas ao exercício das funções elementares urbanísticas, sujeitando-se a legislação urbanística municipal, podendo ser feita essa divisão por: arruamento, loteamento, desmembramento, desdobro de lote e reparcelamento.

 

ARRUAMENTO E LOTEAMENTO
O arruamento e o loteamento guardam conexão entre si, sendo que o loteamento pressupõe o arruamento. O arruamento é a divisão do solo mediante abertura de vias de circulação e formação de quadras.  Já o loteamento é a divisão das quadras em lotes com frente para logradouro público. Tanto o arruamento quanto o loteamento, apesar de serem feitos normalmente por particulares, são de interesse público, portanto, sujeitando-se à aprovação pelo Poder público (Prefeitura, autoridades sanitárias, militares e florestais, bem como o INCRA quando se tratar de loteamento em áreas rurais). 
Os projetos de arruamento e loteamento são diversos, não se devendo incluir o arruamento no loteamento. Há, no entanto, divergências quanto à forma de apresentação dos planos, se em conjunto ou isoladamente, uma questão de índole procedimental. Após a aprovação do plano de loteamento há um prazo de 180 dias para Registro Imobiliário, sob pena de caducar. Havendo impugnação de terceiros, o pedido de registro passará por uma fase de judicialização, após ouvido o interessado e a Prefeitura. 
Os efeitos da inscrição são: legitimação da divisão e venda dos lotes, perda da individualidade do imóvel, torna imodificável o plano de loteamento e arruamento e transfere para o domínio público as vias que foram destinadas como de domínio público.

 

DESMEMBRAMENTO
Desmembramento é a subdivisão da gleba em lotes destinados à edificação, aproveitando-se o sistema viário existente e sem ocasionar o surgimento, expansão e modificação de novas vias e logradouros existentes, seguindo as mesmas regras do loteamento, não necessitando apenas do arruamento, mas tendo que ter a autorização da Prefeitura e inscrição no Registro de Imóveis.

 

DESDOBRO DE LOTE
O desdobro do lote nada mais é do que a divisão do lote para a formação de novo ou novos lotes, devendo atender cada lote às exigências de área estabelecidas, como também ocorre com loteamento. Se o desdobro do lote estiver vinculado a projeto de edificação, sua aprovação é automática com a aprovação deste, caso não esteja, haverá necessidade de aprovação da Prefeitura e averbação no Registro de Imóveis.

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REPARCELAMENTO DE SOLO
Esta é uma nova divisão de área parcelada, para regularizar a configuração das parcelas, e, distribuir de modo justo os benefícios e ônus da ordenação do solo. Essa modalidade no Brasil tem finalidade didática, pois ainda não há aplicação, na contramão do resto do mundo que a tem adotado. Há uma preocupação com a distribuição isonômica, sendo necessário que se faça uma divisão que não prejudique ou beneficie em demasia os demais, com um sistema de divisão dos ônus e partilha dos benefícios. 

 

ESTATUTO DA CIDADE
O Estatuto da Cidade-Lei 10.257/2001-veio com o objetivo de dar efetividade às disposições constitucionais insculpidas no artigo 182 e 183 da CF/88, visando sanar problemas com habitação, ocupação de solo de modo regular, entre tantos outros que guardam relação com o direito urbanístico. O artigo 4º do Estatuto da Cidade traz uma série de instrumentos que visam efetivar essas garantias. 
Os graves problemas da ocupação do solo brasileiro se dão pela ausência de políticas públicas que garantam a sua efetivação, devendo-se buscar dar efetividade às garantias constitucionais de habitação, mas sem esquecer-se da preservação ambiental, e do fornecimento de serviços indispensáveis para a coletividade.
O ideal deve ser adequar-se às ocupações de solo em desconformidade para que estas sejam modificadas, de modo a atender os novos paradigmas jurídicos, sociais e urbanísticos, tendo para tanto que se aplicar os instrumentos previstos na atual legislação.
Analisemos.

 

ZONAS ESPECIAIS DE INTERESSE SOCIAL
Prevista como um instrumento de implementação da política urbana, está no artigo 4º, V, alínea f do Estatuto da Cidade, tendo como objetivo gravar uma parte do território para manutenção e habitação social. Esse instrumento visa acabar com a prática da discriminação das classes menos favorecidas, que sempre acabam sendo deslocadas para áreas afastadas, reservando as áreas de boa localização para classes com poder aquisitivo maior, problema do sistema de organização por zoneamento. 

 

CONCESSÃO DE DIREITO REAL DE USO
Lastreado pelo princípio da função social da propriedade, tem como escopo fazer com que os terrenos públicos também deem cumprimento a essa determinação de índole constitucional, sendo o meio viável ante a impossibilidade de aquisição dos terrenos públicos via usucapião.
Essa concessão pode ser para uso (concessão de direito real de uso), ou para de moradia (concessão de uso especial para fins de moradia). Essa concessão pode ser adquirida pela via administrativa ou judicial, onde o poder público ou o judiciário destinará fração ideal não superior a 250 metros quadrados para cada moradia, necessitando em qualquer caso do registro. 

 

USUCAPIÃO URBANA
Encontrando previsão constitucional no artigo 183, foi inserida também no Estatuto da Cidade como mais um instrumento para efetivação da política urbana. Há necessidade de comprovação de uma posse de cinco anos, com animus domini, não ter a propriedade de outro imóvel, e a área não deve ser superior a 250 metros quadrados em área urbana. O grande diferencial a ser valorizado foi a individualização da postulação e titularidade. Há, ainda, a possibilidade da área ser maior que 250 metros quadrados, quando imposta coletivamente.

 

CONCLUSÃO
Hodiernamente não tem como pensar o direito de modo estático, incapaz de acompanhar a evolução social, mormente pelo caráter do Direito, sendo este uma ciência eminentemente social. 
A sociedade é um dos requisitos para formação do Estado, segundo as teorias constitucionalistas, sendo de igual modo, e no mesmo grupo, o território. Sendo o Estado estabelecido em um território, e atuando sobre determinado grupo de pessoas, é obrigação dele zelar para que a sua ocupação seja feita de modo adequado, preservando de uma só vez dois dos seus elementos.
O povo necessita ocupar o solo para o desenvolvimento de garantias como direito de propriedade e moradia. Por outro lado, temos ainda que resguardar direitos difusos, como o direito a um meio ambiente equilibrado. Como sabido por todos, não há hierarquia entre as normas constitucionais, analisando-se na concretude do caso qual norma deve prevalecer. Nessa ótica, o atual Direito Urbanístico, deve seguir a tendência atual de verticalização das normas constitucionais, e buscar acompanhar as lutas por um lugar, confrontadas com os ditames constitucionais, destes não podendo se afastar.

 

REFERÊNCIAS
Silva, José Afonso da. Direito Urbanístico Brasileiro. 6 ed. São Paulo. Malheiros. 2010. Pags. 324-350.
Alfonsin, Betânia. O significado do Estatuto da Cidade para os processos de regularização fundiária no Brasil. Pgs. 68-97.
Marchesan, Ana Maria Moreira. A tutela do patrimônio Cultural sob o Enfoque do Direito Ambiental. Pgs. 199-239.
Constituição da República Federativa do Brasil. Extraído de: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm
Lei 10.257 (Estatuto da Cidade) Extraído de: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LEIS_2001/L10257.htm

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Sobre o autor
Ronaldo Santos

Pós-graduando em Direito Penal e Processo Penal.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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