Conta secreta no estrangeiro faz primeiro-ministro islandês renunciar. Quando Cunha e o Brasil vão tomar vergonha na cara?

06/04/2016 às 09:36
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Se os países avançados pedissem para o Brasil e os brasileiros mandar um foguete para Júpiter amanhã, diríamos que isso seria impossível. Não temos tecnologia. Se a OCDE dissesse para o Brasil e para os brasileiros alcançarem a nota máxima no exame PISA

Se os países avançados pedissem para o Brasil e os brasileiros mandar um foguete para Júpiter amanhã, diríamos que isso seria impossível. Não temos tecnologia. Se a OCDE dissesse para o Brasil e para os brasileiros alcançarem a nota máxima no exame PISA (que mede o nível da educação em vários países), diríamos que isso é impossível (nosso sistema educacional está falido). Se a ONU encarregasse o Brasil e os brasileiros para acabar com a guerra na Síria, diríamos que isso é impossível (não temos influência mundial, muito menos para tanto).

Mas por que é impossível também ao Brasil e aos brasileiros tomar vergonha na cara? Repudiar o que os agentes públicos fazem de errado? O primeiro-ministro islandês, Sigmundur David Gunnlaugsson, renunciou ao cargo em 05/04/16, depois que seu nome foi citado no escândalo “Panama Papers” (contas no exterior não declaradas para o fisco local). O escândalo foi divulgado dia 03/04/16. Dois dias depois ele já pediu renúncia. Isso tem nome: vergonha na cara.

Voltando ao Brasil: por que toleramos um corrupto – com provas materiais contundentes nas mãos (contas bancárias clandestinas na Suíça) – ocupar a presidência de um dos poderes da nação, estando na linha da sucessão presidencial? Como esse Eduardo Cunha ainda não foi defenestrado da presidência da Câmara? Que vergonha! Como a denúncia contra Renan Calheiros, depois de 1.200 dias, ainda não foi recebida no STF? Até quando dura a impunidade das castas?

Que medonha conivência é essa do Judiciário, que tolera um corrupto com provas materiais cuidando do dinheiro público? Que nível de baixaria ética possuem esses comparsas da tropa de choque de Cunha, que praticam chicanas diariamente para evitar a sua cassação? Que honraria lhes dá fazer parte da tropa de choque de um dos maiores corruptos da História do País?

Somos eficazes para criticar os políticos e grande parte do empresariado corruptos, mas por que não somos eficientes para eliminar do cargo público um cara de pau mentiroso, que nos humilha diariamente com seu cinismo? Essa nossa tolerância com a corrupção não poderia ser vista também como conivência?

A decisão do primeiro-ministro islandês foi adotada em uma reunião de seu partido. A renúncia aconteceu horas depois de ele ter pedido a dissolução do Parlamento ao presidente do país, Olafur Ragnar Grimsson. Gunnlaugsson renunciou antes mesmo da votação de uma moção de desconfiança pelo Parlamento que vinha se encaminhando após protestos populares desta segunda.

O agora ex-premiê alegou que não havia feito nada de errado e pediu a dissolução do parlamento para formar uma nova coalizão de governo, já que a que o apoiava demonstrava não ter mais confiança nele. O presidente, no entanto, negou a dissolução naquele momento e respondeu que iria conversar com os principais partidos do país antes de tomar uma decisão. Por fim, sem conseguir a dissolução, Gunnlaugsson renunciou.

No mesmo escândalo foram achadas mais de 100 offshores de brasileiros. Os arquivos da empresa Mossack Fonseca mostram que o escritório panamenho criou ou vendeu empresas offshore para políticos brasileiros e seus familiares. Pelo que se divulgou até aqui, há ligações com PDT, PMDB, PP, PSB, PSD, PSDB e PTB (e o PT? Vamos aguardar a publicação de todas as listas para tirar conclusões). E por que não cassamos imediatamente todos esses políticos com contas no exterior não declaradas ao fisco brasileiro?

Alguns nomes envolvidos: o deputado federal Newton Cardoso Jr. (PMDB-MG) e o pai dele, o ex-governador de Minas Gerais Newton Cardoso; o ex-ministro da Fazenda Delfim Netto; os ex-deputados João Lyra (PSD-AL) e Vadão Gomes (PP-SP), e o ex-senador e presidente do PSDB Sérgio Guerra, morto em 2014 etc.

Tudo que for declarado ao fisco brasileiro é legal. O que não for declarado (por mais que esteja “justificado”) faz parte das bandalheiras das castas nacionais intocáveis, que desfrutam na propinolândia de uma das imunidades mais seguras do planeta. Com o envolvimento e conivências de todas as instituições imagináveis.

Mais de oito mil contas secretas de brasileiros no HSBC da Suíça também foram divulgadas recentemente. Contas comunicadas ao fisco brasileiro são legais. As clandestinas (por mais que sejam “justificadas”) também fazem parte das bandalheiras das nossas castas oligarcas.

O que ocorreu com esses bandoleiros da República que se julgam acima das leis? Fizeram aprovar uma lei de anistia penal, para regularizar a situação deles. Isso é ato de castas dominantes. E é o que pode ocorrer com a Operação Lava Jato. Falta ao Brasil muita coisa para que ele se transforme numa grande nação: uma delas é muito simples e poderíamos praticar desde agora: ter vergonha na cara! Isso só depende de cada um de nós. Menos hipocrisia e mais exemplaridade faria muito bem ao Brasil. Alguém assinaria comigo esse manifesto?

CAROS internautas que queiram nos honrar com a leitura deste artigo: sou do Movimento Contra a Corrupção Eleitoral (MCCE) e recrimino todos os políticos comprovadamente desonestos assim como sou radicalmente contra a corrupção cleptocrata de todos os agentes públicos (mancomunados com agentes privados) que já governaram ou que governam o País, roubando o dinheiro público. Todos os partidos e agentes inequivocamente envolvidos com a corrupção (PT, PMDB, PSDB, PP, PTB, DEM, Solidariedade, PSB etc.), além de ladrões, foram ou são fisiológicos (toma lá dá cá) e ultraconservadores não do bem, sim, dos interesses das oligarquias bem posicionadas dentro da sociedade e do Estado. Mais: fraudam a confiança dos tolos que cegamente confiam em corruptos e ainda imoralmente os defendem. 
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Sobre o autor
Luiz Flávio Gomes

Doutor em Direito Penal pela Universidade Complutense de Madri – UCM e Mestre em Direito Penal pela Universidade de São Paulo – USP. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Jurista e Professor de Direito Penal e de Processo Penal em vários cursos de pós-graduação no Brasil e no exterior. Autor de vários livros jurídicos e de artigos publicados em periódicos nacionais e estrangeiros. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998), Advogado (1999 a 2001) e Deputado Federal (2019). Falecido em 2019.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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