SUMÁRIO: 1- Introdução. 2- Legitimidade para requerer o inventário. 3- Sujeitos. 4- Conclusão. 5- Bibliografia.
Art. 616. Têm, contudo, legitimidade concorrente:
I –O cônjuge ou companheiro supéstite;
II –O herdeiro;
III –O legatário;
IV –O testamenteiro;
V –O cessionário do herdeiro ou do legatário;
VI –O credor do herdeiro, do legatário ou do autor da herança;
VII –O Ministério Público, havendo herdeiros incapazes;
VIII –A Fazenda Pública, quando tiver interesse;
IX –O administrador judicial da falência do herdeiro, do legatário, do autor da herança ou do cônjuge ou companheiro supéstite.
O dispositivo correspondente é o artigo 988 do CPC/73, o qual sofreu alterações quanto a ordem dos incisos e trouxe expressamente a questão da legitimidade do companheiro supérstite, regra que já tinha amparo na jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça.
1. Introdução
No momento do falecimento de uma pessoa é aberta a sucessão, ou seja, ocorre a transmissão do patrimônio do de cujus aos herdeiros legítimos e testamentários no exato momento da morte.
Para que o direito à sucessão se concretize existem regras para o procedimento formal, sendo necessária a provocação do poder judiciário através do inventário. Assim que o inventário é concluído, passa-se à partilha dos bens entre os herdeiros.
Não obstante às regras de direito material compreendidas no Código Civil de 2002, traçaremos comentários apenas com relação ao aspecto processual da legitimidade para requerer o inventário.
2. Legitimidade para requerer o inventário
O requerimento do inventário pode ser feito por quem estiver na posse e na administração do espólio (Art. 615 do CPC/15), que é um ente despersonalizado existente desde abertura da sucessão até o final do inventário, quando a herança universalizada se personaliza com a partilha.
A certidão de óbito do autor da herança instruirá o requerimento que deverá ser feito no prazo de 2 (dois) meses a contar da abertura da sucessão (Art. 611 do CPC/15).
O artigo ora comentado faz referência aos demais sujeitos legítimos para requerer o inventário mesmo se não estiverem na posse e na administração do espólio, são os chamados legitimados concorrentes e qualquer um deles pode dar início à ação.
A legitimidade das partes é condição para propositura da ação e se refere à qualidade para estar em juízo, ou seja, depende de uma relação do sujeito e da causa. No caso específico do inventário, os legitimados tinham relação com o de cujus, com exceção do Ministério Público e da Fazenda Pública.
3. Sujeitos
3.1. Cônjuge ou companheiro supérstite
O Código de Processo Civil de 1973 legitimava o cônjuge supéstite, ou seja, a legitimidade viria com o casamento e não era levada em conta qualquer família fora do casamento.
Assim, é editada a súmula 308 do STF que dispõe sobre a sociedade de fato entre os concubinos, sendo cabível a dissolução judicial e partilha do patrimônio em comum.
Com a regulamentação da Lei 9.278/96, o artigo 226, §3º da Cf/88 passou a considerar, efetivamente, a união estável como entidade familiar, que é a vontade contínua de manter os vínculos afetivos e sustentam a conservação do grupo familiar.
Mesmo sem expressa disposição legal no CPC/73 sobre a legitimidade do companheiro, o STJ julgava a questão no mesmo sentido do novo disposto legal, ou seja, com base nos documentos comprobatórios consignou a existência de união estável e permitiu a nomeação da companheira como inventariante.
“SUCESSÕES. INVENTÁRIO. PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO POR AUSÊNCIA DE JUNTADA DE DOCUMENTO OBRIGATÓRIO E POR INTEMPESTIVIDADE REJEITADA. MÉRITO. PEDIDO DE NOMEAÇÃO DE INVENTARIANTE FORMULADO PELA SEDIZENTE COMPANHEIRA. AJUIZAMENTO DO INVENTÁRIO PROMOVIDO CONCOMITANTEMENTE PELA HERDEIRA, FILHA DO "DE CUJUS" , COM A SUA NOMEAÇÃO COMO INVENTARIANTE, FACE À AUSÊNCIA DE DECLARAÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL ENTRE A RECORRENTE E O FALECIDO. POSSIBILIDADE DE NOMEAÇÃO DA AGRAVANTE PARA EXERCER A INVENTARIANÇA, INDEPENDENTEMENTE DE DECLARAÇÃO JUDICIAL. EXISTÊNCIA DE ELEMENTOS PROBATÓRIOS SUFICIENTES DEMONSTRANDO A VEROSSIMILHANÇA NA ALEGAÇÃO DA CONVIVÊNCIA, RESULTANDO INCLUSIVE NO NASCIMENTO DE UM FILHO COMUM DO CASAL, MENOR DE IDADE. HERDEIRA QUE, ADEMAIS, RESIDE EM OUTRO ESTADO, O QUE RATIFICA QUE A RECORRENTE ESTÁ NA POSSE DOS BENS DO ESPÓLIO, REUNINDO, NO CONTEXTO DOS AUTOS, MELHORES CONDIÇÕES DE EXERCER O ENCARGO COM MAIS FACILIDADE, SEM QUALQUER PREJUÍZO Á HERDEIRA, CUJA RESISTÊNCIA NOS AUTOS SE TRADUZ EM MERA ANIMOSIDADE. Preliminar rejeitada e recurso.” (REsp n. 1025044, decisão monocrática, j. em 01/08/2012, Rel. Min. Marco Buzzi)
A alteração do CPC, no que tange à questão do companheiro, reside justamente na expressa legitimidade do companheiro para requerer o inventário.
3.2. Herdeiro
O NCPC, assim como o CPC/73, não distingue os herdeiros como necessário ou não, legal ou testamentário e/ou legítimo.
De acordo com o Código Civil, os herdeiros podem ser legítimos ou testamentários. Os primeiros, instituídos pela ordem hereditária, ou seja, os descendentes, ascendentes, cônjuge e colaterais até o 4º grau. Já os segundos são instituídos por testamento.
3.3. Legatário
Diz respeito ao indivíduo que não tem direito à herança do de cujus, mas tem direito a um bem específico, chamado de legado.
A sucessão é recebida a título singular, não importando o valor do patrimônio e sim o bem específico disposto no testamento.
Nesses casos, é preciso verificar se o legado está válido, bem como se as hipóteses legais previstas no artigo 1.592 do CC/02.
3.4. Testamenteiro
Se não houve cônjuge ou herdeiros necessários, o testador pode conceder ao testamenteiro a posse e a administração da herança (Art. 1.977 do CC/02);.
De acordo com o disposto no artigo 1.978 do CC, se o testamenteiro tiver a posse e a administração dos bens, pode requerer o inventário a fim de cumprir o testamento,
3.5.Cessionário do herdeiro ou do legatário
A transmissão de obrigações está prevista no CC/02 no Livro I, Título II. Considera-se que o credor pode ceder seu crédito se a isso não se opuser a natureza da obrigação, a lei ou a convenção com o devedor.
O herdeiro pode dispor de seu quinhão da herança em face de seu credor e, assim, este fica legitimado a requerer o inventário a fim de ter cumprida a obrigação.
3.6. Credor do herdeiro, do legatário ou do autor da herança
É sabido que o patrimônio do de cujus responde pelas dívidas contraídas por ele e, assim, os credores do espólio estão legitimados a requerer o inventário para que tais dívidas vencidas sejam quitadas.
Da mesma forma, os credores do herdeiros e do legatário podem requerer o inventário a fim de quitar as dívidas na proporção da parte que cada herdeiro/legatário receberá.
3.7. Ministério Público, havendo herdeiros incapazes
Nos casos em que haja herdeiros menores, o Ministério Público tem legitimidade para requerer o inventário em defesa dos interesses dos incapazes. Por outro lado, cabe destacar que o MP também atua como fiscal da lei.
3.8. A Fazenda Pública, quando tiver interesse
A legitimidade da Fazenda Pública pode decorrer de diversos interesses. Pode figurar como credora do de cujus ou para que os tributos decorres da causa mortis (ITCMD) sejam devidamente pagos.
3.9.O administrador judicial da falência do herdeiro, do legatário, do autor da herança ou do cônjuge ou companheiro supéstite.
Quando é decretada falência de qualquer um dos legitimados ou do próprio de cujus, o administrador judicial nomeado no processo da falência fica legitimado para requerer o inventário.
Tal entendimento do legislador tem fundamento na Lei 11.101/2005 (Lei de falências).
4. Conclusão
O Novo Código de Processo Civil, no que tange a legitimidade concorrente para requerer o inventário, não trouxe significativas alterações além dos dispositivos e entendimentos já pacificados na doutrina e jurisprudência do tribunal do superior.
A equiparação da união estável ao casamento se mostra bastante atual, inclusive com o recente entendimento da famílias homoafetivas e poliafetivas no ordenamento jurídico.
5. Bibliografia
BUENO, Cassio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil Anotado. 2ª Edição. Saraiva, 2016.
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil. 1ª Edição. Revista dos Tribunais, 2015
NERY JR., Nelson. Comentários ao Código de Processo Civil. 1ª Edição. Revista dos Tribunais, 2015.
AMBROSIO, Maria José Silva. Natureza Jurídica do Inventário e da Partilha. Revista dos Tribunais. Doutrinas Essenciais Família e Suucessões. Vol. 6. Páginas 1145-1169. Publicada em Ago/2011.
VIEIRA, Octaviano. Inventário – Dívidas Passivas dos herdeiros. Revista dos Tribunais. Vol. 6. Página 1039. Publicado em Ago/2011.
SALLLES, Sergio Luiz Monteiro. União Estável como Direito Fundamental e Lacunas em Nosso Ordenameto. Revista dos Tribunais. Doutrinas Essenciais Família e Sucessões. Vol. 2. Página 1089. Publicado em Ago/2011