A realidade brasileira demonstra um crescente aumento do número de denúncias, processos administrativos ético-profissionais e processos de reparação civil decorrentes de condutas de médicos e hospitais.
Isto decorre naturalmente da evolução do nosso estado democrático de direito, entretanto, faz-se necessário tecer alguns comentários acerca da responsabilidade civil do médico, para que se possa tentar esclarecer quais situações de fato podem gerar a responsabilidade, e, principalmente, orientar os profissionais para que se possa evitá-las, explanando as principais precauções a serem tomadas por eles.
Inicialmente, cumpre ressaltar que a relação médico-paciente é formada por um autêntico contrato de consumo, no qual há a uma efetiva contratação dos serviços médicos mediante remuneração, seja particular, ou por meio de planos de saúde (público ou privado).
Diante disso, quando da contratação, o médico deverá executar seus serviços de acordo com as regras e métodos da profissão, de forma diligente e cuidadosa, em conformidade com o Código de Ética Médica, e utilizando-se dos meios disponíveis no meio em que exerce a profissão. Entretanto, cabe ressaltar que o exercício da medicina, em regra, é uma obrigação de meio, ou seja, não cabe ao médico garantir o resultado final.
Importante mencionar que, nos casos de medicina estética, há divergências, tanto doutrinárias quanto jurisprudenciais, no que se refere a sua classificação como obrigação de meio ou de resultado, devendo cada situação ser avaliada no caso concreto.
No entanto, a regra da responsabilidade civil do médico, conforme estabelece o Código de Defesa do Consumidor, enquadra-se na da responsabilidade subjetiva, o que implica dizer que, para que haja responsabilidade é necessária a existência de um ato lesivo culposo, o dano ao lesado, e o nexo causal entre estes elementos.
Quando se menciona “ato lesivo culposo” significa dizer, que para que haja dever de reparação, o ato praticado pelo profissional de saúde deve ter sido praticado por dolo, ou por meio de imprudência, negligência ou imperícia.
O dolo seria uma conduta praticada intencionalmente, ou seja, para que seja configurado, o médico teria que realizar um tratamento errôneo com o intuito de prejudicar o paciente.
Já a imprudência se verificaria com um comportamento arriscado do médico, com falta de moderação ou precaução necessária ao caso. Isso ocorre, quando, por exemplo, o médico realizar um procedimento às pressas por estar atrasado para um compromisso.
No que tange à negligência, diferentemente da imprudência, esta é uma conduta omissiva que, para se configurar, o médico teria que deixar de realizar o procedimento adequado ao tratamento do paciente, agindo com descuido, indiferença ou até mesmo desatenção.
Quanto à imperícia, esta se consolida com a prática, pelo profissional, de um procedimento que não é apto para realizar, não possuindo a qualificação técnica necessária. Como exemplo, podemos citar um médico cardiologista que realiza uma cirurgia neurológica; este, por mais qualificado que seja em sua área, não possui o conhecimento técnico para realizar tal cirurgia, podendo, no caso concreto, configurar-se uma situação de imperícia.
Faz-se necessário frisar que, como toda relação de consumo, o profissional médico possui o dever de informação adequada e clara sobre o seus procedimentos, integrando ainda o grupo de deveres, o de orientar o paciente e/ou familiares sobre o diagnóstico, prognóstico, os riscos existentes, as opções e objetivos dos tratamentos, e os medicamentos a serem indicados.
Em muitos casos, uma simples preocupação do profissional em explanar claramente ao paciente e/ou familiares sobre os procedimentos que irá realizar, e os riscos decorrentes, pode evitar que este seja posteriormente acionado, seja administrativamente ou judicialmente.
Entretanto, caso o paciente resolva acionar judicialmente o médico para repará-lo por algum dano, imprescindível faz-se ressaltar que o ônus da prova, em regra, é do autor. Entretanto, como se trata de uma relação de consumo, o juiz, a requerimento do autor, poderá inverter o ônus da prova para o profissional médico, quando verificar que há uma situação de hipossuficiência econômica e/ou técnica.
O que se verifica na prática é que, na maioria dos casos, os juízes concedem a inversão do ônus da prova ao autor, ante a complexidade técnica dos procedimentos, cabendo ao médico demonstrar que agiu corretamente, dentro dos métodos de sua profissão e que não foi responsável pelo ocorrido com o paciente.
Diante disso, é fundamental que os profissionais médicos estejam munidos de provas que demonstrem a devida realização dos procedimentos, sendo de suma importância o preenchimento bem detalhado dos prontuários e, em alguns casos, a utilização de um Termo de Consentimento Informado (documento que tem por finalidade informar o paciente sobre os procedimentos e as consequências que poderão advir do ato médico, entre outras informações), devidamente assinado pelo paciente, ou pelos familiares.
Ademais, a responsabilidade civil do médico trata-se de um tema bastante amplo e complexo, possuindo diversas nuances que somente podem ser avaliadas no caso concreto. Não possui o presente artigo o intuito de esgotar todas as informações sobre o tema, mas de apenas apresentar, de modo geral, alguns aspectos da responsabilidade civil médica, bem como alertar para algumas precauções e cuidados a serem tomados no exercício da medicina.