Os paraísos fiscais e a flexibilização aos princípios fiscais: atos lícitos ou branqueamento de capitais?

14/05/2016 às 18:16
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Análise tributária e fiscal dos paraísos fiscais.

INTRODUÇÃO

Trata-se de estudo sobre paraísos fiscais, em que se busca estabelecer sua dupla função: evasão e elisão fiscal. É um estudo de esclarecimento de como funcionam aludidos mecanismos, e, ainda, a sua importância na movimentação financeira da economia global, com ênfase na relativização dos princípios fiscais e os impactos na fiscalidade.

Embora se compreenda que o Estado tem o poder - dever de tributar, é preciso destacar que este direito deve estar em consonância com os princípios fiscais e na correta escolha dos interesses públicos, sob pena da sobrecarga desproporcional ser um mecanismo contra o próprio Estado.

Diante disso, os paraísos fiscais surgem como zonas de liberdade ou redução de tributação e, ainda, capazes de serem alvos lícitos de planejamentos tributários, levando o Estado a uma penalização da sua própria tributação, à medida que o contribuinte busca outras zonas mais atrativas.

Para se ter um estudo de paraísos fiscais, além da necessidade de se conhecer o instituto, o que é feito no primeiro capítulo, nota-se a importância de conhecer os princípios fiscais e posicionar tais “paraísos” na flexibilização destes axiomas, o que se denomina de técnica fiscal. E, com base nisso, passa-se a conhecer as diferentes manifestações dos investimentos nestes paraísos, sem perder o foco na União Europeia, principalmente, porque Portugal passou e ainda está passando por diversas mudanças em sua trajetória fiscal, seja sobre a existência de imposto único como o IVA, como o aumento das suas taxas de desemprego e o descontentamento em massa de sua população com as opções do Estado pelos interesses públicos a serem custeados com o exercício da atividade fiscal.

Os paraísos fiscais surgem, alternadamente, como “vilões” e “aliados” da técnica fiscal. Esta é a proposta de estudo de um tema ainda em construção, com muitos preconceitos e tabus e, ainda, não suficientemente abordado pela doutrina e jurisprudência. Não se trata de uma exaustão do assunto, mas o ponto de vista teórico de um instituto que causa impacto considerável na economia e na fiscalidade.

  1. Conceito, pressupostos e caracterização dos paraísos fiscais

Paraísos fiscais, também chamados de “refúgios” ou “oásis fiscais”, é uma expressão vinculada a específica situação: são países ou áreas delimitadas de determinados países em que existem facilitações tributárias para que as pessoas, físicas ou jurídicas, possam fazer investimentos de capitais, com a intervenção mínima ou nula do Estado na cobrança de tributos.

Referidos países consideram que seria mais proveitoso movimentar suas economias se abrissem espaço a investimentos externos, não importando, num primeiro momento, a origem de tais recursos, se provenientes ou não de ilicitudes.

Geralmente, são países que estão em constante recessão econômica e, ao mesmo tempo, passam a ser vistos como centros financeiros que se beneficiam enormemente da existência de paraísos fiscais. Além disso, referidos países que servem para tal desiderato não tem outra fonte de recursos que estas, além do turismo, principalmente, os que estão situados no Caribe e na América.

Mencionados países ou territórios, para se configurarem como verdadeiros paraísos fiscais, reúnem como características concomitantes o seguinte: a) como visto, baixa carga tributária ou inexistência de tributação; b) estabilidade política ou segurança jurídica; 3) igualdade no tratamento aos estrangeiros; 4) inexistem restrições a investimentos estrangeiros em quaisquer atividades; 5) ausência de controles cambiais com a livre permissão de controle de moedas; 6) confidenciabilidade e sigilo bancários e de dados; 7) comunicação eficiente com meios de transportes; 8) certa estrutura social.

Nota-se, ainda, que alguns dos paraísos fiscais são abrangidos por convenções que proíbem a dupla tributação. Estas são também as conclusões de TEIXEIRA (2008; p. 59).

Estas facilitações podem ser tanto em referência a diminuição da carga tributária como simplesmente (no caso do Brasil, considera-se qualquer país ou território que tenha menos de vinte por cento do que se considera a taxa de tributação) e a nulidade de qualquer tributação nas operações que se realizam.

A procura por estes paraísos fiscais é justamente para evitar uma carga tributário onerosa e a diversidade de legislações, principalmente, burocráticas, o que dificulta quando uma empresa resolve implantar subsidiárias ao redor do mundo.

Nota-se que depende de país a país o que se considera como paraíso fiscal quando se está a tratar de aspectos de mera diminuição da tributação, pois as faixas de tributação são variáveis no tempo e no espaço. Acima, mencionamos que, para fins de legislação tributária, é preciso verificar o que se revela como facilitação ou não.

Brasil e Portugal não são paraísos fiscais. Pelo contrário. São países que possuem carga tributária considerável, com um governo com grandes despesas sociais que gera déficit público nos orçamentos e com receita fiscal comprometida pelos setores públicos e administrativos, levando-os constantemente a sofrerem os impactos de fugas de investidores para os paraísos fiscais.

A carga tributária portuguesa se mostra onerosa e ainda agravada pelos empréstimos mediante taxas de juros. Diante disso, é preciso que se crie mentalidade de se usar os recursos que o país possui, com o aumento da competitividade, das exportações e diminuir o índice de desemprego. Mas não é isso que acontece, pois a maneira mais fácil do Estado ter dinheiro é atingindo o indivíduo, através da dispensa de funcionários públicos e cortes orçamentários. Ainda acrescenta BRAZ (2013; p. 13):

Acrescenta-se a este panorama, a forte erosão do tecido comercial e industrial, o desemprego galopante, o progressivo e quase generalizado descrédito da Justiça e um endividamento externo à razão de 1, 8 milhões de euros por hora e compreender-se-á facilmente os motivos que têm levado inúmeros portugueses a transferir capitais e a sediar empresas e fundações fora do nosso país.

A grande polêmica destes lugares é quando as pessoas fazem determinadas aplicações possuem sua identidade preservada, existindo, praticamente, uma situação de sigilo bancário, fiscal e de dados de forma absoluta, o que pode ser usado por alguns como instrumento de “lavagem de dinheiro” de ilícitos como tráfico de drogas, abrigo para capitais usados com finalidades criminais, fraudes financeiras e corrupção, por exemplo, à medida que a procedência dos bens não importa para estas localidades, tendo “passe livre” para os investimentos.

Até porque nestes “oásis fiscais”, as contas são numeradas ou as pessoas podem fazer uso de pseudônimos, de modo a facilitar as transferências das contas, mesmo que não seja o caso de anonimato, pois o próprio banco do paraíso fiscal tem conhecimento de quem é o autor da conta, mas não faz divulgações. E, ainda, geralmente, são usados os advogados e especialistas para a realização destas transações.

Nota-se, no entanto, que alguns países, denominados de paraísos fiscais, já estão autorizando a quebra de sigilos bancários, tendo conseguido, por exemplo, as autoridades brasileiras estas aberturas para fins de desbaratar, inclusive, crimes relacionados com corrupção e tráfico de drogas e armas.

Observa-se, no entanto, que é possível utilizar paraísos fiscais não somente para finalidades ilícitas, mas também podem ser instrumentos para atividades lícitas, mediante planejamento tributário no que se refere à elisão fiscal, em que as empresas podem ter uma estrutura internacional que podem com toda a facilidade movimentar seus lucros por meio dos paraísos fiscais, praticando mera elisão.

Isso é bem diverso da ideia de evasão fiscal, esta sim, responsável por desvios em contrariedade com a legislação, sendo, praticamente, infração tributária, pois o desvio não é permitido pela lei. Neste caso, não se trata de mero planejamento e, assim, a aplicação feita em paraíso fiscal na forma de evasão, será considerado ilícito, sujeito à penalidade.

Isso porque nada impede que, para fins de organização da tributação, determinada pessoa, seja física ou jurídica, realize um planejamento tributário, bem como para estrutura de planejamento de heranças, proteção de patrimônio, investimentos offshore, holdings societárias e holdings para direitos autorais, patentes e royalties, dependendo da legislação do país.

Justamente por isso quaisquer investimentos no exterior devem ser declarados, pois a não declaração leva à verificação se o caso é de elisão ou de evasão fiscal, tendo consequências, inclusive, criminais. No entanto, é imperioso destacar que alguns não distinguem entre elisão e evasão fiscal, porém, neste artigo, estabelece-se a diferença, considerando-se a primeira como forma lícita proveniente do planejamento tributário.

Planejamento tributário pode ser entendido como conjunto de sistemas, revestidos de legalidade, em que se procura diminuir, de forma contábil e econômica, o pagamento de tributos, sendo um direito do contribuinte em estruturar seus negócios da maneira que lhe parecer mais oportuna, procurando a diminuição dos seus custos. É uma decisão do investidor e quando isso é feito de forma lícita, o Estado deve respeitar esta decisão.

Há, ainda, como reflexos lícitos dos paraísos fiscais, por exemplo, a criação de sociedades offshore que são empresas criadas de forma legal, bem como devidamente registradas, fora dos limites territoriais das suas sedes ou domicílios dos sócios, constates no contrato social, nestes paraísos que conferem privilégios contábeis e tributários.

Nota-se, ainda, a incidência do princípio da tipicidade na área fiscal e, assim, o que não é proibido é autorizado, e, assim, sem vedações legais, a elisão é permitida, pois é sinônimo de planejamento com métodos legais para redução da carga tributária em determinados orçamentos.

Quando se trata da evasão fiscal, considerando-se algo como diverso de mero planejamento tributário, temos inegavelmente situação de empobrecimento do próprio país que originou a divida. Isso porque a sua tributação não incide e, por isso, com a ausência da arrecadação, haverá diminuição na prestação de serviços públicos. E tem um impacto negativo muito mais nítido em países em desenvolvimento.

Uma forma de estratégia fiscal seria a opção pela tributação do consumo e não, pelo patrimônio, tal como a finalidade do IVA, sendo imposto comum nos 28 países da União Europeia (imposto comunitário) em que incide sobre como prestação de bens e serviços, tendo a taxa na fatura de 23% em Portugal, mas possuem variações dentro da limitação concedida pelos regulamentos da União Europeia, havendo taxas normais (23%), intermediária (13%) e reduzidas (6%) relacionado ao tipo de produto. Obviamente, que também há a tributação sobre o patrimônio como o IMT sobre transmissões onerosas dos imóveis, por exemplo.

No Brasil, temos a tributação, prevista na Constituição de 1988 e no Código Tributário Nacional, de tributação do consumo como do patrimônio.

Há organismos internacionais que estão dedicados a combater a situação da existência dos paraísos fiscais, do qual destacamos a O.C.D.E (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), do qual Portugal faz parte que instituiu lista negra e cinzenta dos países que são considerados paraísos fiscais e que sofrem represália econômica. A lista cinzenta se refere aos países que não cooperam com o intercâmbio de informações, dos quais citamos: Austria, Andorra, Anguila, Antígua e Barbados, Aruba, Bahamas, Bahrein, Bélgica, Belize, Bermudas, Brunel, Ilhas Caimão, Chile, Ilhas Cook, República Dominicana, Gibraltar, Grenada, Libéria, Ilhas Marshall, Guatemala, Lieschtenstein, Luxemburgo, Mônaco, Montserrat, Nauru, Antilhas Holandesas, Niue, Panamá etc.

Diante disso, alguns países, na Europa, estabeleceram uma espécie de intercâmbio automático de informações dos não residentes, iniciando-se a adoção deste modelo pelos Estados Unidos da América, destacando-se, ainda, que a rede dos paraísos fiscais se revelam tão complexas que a maioria dos investimentos ali realizados são de fatais investimentos indevidos, daí porque a visão negativa dos paraísos fiscais, principalmente, sob a roupagem de “economia paralela”, sendo alvos de considerável preconceitos, inclusive, pelos governos.

Segundo notícias veiculadas sobre esta temática, os grandes aplicadores nestes paraísos fiscais são investidores provenientes de instituições bancárias e multinacionais, notando-se maciça presença de pessoas físicas.

Nota-se, ainda, que a mecânica de evasão fiscal é variável de acordo com o investidor, apesar do objetivo ser comum. Cita-se, como exemplo, as multinacionais que se utilizam dos paraísos fiscais, tendo como instrumento que a baixa ou nula tributação, de maneira que contrate a preços inflacionados serviços legais ou financeiros ou de promoção de suas próprias subsidiárias instaladas em paraísos fiscais em que pagam menos impostos, criando uma espécie de realismo mágico dos paraísos, bem como criando a ficção de uma empresa não ter lucros contábeis.

Podemos citar como exemplos destes paraísos os países: Andorra, Bahamas, Belize, Singapura, Dominica, Hong Kong, Ilhas Cayman1, Ilhas Bermuda, Líbano, Londres, Panamá, Paraguai, República da Costa Rica, Suíça2 entre outros.

E, ainda, cada paraíso fiscal tem suas peculiaridades em relação às suas facilitações, como, por exemplo, temos “oásis fiscais” adequados para todos os interessados e outros que são chamativos apenas para alguns perfis. Cita-se, como exemplo, o Principado de Mônaco em que há facilidades para pessoas físicas, mas já não se revela interessante para pessoas jurídicas, tendo em vista tributar sobre lucros.

Temos os paraísos fiscais para pessoas singulares3, dos quais destacamos, por serem os mais conhecidos, a título de exemplo: Andorra, Irlanda, Principado de Mônaco, Polinésia Francesa etc. Destaque-se que, gradualmente, os países estão cedendo às pressões internacionais e flexibilizando o sigilo bancário e fiscal para as autoridades originárias dos recursos, tal como aconteceu com Andorra que editou legislação em 2002, para fins de colaboração com diversos países para evitar o uso indevido dos paraísos fiscais no que tange à lavagem de dinheiro.

Em relação às empresas4, os paraísos fiscais são mais numerosos que para as pessoas físicas e podemos citar Hong Kong, Chipre, Ilha de Jersey, Panamá etc, destacando-se que Hong Kong possui o maior número de instituições bancárias do mundo.

Acerca dos “oásis fiscais” mistos5, ou seja, que atendem as expectativas de pessoas singulares e jurídicas, podemos citar como exemplos: Bahamas e Bermudas.

Paralelo a estes paraísos fiscais e a classificação acima ventilada, destacamos paraísos fiscais com fins especializados6. Destacamos, a título de exemplo, três situações especiais: (a) Dinamarca, como reino dos royalties; Luxemburgo, com tratamento diferenciado para as holdings;

(c) Seychelles, com tratamento diferenciado para as offshores.

Conclui-se que os paraísos fiscais são uma realidade global, servindo-se tanto para pessoas físicas ou jurídicas e, neste sentido, é preciso perquirir para o tipo de finalidade que se busca na escolha de um paraíso fiscal, tendo em vista as peculiaridades de cada um deles e, ao mesmo tempo, é imperioso se esclarecer que eles tanto podem ser usados para fins lícitos ou ilícitos, caindo por terra o preconceito de que os paraísos fiscais servem apenas como instrumentos de lavagem de dinheiro.

2.Os princípios tributários e fiscais e as afrontas pelos Paraísos Fiscais

A grande problemática dos paraísos fiscais é quando são instrumentos para revestimentos de atos ilícitos, mas com a ênfase de que os paraísos fiscais podem revestir negócios lícitos, sob o supedâneo de planejamentos tributários.

Neste capítulo, verificaremos a situação dos paraísos fiscais como afrontas aos princípios presentes nos artigos 103 e 104 da Constituição Portuguesa de 1976, onde é definido o sistema fiscal tendo como princípios fundamentais a legalidade, a igualdade, neutralidade, progressividade e a proibição de retroatividade, dos quais serão tecidos alguns comentários.

Princípios são mandamentos nucleares que servem como fator de interpretação, integração, fundamento e organizacional do ordenamento jurídico. Alguns princípios se tornam tipificados no ordenamento e outros, são implícitos.

Tais axiomas devem ser considerados para fins de manter a harmonia do sistema, principalmente, em termos de Portugal no que se refere às ingerências da União Europeia, em que existe o fenômeno da “europeização do direito” e da transnacionalidade, destacadamente, no que se refere ao ordenamento jurídico supranacional7.

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Todos os princípios possuem como objetivo chegar à ideia de imposto ideal, no sentido de que este corresponderia as satisfações da sociedade. Haveria uma espécie de consentimento do povo para fins de que o Estado tributasse e devolvesse com as devidas contraprestações atendendo ao interesse público primário.

O povo consente com a tributação pelo Estado que se compromete a garantir a satisfação do bem comum (teoria do consentimento), com origens até mesmo nas relações do Estado com o povo, ou seja, as finalidades de criação do Estado, como o contrato social da teoria de Rousseaunismo, por exemplo.

Para se aproximar da ideia de imposto ideal, é preciso que o Estado cumpra alguns princípios que servem como orientador e interpretador para tais fins. Diante disso, busca-se um equilíbrio na balança fiscal com gastos e arrecadação do Estado, pesando, principalmente, quando se trata de programas sociais, que varia de acordo com o tipo de modelo que se busca, pois o Estado Social despende muitos mais recursos que o Estado Liberal e o Neoliberal, por ser aquele um Estado prestacional, em que os serviços públicos passam a ter um quantitativo muito superior em Estados que o adotam, como o fez a Constituição Portuguesa de 1976 e a brasileira vigente (1988) em que se aumentou consideravelmente o rol dos direitos sociais.

Na verdade, a tributação/fiscalidade busca conciliar dois interesses básicos como a sobrevivência do próprio Estado que tem o poder soberano (apesar da relativização deste conceito na atualidade) de escolher os interesses necessários para garantir a felicidade dos seus membros e, ao mesmo tempo, atuar em prol do bem comum.

Ocorre que quando a tributação se torna onerosa, os contribuintes buscam formas de fugir da incidência. Como já visto, os paraísos fiscais podem ser usados para os fins de fuga, que tanto pode ser por planejamento tributário ou evasão fiscal e até lavagem de dinheiro, até porque poderia ser o caso de ocultar a origem de bens.

Diante disso, passemos a analisar alguns princípios fiscais e de que forma os paraísos fiscais afrontam referidos axiomas:

  1. Princípio da neutralidade: este axioma tem como objetivo tratar da eliminação racional da cara tributária dentro do país de origem, dos quais se usam os institutos das isenções e benefícios fiscais, buscando aproximação da ideia de imposto ideal que seria aquele que se aproxima da concepção de capacidade contributiva, aliada à ideia de proporcionalidade na cobrança dos tributos, considerando aquilo que o contribuinte pode adimplir, bem como a correspondência necessária entre o que se paga e aquilo que se recebe de contraprestações do Estado. Para tais desideratos, o Estado pode atuar nas importações e exportações, com a atuação interventiva e reguladora do Estado. No entanto, a carga tributária vem crescendo de forma galopante tanto na União Europeia como no Brasil, a maior carga tributária da América Latina. Diante disso, nestes lugares, é maciça a retirada de recursos e capitais, tanto pela elisão como evasão fiscal. Neste aspecto, temos a participação dos paraísos fiscais diante da insuficiência do Estado em cumprir o princípio da neutralidade, principalmente, quando estamos versando sobre elisão fiscal. Deve-se também registrar que este princípio está relacionado a outro: o da eficiência, no sentido de que haveria racionalização das despesas para a otimização dos resultados, no que se refere à gestão na arrecadação e destinação.

  2. Princípio da equidade: aproxima-se da ideia anteriormente já mencionada acerca da capacidade contributiva, no sentido de que este princípio, mesmo sem a definição exata, significa que cada um deverá contribuir o quanto pode e cada um receberá proporcionalmente por aquilo que contribui. Infelizmente, os sistemas tributários não conseguem manter esta proporcionalidade e nem atender aos interesses públicos primários da sociedade8. Em decorrência disso, desta insuficiência do Estado em que gasta mais do que arrecada, sacrificando parcela da população com as tributações e esta situação passa a incentivar a elisão fiscal nos paraísos fiscais.

  3. Princípio da progressividade: segue a linha axiológica dos princípios mencionados acima, pois está relacionada à ideia de um sistema gradual de tributação em que se vai cobrando a mais, a depender da faixa em que se insere a renda de cada contribuinte, tanto pessoas física ou jurídica, estabelecendo-se formas de contribuição e alíquotas diferenciadas. Seria uma forma de garantir a justiça social, embora, não se aproxime muito deste ideal. No Brasil, observa-se que existe tratamento diferenciado para as empresas de pequeno porte e microempresas, concedendo para estas um tratamento diferenciado de tributação, seja de incidência e de arrecadação. Nota-se uma identificação deste princípio com a simplicidade fiscal, no sentido de se buscar eliminar progressivamente pessoas dos escalões dos impostos. Em relação às pessoas físicas e jurídicas que não possuem referidas prerrogativas e que almejam criar empresas ou subsidiárias e que possam propiciar maior lucratividade, podemos ver a tentativa de investimentos em paraísos fiscais justamente pela não inclusão nas faixas favorecidas pelo referido princípio. Neste caso, pode-se notar até mesmo justificativas para que as pessoas possam se utilizar do mecanismo de elisão fiscal. Em relação a comportamentos ilícitos, os investidores, com vultosos capitais, para escapar de tais faixas de incidência mais severas também se utilizam deste princípio para justificarem atos ilícitos como a evasão fiscal, até porque, se for o caso de origem ilícita de capitais e recursos poderão fazer uso dos “oásis fiscais”.

  4. Princípio da não – discriminação: tende a aplicação do conceito moderno de isonomia, devendo se perquirir pela distinção entre igualdades e desigualdades, notando-se o conceito de que estes conceitos devem ser vistos no prisma de estarem ou não nas mesmas condições, usufruindo da mesma situação jurídica e até do ponto de vista econômico. Este é um dos lemas da União Europeia, com o Tratado de Maastrich que passou a tratar o conceito de cidadão europeu e com a extensão de direitos a todos os cidadãos da União Europeia. Nota-se que este axioma implica também a ideia de jurisdição fiscal em determinado território, levando-se a outro princípio a seguir analisado, sendo estabelecidos alguns critérios, como os apontados por TEIXEIRA (2008; p. 55) como sendo: territorial (ex: tributação de imóveis), residência do contribuinte e nacionalidade. Este princípio possui destaque na União Europeia no intuito de se permitir a paridade entre os membros participantes e entre cidadãos europeus evitar discrepâncias e diferenças e de permitir a livre locomoção e circulação de pessoas, serviços e capitais, abolindo quaisquer elementos discriminatórios, sendo esta também a orientação do Tribunal Europeu. Cumprir o princípio da igualdade é um caminho rápido para se almejar a justiça social. Justamente para aqueles que buscam evitar o tratamento igualitário, no sentido de que a igualdade iria lhes prejudicar, pelo aumento de suas cotas na tributação, fazem uso dos paraísos fiscais, mantendo a nulidade ou rebaixamento da sua tributação.

  5. Princípio da territorialidade: como visto, está relacionado com a ideia de jurisdição fiscal, em que cada Estado tem sua margem de liberdade para a cobrança dos tributos. O Estado, em seu território, pode fazer as aplicações fiscais que forem previstas a todos que estiverem em seu território. Este princípio é o exercício da soberania para tributar estrangeiros que estão em seu território. Os paraísos fiscais servem justamente como fugas a determinados regimes fiscais nos territórios de sua origem. TEIXEIRA (2008; p.56) traz valiosa informação do tema, no sentido do comércio virtual em que se torna mais complexo saber qual tributação incide, ou seja, que país tem poderes para tributar, e, “frequentemente, as transações escapam à rede fiscal, com manifesto prejuízo para os cofres fiscais dos estados envolvidos”. Relembre-se que um dos relevantes conceitos para fins de fomentar o uso de paraísos fiscais seria justamente as convenções coibindo a dupla tributação. O Brasil adotou este princípio/critério de fiscalidade e também em Portugal, destacadamente na situação de estabelecimento estável e os tipos de rendimento sujeitos à retenção na fonte. No paraíso fiscal de Hong Kong, por exemplo, os lucros ou dividendos sujeitos a impostos são os únicos que resultam de uma atividade comercial, profissional ou negocial exercidos em Hong Kong, não existindo impostos sobre capital e dividendos.

  6. Princípio da residência: por este princípio, o responsável pela tributação é do local em que os contribuintes residem e não da origem do rendimento a ser tributado (neste último, temos o princípio da territorialidade). O mecanismo do paraíso fiscal é utilizado para que se “burle” este critério, à medida que permitem investimentos em lugares neutros que possuem como filosofia a manutenção do sigilo dos investimentos e até a movimentação de contas bancárias através de números e pseudônimos, sem a identificação direta com o investidor. Alguns paraísos fiscais, como a Irlanda, permitem que artistas e escritores gozem de verdadeiro status privilegiado desde que comprovem, de forma inconteste, que possuem como única residência a Irlanda. Alguns países permitem o sistema de dupla residência com a previsão das convenções de dupla tributação, inexistindo tal situação nos paraísos fiscais.

  7. Princípio da nacionalidade: tributa-se no país da nacionalidade do contribuinte, mesmo que ele resida em outro local ou que a origem dos rendimentos também seja diferente, ocorrendo a situação de dupla tributação. Segue os mesmos moldes que explicados acima e as mesmas justificativas para a utilização dos paraísos fiscais.

  8. Princípio da simplicidade: a tendência é os sistemas fiscais serem simples até para que o Estado possa, facilmente, arrecadar, fiscalizar e gerenciar os recursos advindos da tributação. Diante disso, até para evitar ações judiciais e impugnações administrativas, as leis fiscais devem ter uma linguagem simples, direta e acessível, evitando interpretações contraditórias que dificultem a aplicação das normas fiscais. Esta simplicidade é um dos obstáculos para a destinação de investimentos aos paraísos fiscais, daí porque é um dos princípios mais importantes nesta temática.

  9. Princípio da reciprocidade: isso enfatiza a ideia de dupla tributação, sendo de exclusiva aplicação no plano internacional. Esse é um dos princípios que, no âmbito fiscal, levam os investidores aos paraísos fiscais. Por tratados internacionais e pelo princípio da reciprocidade, pode-se conceder os mesmos benefícios para Brasil e Portugal, por exemplo, no que se refere à aplicação das mesmas taxas de juros. Sempre que ocorrer dupla tributação, é possível se recorrer para o instituto da compensação, mediante as formas previstas na Convenção, até porque os objetivos dos tratados é incentivar os investimentos. A reciprocidade também pode ser usada para concessões e facilitações de investimentos estrangeiros, o que investidores podem tornar mais vantajoso do que aplicação em paraísos fiscais. Neste ponto, o princípio da reciprocidade pode ser usado para combater as preferências por estes “oásis”. Na prática, não se observa que os Tratados estejam cumprindo eficazmente a situação de prevenção de fraudes. É possível troca de informações acerca de cada contribuinte. Isso ocorre, por exemplo, entre Brasil e Portugal quando se observam movimentações estranhas ocorrendo em contas bancárias. Por derradeiro, analisamos, o último princípio escolhido para fazer um panorama:

  10. Princípio da transparência: está relacionado às questões éticas e de publicidade, no sentido de que todos possam reconhecer e identificar os contribuintes que recebem isenções e imunidades fiscais, principalmente, a quantidade de isenções e benefícios fiscais que são concedidos pelo Estado. Esta é uma missão da Comissão das Comunidades Europeias. A tendência é a diminuição destas isenções para se poder garantir a aplicabilidade dos princípios que mencionamos acima, tornando mais ética a forma de tributar pelo princípio da equidade e da isonomia. Para a Organização Mundial de Comércio, para se fazer cumprir tal princípio seria preciso: a) descrição do tipo de medida fiscal adotada; b) função e objetivos da isenção ou imunidade concedidas; c) custos ou benefícios em termos de receita fiscal; d) a avaliação econômica e se seria possível atingir o objetivo buscado pela concessão de isenção. A OCDE, praticamente, faz uma guerra contra os paraísos fiscais, acionando uma série de mecanismos mediante troca de informações e começou a identificar os paraísos fiscais, nos termos do art. 26 do Acordo da OCDE. Portugal, inclusive, assinou este protocolo. Ainda foi assinada a Diretiva da Poupança em que os bancos da União Europeia permitem informações entre si de forma automática e os bancos também encaminham estas informações para as autoridades fiscais imediatamente. Neste sentido, nota-se que muitas empresas estão perdendo as prerrogativas fiscais em seus territórios de origem, passando a investir capitais em “oásis fiscais” justamente pela isenção total de impostos ou aplicação apenas de taxas nominais. Explica este princípio com propriedade TEIXEIRA (2008; p. 59) ao afirmar:

Tanto a a OCDE como a Comissão das Comunidades Europeias tem desenvolvido esforços consideráveis tendentes à publicitação e racionalização de particulares incentivos ou benefícios fiscais atribuídos pelos estados membros. O fenómeno da concorrência fiscal prejudicial tem vindo a ser analisado, nomeadamente, o uso de “paraísos fiscais” ou adopção pelos estados dos chamados “regimes fiscais preferenciais”.

Temos, assim, com estes princípios o cenário do panorama fiscal foi delineado e apresentado como os paraísos fiscais são usados para burlar os princípios, ou seja, demonstra-se aqui os motivos pelos quais os investidores fazem a opção pelos Paraísos Fiscais.

3. Comportamentos lícitos e ilícitos dos Paraísos Fiscais.

Conforme analisado, temos os Paraísos Fiscais sendo usados como instrumentos para fins de lícitos e ilícitos, dos quais teceremos comentários acerca das situações, iniciando-se pelos paraísos fiscais na modalidade de instrumentos ilícitos.

    1. Paraísos fiscais como instrumentos ilícitos

São situações mais comuns, tendo em vista que até o nome de paraísos fiscais sugestiona a concepção preconceituosa acerca deste instituto. Com esta “fuga ilegal de tributação”, temos a afronta à equidade (já vista no capítulo 2) horizontal e vertical, com vantagem competitiva com os desonestos, semelhante aos reflexos do dumping.

Não se trata de situação de “fuga lícita e planejada”, mas sim uma situação em que as pessoas buscam impedir a tributação, não somente por uma situação econômica/fiscal, mas, primordialmente, por uma questão criminal, haja vista que as rendas e capitais são oriundos de atividades tipificadas como crimes. Isso porque os paraísos fiscais proporcionam a discrição máxima dos investidores, sem demonstrar interesse pela origem dos recursos.

Sob este prisma, os paraísos fiscais funcionam como “economia subterrânea” e, segundo CRUZ (2008; p. 196), “ algumas estimativas indicam que nos países mediterrânicos (Portugal incluído), este prejuízo pela evasão fiscal chega até 20%, o que significa que, em média, os contribuintes pagam voluntariamente apenas 80% do que deveriam pagar”.

Como condutas ilícitas, estes crimes cometem dupla infração: tributária/fiscal e criminal, à medida que se trata de evasão fiscal. Sabe-se que, na fiscalidade, o “dinheiro não tem cheiro”, devendo ser tributada qualquer situação de rendimento para somente depois existir uma investigação mais completa acerca da origem dos recursos.

Ora, diante de tais fatos, para fins de evitar a fiscalidade que surge sobre considerável valor oriundo de atividades criminosas, bem como da futura investigação acerca destes valores, os paraísos fiscais são utilizados para retirar os bens de qualquer alvo de investigação.

Diante deste mecanismo, o preconceito sobre os paraísos fiscais se tornou sempre atrelado a este instituto, do qual destacamos as principais fontes de ilicitude que utilizam tais mecanismos:

(a) Lavagem de dinheiro ou embranquecimento de dinheiro (expressões sinônimas): utilização por diversas pessoas, físicas e jurídicas e até de governos que buscam esconder a origem dos bens.

Relaciona-se com tráfico de drogas, armas, pessoas e animais, consideradas as atividades ilícitas mais rentáveis no mundo. Também se faz uso deste mecanismo para fins de fazer uso do dinheiro adquirido em corrupção.

Movimentam vultosamente a economia em todo o mundo, inclusive, com o financiamento de governos e manutenção de dependência política e econômica de Estados, principalmente, os que ainda estão sem desenvolvimento, tal como ocorrido na América Latina.

Registre-se que muitos paraísos fiscais estão abrindo mão do histórico sigilo bancário e fiscal para evitar o enriquecimento indevido de pessoas, haja vista que, neste caso, a ideia de paraísos fiscais se aproxima a cumplicidade do sistema financeiro estrangeiro, pois conta com a colaboração (consciente ou não) de instituições financeiras situadas no exterior que recebem tais divisas sem qualquer questionamento da sua origem.

Aliás, sobre o sigilo bancário e fiscal, bem como de dados, é imperioso destacar que são direitos fundamentais dos cidadãos. A crítica do Direito Fiscal se refere às tentativas ilícitas de se evitar a tributação. Até porque as instituições financeiras, mesmo em países que não sejam paraísos fiscais, possuem o dever de confidenciabilidade, devendo manter, em determinados níveis, o segredo comercial, industrial e profissional.

No século XXI, enfrentamos a era da troca de informações, destacando-se dois princípios importantes: legalidade e proporcionalidade, com a proibição das “fisching expeditions” ou troca de informações fiscais com âmbito não especificado ou demasiado lato.

Além dos depósitos nestas contas correntes dos “oásis fiscais”, há também a utilização não pelo sistema financeiro, mas pela ausência de burocracia para “abertura de empresa de fachada” que permitem o uso, inclusive, de títulos ao portador, sem qualquer identificação da cadeia de repassadores dos recursos, com a finalidade tanto de “lavar capitais” diretamente como também, de forma indireta, proporcionar uma “mistura” de capitais lícitos com ilícitos, tendo o mesmo objetivo de desvirtuar a origem dos recursos ilícitos, dificultando o rastreamento de futura investigação. Temos, por exemplo, as facilidades em Macau em que são permitidas as atividades bancária, securitária, gestão fiduciária de patrimônio, atividades comerciais, atividades de proteção de serviços auxiliares, não importando a origem dos recursos.

Diante disso, há cautela acerca dos investidores em todo o mundo quando procuram se associar com investimentos vindo de paraísos fiscais, tendo em vista que existe a possibilidade de origem ilícita justamente por esta ausência de rastreamento e das múltiplas opções de realizar o “embranquecimento” de capitais.

(b) Fraudes financeiras ou comerciais: algumas empresas fazem remessas ao exterior no intuito de evasão fiscal. Neste caso, a ilicitude persiste porque se fraudam situações contábeis no intuito de se criar a falsa impressão de rendimentos, quando, na realidade, passa-se o lucro, praticamente, para paraísos fiscais, com a indevida vantagem ou proveito financeiro, burlando o sistema fiscal.

(c ) Instituições fantasma: relacionado com o que exposto sobre lavagem de dinheiro, o mecanismo de uso de empresas fantasmas que, inclusive, fazem uso dos mesmos nomes que instituições bancárias e financeiras conhecidas, mas que não possuem qualquer relação para atrair investidores, representando elevados riscos para quem investe.

Temos julgamento pelo Superior Tribunal de Justiça9, no Brasil, que configurou o abuso de empresas em paraísos fiscais como crime contra o sistema financeiro nacional (art. 22 da Lei 7492/96): do qual se transcreve apenas parte da ementa que interessa:

“ Não são elementares do tipo acima referido, merecendo consideração desfavorável, circunstâncias que denotam a complexidade e sofisticação do esquema, em que foram utilizadas pessoas físicas e jurídicas interpostas e contas bancárias de empresas sediadas em países conhecidos como “paraísos fiscais”, que eram constantemente modificadas, com intermediação constante de doleiros nas transações e uso distorcido do sistema de contas bancárias de não residentes no país.”

      1. Evasão fiscal: neste caso, não se trata de ilícitos criminais propriamente, mas tributários, em que se busca, de forma, indevida escapar da tributação. Nestes casos, são encaminhamentos de divisas a paraísos fiscais sem cumprimento da legislação. Este ilícito tributário leva ao desequilíbrio das contas públicas, tanto em nível horizontal como vertical, o que aumenta a injustiça social.

Esta é uma tendência quando ocorre aumento dos impostos e decresce o poder de fiscalização do Estado, haja vista que este não tem conhecimento do seu rendimento real, mas aleatoriamente fiscaliza a situação dos contribuintes. Pelo princípio da simplicidade e da transparência, conforme visto, nota-se que se pode evitar este fenômeno.

    1. Paraísos fiscais como instrumentos lícitos

Como visto, paraísos fiscais podem ser usados como instrumentos lícitos, dos quais passaremos a analisar. Nestes casos, os paraísos fiscais surgem como alternativas para que, legalmente, pague-se menos impostos. Até porque o princípio da legalidade não obriga ninguém a pagar mais do que deve.

Evitar pagamentos a mais de impostos, além de ser economicamente racional, não é tido como reprovável, na margem da legalidade e, neste aspecto, os paraísos fiscais se mostram positivo.

Registre-se, ainda, que tanto em Portugal como no Brasil, há estudiosos que consideram tanto a elisão a a evasão como sinônimos, bem como considerando a evasão como comportamento que levam os indivíduos a fazerem escolhas lícitas. Neste trabalho, usa-se a distinção entre elisão e evasão, sendo este último atividade ilícita.

Deve-se ficar atento para que não exista o planejamento abusivo, com a centralização das atividades de empresas em países com baixa fiscalização e exigência fiscal, como, por exemplo, a Irlanda. Mas as empresas possuem liberdade para escolher os países em que querem implantar suas empresas. Estas empresas não são residentes de determinados países e usufruem da tributação mais benéfica, razão pela qual os países que possuem a maior sede da empresa ficam sem a maior parte dos impostos. Trata-se de uma atividade ainda lícita, mas revestida de abusividade.

Países como Portugal e Brasil não tinham e ainda não possuem orçamento equilibrado. Os orçamentos plurianuais servem para cobrir despesas e não onerar gerações futuras. Nota-se que a carga tributária excessiva nem sempre atende às necessidades coletivas, pois nem sempre o Estado faz as escolhas corretas do que seja interesse público.

Quando existe o descompasso entre a arrecadação e a destinação com a escolha dos interesses públicos, chegamos, inevitavelmente às insatisfações populares10 e, assim, às perspectivas do contribuinte de “fugir” da carga tributária, de forma lícita ou não.

(a) Empresas offshore: este nome explica a situação das sociedade comerciais construídas em zonas privilegiadas ou até livres de tributação, inclusive, com a cesso a determinados tipos de financiamento internacional a juros baixos. Estas sociedades são situadas no exterior, sujeita a um regime legal diferente em relação ao país de domicílio dos seus sócios. Neste caso, criam-se em paraísos fiscais este tipo de empresa, lícitas, constituídas em território diferente da sua sede ou do domicílio dos interessados, registradas de forma correta em paraísos fiscais, cumprindo a devida legislação jurídica e contábil, na busca de lugares em que existe maiores vantagens para a criação e manutenção destas empresas. São entidades extraterritoriais em busca de privilégios e isenções nos paraísos fiscais, e até carga tributária reduzida, até porque quanto maior a carga fiscal existente em certos países, maior se torna o interesse de empresas e pessoas físicas em fazer investimentos no exterior, com o uso dos paraísos fiscais. Diante disso, a criação de empresas nestes países ou território não se revela como algo ilícito, mas racionalização do uso do capital e uma opção do contribuinte que obviamente fará sua escolha naquele setor ou lugar que proporcionar maiores vantagens, até para o aumento dos seus lucros. Isso aconteceu, em Portugal, principalmente, diante da liberalização da economia, com a eliminação das “golden shares” e redução do subsídios estatais a determinados setores, até como orientação da União Europeia para fins de reduzir o número de subsídios estatais e quem faz a fiscalização é a União Europeia. Além disso, houve redução dos lucros do setor financeiro. Os paraísos fiscais surgem como atrativos pela redução de impostos ou até mesmo isenção. Para a formação destas sociedades, é imperioso que a legislação do paraíso fiscal lhe permita um capital mínimo autorizado, limitação de responsabilidade entre os sócios, viabilidade da emissão de ações ao portador e a possibilidade de diretores residentes fora do “oásis fiscais”, haja vista que alguns paraísos, como exceção, não permitem tal situação.

(b) Empresas holding offshore11: neste caso, temos situação de filiais em paraísos fiscais, quando as sedes estão em seus territórios. Busca-se fugir de se manter as filiais, tendo em vista que as empresas buscam aumentar seus lucros, partindo para referidos paraísos fiscais, em que o Estado busca, nestes paraísos, montar filiais, no que tange à moeda forte, estabilidade econômica e política, isenções fiscais e impostos reduzidos. As holding se mostram como empresas filiais ou associações em grupos econômicos ou fusões. São usadas para a criação de fundações familiares (rendas pessoas e familiares) em que o patrimônio do fundador (neste caso, pessoa jurídica de direito privado); investimentos internacionais; sociedades para serviços pessoais (exemplos: engenharia, transportes, informática, filmes etc) em que a sede é em outra jurisdição tributária de onde ocorre; há também a possibilidade das companhias de comércio internacional denominadas de “trading companies” , ávidas por zonas de impostos nulos ou reduzidos, com transações de importação e exportação. A prática é descrita por POLAK:

Assim, a sociedade offshore, no território B, será contratada para funcionar como uma distribuidora comercial do grupo e poderá re-exportar as mesmas mercadorias para outros países auferindo lucros isentos de impostos, resultantes da diferença entre preço de compra e preço de revenda. Em muitos casos, os produtos não precisam ser fisicamente recebidos pela offshore, mas podem ser embarcados diretamente para o comprador final. A offshore pagará uma fatura para o vendedor e o comprador final pagará outra fatura maior, contra ele emitido pela offshore.

(c ) Elisão Fiscal ou planejamento tributário:. Nesta situação, o contribuinte tem algumas opções para o pagamento dos seus impostos, tudo sob o prisma da legalidade, fazendo a opção planejada e legal de escolher uma das vias que lhe permite o pagamento a menor. Nestas possibilidades, surgem os paraísos fiscais, com os investimentos pessoais, em que se terá uma rentabilidade maior explicada pela diminuição ou inexistência de tributação nos paraísos fiscais, além da confidencialidade das negociações firmadas.

Deve-se ficar atento para que não exista o planejamento abusivo, com a centralização das atividades de empresas em países com baixa fiscalização e exigência fiscal, como, por exemplo, a Irlanda. Mas as empresas possuem liberdade para escolher os países em que querem implantar suas empresas. Estas empresas não são residentes de determinados países e usufruem da tributação mais benéfica, razão pela qual os países que possuem a maior sede da empresa ficam sem a maior parte dos impostos. Trata-se de uma atividade ainda lícita, mas revestida de abusividade.

Por derradeiro, buscou-se analisar os paraísos fiscais como “vilão”, mas também como “aliado” no planejamento tributário, tentando expor, juridicamente, que a pecha negativa dos paraísos fiscais é relativa, principalmente, quando a elisão fiscal é uma possibilidade do contribuinte que se encontra em situação de onerosa e excessiva carga tributária, desvirtuada dos princípios fiscais e, ainda, sem as contraprestações do Estado quando este opta pela má escolha dos interesses públicos primários, quebrando a teoria do consentimento e do princípio da confiança.

CONCLUSÃO

Paraísos fiscais são zonas com isenção ou redução de tributação. Mencionados países ou territórios, para se configurarem como verdadeiros paraísos fiscais, reúnem como características concomitantes o seguinte: a) como visto, baixa carga tributária ou inexistência de tributação; b) estabilidade política ou segurança jurídica; 3) igualdade no tratamento aos estrangeiros; 4) inexistem restrições a investimentos estrangeiros em quaisquer atividades; 5) ausência de controles cambiais com a livre permissão de controle de moedas; 6) confidenciabilidade e sigilo bancários e de dados; 7) comunicação eficiente com meios de transportes; 8) certa estrutura social.

Diante disso, podem ser usados tanto de forma lícita como ilícita, sendo, neste último caso, o uso para “branqueamento de capitais” , tendo em vista o crescente comércio ilegal de tráfico de drogas, armas, animais e pessoas.

No entanto, referidos paraísos podem ser usados como formas lícitas de atuação fiscal, principalmente, pela criação de empresas off – shore, holding off – shore (criação de fundações e investimentos de capitais, além das trading companies) e criação de empresas relacionadas ao entretenimento e informática, etc em paraísos fiscais, buscando-se, com isso, a situação clara e evidente de planejamento tributário.

Por derradeiro, buscou-se analisar os paraísos fiscais como “vilão”, mas também como “aliado” no planejamento tributário, tentando expor, juridicamente, que a pecha negativa dos paraísos fiscais é relativa, principalmente, quando a elisão fiscal é uma possibilidade do contribuinte que se encontra em situação de onerosa e excessiva carga tributária, desvirtuada dos princípios fiscais e, ainda, sem as contraprestações do Estado quando este opta pela má escolha dos interesses públicos primários, quebrando a teoria do consentimento e do princípio da confiança.

BIBILIOGRAFIA

BRAZ, Manuel Poirier. Sociedades Offshore e paraísos fiscais. 2 ed. Verba Petrony Legis, 2013.

CRUZ, José Neves. Economia e Política: uma abordagem dialética da escolha pública. Coimbra: Coimbra Editoras, 2008.

DINIZ, Arthur J. Almeida. Novos paradigmas do direito internacional público. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 1995.

HUSSEK, Carlos Roberto. Curso de Direito Internacional Público. 9 ed. São Paulo: Ltr, 2009.

MONCADA, Luís Cabral de. Manual Elementar de Direito Público da Economia e da Regulação: uma perspectiva luso – brasileira. Coimbra: Almedina, 2012.

NABAIS, Casalta. Direito Fiscal. Coimbra: Almedina, 2007.

POLAK, Sergio. Companhias off – shore in www.plackconsult.com. Acesso em 02.12.2013.

STRENGER, Irineu. Direito Internacional Privado – parte geral. São Paulo: Ltr, 1996.

TEIXEIRA, Glória. Manual de Direito Fiscal. Coimbra: Almedina, 2008.

1Os Paraísos Fiscais mais conhecidos no Brasil. No final do século XX, diversos bancos brasileiros abriram filiais nesta região e foram relacionados à lavagem de dinheiro em corrupção durante campanhas eleitorais, sendo alvo de investigação pelo Ministério Público Federal, destacadamente, em operação para desbaratar o que ficou conhecimento no País como “Dossiê Caymã¨. Registre-se que, neste caso, as Ilhas Caymã liberaram o sigilo fiscal dos envolvidos.

2A Suíça, recentemente, assinou acordo em que aceita cooperar com investigações sobre evasão fiscal e fuga de capitais para seus bancos, inclusive, o Brasil pode pedir informações sobre contas suspeitas de serem usadas para evadir do pagamento de impostos. O Acordo permite que a Suíça colabora com outros 57 países em matéria fiscal. A Suíça veio sofrendo forte pressão diante da crise financeira, principalmente, na Europa acerca destas evasões fiscais. A Suíça rompeu com uma tradição que mantinha desde antes a 2a Guerra Mundial.

3A obra de Manuel Poirier Braz ainda acrescentou: Campion d´Italia e São Bartolomeu. Destaque-se que a Irlanda é conhecido como paraíso fiscal dos artistas e escritores, pois permite isenção fiscal até mesmo para os estrangeiros, desde que habitem em território Irlandês e exclusivamente neste país.

4A obra de Manuel Poirier Braz ainda acrescentou: Bahrein, Chipre, Guernesey, Libéria, Liechtenstein, Ilha de Man, Nauru, Estado de Delaware.

5A obra de Manuel Poirier Braz ainda acrescentou: Caimão, Turcos e Laicos.

6A obra de Manuel Poirier Braz ainda acrescentou: Ilhas Maurícias, Macau, Barbados, Vanuatu, Gilbratar, Ilhas Virgens Britânicas.

7No âmbito da União Europeia, temos as diretivas e regulamentos. A legislação interna de cada Estado-membro deve se adaptar ao Direito Comunitário europeu. Com as diretivas, os Estados podem adaptar determinadas normas em seus ordenamentos internos de forma gradativa. Com os regulamentos, a adaptação se torna obrigatória, devendo ser cumprida pelos Estados – membros que não podem alegar ofensas aos seus ordenamentos internos. No direito comunitário, temos a ordem interna como fonte primária e os regulamentos e as diretivas como fontes secundárias. Os regulamentos, na União Europeia, entram automaticamente em vigor sem necessidade de transposição. Diferente das diretivas em que os Estados -membros devem fazer a devida transposição, tendo liberdade quanto aos meios desta transposição, apesar de vinculadas aos fins. No âmbito das decisões administrativas, ainda temos os pareceres e recomendações. O Regulamento passa a ser o ato administrativo mais importante no âmbito da União Europeia, sendo o instrumento jurídico apto para criar um ordenamento mais uniforme. Mais tecnicamente podemos classificá-los: a) atos nominados que são os previstos nos Tratados; b)atos inominados que são as resoluções, os acordos, conclusões que os órgãos praticam no desempenho de suas funções. Os tratados que instituem o Direito Comunitário estão em posição superior, porque deles é que se originam os demais atos. Os regulamentos estão abaixo dos tratados.

8Interesse público, paralelamente, relaciona-se com o Estado e seus elementos constitutivos. Isso porque o Estado funciona como um administrador de interesses gerais da sociedade definidos no texto constitucional. O interesse público, inerente ao Estado, é posto sob a responsabilidade deste e como finalidade de sua ação. É o interesse geral da sociedade também denominado de bem comum que, ao seu turno, inspira a ação política do Estado considerando os regimes políticos de povos civilizados. Na visão clássica, o interesse público é algo superior e diferenciado dos demais interesses existentes no seio da sociedade. Hoje, como veremos, temos a situação de aproximação da concepção de interesse público tal qual se vê no direito anglo-saxônicos, principalmente, pelas novas mentalidades do Estado Neoliberal, com o corte nos orçamentos públicos. Nota-se, ainda, que nas teorias anarquistas e maxistas existe a negativa da própria soberania e não somente, a sua relativização.

9Julgamento no STJ: Habeas Corpus n. 206145 do Estado do Paraná. Relatora: Ministra Laurita Vaz. Julgamento pela 5a Turma. Data de julgamento: 22.05.2012.

10No Brasil, em 2013, observou-se movimentos populares questionando a destinação das verbas públicas e o cumprimento administrativo e constitucional dos interesses públicos primários. Houve questionamento das verbas orçamentárias destinadas à realização do evento da Copa do Mundo 2014, enquanto milhões de pessoas ainda estavam sem o mínimo existencial, sem o gozo do patamar civilizatório mínimo. Tanto os setores de saúde e educação no Brasil são em nível atrasado, sem a devida prestação suficiente, ensejando a situação de penúria e sofrimento constante nos hospitais públicos, principalmente nas cidades mais afastadas dos grandes centros urbanos. A educação também está em nível desejável, ainda com grande contingente de analfabetos. Tais discussões recaem justamente nos interesses escolhidos pelo Estado e na destinação dos recursos advindos, primordialmente, das tributações. O STF analisou a questão também no ano de 2013, manifestando-se pela constitucionalidade do direito à reunião e à reivindicação popular pelas manifestações, principalmente, quando a insatisfação com o Estado é generalizada.

11No Brasil, a República Oriental do Uruguai representa o melhor paraíso fiscal para investimentos, pois oferece benefícios fiscais e financeiros, bem como faz uso da moeda brasileira – o real (R$) e se permite a transformação dos reais para outras moedas.

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Sobre o autor
Maria Rafaela de Castro

Juíza do Trabalho da 7a Região. Trabalhou como Juíza no TRT da 14a Região e como promotora de Justiça no Ministério Público do Estado de Rondônia. Mestre em Ciências Jurídicas pela Universidade do Porto, em Portugal. Professora de Cursos Preparatórios.

Informações sobre o texto

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