Direitos humanos dos refugiados no Brasil

30/05/2016 às 09:54
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Breve considerações sobre os direitos inerentes aos refugiados, em especial no Brasil.

A partir do século XX as migrações internacionais motivadas por conflitos bélicos passaram a atrair grande atenção no plano internacional. O cenário estabelecido durante e após a guerra que dizimou cinquenta milhões de pessoas de diferentes nacionalidades causou várias migrações, especialmente de refugiados, que buscavam paz e novas oportunidades em diferentes locais do mundo, abandonando suas origens, residências e bens em busca de paz em outros países.
A lei nº 9.474/1997, traz em seu artigo 1º o rol de pessoas que serão consideradas refugiadas, conforme se nota abaixo; 
Art. 1º Será reconhecido como refugiado todo indivíduo que:
I - devido a fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas encontre-se fora de seu país de nacionalidade e não possa ou não queira acolher-se à proteção de tal país;
II - não tendo nacionalidade e estando fora do país onde antes teve sua residência habitual, não possa ou não queira regressar a ele, em função das circunstâncias descritas no inciso anterior;

III - devido a grave e generalizada violação de direitos humanos, é obrigado a deixar seu país de nacionalidade para buscar refúgio em outro país.

A definição de refugiado adotada pela legislação brasileira coincide exatamente com a que é adotada pela Organização das Nações Unidas em suas convenções.
O grande fluxo de refugiados atraiu atenção dos Estados, forçando a Organização das Nações Unidas, no ano de 1951, a elaborar através de sua Assembleia-Geral a Convenção de Genebra, que trata desta situação jurídica, tendo sua vigência iniciada no ano de 1954, criando obrigações para os Estados signatários.
 A Convenção de Genebra trouxe conquistas significativas para os refugiados, como a positivação do princípio non-refoulement, que compromete os signatários a não repatriar refugiados que estejam sob ameaças ou perseguição em suas nações originárias, estando os países signatários comprometidos a dar celeridade ao processo de naturalização, visando maior acesso aos direitos sociais, havendo ainda a extensão da proteção a todos eles e seus grupos familiares, sem discriminações.
De acordo com a Convenção, o refugiado só poderá ser expulso em casos de risco à segurança nacional e à ordem pública, tendo garantia à defesa e a um tempo razoável que lhe permita buscar asilo em outro Estado. Há ainda vedações à devolução ou expulsão para países em que a vida ou liberdade dos refugiados estejam ameaçadas por motivo de religião, raça, nacionalidade, grupos sociais e/ou opinião política.
Nos dizeres do ilustre doutrinador Jacob Dolinger;
“ A Convenção se ocupa dos direitos artísticos, intelectuais e de propriedade industrial do refugiado, seu direito de acesso aos tribunais, de acesso ao mercado de trabalho, se engajar na iniciativa privada e nas profissões liberais. ” (Direito Internacional Privado, 11ª ed., pág. 124).
Ainda no plano internacional, motivada pelas mudanças geopolíticas e novos conflitos, no ano de 1967, a ONU aprova o Protocolo sobre o Status de Refugiados, que complementava a Convenção de 1951 e a Declaração Universal dos Direitos do Homem. É notável que o imigrante ao abandonar seu país de origem, não o faz por mero desejo, mas sim porque busca condição de vida digna e proteção de seus direitos, vez que os direitos humanos daquele local se encontram muitas das vezes ameaçados.
Nessa perspectiva a Corte Europeia de Direitos Humanos que tem como finalidade zelar pelos direitos e liberdades fundamentais de seres humanos injustiçados, direitos estes que se encontram elencados na Convenção Internacional de Direitos Humanos elaborada em 1950, que contempla hoje 47 países (os 27 membros da União Europeia além de outros 20, como a Rússia, Ucrânia, Noruega, Mônaco e Azerbaijão); tem se voltado para casos em que haja violação de direitos inerentes aos refugiados.
“A Convenção é, em essência, similar aos principais incisos do art. 5o da Constituição brasileira, e protege direitos básicos, como à vida, a liberdade contra tortura, contra o tratamento desumano, contra a escravidão, o direito a um julgamento justo, a irretroatividade da lei penal, direito à privacidade, liberdade de expressão, de imprensa, de associação e de casamento e o direito à propriedade” (para entender Direito. Disponível em: http://direito.folha.uol.com.br/blog/o-que-e-a-corte-europeia-de-direitos-humanos)

SISTEMA DE PROTEÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS DE REFUGIADOS NO BRASIL
O Brasil é um dos países signatários tanto da Convenção quanto do Protocolo.  E, no âmbito da legislação interna, no ano de 1997, foi promulgada a lei nº 9.474, que define mecanismos para implementação do Estatuto dos Refugiados, inspirada na Declaração de Cartagena de 1984, além de internalizar as disposições de outros diplomas legais no âmbito internacional referentes a proteção dos direitos humanos.
A lei 9.474 de 1997 criou ainda o CONARE – Comitê Nacional para Refugiados, responsável por receber as solicitações de refúgio, estabelecer critérios para reconhecimento de refugiados, bem como estabelecer políticas de assistência a estes. O comitê é um órgão interministerial, sendo ligado ao Ministério da Justiça e se relacionando aos ministérios da saúde, da educação, de relações exteriores, do trabalho e emprego, além do Departamento de Polícia Federal.
O Brasil é historicamente um país que recebe vários imigrantes, inclusive refugiados, o que pode ser observado pela formação social, econômica e cultural. Tal vocação é refletida no âmbito jurídico, já que o país se mostra menos rigoroso do que a maioria dos demais estados para reconhecimento da condição jurídica de refugiado.
Apesar do grande número de diplomas legais que versam sobre o tema abordado, os refugiados ainda enfrentam uma série de dificuldades, tanto para conseguirem adentrar ao território de outros países, quanto para viverem dignamente, enfrentando restrições ao mercado de trabalho, dificuldades para conseguirem moradias, problemas no acesso à saúde e à educação, além de uma grande discriminação. Esses problemas são expostos diariamente nos noticiários, sobretudo nos Estados europeus, que atraem uma grande quantidade de pessoas em busca de refúgio todos os dias, vindo sobretudo do oriente médio, como é o caso dos sírios, que fogem dos conflitos que estão cada vez mais graves.
No âmbito da legislação pátria, nossa Carta Magna de 1988 também assegura, em seu artigo 1º, a dignidade da pessoa humana, tendo esta como um de seus fundamentos, daí a necessidade de proteção jurídica através da legislação infraconstitucional àqueles que saem de suas nações por motivos de guerras, perseguições e desastres.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apesar dos significativos avanços alcançados nas últimas décadas, os problemas enfrentados pelos refugiados persistem e se mostram diariamente, não importando se se tratam de haitianos, sírios, nigerianos ou ucranianos. Se faz necessária uma maior atenção internacional para a recepção e concessão de direitos, deixando de lado os interesses puramente econômicos, para dar lugar à uma visão humanitária, onde o valor a vida e a dignidade da pessoa humana se sobreponha às grades e muros das fronteiras.
REFERÊNCIAS
DOLINGER, jacob. Direito Internacional Privado: parte geral – 11. Ed. – Rio de Janeiro: Forense 2014. ISBN: 978-85-309-5220-4.
Agência da ONU para Refugiados. Disponível em:< http://www.acnur.org/t3/portugues/informacao-geral/o-acnur-no-brasil/do no Brasil. >. Acesso em: 28 de maio de 2016.

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O direito internacional dos refugiados: a lei nacional atende aos reclamos
da legislação internacional? Disponível em:< http://www3.pucrs.br/pucrs/files/uni/poa/direito/graduacao/tcc/tcc2/trabalhos2006_2/rosana_kim.pdf>. Acesso em: 28 de maio de 2016.

Para entender Direito. Disponível em <http://direito.folha.uol.com.br/blog/o-que-e-a-corte-europeia-de-direitos-humanos>. Acesso em: 28 de maio de 2016
A proteção internacional dos refugiados e o sistema brasileiro de concessão de refúgio. Disponível em <http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9430>. Acesso em: 28 de maio de 2016.
Os desafios na proteção dos direitos humanos dos refugiados no sistema brasileiro, por Jeane Silva de Freitas. Disponível em <http://www.mundorama.net/2013/03/25/os-desafios-na-protecao-dos-direitos-humanos-dos-refugiados-no-sistema-brasileiro-por-jeane-silva-de-freitas/>. Acesso em: 28 de maio de 2016

BRASIL.Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado>. Acesso em: 28 de maio de 2016.
Brasil. Lei nº 9474/1997.
Define mecanismos para a implementação do Estatuto dos Refugiados de 1951, e determina outras providências. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9474.htm>. Acesso em: 28 de maio de 2016.
Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados. Disponível em <1951http://www.pucsp.br/IIIseminariocatedrasvm/documentos/convencao_de_1951_relativa_ao_estatuto_dos_refugiados.pdf>. Acesso em: 28 de maio de 2016.

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