Temer não queria afastar ministro que orientou Renan para se livrar da Lava Jato: novas revelações sobre o extrativismo e a cleptocracia

31/05/2016 às 09:32
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Temer, ao não exonerar prontamente o ministro Fabiano Silveira que, valendo-se das relações propiciadas pelo seu cargo de Conselheiro do CNJ (órgão máximo de direção da magistratura nacional), conspirou contra a Lava Jato em favor de Renan, mostra...

1) Temer, ao não exonerar prontamente o ministro Fabiano Silveira que, valendo-se das relações propiciadas pelo seu cargo de Conselheiro do CNJ (órgão máximo de direção da magistratura nacional), conspirou contra a Lava Jato em favor de Renan, mostra, para quem tinha dúvida, a que veio: é a continuidade daquilo que vimos de pior nos 13 anos do lulopetismo, que por sua vez foi retrato do extrativismo e da corrupção sistêmica das elites/oligarquias econômicas e políticas nos cinco séculos anteriores.

2) Fabiano pediu exoneração do cargo de ministro da Transparência, Fiscalização e Controle, que nominalmente substituiu a Controladoria Geral da União-CGU. A incompatibilidade da sua (descom)postura com o cargo se tornou manifesta. Mas o pior em todo episódio é a tibieza de Temer, que está nas mãos de Eduardo Cunha, Renan Calheiros e toda a velha cúpula corrupta do PMDB (Sarney, Jader, Lobão, Jucá etc.). Não dá para sair imune da presidência de um partido desse. O governo Temer está se acabando antes de começar. Não será desta vez que vamos nos desvencilhar dessa velha politicagem praticada pelas elites/oligarquias econômicas e políticas.

3) O “Fantástico” (29/5/16) revelou áudio onde Fabiano Silveira  cumpria o papel de “correia de transmissão” contra as ações da força-tarefa da respectiva operação. Ele aparece, nas gravações de Sérgio Machado (ex-presidente da Transpetro), dando conselhos a Renan e ao próprio Sérgio para escaparem das investigações do Ministério Público.

4) O ministro teleguiado, com acesso facilitado pelo seu cargo no CNJ, (a pedido de Renan) chegou inclusive a fazer visitas a representantes do Ministério Público e até mesmo ao Procurador-Geral, Rodrigo Janot, para levantar informações que auxiliassem o presidente do Senado que, envolvido em ato de corrupção com a empreiteira Mendes Júnior, há muito tempo só é chefe de poder porque o Brasil é uma cleptocracia. Há registros de conversas entre Renan e Machado sobre o suposto êxito desta espionagem de Fabiano, que evidentemente, por falta de condição ética, jamais poderia ocupar o cargo de ministro justamente da Transparência,  Fiscalização e Controle em qualquer país com instituições bem estruturadas.

5) Nas cleptocracias, onde o frequente é que as novas elites/oligarquias corruptas ocupem o lugar de outras, não é incomum que quem esteja ganhando dinheiro público para combater a corrupção no governo, na administração pública e nas suas relações espúrias com o mundo dos mercados, cumpra papel oposto (de vilão), tendente, no caso, a “estancar a sangria” gerada pela Lava Jato.

6) O senador Romero Jucá (PMDB-RR), depois de 12 dias no cargo de ministro do Planejamento, foi defenestrado do novo (velho) ministério, que já nasceu sem nenhum mistério: ele foi composto por Temer para a perpetuação dos privilégios econômicos dos donos do poder (velhos caciques da política conseguiram alojar cinco filhos no ministério) assim como das relações políticas carcomidas do poder extrativista e corrupto que há séculos vem sugando e sangrando o Brasil.

7) O que existe em comum entre o Brasil, Zimbábue, Serra Leoa, Colômbia, Argentina, Coreia do Norte, Venezuela, Uzbequistão, Egito, Rússia, Indonésia e México? São países muito diferentes no clima, no idioma, nas histórias, nos seus substratos colonizadores, nas suas populações, nas suas culturas, nas suas culinárias, nos seus gostos etc.  O ponto comum reside nas instituições econômicas e políticas extrativistas (ver Acemoglu e Robinson), assim como na sistêmica corrupção. A base de todas essas sociedades está ancorada na locupletação do dinheiro público bem como na espoliação da maioria do povo pelas elites/oligarquias econômicas e políticas que se revezam na perpetuação do poder, em detrimento da construção de instituições inclusivas e de controle dos poderes instituídos.

8) Todos os países com instituições econômicas e políticas extrativistas formam um círculo vicioso que, ao longo dos anos, vai diminuindo o crescimento econômico, sua competitividade, sua relevância internacional e, consequentemente, agravando a desigualdade (geradora de caos, em primeiro lugar, e depois do colapso – ver o caso da Venezuela, Congo, Zimbábue etc.). Não é por acaso que o Brasil (em 2016, na pesquisa do IMD, com participação local da Fundação Dom Cabral) passou a ocupar a 57ª posição entre 61 países no ranking de competitividade. Só está à frente de Croácia, Ucrânia, Mongólia e Venezuela (Estadão). Desde 2012, rebaixou 11 posições (em virtude da crise política assim como da redução da importância brasileira dentro do comércio internacional). Os cinco primeiros da lista são Hong Kong, Suíça, EUA, Cingapura e Suécia (são os melhores lugares para se fazer negócio).

9) Nos países cleptocratas as elites/oligarquias econômicas e políticas (extrativistas e corruptas) produzem instituições às suas semelhanças, ou seja, com suas características, para que os interesses privados se mesclem com os públicos, dando ensejo ao enriquecimento politicamente favorecido dos donos do poder, que promovem assim uma concentração absurda da riqueza nacional, deixando a maioria da população sem poder desfrutar de instituições inclusivas.

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10) A solução para esses países fracassados institucionalmente (como é o caso do Brasil) consiste em promover microrrevoluções contínuas. A Lava Jato é uma delas, porque está colocando limites na corrupção. De outras microrrevoluções (sobretudo digitais) devem se encarregar a sociedade civil. A inércia da sociedade civil é a alavanca de que necessitam as elites/oligarquias extrativistas para a perpetuidade do seu poder saqueador. É a droga de que carecem para continuarem sua adição, até que um dia chega a “destruição criativa” (Schumpeter), a inovação e novas tecnologias para tomarem seus lugares. Antes disso, o extrativismo prossegue, enquanto existam recursos para serem sugados e privilégios a serem preservados.

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Sobre o autor
Luiz Flávio Gomes

Doutor em Direito Penal pela Universidade Complutense de Madri – UCM e Mestre em Direito Penal pela Universidade de São Paulo – USP. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Jurista e Professor de Direito Penal e de Processo Penal em vários cursos de pós-graduação no Brasil e no exterior. Autor de vários livros jurídicos e de artigos publicados em periódicos nacionais e estrangeiros. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998), Advogado (1999 a 2001) e Deputado Federal (2019). Falecido em 2019.

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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