No Brasil, as mulheres, em comparação aos homens, se aposentam com cinco anos a menos, tanto no critério de idade quanto no de tempo de contribuição. Tal realidade existe no RPPS e no RGPS.
Historicamente, vários foram os motivos que justificaram esta segregação de requisitos, sempre com objetivo de oferecer uma maior proteção à mulher em face da discriminação sofrida no mercado de trabalho. Dentre eles, podemos perfilhar:
a) a mulher sempre teve mais dificuldade de se inserir no mercado em relação ao homem;
b) a mulher sempre percebeu remuneração menor do que a do homem;
c) a mulher sempre teve menos acesso a cargos importantes, em comparação ao homem;
d) a mulher é mais demitida do que o homem;
e) a mulher sempre teve alta taxa de fertilidade no brasil, o que, em tese, poderia contribuir para uma menor expectativa de vida;
f) a mulher tem dupla ou tripla jornada, em razão dos afazeres domésticos e criação dos filhos;
Eis, pois, alguns dos motivos que, ao longo da história, contribuíram para a atual diferenciação entre homens e mulheres, nos requisitos de aposentadoria.
Entretanto, atualmente, em tempos de reforma da previdência, dentre todas as que se apresentam, temos a polêmica proposta de unificação dos critérios de idade e tempo de contribuição entre homens e mulheres, tanto no RPPS, quanto no RGPS.
Assim, em face da proposta de reforma acima esposada, algumas indagações surgem e são bastante pertinentes, merecendo nossa reflexão: a situação da mulher hoje é rigorosamente a mesma no RPPS e no RGPS? Quem perderá mais com a mudança: a mulher servidora ou a celetista? Em qual regime de previdência esta unificação de requisitos é mais urgente: no RPPS ou no RGPS?
Vejamos:
a) Atualmente, no Serviço Público, a mulher tem mais dificuldade do que o homem para ingressar em cargos públicos? É certo que não. A lei e o edital do concurso não podem discriminar o sexo de quem pretende ingressar no serviço público.
E nas relações celetistas, a mulher ainda é preterida ao concorrer a um posto no mercado de trabalho? É certo que sim. Embora sendo uma realidade que vem mudando ao longo dos anos, a mulher ainda sofre uma relativa discriminação quando concorre com o homem a uma vaga.
b) Atualmente, no Serviço Público, a remuneração da mulher é menor do que a do homem? É certo que não. A lei e o edital do concurso estabelecem a remuneração dos cargos, independente do sexo do servidor que o ocupe.
E nas relações celetistas, a mulher ainda percebe remuneração inferior à do homem? É certo que sim. Embora sendo uma realidade que vem mudando ao longo dos anos, a mulher ainda sofre uma relativa discriminação por receber salários menores.
c) Atualmente, no Serviço Público, há poucas mulheres em cargos estratégicos de chefia e direção? É certo que não. Essa realidade mudou substancialmente ao longo das décadas, embora, saibamos que as mulheres precisam de mais espaço e oportunidades dentro do serviço público. Entretanto, em comparação ao que existia há 20 ou 30 anos, as mulheres desempenham hoje atividades estratégicas das mais relevantes na Administração Pública.
E nas relações celetistas, a mulher ainda é preterida ao concorrer a postos de maior importância no mercado de trabalho? É certo que sim. Embora sendo uma realidade que vem mudando ao longo dos anos, a mulher ainda sofre uma relativa discriminação quando concorre com o homem a um cargo mais estratégico.
d) Atualmente, no Serviço Público, a mulher perde seu cargo numa taxa de rotatividade maior do que a do homem? É certo que não. Na verdade, quem ingressa em cargo público, seja homem ou mulher, via de regra, só sai para outro melhor. A estabilidade, embora já relativizada no texto constitucional, ainda é importante fator de proteção ao servidor. E, estatisticamente, quem ingressa no serviço, se aposenta no serviço público, salvo as excepcionais situações de demissão, após a instauração de processo administrativo disciplinar, onde é garantido o contraditório e a ampla defesa.
E nas relações celetistas, a mulher ainda perde o emprego primeiro que o homem? É certo que sim. Embora sendo uma realidade que vem mudando ao longo dos anos, a mulher ainda sofre uma relativa discriminação quando o assunto é quem deve ser demitido primeiro da empresa.
e) Atualmente, a servidora pública tem mais filhos do que uma trabalhadora celetista ou mesmo que esteja na economia informal? Bom, a questão aqui é bem interessante. Em tese, a mulher servidora, dedica-se primeiro aos estudos para passar no concurso público. Ela prefere adiar a constituição da família e a criação da prole. E quando revolve fazê-lo, opta por poucos filhos em comparação com o que acontecia há décadas atrás. Em geral, a taxa de fertilidade no Brasil vem caindo de forma muito importante entre as mulheres. O fenômeno também ocorre entre as celetistas e trabalhadores que estão inseridas na economia informal.
f) Atualmente, no Serviço Público, a mulher ainda possui a dupla ou tripla jornada? É certo que sim. A mulher, após o expediente na repartição pública, ainda cuida de sua casa e dos filhos. Entretanto, a opção de ter menos filhos, aliada à adoção do trabalho em casa, implantado por alguns órgão públicos, somado ainda à mudança de mentalidade de alguns parceiros em face da divisão de afazeres domésticos, tem aliviado paulatinamente as jornadas.
Percebamos, a título de curiosidade, que o elenco de justificativas históricas de proteção à mulher tem mais relação com o direito do trabalho do que propriamente com o direito previdenciário.
E, em tempos de reforma, se esta é inevitável, e se a proposta de unificação de requisitos entre homens e mulheres for levada a cabo, nos parece claro que esta medida hoje tem mais cabimento no RPPS do que no RGPS.
Muitos dos motivos que fundamentaram, no passado, a segregação de requisitos entre homens e mulheres, praticamente não existem mais no Serviço Público. Mas muitos, ainda que de forma mais amena, ainda existem nas relações celetistas.
Destarte, a situação da mulher celetista é bem mais grave do que a da mulher servidora. Aquela será muito mais penalizada do que esta, quando a unificação dos critérios de aposentadoria entre homens e mulheres for implementada.
A reforma virá e a proposta aqui tratada está na pauta do dia. A nosso sentir, o preço a ser pago pela mulher inserida no RGPS será bem mais alto do que o da servidora que se aposentará pelo RPPS.