Processo administrativo previdenciário.

O artigo 682 da IN INSS-PRES 77/2015 à luz dos princípios norteadores do Direito Administrativo

22/06/2016 às 11:31
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O presente trabalho almeja estudar os princípios da legalidade e oficialidade do INSS, quando da análise do requerimento administrativo do segurado, quando há divergência cadastrais no CNIS.

Resumo:

O presente trabalho almeja estudar os princípios da Legalidade e Oficialidade do INSS, quando da análise do requerimento administrativo do segurado, quando há divergência cadastrais no CNIS.

Sumário: Introdução. 1. Conceito de direito administrativo. 2. Princípio da legalidade. 3. O processo administrativo. 4. O processo administrativo previdenciário. 4.1. Impulsão de ofício. 5. O artigo 682 da IN 77/2015. 6. Conclusão. 7. Bibliografia.

Introdução:

A vivência do Direito Previdenciário nos faz refletir sobre as diversas interpretações sobre a mesma Instrução Normativa 77/2015. Neste estudo é proposta uma reflexão sobre os princípios da legalidade e oficialidade, na condução do processo administrativo previdenciário, no sentido de que a Administração deve agir de ofício, pautada na lei.

Se a Administração – INSS – deve agir de ofício, pautada na Lei, é presumível que os atos por ele emanados gozam de presunção de veracidades. Aliás, esse é um dos fundamentos preferidos pelo judiciário, quando nega a concessão da tutela de urgência.

O texto a seguir declinado é apenas uma reflexão, não devendo o leito ficar restrito aos termos deduzidos, devendo buscar outras opiniões.

  1. Conceito de Direito Administrativo

Na lição de Hely Lopes Meireles, resumidamente, direito administrativo é um “conjunto harmônico de princípios jurídicos que regem os órgãos e as atividades estatais”.

Maria Sylvia Zanela Di Pietro, por sua vez, conceitua o Direito Administrativo como “o ramo do direito publico que tem por objetivo os órgão, agentes e pessoas jurídicas administrativas que integram a Administração Pública, a atividade jurídica não contenciosa que exerce e os bens de que se utiliza para a consecução de seus fins, de natureza pública”.

2. Princípio da legalidade

Nesse sentido, dispõe o artigo 37 da Constituição Federal:

A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

O INSS, por sua vez, é órgão público, integrante do Poder Executivo da União, logo vinculado aos princípios constitucionais positivados, portanto presume-se que seus atos (concessão ou não de benefícios e serviços) estejam amparados na legalidade da norma.

O princípio da legalidade, também, é previsto no, inciso II, do artigo 5º da Constituição, onde transcreve que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.

Em razão deste princípio, a Administração (INSS) só pode fazer o que é previsto em Lei, uma vez se tratar de ato administrativo vinculado e não discricionário.

A palavra ou termo Lei deve ter sua interpretação estendida, para Decretos, Instruções Normativas etc., em razão do poder de polícia exercido pelo Estado, uma vez que este é autorizado pela Constituição em editar tais instrumentos com a finalidade de ajustar os interesses coletivos, individuais e do próprio Estado.

Portanto, quando falar em princípio da legalidade, deve ser sopesado o sentido amplo do termo legalidade, uma interpretação sistemática e não restritiva.

3. O processo administrativo  

Processo não é procedimento. Processo é como uma avenida. Visualize uma grande avenida. Então, para você chegar ao seu destino (objetivo) você deve percorrer esta avenida. Isso é o processo, para Administração atuar deve instaurar o processo.

Quando um administrado requer algo perante a Administração, essa por sua vez, instaura o processo administrativo, o qual será composto por diversos procedimentos internos da administração, com a finalidade de responder ao pleito do interessado.

Vejam o cuidado de escrever “responder” e não conceder. Nem sempre, o administrado terá direito ao requerido.

4. O processo administrativo previdenciário

O processo administrativo é regulamentado pela Lei 9.784/99, que tem por fundamento, a proteção dos direitos dos administrados, confira:

Art. 1o Esta Lei estabelece normas básicas sobre o processo administrativo no âmbito da Administração Federal direta e indireta, visando, em especial, à proteção dos direitos dos administrados e ao melhor cumprimento dos fins da Administração.

A Lei 9.784/99, como elucida é auto-aplicável no Direito Previdenciário, visto que o INSS compõe a Administração Federal, logo não há margem para discussões sobre sua observância.

Fazendo a correlação entre o princípio da legalidade e o disposto no artigo 1º da Lei supracitada, o INSS, tem o dever de proteger o administrado, porquanto o disposto na Lei é de ESPECIAL proteção ao administrado.

Como mencionado, o princípio da legalidade obriga a Administração a fazer tudo que estiver previsto na Lei, neste caso, proteger o administrado, agindo inclusive de ofício, mormente pelo exercício da autotutela administrativa ou impulsão de ofício.

4.1 Impulsão de ofício

Também conhecida como autotutela administrativa, que dizer que a Administração deve agir de ofício no processo administrativo, veja-se:

Art. 2o[1] A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.

Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de:

(...)

XII - impulsão, de ofício, do processo administrativo, sem prejuízo da atuação dos interessados;

No mesmo sentido, é o disposto na Instrução Normativa 77/2015:

Art. 659. Nos processos administrativos previdenciários serão observados, entre outros, os seguintes preceitos:

(...)

XVI - impulsão, de ofício, do processo administrativo, sem prejuízo da atuação dos interessados; e

Para Maria Sylvia Zanela Di Pietro, a impulsão de ofício “assegura a possibilidade de instauração do processo por iniciativa da Administração, independentemente de provocação do administrado e ainda a possibilidade de impulsionar o processo, adotando todas as medidas necessárias a sua adequada instrução”.

Destarte, levando-se em consideração os ditames do Direito Administrativo, é dever do INSS fazer tudo que estiver em seu alcance para atender o pleito formulado pelo requerente (segurado/dependente).

Sobre a autotutela do INSS, confira o julgado do Tribunal Administrativo:

Processo: 44232.150401/2014-65

Orgão Julgador: 12ª Junta de Recursos

Ementa: Pensão por morte previdenciária. Indeferimento. Recurso Ordinário. Filha - Inocorrência do direito à manutenção do benefício, por ter ocorrido a maioridade. Aplicabilidade do art. 17, III do Decreto nº 3.048/99

Voto:

(...)

Não obstante o recebimento de boa-fé, o interesse público prevalece na relação entre a Administração e o administrado, sendo um dos princípios da Administração Pública a Autotutela, segundo o qual a Administração e o poder-dever de controlar seus próprios atos, revendo-os e anulando-os quando houverem sido praticados com alguma ilegalidade. Dessa forma, a Autotutela, funda-se no princípio da legalidade administrativa: se a Administração Pública só pode agir dentro da legalidade, é de se considerar que os atos administrativos, eivados de ilegalidade devem ser revistos e anulados, sob pena de afronta ao ordenamento jurídico. Assim sendo, a Autotutela abrange o poder de anular, convalidar e, ainda, o poder de revogar atos administrativos.

(...)

Na prática, a autotutela só ocorre em favor do INSS. Uma pena, visto que tal princípio não pode ser aplicado apenas em benefício da Administração, sobretudo quando a Instrução Normativa 77/2015, determina que na condução do processo administrativo previdenciário, o servidor DEVE resguardar os direitos subjetivos do segurado.

Veja o disposto no artigo 659 da IN 77/2015:

Art. 659. Nos processos administrativos previdenciários serão observados, entre outros, os seguintes preceitos:

(...)

VI - condução do processo administrativo com a finalidade de resguardar os direitos subjetivos dos segurados, dependentes e demais interessados da Previdência Social, esclarecendo-se os requisitos necessários ao benefício ou serviço mais vantajoso;

VII - o dever de prestar ao interessado, em todas as fases do processo, os esclarecimentos necessários para o exercício dos seus direitos, tais como documentação indispensável ao requerimento administrativo, prazos para a prática de atos, abrangência e limite dos recursos, não sendo necessária, para tanto, a intermediação de terceiros;

Ora, se na condução (procedimentos) do processo administrativo (avenida) o servidor deve resguardar os direitos subjetivos do segurado, este por sua vez, tem o dever constitucional de cumprir fielmente o princípio da legalidade (poder de polícia) de fazer de tudo que estiver ao seu alcance (oficialidade) para atender o pleito do requerente.

Em que pese à uniformização do entendimento administrativo (IN 77/2015), na prática, não se visualiza obediência à Constituição, quiçá as Instruções Normativa.

5. O artigo 682 da Instrução Normativa 77/2015   

Após uma breve explanação sobre a forma do trato entre INSS e segurados, vamos ao ponto central deste arrazoado, que é o artigo 682 da IN 77/2015, in verbis:

Art. 682. A comprovação dos dados divergentes, extemporâneos ou não constantes no CNIS cabe ao requerente.

§ 1º Nos casos de dados divergentes ou extemporâneos no CNIS cabe ao INSS emitir carta de exigências na forma do § 1º do art. 678.

§ 2º Quando os documentos apresentados não forem suficientes para o acerto do CNIS, mas constituírem início de prova material, o INSS deverá realizar as diligências cabíveis, tais como:

I -  consulta aos bancos de dados colocados à disposição do INSS;

II - emissão de ofício a empresas ou órgãos;

III - Pesquisa Externa; e

IV - Justificação Administrativa.

O artigo retro, ora em estudo, elucida como o segurado fará prova dos dados divergentes e não constantes no CNIS.[2]

Com efeito, havendo divergência de dados registrados no CNIS, no primeiro momento, é de responsabilidade dos segurados ou seus dependentes sua comprovação.

De fato, as informações constantes do CNIS poderão precisar de tratamentos, este é o termo usado pelo INSS, quando as informações apresentam divergências ou extemporaneidades.

As divergências poderão ser diversas, tais como: salários-de-contribuição divergentes da realidade. Exemplo: contrato de trabalho informa que o salário é de R$ 2.500,00 e a empresa informa na GFIP que o salário pago foi de R$ 1.000,00, ou seja, uma diferença de R$ 1.500,00, situação que poderá prejudicar o segurado quando da concessão de qualquer benefício previdenciário.

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Outro exemplo corriqueiro é a data de início da prestação dos serviços. Na CTPS a data do início é de 10.02.1978 e no CNIS a data informada é de 01.03.1979. Neste exemplo, o segurado perderá mais de um ano de tempo de contribuição/serviço, que fará diferença quando requerer sua aposentadoria.

Vejam leitores, esse é objetivo da IN 77/2015, evitar que os segurados sejam prejudicados por falha no sistema ou informações divergentes. Essa é uma das razões para existência do expediente (procedimento) conhecido Carta de Exigência.

O parágrafo 1º do artigo 678 da referida Instrução Normativa, obriga o servidor responsável pela condução do processo administrativo a expedir carta de exigência ao interessado, a fim de que este traga os documentos necessários para instrução do processo administrativo.

Obriga, viu!!! Isso mesmo, obriga o servidor, veja:

Art. 678. A apresentação de documentação incompleta não constitui motivo para recusa do requerimento de benefício, ainda que, de plano, se possa constatar que o segurado não faz jus ao benefício ou serviço que pretende requerer, sendo obrigatória a protocolização de todos os pedidos administrativos.

§ 1º Não apresentada toda a documentação indispensável ao processamento do benefício ou do serviço, o servidor deverá emitir carta de exigências elencando providências e documentos necessários, com prazo mínimo de trinta dias para cumprimento.

Destarte, apresentada a documentação e estes não forem suficientes para acerto dos dados constantes do CNIS, entretanto constituírem início de prova material aos fatos alegados, caberá ao INSS a confirmação dos dados. O INSS não poderá negar o benefício ou conceder de forma errada, sem proceder nos termos do disposto no parágrafo 2º do artigo 682.

Repetindo o disposto no parágrafo 2º:

§ 2º Quando os documentos apresentados não forem suficientes para o acerto do CNIS, mas constituírem início de prova material, o INSS deverá realizar as diligências cabíveis, tais como:

 I -  consulta aos bancos de dados colocados à disposição do INSS;

II - emissão de ofício a empresas ou órgãos;

III - Pesquisa Externa; e

IV - Justificação Administrativa.

O texto grifado vem do verbo “dever”, obrigação, doravante ato administrativo vinculado e não discricionário.

Essa é a correlação entre o artigo 682 e os princípios do Direito Administrativo.

O INSS, em respeito aos princípios da legalidade e da oficialidade, tem por obrigação buscar as informações necessárias para que se possa retificar os dados constantes do CNIS para concessão do melhor benefício previdenciário ao segurado.

O segurado ou dependente, ao apresentarem início de prova material para retificação do CNIS, impõem ao INSS o dever de agir de ofício para resguardar os direitos subjetivos dos segurados.

Em que pese a determinação para realização de Pesquisa Externa, esta só é realizada para investigar se o benefício foi concedido de forma correta ou não. A Justificação Administrativa, por sua vez, forma de produção de provas, onde se ouviriam as testemunhas, é procedimento que está em extinção, por motivos desconhecidos.

6. Conclusão

Em termos, pode se concluir que, em razão dos princípios da legalidade e oficialidade (impulso oficial), o INSS deve (obrigação) proceder de todas as formas previstas na Instrução Normativa 77/2015, a fim de resguardar os direitos subjetivos dos segurados, agindo de ofício para lhes proteger.

7. Bibliografia

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2004

GOUVEIA, Oliveira Michel. Processo administrativo previdenciário: teoria e prática. 2º ed. São Paulo: Ltr, 2016.


[1] Lei 9.784/99

[2] Cadastro Nacional de Informações Sociais

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Sobre o autor
Michel Oliveira Gouveia

Advogado; Pós Graduado em Direito Civil e Processual Civil pela Escola Paulista de Direito; Pós Graduado em Direito Previdenciário pela Faculdade Legale, Graduado em MBA em prática Previdenciária pela Faculdade Legale; Pós Graduado em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Faculdade Legale. Professor de Cursos de Extensão e de Pós Graduação; Palestrante,

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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