Uma análise histórica-jurídica com enfoque em Direitos Humanos, com ênfase no filme “O Grande Ditador”

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Este estudo tem por objetivo analisar questões culturais e históricas que proporcionaram elementos ao debate à cerca da proteção dos Direitos Humanos, travado no contexto posterior às duas grandes guerras mundiais.

Uma análise histórica-jurídica com enfoque em Direitos Humanos, com ênfase no filme “O Grande Ditador”

 

 

Jeifa Alice Gericó (FACESF)

[email protected]

 

Leonardo Barreto Ferraz Gominho (Estácio FAL)

[email protected]

 

 

RESUMO

Este estudo tem por objetivo analisar questões culturais e históricas que proporcionaram elementos ao debate à cerca da proteção dos Direitos Humanos, travado no contexto posterior às duas grandes guerras mundiais. Tal debate se deu especialmente após a segunda grande guerra que teve como ponto de partida a Alemanha nazista, comandada por Adolf  Hitler, que por meio de um regime totalitarista se fortalecia via uma propaganda política e leis pautadas na alegada supremacia ariana sobre os demais povos. Utilizando-se do filme “O Grande Ditador”, de Charles Chaplin, faz-se uma observação comparativa entre ficção e realidade.

Palavras Chave:

Direitos Humanos; Totalitarismo; Cumprimento de lei.

 

 

1. Introdução

O estudo que se seguirá tem por objetivo analisar questões históricas que proporcionaram a preocupação e os debates acerca da instauração normativa da perspectiva dos Direitos Humanos, principalmente após as duas grandes guerras mundiais[1]; tendo como ponto de partida a Alemanha nazista, comandada por Adolf  Hitler, o qual, por meio de um regime totalitarista, se fortaleceu via propaganda política e leis pautadas na alegada supremacia da raça ariana sobre as demais.

O ponto de partida será a análise do “O Grande Ditador”[2] de Charles Chaplin em uma observação comparativa entre ficção e realidade.

            Todavia, é necessário proporcionarmos uma análise histórica acerca dos acontecimentos que antecederam à Primeira Guerra Mundial e o período entre guerras, responsáveis por provocar uma explosão em cadeia que rompeu irremediavelmente com a comunidade europeia como havia antes.

2. Efeitos da primeira e da segunda guerras mundiais

Na Europa os pequenos proprietários foram destruídos pelo impacto da inflação; o índice de desemprego atingiu proporções nas quais não se limitou as classes trabalhadoras mas alcançaria nações inteiras. O efeito em cadeia de guerras civis que se alastraram durante os vinte anos de paz turbulenta foi tão cruéis e sangrentas quanto a própria grande guerra, causando um processo de seguidas migrações, ocasionando uma séria instabilidade que leva a destruição do sistema político ainda vigente, antes mesmo que a política totalitária reconstruísse a estrutura da civilização europeia[3].

            A onda de migrações apresenta uma outra face para os acordos que vigoravam na sociedade no momento histórico apresentado, o ódio passa a agir como personagem que desempenha um papel de centralidade dos negócios públicos dos países; vale ressaltar que este clima nasce do sofrimento causado pela instabilidade interna em comparação a uma estabilidade externa, criando uma ideia de destino aparentemente injusto e anormal, este ódio gerado pela atmosfera sórdida do período, nos quais as regras antes vigentes não se aplicavam mais[4].

            Esta desintegração entre os países europeus torna-se extremamente mais visível nos países que perderam a primeira guerra. Neste cenário, os últimos resquícios de solidariedade entre as nações evapora-se, resultando em um conflito entre nacionalidades e povos que formavam os estados, bem como entre minorias e maiorias. O que poderia ser visto como uma querela, “briga de família”, esconde uma séria crise que vai envolver dois grupos que se consideravam vítimas, cujo os problemas diferenciavam dos demais países; a Alemanha e a Itália no intervalo das duas guerras, como afirma Hannah Arendt[5]; haviam perdido direitos ora tidos como inalienáveis, os Direitos do Homem; as classes médias desapossadas, os desempregados, os pequenos rentiers, os pensionistas aos quais os eventos haviam privado da posição social, da possibilidade de trabalhar e do direito de ter propriedades.

Neste cenário surgem as leis de exceção dos “Tratados das Minorias”, que afetava os grupos minoritários, que sem a presença de um governo que os representassem eram forçados a viver sob a égide da regulamentação apresentada. Posteriormente, a desnacionalização torna-se uma nova arma da política totalitária em oposição da impossibilidade dos Estados-nações da Europa em proteger os Direitos Humanos dos que os perderam, possibilitou aos governos opressores a imposição de valores; a propaganda que acometeu os judeus, os tornavam indesejáveis, sem o manto protetor da nacionalidade os cabia a miséria, a vida atormentada, a eliminação dos direitos básicos tendo em vista sua condição de inferioridade. Este discurso disseminado enquanto propaganda, além de tornar os judeus e as minorias em inimigos do estado, construía uma ideia de relativização dos direitos humanos – um idealismo, uma leviana hipocrisia diante o surgimento de um mundo novo, um mundo em guerra[6].

Importante frisar o texto Nazi conspiracy and agression[7], Washington, 1946, publicado pelo governo norte-americano, VI, 87 ss.; considera que o início da perseguição dos judeus alemães pelos nazistas deve ser considerada:

[...] uma tentativa de espalhar o antissemitismo entre aqueles povos que simpatizam com os judeus, principalmente as democracias ocidentais", e não um esforço de se descartar dos judeus. Uma circular do Ministério das Relações Exteriores para todas as autoridades alemãs no exterior, logo depois dos pogroms de novembro de 1938, dizia: "O movimento imigratório de apenas cerca de 100 mil judeus já foi suficiente para despertar o interesse de muitos países para o perigo judaico. (...) A Alemanha está muito interessada em manter a dispersão dos judeus; (...) o influxo de judeus em todas as partes do mundo desperta a oposição da população nativa e, assim, se constitui na melhor propaganda para a política judaica alemã (...) Quanto mais pobre for o imigrante judeu e, portanto, quanto mais incômodo para o país que o absorve, mais fortemente reagirá o país.

Desta feita, fica evidente que a apologia a perseguição a minoria foi adotada de maneira sistemática na clara intenção de persuadir a sua população a combater um inimigo interno inexistente.

3. O Grande Ditador

No filme “O Grande Ditador”, de Charlie Chaplin, lançado em 1940 quando o regime nazista se impunha no continente europeu, o conteúdo político e a sátira aos regimes totalitários que ao se estabelecerem produziram uma barbárie no decorrer da segunda grande guerra; utilizando-se do humor a película satiriza através da crítica todas as formas de autoritarismo.

Charlie Chaplin interpreta ao mesmo tempo o simpático barbeiro que no início do filme luta por seu país, mas sofre um acidente que o deixa em coma, e que acorda do coma em um novo mundo, que se encontra em desordem provocado pela guerra e o totalitarismo que regia a sociedade; e o ditador Hynkel, que na ambição de conquistar o mundo utiliza-se da força, da opressão e da tirania para impor o medo à população.

Se com o barbeiro judeu identificamos os ideais que representam a liberdade e a esperança em uma mudança política; no ditador, em uma nítida alusão a Hitler, observamos a mão opressora que gera a ditadura e priva o povo de direitos humanos essenciais.

Fica evidente no filme o caráter ilusório do patriotismo, que garantia a concentração das decisões do Estado em todos os aspectos da vida pública e privada, a série de proibições a que os judeus foram impostos, as humilhações caracterizadas pela ofensa e a construção de uma ideia de raça inferior e da superioridade de um determinado grupo racial em detrimento de outros. Expondo a forma pelo qual o Estado garantia o controle, utilizando-se de uma propaganda ideológica que apresentava um inimigo que deveria ser combatido em nome da unificação e fortalecimento deste, a intimidação através das formas de violências introduzidas quando o totalitarismo já estava implementado.

O barbeiro judeu e o ditador se confundem fisicamente, na necessidade que o próprio Charlie Chaplin tinha de demonstrar as semelhanças entre os personagens de uma história fictícia que se confunde com a realidade, os dois seres humanos que divergem-se quanto ao ideal de mundo; a oposição entre o libertador e o opressor, o respeito e a intolerância.

No fim, somos convidados a olhar para o mundo que nasce, não mais com o silenciamento das vozes diante as barbáries mas da necessidade do posicionamento e do questionamento acerca dos caminhos para qual a sociedade se encaminha.

3.1 Dissecando “O Grande Ditador”

Nos regimes totalitários a propaganda serve para “educar” a população para a acreditar nas decisões e apoiar o Governo; se conquista a massa para controla-la a seu favor, em prol de um nacionalismo interligado aos valores morais pelos quais a sociedade se constrói. Este tipo de política traz uma série de limitações as liberdades individuais e da manifestação do pensamento, se institucionaliza um sistema coercitivo garantido pela lei e aceito pelo povo influenciado pela propaganda ou pela impotência provocada pelo medo[8].

Carlos Diegues, cineasta brasileiro em entrevista ao Jornal Trade em 1978, utilizava a expressão “patrulha ideológica”, para designar uma espécie de política ideológica que tinha como intenção exercer o controle através da formação ideológica[9].

Louis Allthusser[10] analisa os aparelhos repressivos do Estado e os aparelhos ideológicos do Estado, o segundo de maior importância para este estudo, para o mesmo, estes garantem a efetiva reprodução das relações sociais fortalecendo a ideologia da classe dominante.

“O Grande Ditador” trata de maneira irônica o devaneio de ditadores que acreditam ser o centro do universo. A ironia é a arma de Charles Chaplin para demonstrar como uma população pode ser ludibriada por circos públicos de demonstração e grandeza. Trata, ainda, de maneira lúcida, como o exército alemão perseguiu os judeus, simplesmente por não ser arianos.

Ao término do filme Charles Chaplin faz um dos discursos mais emocionantes do cinema, talvez sintetizando a base dos Direitos Humanos. O discurso final do “ditador” Chaplin[11] é emocionante e merece destaque:

Sinto muito, mas não pretendo ser um imperador. Não é esse o meu ofício. Não pretendo governar ou conquistar quem quer que seja. Gostaria de ajudar a todos - se possível - judeus, o gentio... negros... brancos. Todos nós desejamos ajudar uns aos outros. Os seres humanos são assim. Desejamos viver para a felicidade do próximo - não para o seu infortúnio. Por que havemos de odiar ou desprezar uns aos outros? Neste mundo há espaço para todos. A terra, que é boa e rica, pode prover todas as nossas necessidades. O caminho da vida pode ser o da liberdade e da beleza, porém nos extraviamos. A cobiça envenenou a alma dos homens... levantou no mundo as muralhas do ódio... e tem-nos feito marchar a passo de ganso para a miséria e os morticínios. Criamos a época da velocidade, mas nos sentimos enclausurados dentro dela. A máquina, que produz abundância, tem-nos deixado em penúria. Nossos conhecimentos fizeram-nos céticos; nossa inteligência, empedernidos e cruéis. Pensamos em demasia e sentimos bem pouco. Mais do que máquinas, precisamos de humanidade. Mais do que de inteligência, precisamos de afeição e doçura. Sem essas virtudes, a vida será de violência e tudo será perdido. A aviação e o rádio aproximaram-nos muito mais. A próxima natureza dessas coisas é um apelo eloquente à bondade do homem... um apelo à fraternidade universal... à união de todos nós. Neste mesmo instante a minha voz chega a milhões de pessoas pelo mundo afora... milhões de desesperados, homens, mulheres, criancinhas... vítimas de um sistema que tortura seres humanos e encarcera inocentes. Aos que me podem ouvir eu digo: "Não desespereis!" A desgraça que tem caído sobre nós não é mais do que o produto da cobiça em agonia... da amargura de homens que temem o avanço do progresso humano. Os homens que odeiam desaparecerão, os ditadores sucumbem e o poder que do povo arrebataram há de retornar ao povo. E assim, enquanto morrem homens, a liberdade nunca perecerá. Soldados! Não vos entregueis a esses brutais... que vos desprezam... que vos escravizam... que arregimentam as vossas vidas... que ditam os vossos atos, as vossas ideias e os vossos sentimentos! Que vos fazem marchar no mesmo passo, que vos submetem a uma alimentação regrada, que vos tratam como um gado humano e que vos utilizam como carne para canhão! Não sois máquina! Homens é que sois! E com o amor da humanidade em vossas almas! Não odieis! Só odeiam os que não se fazem amar... os que não se fazem amar e os inumanos. Soldados! Não batalheis pela escravidão! Lutai pela liberdade! No décimo sétimo capítulo de São Lucas é escrito que o Reino de Deus está dentro do homem - não de um só homem ou um grupo de homens, mas dos homens todos! Está em vós! Vós, o povo, tendes o poder - o poder de criar máquinas. O poder de criar felicidade! Vós, o povo, tendes o poder de tornar esta vida livre e bela... de fazê-la uma aventura maravilhosa. Portanto - em nome da democracia - usemos desse poder, unamo-nos todos nós. Lutemos por um mundo novo... um mundo bom que a todos assegure o ensejo de trabalho, que dê futuro à mocidade e segurança à velhice. É pela promessa de tais coisas que desalmados têm subido ao poder. Mas, só mistificam! Não cumprem o que prometem. Jamais o cumprirão! Os ditadores liberam-se, porém, escravizam o povo. Lutemos agora para libertar o mundo, abater as fronteiras nacionais, dar fim à ganância, ao ódio e à prepotência. Lutemos por um mundo de razão, um mundo em que a ciência e o progresso conduzam à ventura de todos nós. Soldados, em nome da democracia, unamo-nos. Hannah, estás me ouvindo? Onde te encontres, levanta os olhos! Vês, Hannah?! O sol vai rompendo as nuvens que se dispersam! Estamos saindo da treva para a luz! Vamos entrando num mundo novo - um mundo melhor, em que os homens estarão acima da cobiça, do ódio e da brutalidade. Ergue os olhos, Hannah! A alma do homem ganhou asas e afinal começa a voar. Voa para o arco-íris, para a luz da esperança. Ergue os olhos, Hannah! Ergue os olhos!

A mensagem para a humanidade é simples e direta. Pena que ainda não a seguimos.

Com o fim da Segunda Guerra Mundial, a Alemanha perde a guerra e fica responsável por todas as consequências da guerra, sendo condenada a executar o pagamento de uma multa de vinte bilhões de dólares. Metade deste valor destinado a União Soviética. A indústria bélica fora anulada, e se instaura o tribunal de Nuremberg, tribunal internacional que tinha como finalidade julgar os principais líderes do regime nazista, destes vinte e um foram sentenciados a penas diversas.

4. Da noção de Direitos Humanos

            Na contemporaneidade os Direitos Humanos estão prescritos no direito internacional e nas cartas políticas. Os países que se comprometeram em assegurar a dignidade humana na igualdade, liberdade e solidariedade recepcionados nas Constituições Federais[12].

            O surgimento dos direitos humanos nasce da luta contra a opressão e da tirania impostas pelo poder absolutista, com a Revolução Francesa os ideais passam a ser assegurados através de constituições republicanas e monarquistas, garantindo as liberdades públicas e os direitos políticos do homem[13].

            O fim da Primeira Guerra Mundial, em 1918, propiciou o colapso aprofundado pelas crises e a intensificação das desigualdades sociais levam ao colapso do liberalismo clássico; e o fortalecimento do capitalismo selvagem. Com o welfare state se constitucionaliza os direitos sociais, econômicos e culturais como resposta ao sistema capitalista que beneficia os donos do capital em detrimento da exploração do trabalhador[14].

            Marcados pela intolerância e o preconceito, a destruição ambiental; nos anos 60 se torna necessário a luta por direitos de reconhecimento de grupos específicos, as minorias sociais ou os grupos estigmatizados enquanto inferiores como os movimentos feministas e os ambientalistas[15].

4.1 As gerações dos Direitos Humanos

            É nítida a relação entre os direitos tidos como fundamentais e as relações sociais que levam as necessidades humanas, a uma ideia de “geração de direitos”. Esta teoria vincula as épocas civilizatórias e os valores que são necessários a vida humana naquele período.

Assim, temos quatro gerações bem definidas. A Primeira Geração trata das liberdades públicas e direitos políticos; A Segunda Geração destaca os direitos sociais, os econômicos e as culturais; Na Terceira Geração vemos os direitos difusos, os coletivos e os individuais homogêneos; e, ainda, a Quarta Geração atribui os direitos da bioética e direito da informática[16].

            Na Primeira Geração o marco é a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, em 1780, tinha como elemento a liberdade como principal ponto para sua constituição. Denominadas direitos civis que protegem a integridade física, moral e psíquica dos abusos de poder, estas garantem a dignidade da pessoa humana e a sua tutela em sua dimensão individual[17].

            Emanando da teoria de Estado do Bem-Estar Social, a Segunda Geração que começa ganhar corpo com o fim da Primeira Guerra Mundial; possibilitam a igualdade de oportunidades sociais, econômicos e culturais[18].

            Para Etiene-R. Mbaya a Terceira Geração garante os direitos de solidariedade. Garantindo a proteção a grupos sociais vulneráveis e preservar o meio ambiente que devem ser defendidos através da atuação do povo na atuação do Ministério Público ou de representantes da sociedade civil, sobretudo as organizações não-governamentais[19].

            A Quarta Geração trata dos direitos a bioética e dos direitos da informática; no campo jurídico aquele trata de assuntos como o comércio de órgãos, manipulação de código genético, eutanásia, o aborto, e demais questionamentos que envolvem os problemas e implicações morais nas pesquisas cientificas e procedimentos médicos. Com a informática, as telecomunicações e a telemática incide os problemas que envolvam o comércio virtual, a pirataria, a invasão de privacidade, direitos autorais, propriedade industrial etc[20].

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5. Contexto histórico

“O Grande Ditador” é uma sátira magistral para expor Adolf Hitler, mas não há apenas um tema central, Charles Chaplin atacou os governos totalitários (exemplificando o nazismo e o fascismo), a perseguição sofrida pelos judeus, os ideais expansionistas, as relações diplomáticas com o ditador italiano Benito Mussolini.

A sátira inicia nos discursos do ditador Hynkel, que discursa violentamente e teatralmente para uma plateia que nada entende. Ademais, Chaplin utilizou a própria imagem de Adolf Hitler na criação de seu personagem, que utiliza roupas, trejeitos e teatralidade próprios do ditador real.

O antissemitismo foi abordado no filme de maneira tênue, mais como uma forma de repressão do que verdadeiramente um massacre, tal fato merece uma ressalva, até aquele momento não se imaginava a dimensão do genocídio cometido pelas tropas de Adolf Hitler. A esse respeito temos a fala do mestre Chaplin[21]:

Se eu já houvesse tomado conhecimento dos horrores que aconteciam nos campos de concentração alemães, não teria podido realizar O Grande Ditador; não teria podido fazer graça à custa da demência homicida dos nazistas. Entretanto, mantinha-me no firme propósito de ridicularizar a sua mística baboseira a respeito de pureza racial.

A cena clássica do ditador Hynkel dança com um globo terrestre, perdido em sua fantasia de dominação do mundo, é o maior exponencial da sátira, e para completar a cena o toque do gênio ao término da cena o balão explode e Hynkel faz uma cara de criança cujo brinquedo se quebrou.

Entretanto, o filme não foi só sátira, apresentou a discussão sobre as atrocidades cometidas por Adolf Hitler, abordou uma mensagem de humanismo e solidariedade em um período histórico essencialmente marcado pela tirania de um homem com ideais racistas e totalitários, o que gera a intolerância entre os povos.

As filmagens começaram poucos dias depois do início da Segunda Guerra Mundial em 1939, diante deste contexto Charles Chaplin recebeu várias cartas e pedidos legais para interromper as filmagens, mas Charles Chaplin continuou seu trabalho. Com a entrada dos Estados Unidos na Grande Guerra o papel se inverteu e o desejo era que o filme logo estreasse.

O filme manteve-se em cartaz por quinze semanas, e foi o de maior renda entre todos os de Chaplin. Bateu recorde de bilheteria, tanto na Inglaterra como nos Estados Unidos.

6. Proteção aos Direitos Humanos em nosso ordenamento

            Com o fim da segunda guerra mundial se mostrou necessário assegurar os direitos do homem e de se combater uma possível nova guerra mundial. Neste viés nasce a Organização das Nações Unidas - ONU - responsável por assegurar a paz e manter a segurança internacional através da cooperação entre os Estados-partes.

            O Brasil ratificou a Carta das Nações Unidas em 22 de outubro de 1945 que envolve a República dos Estados Unidos e os países representados na Conferência das Nações Unidas, assinada em 26 de junho de 1945, em São Francisco, nos Estados Unidos da América[22]:

Nós, os povos das Nações Unidas, resolvidos a preservar as gerações vindouras do flagelo da guerra, que por duas vezes, no espaço da nossa vida, trouxe sofrimentos indizíveis à humanidade, e a reafirmar a fé nos direitos fundamentais do homem, na dignidade e no valor do ser humano, na igualdade de direito dos homens e das mulheres, assim como das nações grandes e pequenas, e a estabelecer condições sob as quais a justiça e o respeito às obrigações decorrentes de tratados e de outras fontes do direito internacional possam ser mantidos, e a promover o progresso social e melhores condições de vida dentro de uma liberdade ampla.

                Destes princípios parte a necessidade de preservação das garantias fundamentais que se efetivará com o fim da Ditadura Militar no Brasil[23].

Em 1948 as organizações regionais com finalidade política, ou como chamadas “braços” da ONU, estabelecem-se enquanto sistema de proteção aos direitos humanos em seus âmbitos regionais levando em consideração as especificidades culturais e sociais.

            Criada em 1948, pela Carta de Bogotá, a Organização dos Estados Americanos[24] tem o objetivo de proteger regionalmente os direitos humanos nos países americanos em conjunto com a assinatura da Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem. No entanto, o sistema de proteção americano, tem sua efetiva implantação com a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, em 1969; conhecida como Pacto de São José da Costa Rica[25], que entrou em vigor somente em 1978 com a ratificação de um número mínimo de países.

            Impulsionados pela Constituição Federal de 1988 e pela redemocratização do Estado brasileiro iniciado em 1985, que consagram os princípios da prevalência dos direitos humanos e da dignidade humana, o Brasil passa compor o cenário de proteção internacional dos direitos humanos. Neste momento de transição entre regime ditatorial e estado democrático de direitos a Constituição Federal ratifica tais disposição, conforme ensina Flávia Piovesan[26]:

a) a Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura, em 20 de julho de 1989; b) a Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes, em 28 de setembro de 1989; c) a Convenção sobre os Direitos da Criança, em 24 de setembro de 1990; d) o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, em 24 de janeiro de 1992; e) o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, em 24 de janeiro de 1992; f) a Convenção Americana de Direitos Humanos, em 25 de setembro de 1992; g) a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, em 27 de novembro de 1995; h) o Protocolo à Convenção Americana referente à Abolição da Pena de Morte, em 13 de agosto de 1996 e i) o Protocolo à Convenção Americana referente aos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (Protocolo de San Salvador), em 21 de agosto de 1996.  

            Sob este enfoque o Brasil possibilita a fiscalização internacional diante as relações e obrigações assumidas, Flávia Piovesan[27] alerta:

Os instrumentos internacionais de proteção dos direitos humanos, ao consagrarem parâmetros mínimos a serem respeitados pelos Estados, apresentam um duplo impacto: são acionáveis perante as instâncias nacionais e internacionais. No campo nacional, os instrumentos internacionais conjugam-se com o Direito interno, ampliando, fortalecendo e aprimorando o sistema de proteção dos direitos humanos, sob o princípio da primazia da pessoa humana. No campo internacional, os instrumentos internacionais permitem invocar a tutela internacional, mediante a responsabilização do Estado, quando direitos humanos internacionalmente assegurados são violados. Para o Direito Internacional dos Direitos Humanos, o Estado tem a responsabilidade primária no tocante à proteção de direitos, tendo a comunidade internacional a responsabilidade subsidiária, quando as instituições nacionais se mostrarem falhas ou omissas na proteção de direitos. O objetivo maior da tutela internacional é propiciar avanços internos no regime de proteção dos direitos humanos.

            A Constituição Federal de 1988 marca juridicamente a transição democrática e a institucionalização dos Direitos Humanos no Brasil, quer pela necessidade de constituir uma nova imagem internacionalmente pós ditadura, ou da ideia de um pais que se subscreve na contemporaneidade que globaliza os direitos fundamentais.

            O inciso III, do artigo 1º, da Carta Magna[28] prevê:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

(...)

III - a dignidade da pessoa humana;

Assim, fica clara a intenção protetiva da nossa Constituição Federal, até porque existe a necessidade de se inserir o respeito à dignidade humana em nosso sistema jurídico.

E o acolhimento em nossa legislação persiste ao lermos os direitos fundamentais elencados no artigo 5º[29], de forma que se estenderam em todo ordenamento jurídico; não excluindo outros “decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”.

            O direito brasileiro disciplina os tratados através de um sistema misto disciplinador que combina os regimes jurídicos diferenciados entre os que tratam de assuntos de direitos humanos e os que possuem hierarquia constitucional por efeito do parágrafo 2º, do artigo 5º, da Constituição Federal de 1988[30], e outro que trata dos tratados tradicionais, com hierarquia infraconstitucional.   

Todavia, mesmo com a ratificação dos tratados internacionais que versam sobre os direitos humanos, o Brasil não garante integralmente o que recepcionou em sua legislação.

O país recebeu, de acordo com dados presentes no site da Secretaria Especial de Direitos Humanos, mais de cento e trinta mil denúncias de violações de direitos humanos no ano de 2015. Para Rogério Sottili[31], “O perfil da violência que temos no Brasil hoje é a população negra, mulheres e pessoas de 18 a 30 anos de idade. E se considerarmos a orientação de gênero, a população LGBT também está neste quadro de violência”.

            A Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos recebeu 98 casos contra o Brasil, destes podemos citar a violação de direitos da criança e do adolescente, dos povos indígenas, denúncias de torturas e assassinatos no período de Ditadura Militar, violência contra mulher, discriminação racial, sistema penitenciário brasileiro, violência no campo, dentre outras[32].

            Dentre as denúncias apresentadas contra o Estado Brasileiro se destaca o caso de Eldorados dos Carajás, ocorrido em 1996, no qual os peticionários, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e o Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL) denunciaram o assassinato de 19 trabalhadores rurais e outros feridos cometido por agentes do Estado ao desalojá-los da rodovia pública que ocupavam; o Estado alegou a incompetência da comissão justificando que os recursos internos não haviam sido esgotados[33].

A investigação por organismo internacional referente a casos de violação de tratados internacionais se possibilita com a ineficiência do Estado em investigar, julgar e punir os responsáveis, ou seja, com o exaurimento dos recursos internos.

            A Comissão Interamericana considerou que os recursos internos foram conduzidos de forma ineficaz o que levou a não conclusão do caso, no relatório apresentado se destaca o argumento de vício do processo em vista das investigações realizadas pela Polícia Militar; critica os fatos de investigações de crimes comuns cometidos por policias militares serem de autonomia de competência da Policia Militar, não garantindo independência, autonomia e imparcialidade. Do relatório se observa a denúncia dos peticionários acerca do julgamento[34]:

Aduzem que em 16 de agosto de 1999 foi realizado o primeiro juízo relacionado com os fatos, perante tribunais do foro criminal ordinário, logo anulado por vícios processuais. Acrescentam que entre 14 de maio de 2002 e 10 de junho do mesmo ano foi realizado, também perante o foro criminal ordinário, o segundo juízo relacionado com os fatos, no qual, de 144 policiais militares acusados, 142 foram absolvidos e somente dois oficiais da Polícia Militar que participaram dos fatos foram condenados pelo delito de homicídio: o Coronel Mário Colares Pantoja, que recebeu pena de 258 anos de prisão, e o Major José Maria Oliveira, condenado a 158 anos de prisão.

            O Brasil foi réu em cinco processos julgados pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, outro que destacamos é o caso Nogueira de Carvalho e outros vs. Brasil, submetido em 2005, no qual o Estado foi absolvido[35].

            A primeira condenação adveio do caso Damião Ximenes Lopes[36] em 2006, o mesmo era portador de deficiência mental e interno na Casa de Repouso Guararapes, entidade do Sistema Público de Saúde - SUS -, no qual o incapaz foi submetido a condições desumanas e degradantes que resultaram em seu falecimento em quatro dias de internamento. O Estado brasileiro foi condenado por omissão, em virtude da inercia em processar e julgar os responsáveis pela violação. O caso se torna um marco para a análise e investigação das condições aos quais os portadores de deficiência mental eram submetidos nos hospitais psiquiátricos no pais.

            Em 2009, o Brasil foi réu em dois julgamentos, Caso Escher e outros vs. Brasil e Garibaldi vs. Brasil; que resultou na responsabilização do Brasil pela violação de direitos humanos que acometeram os membros das organizações Coana e Adecon por dano imateriais através de interceptação telefônica divulgadas na mídia nacional e local. O Caso Sétimo Garibaldi, fazia referência a omissão do Estado em investigar e punir o homicídio de Sétimo Garibaldi em 1998 na operação de despejo de famílias do Movimento dos Sem Terra que se encontravam ocupadas em fazenda do Paraná[37].

            O caso da Guerrilha do Araguaia, a Corte analisou a denúncia de violação de direitos humanos em função da repressão realizada pelo governo brasileiro contra os opositores da ditadura entre 1972 e 1975, formados por membros do Partido Comunista do Brasil e camponeses da região. Reconhecendo que, ao operar com o objetivo de reprimir a manifestação, o Exército Brasileiro levou o desaparecimento de setenta pessoas, utilizando-se de detenção arbitrária e tortura. O país foi condenado a adotar medidas de reparação, como a abertura dos arquivos da época que estavam em poder da ditadura militar; instaurar a Comissão da Justiça, Memória e Verdade; compensar às famílias das vítimas; encontrar os corpos dos desaparecidos; possibilitar aos familiares o direito de velar seus entes e; invalidou a Lei da Anistia (Lei Federal n.º 6683/1979)[38].

            Desta maneira, resta ao nosso país aplicar a sua própria legislação para proteger a dignidade da pessoa humana em nosso território.

7. Direito Comparado

            A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi um marco para a preservação da vida e da integridade do homem bem como para a criação de tratados internacionais que versam sobre a dignidade humana; mas vale ressaltar que sessenta e oito anos depois de promulgada a mesma não garantiu que as violações cessassem, como também não foi aplicada de forma efetiva no mundo[39].

A África recorda o genocídio de Ruanda ao mesmo tempo em que uma série de conflitos violentos continuam a acontecer; extremamente sangrentos na República Centro Africana, no Sudão do Sul e na Nigéria, e seguindo por anos sem resolução de conflitos na República Democrática do Congo, no Sudão e na Somália. Com nítidas violações de direitos humanos os conflitos armados que assolam os países africanos geram além da injustiça e da repressão, a marginalização e a negação de liberdades fundamentais e de direitos socioeconômicos básicos, que se configuram como geradores de outros conflitos e instabilidade política[40].

O relatório das Nações Unidas referente aos Objetivos de Desenvolvimento do Milénio - ODM -, aponta que mesmo diante dos desafios que acomete o continente muitos estados africanos tiveram uma aceleração rápida do crescimento econômico e na urbanização alterando de modo significante a vida das pessoas e seus meios de subsistência. Todavia o rápido crescimento não é sinônimo de melhores condições de vida, como alerta o relatório da Anistia Internacional, informe 2014-2015[41]:

No entanto, muitos indicadores trouxeram lembranças amargas de que o rápido crescimento econômico não conseguiu melhorar as condições de vida de muitas pessoas. Enquanto a taxa de pobreza global na África caiu na última década, o número total de africanos que vivem abaixo da linha da pobreza (1,25 dólares por dia) aumentou. Duas das nações assoladas por conflitos, Nigéria (25,89%) e República Democrática do Congo (13,6%), são responsáveis por quase 40% dos pobres do continente. A África tem uma das taxas mais elevadas de desemprego de jovens no planeta, e continua a ser a segunda região mais desigual do mundo, depois da América Latina.

            A constante negação de direitos e a repressão política proporcionam força para os conflitos violentos; o que se apresenta tanto nos países democráticos quanto nos regimes autoritários. Países como a Nigéria e a Somália veem enfrentando um grave aumento nos indicies de violência em grande parte proporcionados pelos grupos armados radicais como o Boko Haram e o Al-Shabab; em respostas aos ataques os governos respondem de forma brutal e indiscriminada, numa ofensiva igualmente violenta[42], “A tortura e outros maus-tratos foram rotineiros e sistematicamente praticados pelos serviços de segurança da Nigéria em todo o país, inclusive no contexto do conflito no Nordeste. Autoridades de segurança raramente foram responsabilizadas”.

Na Ásia e na Oceania, o avanço econômico e a força política internacionalmente tem potencializado uma transformação na balança do poder e da riqueza global. Sob a ótica dos direitos humanos, mesmo com a eleição de alguns governos que se comprometeram em proporcionar mudanças na relação com direitos do homem a impunidade, a constante violação de direitos das mulheres, a utilização de tortura, a imposição de pena de morte, a repressão a liberdade de expressão e de livre associação, às ameaças a defensores dos direitos humanos e profissionais da imprensa, dentre outras tantas violações não apresenta alterações[43].

            A ONU em relatório divulgado sobre a situação de direitos humanos na República Popular Democrática da Coreia - Coreia de Norte - apresenta um número extremo de violações do governo desde campos de prisioneiros e de detenção que em sua maioria encarceram pessoas sem o cometimento de qualquer crime, a violações de liberdade e acesso a informação e comunicação[44].

[...]centenas de milhares de pessoas continuaram detidas em campos penitenciários para presos políticos e outros centros de detenção, onde foram submetidas a graves violações dos direitos humanos, como execuções extrajudiciais, tortura e outros maus-tratos. Os mecanismos de prestação de contas continuaram insuficientes para lidar com as denúncias de tortura, muitas vezes deixando as vítimas e suas famílias sem acesso à Justiça e a outros recursos eficazes.

            Países como a China utilizam uma forte repressão ao ativismo e a liberdade de expressão, com penas severas para aqueles que desafiam e denunciam a situação no pais. Na Coreia do Norte a presença de partidos políticos, jornais ou organizações da sociedade civil aparenta ser inexistente, segundo a Anistia Internacional, a prática da leitura, ouvir meios de comunicação estrangeiro levam a punição. No Camboja os protestos foram contidos com uso de força excessiva levando a morte de um grupo de trabalhadores têxteis; pós o golpe de Estado realizado na Tailândia resultou na detenção arbitraria, proibição de reunião e julgamentos de civis em tribunais militares sem o devido processo legal e o direito a defesa[45].

            No oriente médio conflitos coordenados por grupos armados como Estado Islâmico - EI -, conhecido anteriormente como ISIS, que controlam extensas áreas da Síria e do Iraque, impondo punições aos que contrariam a “lei islâmica” adotada, utilizando-se de um terrorismo extremista impõem assassinatos e açoitamento aos que contrariam sua “verdade” religiosa, execução em massa de soldados do governo capturados, a minorias, mulçumanos xiitas e demais grupos considerados como inimigos e contraventores[46].

Utilizando a internet como meio de propaganda das práticas e discursos, com a finalidade de recrutar novos membros, de negociação de reféns e fortalecimento do organismo, o grupo EI divulga uma série de vídeos obtidos via tortura e assassinatos. Com o crescimento do mesmo os Estados Unidos formou uma aliança com mais de sessenta países para combater o avanço do EI, realizando ataques aéreos contra as posições do EI levando a morte de milhares de civis.  O Governo Sírio apoiado pela Rússia, sem respeitar os tratados que versam sobre crimes de guerra e outras violações; para manter o controle das áreas que ainda detinham o poder e recuperar aquelas que foram invadidas atacam sem qualquer respeito pela vida dos civis em oposição a suas obrigações com o Direito Internacional, como apresenta a Anistia Internacional[47]:

Forças do governo realizaram ataques indiscriminados nas áreas em que civis estavam abrigados, utilizando diversos armamentos pesados, como bombas de barril (bombas feitas de barris carregados com explosivos e munições que atingem grandes áreas), tanques e fogo de artilharia. Além disso, mantiveram cercos por tempo indeterminado, impedindo o acesso de civis a alimentos, água e suprimentos médicos, tendo atacado hospitais e trabalhadores da saúde. Também continuaram a deter um grande número de críticos e supostos opositores, submetendo muitos à tortura e a condições degradantes, cometendo vários homicídios ilegítimos. No Iraque, a resposta do governo aos avanços do Estado Islâmico foi fortalecer as forças de segurança com milícias xiitas pró-governo e deixá-las agir livremente nas comunidades sunitas vistas como anti- governo ou simpatizantes do EI, ao mesmo tempo em que realizava ataques aéreos indiscriminados em Mossul e outros centros controlados pelas forças do EI. Como na maioria dos conflitos atuais, os civis novamente pagaram o preço mais alto do conflito, uma vez que as forças em combate ignoraram suas obrigações de poupá-los.

                É perceptível a constante violação de direitos humanos cometidos pelos países, o que nos chama atenção é o comum tema da impunidade em detrimento desta; é recorrente a privação de justiça por negação dos direitos das vítimas inclusive em contextos armados.

A ineficiência da ONU em punir e garantir que as penalidades impostas sejam cumpridas, o desrespeito dos estados aos tratados internacionais se torna preocupante, pois legitima a intolerância, o genocídio, o terrorismo, a opressão e a perseguição política, as quais foram combatidas pela Declaração de Direitos Humanos que nasceu dos horrores dos conflitos sociais e políticos ao longo da história.

Conclusão

            A história dos Direitos Humanos remonta a própria construção da sociedade moderna, desde a Revolução Francesa que possibilitou a conquista dos Direitos Civis e Políticos do homem; aos horrores da Segunda Guerra Mundial tornando necessário uma aliança internacional para que violações e os crimes cometidos não voltassem a acontecer e que constituiu uma nova compreensão de direitos dos homens. Estes direitos tem relação com a própria evolução dos direitos que evoluíram a partir das necessidades da sociedade, o que faz com que seja extremamente importante a sua proteção e o aperfeiçoamento das ferramentas que garantem os mesmos.

            A Segunda Guerra Mundial traz à tona as divergências e o choque dos sistemas governamentais como o totalitarismo, a democracia e o comunismo; e como estes possibilitaram os elementos que desencadearam a guerra; bem como o fortalecimento dos ideais nazistas. Assim como a utilização de uma propaganda política interna fundamentada em um terrorismo ideológico que garantiu a aceitação de um país as atrocidades realizadas contra em sua maioria o povo judeu.

            A ONU e todos os demais órgãos criados para assegurar e fiscalizar o cumprimento dos direitos humanos no mundo bem como a disponibilidade dos Estados em garantir em suas próprias constituições, a proteção a dignidade humana, assegurando os direitos civis e políticos, os direitos sociais, culturais e religiosos, o direito à liberdade, o acesso a informática, bioética dentre outros.

            Todavia é perceptível a ineficiência dos organismos internacionais em garantir a proteção dos direitos humanos por uma diversidade de fatores que vão desde aos problemas internos que assolam os estados e que consequentemente violam com a justificativa de garantir a estabilidade do país, bem como quanto a personagens que utilizam-se da opressão para o fortalecimento dos governantes. Questões ligados as divergências culturais e religiosas incidem em um momento em que intolerâncias históricas se fortalecem e conflitos antigos reacendem no cenário mundial.

Nas últimas décadas observamos uma série de conflitos violentos e o fracasso dos Estados em manter a população em segurança; o fortalecimento de grupos extremistas e de ataques a direitos humanos. Direitos, ora conquistados estão em risco diante os governos ditatórias e opressores que detém o poder em diversas parte do mundo.

Não obstante encontra-se o Brasil; as constantes violações aos direitos do homem, torna-se um empecilho para à efetividade dos direitos em uma sociedade dita democrática, que só se constitui com o cumprimento das normas Constitucionais e dos tratados internacionais ratificados pelo Estado.

            Em um mundo em que o terrorismo se fortalece, estados totalitaristas ressurgem, democracias são destruídas e ditaduras são implantadas; extermínios e assassinatos de opositores tornam-se veículo de manutenção do poder estatal, conflitos antigos se apropriam de novos meios de conquista e opressão da população.

Torna-se necessário, diante dos fatos expostos a efetiva investigação dos crimes, a condenação e a sanção dos responsáveis por práticas que violam Direitos Humanos, principalmente quando estejam envolvidos agentes do Estado, a fim de evitar o sentimento de impunidade à medida que cria a ideia de proteção aos violadores. O compromisso dos Estados em garantir o cumprimento dos tratados internacionais e dos acordos regionais, bem como da eficiência da ONU em investigar e garantir a segurança dos Direitos Humanos.

            Chaplin em seu discurso final no filme “O Grande Ditador” proclama um dos mais fortes discursos proferidos na história; conclamando a criarmos um mundo de liberdade no qual a cobiça não envenenasse a alma dos homens e pudéssemos sentir a humanidade dentro de cada um, talvez não tenhamos compreendido os conselhos do diretor e construímos um novo mundo de conflitos.

 

Referência

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Sobre os autores
Leonardo Barreto Ferraz Gominho

Graduado em Direito pela Faculdade de Alagoas (2007); Pós-Graduado em Direito Processual Civil pela Universidade do Sul de Santa Catarina (2010); Especialista e Mestre em Psicanálise Aplicada à Educação e a Saúde pela UNIDERC/Anchieta (2013); Mestre em Ciências da Educação pela Universidad de Desarrollo Sustentable (2017); Foi Assessor de Juiz da Vara Cível / Sucessões da Comarca de Maceió/AL - Tribunal de Justiça de Alagoas, por sete anos, de 2009 até janeiro de 2015; Foi Assessor do Juiz da Vara Agrária de Alagoas - Tribunal de Justiça de Alagoas, por sete anos, de 2009 até janeiro de 2015; Conciliador do Tribunal de Justiça de Alagoas. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito das Obrigações, das Famílias, das Sucessões, além de dominar Conciliações e Mediações. Advogado. Professor da Faculdade de Ciências Humanas e Exatas do Sertão do São Francisco - FACESF -, desde agosto de 2014. Professor e Orientador do Núcleo de Prática Jurídica da Faculdade de Ciências Humanas e Exatas do Sertão do São Francisco - FACESF -, desde agosto de 2014. Responsável pelo quadro de estagiários vinculados ao Núcleo de Prática Jurídica da Faculdade de Ciências Humanas e Exatas do Sertão do São Francisco - FACESF - CCMA/FACESF, em Floresta/PE, nos anos de 2015 e 2016. Responsável pelo Projeto de Extensão Cine Jurídico da Faculdade de Ciências Humanas e Exatas do Sertão do São Francisco - FACESF, desde 2015. Chefe da Assessoria Jurídica do Município de Floresta/PE. Coautor do livro "Direito das Sucessões e Conciliação: teoria e prática da sucessão hereditária a partir do princípio da pluralidade das famílias". Maceió: EDUFAL, 2010. Coordenador e Coautor do livro “Cine Jurídico I: discutindo o direito por meio do cinema”. São Paulo: Editora Lexia, 2017. ISBN: 9788581821832; Coordenador e Coautor do livro “Coletânea de artigos relevantes ao estudo jurídico: direito civil e direito processual civil”. Volume 01. São Paulo: Editora Lexia, 2017. ISBN: 9788581821749; Coordenador e Coautor do livro “Coletânea de artigos relevantes ao estudo jurídico: direito das famílias e direito das sucessões”. Volume 01. São Paulo: Editora Lexia, 2017. ISBN: 9788581821856. Coordenador e Coautor do livro “Coletânea de artigos relevantes ao estudo jurídico: direito das famílias e direito das sucessões”. Volume 02. Belém do São Francisco: Editora FACESF, 2018. ISBN: 9788545558019. Coordenador e Coautor do livro “Cine Jurídico II: discutindo o direito por meio do cinema”. Belém do São Francisco: Editora FACESF, 2018. ISBN: 9788545558002.

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