1. Introdução. 2. Considerações iniciais sobre o ICMS. 2.1 O ICMS incidente nas operações mercantis. 2.1.1 A Regra-Matriz de Incidência do ICMS nas operações mercantis. 2.2 O ICMS incidente na prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal. 2.2.1 A Regra-Matriz de Incidência do ICMS na prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal. 2.3 As alterações nas operações interestaduais promovidas pela Emenda Constitucional nº 87/2015. 2.4 As operações interestaduais destinadas a não contribuinte do ICMS realizadas por contribuinte optante pelo Simples Nacional. 3. Posicionamento da Consultoria Tributária com relação às operações interestaduais com mercadorias e serviços destinadas a consumidor final, não contribuinte do ICMS. 4. Considerações Finais.
1. Introdução
O Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) está previsto no art. 155, II, da Constituição Federal.
A Lei Estadual nº 6.374, de 01 de março de 1989, instituiu o ICMS no âmbito do Estado de São Paulo.
Posteriormente, foi editada a Lei Complementar Federal nº 87, de 13.09.1996 em cumprimento ao estabelecido no artigo 155 da Constituição Federal estabelecendo disposições sobre o imposto dos Estados e do Distrito Federal sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação.
O objetivo do presente trabalho é analisar as alterações ocorridas nas operações interestaduais que destinem mercadorias e serviços a não contribuinte do ICMS decorrentes da Emenda Constitucional nº 87/2015.
2. Considerações iniciais sobre o ICMS
O imposto sobre circulação de mercadorias é, na verdade, constituído por várias hipóteses de incidência distintas, em virtude de possuírem critério material, sujeito passivo e base de cálculo próprios[1].
Considerando os objetivos deste trabalho, limitaremos a uma breve consideração a respeito do ICMS incidente sobre operações mercantis e sobre prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal, que terão implicação, posteriormente, quando do estudo das alterações promovidas pela Emenda Constitucional nº 87/2015.
2.1 O ICMS incidente nas operações mercantis
Roque Antonio Carraza[2] adverte que o ICMS incide sobre operações mercantis, das quais resulta circulação de mercadorias, devendo tal circulação ser entendida em sentido jurídico, isto é, deve ocorrer a transmissão da titularidade da mercadoria em questão.
Nesse mesmo sentido o magistério de José Eduardo Soares de Melo[3] que considera tratar-se de circulação jurídica de mercadoria, entendida esta como espécie do gênero produto, como um bem econômico, que o vendedor, com propósito de lucro, produz para vender, ou adquire para revender. A importação de mercadoria também está sujeita à incidência do ICMS.
Tratando-se de imposto a cobrança do ICMS: não está vinculada a nenhuma ação estatal específica ao contribuinte.
O ICMS é um imposto não-cumulativo, de forma que na apuração do valor devido em determinado período (normalmente a apuração é mensal), serão descontados os créditos provenientes das aquisições de mercadorias para revenda ou utilização como ativo permanente[4].
A isenção ou não-incidência salvo disposição em contrário não implicará direito a crédito em relação às operações posteriores e acarretará a anulação (estorno) do crédito em relação às operações anteriores.
A Constituição Federal estabelece no art. 155, § 2º, inciso III que o ICMS poderá ser seletivo, em função da essencialidade das mercadorias e dos serviços. A seletividade será efetividade por intermédio da aplicação de alíquotas diferenciadas.
As microempresas e empresas de pequeno porte deverão ter tratamento diferenciado e favorecido. Nesse sentido, foi publica a Lei Complementar Federal nº 123, de 14.12.2006 – que instituiu o regime tributário simplificado denominado “Simples Nacional”.
2.1.1 A Regra-Matriz de Incidência do ICMS nas operações mercantis
Hipótese de incidência.
Critério material: Realizar operação de circulação de mercadorias
Critério Temporal: O momento da transferência da titularidade da mercadoria, ou seja, no momento da tradição que faz a transferência de domínio de bens móveis.
Critério Espacial: O território do Estado onde ocorreu a operação de circulação de mercadorias, independentemente de o destinatário estar ou não localizado nesse Estado.
Consequente:
Critério Pessoal:
Sujeito Ativo: O Estado onde se realizou a operação de circulação de mercadorias.
Sujeito Passivo: O comerciante, o industrial, o produtor, ou assemelhado que realize operação de circulação de mercadorias, ou pessoa física que promova tal fato com habitualidade.
Base de cálculo: O valor da operação referente ao negócio jurídico realizado.
Alíquota: Operação interna: 18%. Operação interestadual aos Estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul: 12%. Demais Estados: 7%[5].
Produto importado sem similar nacional: 4%[6].
Entretanto, nas operações internas existem outras alíquotas, dependendo do produto, como produtos supérfluos, que são tributados à alíquota de 25%, nos termos da Lei Estadual Paulista n.º 6.374/89.
2.2 O ICMS incidente na prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal
O ICMS também incide sobre prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal[7].
Roque Antonio Carrazza[8] enfatiza a circunstância de uma pessoa prestar, a terceiro, um serviço de transporte intermunicipal ou interestadual, com conteúdo econômico, sob regime de direito privado, ou seja, em caráter negocial, mas não trabalhista.
2.2.1 A Regra-Matriz de Incidência do ICMS na prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal
Hipótese de incidência.
Critério material: Realizar prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal
Critério Temporal: O momento da realização da prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal
Critério Espacial: O território do Estado onde ocorreu o início da prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal
Consequente:
Critério Pessoal:
Sujeito Ativo: O Estado onde se iniciou a prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal.
Sujeito Passivo: O prestador do serviço de transporte interestadual ou intermunicipal.
Base de cálculo: O preço cobrado na prestação do serviço.
Alíquota: Operação interna: 12%. Operação interestadual aos Estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul: 12%. Demais Estados: 7%.
2.3 As alterações nas operações interestaduais promovidas pela Emenda Constitucional nº 87/2015
A Constituição Federal em seu artigo 155 dispõe:
Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:
II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;
§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
VII - nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro Estado, adotar-se-á a alíquota interestadual e caberá ao Estado de localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna do Estado destinatário e a alíquota interestadual; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 87, de 2015) .
a) (revogada)
VIII - a responsabilidade pelo recolhimento do imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual de que trata o inciso VII será atribuída: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 87, de 2015) .
a) ao destinatário, quando este for contribuinte do imposto; .
b) ao remetente, quando o destinatário não for contribuinte do imposto; .
(http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm) acesso em 21.08.2016.
Com as alterações promovidas pela Emenda Constitucional nº 87, de 2015, nas operações e prestações interestaduais que destinem bens e serviços a consumidor final não contribuinte do ICMS, aplica-se a alíquota interestadual, cabendo ao remetente a responsabilidade pelo recolhimento do imposto correspondente ao diferencial de alíquota, observada a regra de partilha[9].
Cabe ressaltar que por intermédio do art. 82 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias os Estados e o Distrito Federal foram autorizados a criar um adicional de até dois pontos percentuais na alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS, sobre os produtos e serviços supérfluos destinado ao financiamento dos Fundos de Combate à Pobreza[10].
O Convênio ICMS 93, de 17.09.2015[11] estabeleceu disposições no tocante à responsabilidade do contribuinte (remetente) pelo pagamento do imposto correspondente ao diferencial de alíquota, observada a regra de partilha, bem como pelo adicional do imposto destinado ao Fundo de Combate à Pobreza devido ao Estado do destinatário da mercadoria.
Para o cálculo do imposto o remetente deverá utilizar a alíquota interna prevista na unidade federada de destino para calcular o ICMS total devido na operação, e a alíquota interestadual prevista para a operação, para o cálculo do imposto devido à unidade federada de origem[12].
A diferença entre o valor do imposto total devido na operação e do valor do imposto correspondente à aplicação da alíquota interestadual deverá ser recolhido ao Estado de destino da mercadoria ou serviço, utilizando-se base de cálculo única correspondente ao valor da operação ou o preço do serviço, observado o disposto no § 1º do art. 13 da Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996[13].
É importante ressaltar que no ano de 2016 o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual deve ser partilhado, cabendo à unidade federada de destino 40% (quarenta por cento) e à unidade federada de origem 60% (sessenta por cento).
No âmbito do Estado de São Paulo o Fundo Estadual de Combate e Erradicação da Pobreza – FECOEP, nos termos da Emenda Constitucional Federal nº 31, de 14 de dezembro de 2000 foi instituído pela Lei nº 16.006, de 24.11.2015, constituindo receita do FECOEP a parcela do produto da arrecadação correspondente ao adicional de 2% (dois por cento) na alíquota do ICMS, ou do imposto que vier a substituí-lo, incidente sobre as seguintes mercadorias: a) bebidas alcoólicas classificadas na posição 22.03; b) fumo e seus sucedâneos manufaturados, classificados no capítulo 24 da NCM[14].
Questão relevante no tocante à aplicação da alíquota interestadual é a disposição constante do art. 52, § 3º do Regulamento do ICMS vigente no Estado de São Paulo, verbis:
Artigo 52 - As alíquotas do imposto, salvo exceções previstas nesta seção, são: (Redação dada ao "caput" do artigo, mantidos os seus incisos, pelo Decreto 61.838, de 18-02-2016; DOE 19-02-2016; Efeitos a partir de 23-02-2016).
I - nas operações ou prestações internas, ainda que iniciadas no exterior, 18% (dezoito por cento);
§ 3º - São internas, para fins do disposto neste artigo, as operações com mercadorias entregues a consumidor final não contribuinte do imposto no território deste Estado, independentemente do seu domicílio ou da sua eventual inscrição no Cadastro de Contribuintes do ICMS de outra unidade federada. (Parágrafo acrescentado pelo Decreto61.744, de 23-12-2015, DOE 24-12-2015; produzindo efeitos a partir de 01-01-2016).
2.4 As operações interestaduais destinadas a não contribuinte do ICMS realizadas por contribuinte optante pelo Simples Nacional.
A cláusula nona do Convênio ICMS 93, de 17.09.2015 estabeleceu que as suas disposições aplicam-se aos contribuintes optantes pelo Simples Nacional, em relação ao imposto devido à unidade federada de destino.
Porém, em sede da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5464 o Ministro Dias Toffoli concedeu medida cautelar, ad referendum do Plenário, para suspender a eficácia da cláusula nona do Convênio ICMS nº 93/2015 editado pelo CONFAZ, até o julgamento final da ação[15].
O Ministro Dias Toffoli ressaltou em sua decisão que o disposto na Cláusula nona do Convênio ICMS 93/2015 invade campo de lei complementar. Assim, a aplicação da Emenda Constitucional nº 87 aos optantes do Simples Nacional, resultará um concreto aumento de carga tributária e não mera repartição de receita do ICMS entre as unidades da federação de origem e destino das operações nessa sistemática, haja vista, que a responsabilidade pelo recolhimento do diferencial de alíquota é do remetente.
Desse modo, nas operações interestaduais que destinem mercadorias ou serviços a consumidor final, não contribuinte do ICMS, promovidas por contribuinte optante pelo Simples Nacional, o imposto devido será calculado segundo as disposições constantes do artigo 18 da Lei Complementar n° 123, de 14 de dezembro de 2006.
A Coordenadoria da Administração Tributária – CAT expediu o Comunicado CAT-08, de 19.02.2016, esclarecendo que os contribuintes optantes pelo Simples Nacional que realizarem operações e prestações interestaduais que destinem bens e serviços a consumidor final não contribuinte do ICMS ficam desobrigados de recolher a parcela do imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a alíquota interestadual que cabe ao Estado de São Paulo em relação aos fatos geradores ocorridos a partir de 18-02-2016[16].
3. Posicionamento da Consultoria Tributária com relação às operações interestaduais com mercadorias e serviços destinadas a consumidor final, não contribuinte do ICMS.
As disposições introduzidas pela Emenda Constitucional nº 87/2015 alteraram substancialmente as regras do ICMS nas operações interestaduais, gerando muitas dúvidas por parte dos contribuintes (remetentes das mercadorias).
Assim, transcrevemos duas Ementas de Respostas de Consultas Tributárias disponibilizadas no site da Sefaz/Sp, envolvendo questões relativas à diferenciação entre operação interna[17] e interestadual e aplicação de redução de base de cálculo e isenção[18].
4. Considerações Finais
As disposições introduzidas pela Emenda Constitucional nº 87/2015 promoveram alterações substanciais nas operações interestaduais com mercadorias e serviços destinados a consumidor final, não contribuinte do ICMS, mediante aplicação da alíquota interestadual.
Assim, o remetente da mercadoria é responsável pelo recolhimento do imposto correspondente ao diferencial de alíquota, observada a regra de partilha.
Cabe ressaltar que por intermédio do Protocolo ICMS 21, de 1º de abril de 2011, os Estados dele signatários estabeleceram disciplina visando à exigência do ICMS nas operações interestaduais que destinassem mercadoria ou bem a consumidor final, cuja aquisição tivesse ocorrido de forma não presencial no estabelecimento remetente.
Porém, em 17 de setembro de 2014 por unanimidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) declarou a inconstitucionalidade do Protocolo ICMS 21/2011, do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), que exigia, nas operações interestaduais por meios eletrônicos ou telemáticos, o recolhimento de parte do ICMS em favor dos estados onde se encontram consumidores finais dos produtos comprados. Para os ministros, a norma viola disposto no artigo 155 (parágrafo 2º, inciso VII, alínea b) da Constituição Federal.
Contudo, as alterações objeto desse estudo decorreram de Emenda Constitucional não padecendo do vício de inconstitucionalidade, e atendendo os anseios das Unidades da Federação no sentido da partilha do ICMS nas operações interestaduais destinadas a consumidor final não contribuinte do ICMS, com exceção dos contribuintes optante pelo Simples Nacional aos quais não se aplicam as novas regras do ICMS, tendo em vista a concessão de medida liminar em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade pelo ministro Dias Toffoli do Supremo Tribunal Federal.
Por outro lado, o contribuinte remetente é responsável pelo recolhimento do diferencial de alíquota, além do cumprimento das novas obrigações acessórias instituídas pelo Convênio ICMS 93/2015 e pelas legislações das demais Unidades da Federação sobre o referido tema.
BIBLIOGRAFIA
CARRAZZA, Roque Antonio. Icms. 16. ed. rev. e ampl. São Paulo: Malheiros Editores, 2012.
MELO, José Eduardo Soares de. Icms teoria e prática. 11 ed. São Paulo: Dialética, 2009.