As formas de violência sexual detectivas na seara infantil

01/09/2016 às 02:58
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O presente artigo tende a examinar quais as expressões de violência sexual deflagradas em desfavor de crianças e adolescentes, de modo a estatuir as peculiaridades que circundam cada manifestação de violência infanto-juvenil.

A inserção da violência sexual na ótica infantil,é sem dúvida uma das formas de manifestação da violência intentada contra crianças que pode ser detectada com maior veemência e relevo no contexto infantil.

Esta forma peculiar de violência contra crianças apresenta-se sob diversas nuances, adquirindo, pois, peculiaridades específicas, de acordo com o tipo de violência sexual infantil a ser empregada. Verifica-se a prática do abuso sexual em desfavor de crianças vislumbrando-se a satisfação da lascívia sexual do infrator, sendo esta delineada em detrimento da liberdade sexual da criança e do respeito à dignidade da pessoa humana da qual são detentores, segundo previsão constitucional.

Observa-se, ainda que em nosso atual contexto social, crescente é a incidência da violência sexual infantil, seja mediante a consecução desta no seio familiar, caracterizando assim a inserção da violência sexual intra-familiar ou incestuosa na ótica familiar infantil, ou ainda através de vários outros meios de contato sexual com o menor distintos do âmbito familiar, haja vista que o abuso sexual infantil pode ser perpetrado em contextos diversos do que circunda a ótica familiar.

Assim, entender-se-á por violência sexual infantil toda e qualquer forma de coação que vislumbra a obtenção de satisfação sexual do infrator em desfavor daqueles que perfazem idade de 12 anos (denominação atribuída a crianças segundo entendimento adotado pelo ECA em consonância com o critério etário).

Corroborando entendimento apto a conceituar o que vem de fato a ser definido por violência sexual infanto-juvenil, dispõe Hernane Elesbão Wiese (2009 on line):

[...] configura-se a violência sexual como todo ato ou jogo sexual, relação hetero ou homossexual, entre um ou mais adultos e uma criança ou adolescente, ou utilizá-la para obter uma estimulação sexual sobre sua pessoa ou de outra pessoa. Ressalte-se que em ocorrências desse tipo, a criança é sempre vítima e não poderá ser transformada em ré.

Prossegue explicitando o referido entendimento quanto à finalidade precípua almejada pelo abusador que molesta sexualmente crianças e adolescentes, assim entendendo Hernane Elesbão Wiese (2009, on line):

[...] A intenção do processo de Violência Sexual é sempre o prazer (direto ou indireto) do adulto, sendo que o mecanismo que possibilita a participação da criança é a coerção exercida pelo adulto, coerção esta que tem raízes no padrão adultocêntrico de relações adulto-criança vigente em nossa sociedade.[...]

Podemos observar a prática desta toda vez que um adulto vier a constranger ou coagir crianças a satisfazer seus desígnios sexuais, seja mediante a consecução de violência psicológica ou física empregada em desfavor do menor.

Expõem-se adiante as devidas análises acerca dos aspectos históricos desta forma de violência visualizada na seara infantil, bem como efetua-se a observância das formas de abuso sexual praticada em desfavor de menores, observando-se, por conseguinte, a ingerência desta mazela social nas diversas etapas da evolução social da humanidade, bem como traçando a respectiva conceituação acerca da pedofilia, segundo entendimento corroborado pela psicanálise, explicitaremos as peculiaridades deste distúrbio sexual que culmina com a prática da violência sexual na ótica infantil, analisando as formas como pode delinear-se a violência sexual infantil, as especificidades e conseqüentes nuances e peculiaridades que circundam esta forma abjeta de violência perpetrada contra inúmeras crianças nos dias atuais.

1. Aspectos históricos

Ressaltando-se a análise da evolução histórica da humanidade, detectamos a ingerência no seio social do relacionamento sexual efetuado com crianças nas mais diversas etapas da história dos povos primitivos.

Observa-se ainda que a prática sexual com menores passou a adquirir aspectos bastante peculiares com o deslinde da evolução sócio-cultural no tempo. Contudo, mister se faz destacar que sempre pôde ser detectada a prática sexual com crianças no âmbito social, desde os tempos mais remotos até os nossos dias atuais.

Assim sendo, salienta-se a existência da prática sexual realizada com crianças de acordo quanto aos aspectos históricos da evolução social. Ressalta-se que a mesma não se mostra como vicissitude integrante do âmbito social em caráter recente, posto que se detecta a incidência desta desde as mais remotas sociedades antigas.

Nesta ótica, ressalta Thiago Borba Calixto dos Santos (2009, on line) explicitando cocatenadamente o quão corriqueiro era o relacionamento sexual perpetrado com crianças desde os tempos mais remotos, assim dispondo: “Nas culturas primitivas, o relacionamento sexual com crianças e pessoas do mesmo sexo era tolerado e, sobretudo, admirado, dando-se a iniciação sexual em cerimônias que envolviam magia, crença e rituais de cura”.

No Antigo Egito, a incidência de vantagens sexuais dos poderosos faraós sobre as crianças egípcias apresentava-se como prática inerente aos costumes sociais daqueles povos, sendo a referida prática acerca da violência sexual intentada contra menores no âmbito da sociedade egípcia empregada com bastante freqüência, constituindo-se, pois de práticas habituais daquela sociedade o relacionamento sexual com crianças.

Percorrendo ainda a análise dos aspectos históricos e culturais da humanidade, verificamos a incidência do envolvimento sexual com crianças também nas sociedades antigas que sucederam o Antigo Egito na escala de evolução sócio-cultural da humanidade, incidindo, o costume de empregar práticas sexuais com menores inclusive no seio de sociedades mais evoluídas, como é o caso de Roma e da Grécia Antiga.

Nestas, pode-se verificar outras nuances quanto ao emprego do abuso sexual infantil, ressaltando-se a ingerência habitual acerca do relacionamento sexual infantil. No seio da sociedade romana consistia costume e tradição dos povos a inserção na vida sexual, bem como a prática do primeiro contato com a sexualidade por intermédio do patriarca da família, caracterizando-se, assim, campo propício à proliferação do homossexualismo entre crianças e adolescentes (destaca-se ainda o quão costumeira tornou-se a verificação de práticas homossexuais na Grécia Antiga). Foi no seio da cultura grega que surgiu o uso da expressão efebo de modo a denominar os jovens de sexo masculino que eram inseridos na vida sexual e social por um homem mais velho.

Ao tecer comentários acerca da evolução histórica da humanidade vislumbrando-se paralela a esta a prática sexual infantil, ressalta Thiago Borba Calixto dos Santos (2009, on line) quanto a verificação do relacionamento sexual a qual eram submetidas às crianças no âmbito da sociedade romana, salientando, por conseguinte, ser no seio familiar da sociedade romana que efetivou-se a prática de relações incestuosas delineadas no âmbito familiar, assim, dispondo o referido autor:

Na sociedade romana a pater famílias possuía a pater potestas, poder quase absoluto sobre os que dele dependiam. Nessa condição, responsabilizava-se, inclusive, pela iniciação sexual do filius. A prática do sexo entre o pater famílias e o filius estava inteiramente fora do controle do Estado, posto que aquele tinha o poder de vida e de morte sobre este, agindo como verdadeiro dominus. (SANTOS, 2009, on line)

Ademais, destaca-se ainda a inserção da prática sexual com crianças inclusive na ótica de países do Oriente. Nestes também pôde-se ver a constante incidência da relação sexual com menores, observando-se a efetivação do envolvimento sexual infantil de modo a satisfazer os desígnios sexuais dos antigos samurais. Mister se faz ressaltar, o quão habitual era no mundo oriental o sexo entre adultos e crianças, observando-se a ingerência das práticas sexuais delineadas nestes moldes entre os samurais com suas jovens amantes, que apesar de denotarem experiência sexual ainda quando meninas, somente podiam emancipar-se quando atingissem a idade adulta.

Durante a Idade Média, diferentemente das demais sociedades mencionadas anteriormente, toda e qualquer forma de exploração, abuso, envolvimento ou prática sexual com crianças foram incansavelmente combatidas em toda a Europa. Mas, em contraposição ao ferrenho combate à estas práticas sexuais na ótica infantil no período da Idade Média, o ideal de beleza feminina cultuado durante o período Renascentista, era praticamente infantil, denotando certa oposição ao ideário de preservação da liberdade sexual infantil almejada durante a Idade Média.

No âmbito das sociedades modernas, diferente não é a realidade do envolvimento sexual infantil com pessoas que denotam idade adulta, vislumbrando-se claramente a mesma ao verificarmos o caso de um dos maiores pedófilos existentes nos dias atuais o escritor inglês Lewis Carrol, autor de um dos maiores contos infantis da modernidade, Alice no País das Maravilhas (de 1865). O referido autor tinha como hábito corriqueiro fotografar e observar menininhas em parques, desejando-as sexualmente. O intenso desejo sexual do escritor por crianças foi o motivo principal quando da elaboração do clássico conto do autor, posto que o nome designado à obra foi estabelecido em “homenagem” a uma jovem menina de apenas 4 (quatro) anos de idade chamada Alicia Lindell, garota assediada constantemente pela lascívia do renomado escritor.

No Brasil, pode-se verificar a prática desta vicissitude inerente à evolução sócio-cultural da humanidade desde os primórdios da colonização brasileira pelos portugueses, haja vista que as indígenas eram ainda meninas submetidas brutalmente à satisfazer a lascívia sexual dos “desbravadores da terra desconhecida”, Neste contexto, vale destacar a costumeira prática de violência física em desfavor das jovens meninas que se opunham à atender às ordens dos homens portugueses que no Brasil desembarcavam, quanto à prática sexual com eles, vindo por várias vezes inclusive à culminar na morte das jovens nativas tidas como “rebeldes” por negar-se a manter relacionamento sexual com os colonizadores.

A verificação da violência sexual infantil, principalmente em desfavor da criança que denotasse sexo feminino continuou a ser observada no contexto da evolução histórico-cultural da sociedade brasileira, adquirindo com o passar dos anos determinadas peculiaridades. No período onde podemos observar a prática da escravidão negra delineada na ótica da sociedade brasileira recém-colonizada, podemos detectar efetivamente o abuso sexual perpetrada em desfavor de jovens garotas negras que satisfaziam os desejos sexuais de seus donos, que na grande maioria das vezes eram ricos fazendeiros donos de terras, casados e possuidores de uma tradicional família burguesa daquela época. Além de serem vitimadas por ter de manter relacionamentos sexuais com seus donos, as jovens escravas ainda eram torturadas e até mortas por suas patroas, esposas dos ricos fazendeiros, que eivadas de ciúmes e ódio não mediam esforços em livrar-se das jovens escravas, atribuindo a elas o envolvimento sexual perpetrados com seus maridos.

Inenarráveis são os casos de verificação da prática e do envolvimento sexual com crianças observadas nas culturas primitivas. No entanto, com a evolução histórico-social da humanidade, houve também a modificação dos costumes que integram o seio social, assim sendo, ressalta-se que, práticas anteriormente tidas como costumeiras passaram a adquirir contornos tolerados e posteriormente vedados sendo inclusive combatidos no âmbito social, posto que, com o decorrer do tempo a prática sexual com crianças passou a ser repudiada no seio social sendo, pois, combatida a prática desta. Contudo, apesar do veemente combate à exploração sexual infantil, a mesma ainda subsiste em nosso atual contexto social.

2. Conceito de pedofilia

A pedofilia consiste precipuamente na verificação de atração e desejo sexual de indivíduo adulto por crianças de tenra idade, sendo entendido pela grande maioria dos estudiosos em psicanálise como um distúrbio mental.

Assim sendo, interessante faz-se destacar que, segundo alguns estudiosos em psicanálise, imprescindível se faz para a caracterização do pedófilo o estabelecimento de uma distinção de caráter etário entre o mesmo e a criança de um lapso temporal mínimo de 5 (cinco) anos entre a idade do abusador e a da criança abusada para poder verificar-se a incidência da pedofilia. No entanto, segundo o entendimento predominante corroborado por alguns sexólogos, crê-se que a pedofilia como distúrbio de índole sexual pode ser diagnosticada tanto na seara mental de um indivíduo adulto, quanto daquele que encontra-se na adolescência, podendo portanto ser classificado como pedófilo inclusive adolescentes que perfazem os requisitos de desejo e atração sexual instintiva por crianças.

A Organização Mundial de Saúde entende que a pedofilia apresenta-se como uma desordem mental e de personalidade que assola a mente de indivíduo adulto, sendo também entendida como um distúrbio sexual.

Segundo entendimento corroborado por estudiosos da psicanálise e sexologia acerca da pedofilia, para ser classificado como pedófilo, faz-se necessário o preenchimento de alguns requisitos caracterizadores da pedofilia a saber: dentro de um lapso temporal de no mínimo 6 (seis) meses, detectar-se intenso desejo e atração por crianças, bem como a observância de fantasias sexuais envolvendo menores que denotam idade aproximadamente inferior a 13 (treze) anos; frustração em face da impossibilidade de satisfação sexual diante das dificuldades de exteriorização dos desejos sexuais que culminam na verificação de elevados níveis de estresse, bem como de dificuldades interpessoais; e ainda, segundo entendimento minoritário perpetrado no campo da psicanálise acerca dos dados comportamentais do pedófilo, observa-se que o indivíduo detentor de distúrbios sexuais que culminam na verificação da pedofilia há de possuir basicamente mais de 16 (dezesseis) anos de idade, bem como será aproximadamente 5 (cinco) anos mais velho que a crianças vitimada por seus desígnios sexuais perpetradas em desfavor desta .

No entanto, ressalta-se a relativização quanto aos caracteres classificadores da conduta do pedófilo em face da diferença etária mínima de 5 (cinco) anos entre abusador e abusado, haja vista que se assim fosse, inenarráveis seriam os indivíduos classificados de pedófilos simplesmente por encontrar-se no gozo de sua adolescência e viessem a envolver-se emocionalmente com jovem menina de idade pré-púbere, ou seja, perfazendo basicamente entre 12(doze) e 13 (treze) anos de idade.

Note-se, portanto, que para a efetiva caracterização de determinado indivíduo como detentor dos distúrbios de índole sexual denominados por pedofilia, não se faz necessário qualquer tipo de contato físico com a criança, bastando coexistir no âmbito mental do pedófilo o intenso desejo e atração sexual envolvendo crianças. Mas, deve-se verificar se incide no caso concreto a presença dos requisitos que hão de qualificar determinado indivíduo como sendo um pedófilo.

Assim sendo, preceitua Gabriel José Chittó Gauer e Débora Silva Machado (2006, p. 41) corroborando o entendimento que trata a pedofilia como sendo um distúrbio de natureza sexual, assim dispondo:

O diagnóstico de pedofilia esta incluído no grupo de Parafilias, na qual o objeto de excitação caracteriza-se por diferentes objetos, comportamentos ou pessoas. Na pedofilia o foco da excitação está na relação de um adulto com uma criança, envolvendo uma vítima.

Nesse contexto prosseguem quanto à análise acerca dos requisitos básicos que hão de caracterizar a incidência das condutas perpetradas pelo pedófilo, traçando entendimento acerca dos requisitos inerentes à distinção etária mínima entre o pedófilo e a sua vítima, entendendo ainda que a verificação de índole pedofílica só poderá ser detectada se o indivíduo constar com idade mínima de 16 (dezesseis) anos, segundo entendimento disciplinado por Gabriel José Chittó Gauer e Débora Silva Machado (2006, p. 42), a saber:

A pedofilia caracteriza-se por fantasias, impulsos sexuais ou comportamentos sexualmente excitantes recorrentes e intensos envolvendo atividade sexual com crianças ou pré-púberes. A pessoa deve ter pelo menos 16 anos de idade e ser 5 anos mais velha do que a vítima. Indivíduos no final da adolescência envolvidos em um relacionamento sexual contínuo com uma crianças de 12 ou 13 anos não são excluídos.

Ademais, destacam Gabriel José Chittó Gauer e Débora Silva Machado (2006, p. 42) sobre a detectação da pedofilia no âmbito intra e extra familiar, tecendo as diretrizes da pedofilia delineada no âmbito doméstico, vislumbrando, pois, o seguinte entendimento:

[...] o pedofílico pode limitar suas atuações a seus próprios filhos, filhos adotivos, parentes ou crianças de fora da família. Normalmente o pedofílico ameaça a criança para não responder pelos seus atos, ou desenvolve técnicas específicas de manipulação como: seduzir e obter a confiança da mãe da criança, casar-se com uma mulher visando a filha desta, traficar crianças.

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Seguindo acerca da análise comportamental que envolve as atitudes de índole pedofílica, prelecionam Gabriel José Chittó Gauer e Débora Silva Machado (2006, p. 42) sobre a análise da repulsa social que envolve a prática pedofílica, ao tercer os seguintes comentários:

Pedofilia é um transtorno mental grave, crônico e com fortes elementos compulsivos. Essa é uma das parafilias que desperta sanção social mais intensa, com envolvimento extensivo no sistema legal e da própria prisão.

Contudo, verific-se que nem sempre a denominação de pedófilo poderá incidir sobre todos os indivíduos que indistintamente praticam atos sexuais com crianças, posto que a pedofilia em sentido estrito refere-se aos indivíduos dotados de distúrbios sexuais e comportamentais que culminam com a verificação de parafilia específica conceituada de pedofilia.

Os indivíduos caracterizados como pedófilos são assim denominados de acordo com análises inerentes ao ponto de vista clínico que entende pela existência de distúrbio sexual em determinadas circunstâncias, não podendo portanto o termo pedofilia ser utilizado em sentido amplo para designar todos aqueles infratores que abusam e molestam sexualmente crianças.

Observa-se, ainda, que a grande maioria dos crimes de abuso sexual envolvendo crianças são efetuadas por indivíduos que não são classificados de acordo com o ponto de vista científico, clinicamente como pedófilos, vindo estes a intentar grave constrangimento e coação a crianças obrigando-as a praticas atos sexuais por razões diversas, aproveitando-se da situação de fragilidade e vulnerabilidade da vítima infantil abusada. Estima-se que ínfimo seja concretamente o percentual quanto às práticas de abuso sexual infantil praticado por pedófilos propriamente ditos que detêm distúrbios sexuais, perfazendo esta aproximadamente 2% a 10% dos casos de violência sexual infantil, posto que na maioria das vezes a prática deste tipo abominável de violência é efetuada por indivíduos que gozam de plena sanidade psíquica e ausência concreta de distúrbios sexuais.

São estes denominados de abusadores oportunos, regressivos ou situacionais, sendo assim conceituados todos aqueles que não perfazem os caracteres para ser efetivamente enquadrado como pedófilo de acordo com ponto de vista corroborado no âmbito clínico, praticando atos de abuso e violência sexual em desfavor de crianças motivado por condições distintas do transtorno psico-sexual que circundam a lascívia sexual do pedófilo propriamente dito, verificando-se, pois, que estes abusadores não atendem aos critérios regulares de diagnósticos inerentes a pedofilia.

3. Formas de abuso sexual contra crianças

O abuso sexual infantil pode adquirir inenarráveis contornos, sendo perpetrado de peculiaridades sui generis em cada caso específico.

Ressalta-se que, de acordo com o modo em que se dá, bem como em consonância com a intenção almejada pelo infrator, o abuso sexual infantil poderá assumir diversas formas.

De acordo com o modo, o abuso sexual pode ser classificado como intra-familiar ou doméstico e não doméstico. Assim sendo, entender-se-á por abuso sexual intra-familiar toda e qualquer forma de violação apta a concretizar o abuso e constrangimento sexual infantil no âmbito familiar, ou seja, no seio da convivência doméstica do menor.

Acerca desse enfoque, vislumbra-se ainda salientar que a violência sexual infantil intra-familiar ainda poderá assumir duas nuances distintas, posto que a mesma tanto poderá ser intentada por indivíduo integrante da família do menor, verificando-se neste tipo de abuso sexual a existência de vínculo familiar entre a criança e seu abusador, detectando-se, assim, a ingerência da relação incestuosa dentro dos liames da relação sexual intra-familiar; bem como poderá delinear-se no contexto familiar o abuso sexual perpetrado por infrator que não denota vínculo familiar de fato com a criança vitimada, mas que possui contato com o menor em face de ter livre acesso ao convívio familiar da criança abusada, podendo-se assim inserir neste contexto a figura de um dos amigos do pai da criança que com freqüência em demasia encontra-se no âmbito familiar da mesma, bem como o entregador de encomendas que se aproveita da confiança depositada em si pelos pais do menor vitimado para efetuar o abuso sexual em desfavor do mesmo.

Diante de toda esta análise, explicitar-se-á a seguir cada modalidade em que se pode verificar a incidência de abuso sexual infantil, partindo-se precipuamente da consideração do abuso sexual perpetrado mediante duas formas, a saber: o abuso sexual sem contato físico (incidindo neste âmbito as hipóteses de atentado violento ao pudor, assédio sexual, ou pornografia), e o abuso sexual a delinear-se mediante a consecução de contato físico entre a criança e seu abusador (sendo detectada esta forma de abuso sexual nas hipóteses de relações incestuosas, que em sua grande maioria, dar-se-a através de estupro intentado em desfavor de menor, verificando-se ainda o emprego desta modalidade de abuso sexual no âmbito da prostituição infantil).

Ao corroborar entendimento acerca da contextualização que pode ser delineada a prática do abuso sexual infantil, dispõe Luíza F. Habigzang, Sílvia H. Koller, Gabriela Azen Azevedo e Paula Xavier Machado (2005, on line):

O abuso sexual também pode ser definido, de acordo com o contexto de ocorrência, em diferentes categorias. Fora do ambiente familiar, o abuso sexual pode ocorrer em situações nas quais crianças e adolescentes são envolvidos em pornografia e exploração sexual. No entanto, a maioria dos abusos sexuais cometidos contra crianças e adolescentes ocorre dentro de casa e são perpetrados por pessoas próximas, que desempenham papel de cuidador destas. Nesses casos, os abusos são denominados de intrafamiliares ou incestuosos.

Contudo, mister faz-se destacar que essa discriminação quanto às formas de abuso sexual perpetrada na ótica infantil não se mostra discriminada em caráter absoluto, haja vista que poderão ser detectadas algumas hipóteses de consecução de abuso sexual em uma relação incestuosa que veio a ser efetuada sem a necessária ingerência da prática de contato físico entre a criança e seu abusador, posto que o contato físico não integra de fato o núcleo do delito de abuso sexual, não excluindo-se, pois, a efetiva manifestação do mesmo mediante a verificação da ausência de um de seus elementos agravantes, o qual seja, o emprego de contato físico com o menor, posto que, o objetivo basilar intentado pelo abusador atinge seu ápice no devido momento em que o mesmo efetua a coação ou o constrangimento em desfavor da criança e satisfazer sua lascívia sexual.

Entende-se portanto que o abuso sexual apresenta peculiaridades multifatoriais, encontrando-se, adstrito aos contextos inerentes aos grupos sociais, culturais, econômicos ou históricos que acabam por moldar essa ou aquela forma de violência sexual que deverá delinear-se naquele âmbito específico.

3.1 A relação incestuosa e a violência sexual intra-familiar

Entender-se-à por relação de índole incestuosa toda aquela que vier a possuir como característica básica a existência de relação amorosa, e/ou sexual entre sujeitos que integram o mesmo grupo familiar, pertencentes a mesma família.

Apesar de bastante repudiada no seio social, a ingerência de relações incestuosas não se constitui conduta delituosa tipificada no bojo da norma penal, ressalvando-se pois, que a prática incestuosa só irá ser configurada como crime quando esta for empregada contra menores, mesmo que esta venha à delinear-se nos contornos familiares com a anuência deste, ou seja, não será criminosa a prática do incesto desde que não venha a se configurar com indivíduos que denote idade apta à enquadra-lo de acordo com o contexto infantil.

Portanto, o incesto não será qualificado como delito de abuso sexual se não vier à ser empregado contra menores de 14 (quatorze) anos, visto que, caso contrário restará configurada a relação incestuosa em consonância com os caracteres de violência sexual infantil. Assim sendo, verificamos a tipificação legal da conduta incestuosa mesmo ainda que esta venha a delinear-se sem o emprego de violência em desfavor do menor, pois, de acordo com os ditames albergados no bojo da norma penal brasileira, restará configurada a hipótese de violência presumida.

Verifica-se portanto que o consentimento quanto à prática do ato sexual de uma criança não apresenta validade jurídica perante os preceitos da norma penal brasileira.

Albergando entendimento minucioso acerca da caracterização quanto à análise de relações incestuosas na ótica intra-familiar, bem como acerca do perfil do abusador e da criança vitimada, preleciona Luíza F. Habigzang, Sílvia H. Koller, Gabriela Azen Azevedo e Paula Xavier Machado (2005, on line):

O abuso sexual intra-familiar é desencadeado e mantido por uma dinâmica complexa. Tal dinâmica envolve dois aspectos que apresentam-se interligados: a ‘Síndrome de Segredo’, que está diretamente relacionado com a psicopatia do agressor (pedofilia) que , por gerar intenso repúdio social, tende a se proteger numa teia de segredo, mantido às custas de ameaças e barganhas á criança abusada; e a ‘Síndrome da Adição’ caracterizada pelo comportamento compulsivo do descontrole de impulso frente ao estímulo gerado pela criança, ou seja, o abusador por não se controlar usa a criança para obter excitação sexual e alívio de tensão, gerando dependência psicológica e negação da dependência. (HABIGZANG, KOLLER, AZEVEDO, MACHADO, on line)

Nesse diapasão, observamos que a violência sexual intra-familiar nem sempre poderá ser classificada como de natureza incestuosa, posto que verifica-se a possibilidade de efetivação da mesma por pessoa distinta daquelas que integram o mesmo âmbito familiar do menor.

Ressalta-se ainda quanto ao abuso sexual intra-familiar e as nuances da relação incestuosa, a possibilidade de verificação desta em ótica eminentemente distinta das que perfazem a conduta delituosa tipificada no bojo da norma penal, haja vista que poderá ser detectada a prática de relações incestuosas que não perfazem os requisitos de uma violência sexual intra-familiar propriamente dita ante a ausência de dolo por parte do possível abusador, observando-se nítida concretização da referida hipótese no caso de primos que denotam tenra idade, o qual seja 13 e 16 anos respectivamente e que mantêm relação conjugal no âmbito familiar.

Quanto à manutenção de relações sexuais entre menores de faixa etária assemelhada no delineada no âmbito familiar, estaria, pois afastada a incidência da violência sexual intra-familiar, não podendo incidir sequer a violência ficta ou presumida, posto que ambos os indivíduos denotem tenra idade e ambos anuíram livremente quanto à consumação da conjunção carnal.

Partindo para a análise da manifestação conjunta da incidência da violência sexual intra-familiar nos contornos de uma relação incestuosa, verificamos que inenarráveis são os casos onde pode ser detectada a incidência conjunta destas, constituindo-se neste diapasão a prática mais comum de violência a ser delineada no âmbito familiar em desfavor do menor.

Nesse enfoque explicita a Dra. Lekissandra Gianis (2007, on line) quanto a incidência da prática de relação incestuosa perpetrada no contexto de violência sexual intra-familiar, assim dispondo:

O incesto está ligado à idéia de proibido e parece ser um assunto que não se pode falar. Trata-se de uma violência silenciosa, pois ocorre dentro de casa. É um dos grandes segredos mais bem guardados. São consideradas incestuosas, geralmente, as relações entre pais, padrastos e filhos, entre irmãos ou meio irmãos, ou entre tios e sobrinhos. (GIANIS, on line)

Assim sendo, prossegue a Dra. Lekissandra Gianis (2007, on line), corroborando entendimento acerca das relações incestuosas como sendo estas uma espécie de manifestação violência doméstica ou intra-familiar:

[...] É uma forma de violência doméstica contra a criança e o adolescente e tem sido nos últimos anos, alvo de interesse e preocupação dos pesquisadores do desenvolvimento infantil, principalmente no que se refere às conseqüências e seqüelas psicológicas. Acontece muito mais do que se imagina, causando seq6uelas físicas, psicológicas e sociais. A lei do silêncio acontece na maioria dos casos.

Ao preceituar entendimento acerca do âmbito em que se verifica com maior incidência a prática de violência sexual intra-familiar e as respectivas peculiaridades deste tipo de abuso sexual infantil, preleciona Ceila Sales de Almeida (2006, on line):

Uma das formas de abuso de maior incidência na sociedade atual é a violência sexual intra-familiar. Essa forma de violência é a que ocorre no recinto do afeto, ou seja, na família, escola, igreja, abrigos, círculos de amizades ou ambientes vistos como de proteção ao menor. Pode ocorrer dentro do círculo familiar de um pai, padrasto, irmão ou qualquer outro membro da família, na casa de um vizinho, de uma pessoa que cuida do menor, na escola ou em qualquer outro ambiente que a criança se sinta segura e que o adulto se utilize de sua fragilidade e falta de defesa. Geralmente o abusador é alguém muito próximo à criança, uma pessoa que ela conhece e confia e que se encontra inserida em seu círculo familiar.

Nesse sentido, importante se mostra explicitar o caráter abjeto da violência sexual infantil perpetrada na ótica intra-familiar sob os contornos de uma relação de índole incestuosa; cumulando, pois, concomitantemente no íntimo da criança violentada a ingerência quanto à manifestação da violência sob suas diversas modalidades o qual seja física e psíquica, passando o menor a vivenciar dias de suplício, haja vista que a verificação de violação a sua dignidade e liberdade sexual apresenta-se maculada pela figura de seu próprio familiar, pessoa esta que presumivelmente detêm a confiança e o respeito da criança, sendo na figura do abusador que integra o seio familiar que via de regra, o menor deposita todas as suas expectativas de segurança e proteção ante sua fragilidade e vulnerabilidade infantil, de pessoa em desenvolvimento.

Assim sendo, detectamos quanto à inserção da relação sexual incestuosa infantil, a completa ausência de proteção à dignidade do menor, encontrando-se o mesmo em pleno desamparado diante do problema que à ele se mostra, sendo pois a criança eivada de transtornos psíquicos em face da coação e do constrangimento que passa à vivenciar, não podendo sequer socorrer-se ao amparo dos demais familiares por não almejar a destruição de sua estrutura familiar; sofrendo portanto, não só pela mácula em seu corpo, em sua inocência (ante as conseqüências do abuso à que fora submetido), mais violentado em toda a sua concepção de família, de dignidade, de liberdade sexual, integridade física e psíquica, e mais ainda maculado quanto aos seus ideais de proteção e respeito familiar.

3.2 Atentado violento ao pudor

Entende-se o atentado violento ao pudor como sendo uma das formas de manifestação do abuso sexual na ótica infantil, caracterizando-se pela presença de contato físico entre o abusador e o menor que denota peculiaridades específicas.

O atentado violento ao pudor denota como requisito a prática de qualquer forma de ato libidinoso distinto da conjunção carnal em desfavor do menor. Assim sendo, podemos elencar neste contexto os mais diversos tipos de atos libidinosos à saber: a prática de coito anal, sexo oral, felação, dentre outras formas que tem por finalidade efetivar a prática do ato libidinoso.

Nesse contexto, disciplina Ceila Sales de Almeida (2006, on line) acerca da conceituação do delito de atentado violento ao pudor dentro da ótica do abuso sexual infantil: “Uma das formas de abuso sexual com contato físico é o atentado violento ao pudor, que ocorre quando se constrange o menor, mediante violência ou grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal”.

Nesse diapasão, salienta-se que o atentado violentado ao pudor poderá manifestar-se de dois modos, a saber: mediante o emprego de constrangimento que culmina com a coação do menor a efetuar praticas libidinosas diversas da conjunção carnal, exigindo-se assim, o emprego por parte do menor coagido de uma obrigação de fazer, observando-se a caracterização deste tipo de atentado violento ao pudor quando emprega-se coação contra um menor obrigando-o a efetuar práticas caracterizadoras da felação em seu abusador.

Explicitando nuances opostas quanto à caracterização de outra forma de manifestação do atentado violento ao pudor delineado em desfavor do menor, entender-se-à caracterizado o atentado violento ao pudor também quando o mesmo consumar-se mediante a “anuência” por parte do menor para que com ele seja praticado, mediante o emprego da violência ou grave ameaça por parte do abusador, toda conduta apta à satisfazer a lascívia sexual do abusador, distinta da conjunção carnal, que busque efetivar o emprego de ato libidinoso por parte do abusador à ser intentado em desfavor do menor.

Aqui, o que se espera detectar para a caracterização do delito em comento é o emprego de uma obrigação de não fazer instituída ao menor violentado, haja vista que os atos libidinosos distintos da conjunção carnal hão de ser concretizados mediante atividade comissiva empregada pelo abusador. Esta modalidade de atentado violento ao pudor pode ser detectada na hipótese de consumação do coito anal ou do sexo oral intentada pelo abusado contra a criança violentada.

Neste sentido, há de entender-se haver a incidência desta forma de abuso sexual infantil, toda vez que se possa detectar o emprego de violência sexual infantil, mediante o emprego de contato físico entre uma criança e o abusador que há de culminar na prática de qualquer tipo de ato libidinoso diverso da conjunção carnal.

3.3 Estupro

O estupro pode ser entendido como espécie de violência sexual infantil onde se atinge o ápice de violações dos direitos inerentes à liberdade sexual e à dignidade da quanto à pessoa do menor, haja vista que este tipo de abuso sexual abrange todos os outros tipos de violência sexual intentada na ótica infantil que fora mencionado anteriormente, culminando, pois o estupro numa somatória de todas as outras formas de violações, constrangimentos e coações praticadas em desfavor da criança.

Assim sendo, poderá manifestar-se a prática do estupro em intentado em desfavor do menor como outra modalidade de violência intra-familiar, quando este vier a ser empregado no seio do âmbito doméstico do menor. Poderá o estupro apresenta-se também através de relações incestuosa, quando puder ser detectada a prática do mesmo por pessoas que integram o vínculo familiar com o menor. O estupro abrange ainda a possibilidade de manifestação da violência física, bem como da violência psíquica perpetrada em desfavor do menor, haja vista a incidência de contato físico, bem como o emprego de coação e do constrangimento contra a criança por seu abusador.

Entende-se, pois o estupro como outra subespécie de violência ou abuso sexual intentada através do contato físico entre a criança e seu agressor, onde se observa o uso de violência ou grave ameaça por parte do abusador em detrimento à liberdade sexual e integridade física do abusado, com o fito de obter qualquer tipo de vantagem de caráter sexual, mas especificamente busca-se concretizar a prática da conjunção carnal com a criança violentada, atingindo-se o ápice da violência sexual mediante estupro em desfavor do menor com a consumação dos atos de penetração do agressor em detrimento do agredido (incidindo, pois, na caracterização da prática de conjunção carnal). Nesse sentido cabe ressaltar que, só é possível visualizar essa modalidade de abuso sexual infantil quando o abusador denotar sexo masculino (somando-se a este fator o emprego por parte do sujeito que possua sexo masculino de qualquer forma de coação ou constrangimento que tenha por finalidade a obtenção de vantagem sexual), em desfavor de crianças que para constituírem-se vítimas desse tipo de delito hão de ser detentoras do sexo feminino.

Segundo Ceila Sales de Almeida (2006, on line), o estupro intentado em desfavor de crianças pode ser conceituado como forma de abuso sexual com a verificação da presença de contato físico a ser consumado através do emprego de violência física ou psicológica que implica em “constranger uma menor à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça”.

Ressaltamos ainda que o estupro delineado em desfavor de crianças denota duas modalidades bastante peculiares não visualizados até então nas demais formas de abuso sexual infantil exposta, haja vista que o estupro poderá manifestar-se mediante o uso de violência real perpetrada pelo agressor, mostrando-se ainda através do emprego de violência ficta ou presumida.

Neste sentido, entender-se-á por violência real apta a efetuar o estupro, toda manifestação de atos de coação ou constrangimento que denote o uso de violência ou grave ameaça. Diferentemente dos contornos albergados pela violência real, a violência ficta ou presumida não perfaz o preenchimento do requisito inerente ao uso de violência ou grave ameaça em desfavor do menor, sendo vislumbrada, por conseguinte a prática desta quando detectada a anuência do menor quanto à prática do ato sexual com pessoa adulta para que possa restar configurada essa modalidade de violência advinda do estupro. No entanto, por denotar idade que o caracteriza como sujeito de direitos dotado de caracteres próprios, como a condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, não possui o menor, portanto, pleno discernimento que o torne inteiramente apto a deliberar acerca de seu próprio corpo, bem como acerca de sua respectiva liberdade sexual.

Ao corroborar no âmbito da norma penal entendimento acerca da inserção de violência ficta do estupro delineado na ótica infantil, pautou-se precipuamente o legislador pelo entendimento que busca evitar a obtenção de qualquer tipo de vantagem ilícita através do emprego de favores sexuais por parte do menor com os infratores que alimentam o infindável mercado da prostituição infantil.

Apesar da existência de previsão legal quanto ao emprego sanção em caso de verificação da prática de violência ficta nas hipóteses de estupro perpetrado em desfavor do menor, deverá o magistrado pautar-se pelas devidas cautelas, posto que a conjunção carnal possa vir a adquirir nuances completamente distintos daqueles que hão de caracterizar, em sentido estrito, a prática do abuso sexual infantil, podendo inclusive ser verificada a mesma fora dos contornos que integram a violência sexual, na hipótese de um jovem casal de namorados onde estes detêm respectivamente idade aproximada de 13, e o outro 14 anos, caso estes entendam por consumar a prática da conjunção carnal, verificamos, pois que estaria completamente afastada a hipótese de aplicação dos ditames e preceitos que integram a caracterização da violência ficta ou presumida no caso de estupro contra crianças, haja vista a ausência de tipicidade dentro dos contornos da ótica da norma penal, descaracterizando o ato da conjunção carnal ora mencionada, ante a ausência quanto ao emprego de violência, bem como ressaltamos também quanto a inserção da conjunção carnal consumada entre jovens de tenra idade como modalidade de violência ficta, em face da verificação de anuência de ambas as partes quanto à prática da conjunção carnal.

Neste sentido, corroborando entendimento constante no âmbito dos tribunais, bem como de seus respectivos entendimentos jurisprudenciais, segundo o STJ, dispõe Tiago Emboaba Dias (2005, on line), traçando entendimento acerca da possibilidade de aplicação mediante o emprego da relativização quanto à presunção de violência no caso do estupro presumido em desfavor de menor, quando verificada a ausência do uso de violência (assim entendida em sentido estrito) atrelada a respectiva anuência por parte do menor quanto à consumação da conjunção carnal, assim dispondo:

Recurso especial não reconhecido. (STJ – Rel. Fernando Gonçalves – DJ DATA 24/05/1999 – PÁGINA 207 – STJ000265672).

No crime de estupro, a presunção de violência prevista no art. 224,a, do CP é relativa. Assim, pode ser afastada se a vítima, ainda que com 12 anos de idade, não era ingênua ou inexperiente e tinha capacidade de autodeterminação, com clara ciência da importância do ato que praticava(STJ – Resp – Rel. Edson Vidigal – j. 13.10.1998 – RT 762/580) (DIAS, on line)

Portanto há de entender-se praticada o estupro (assim entendido como aquele que denote o uso de violência real) em desfavor de crianças toda vez que se puder visualizar-se o emprego de grave ameaça perpetrado pelo abusador que denote sexo masculino em detrimento de criança que eminentemente possua sexo feminino, forçando a esta à com ele praticar relações sexuais, utilizando-se para isto do emprego de violência física empregada contra o menor, ou realizando ameaças verbais, observando-se, pois, o emprego da coação para satisfazer-se a lascívia e os desígnios sexuais do abusador.

3.4 Assédio sexual

Denomina-se assédio sexual como sendo todo tipo de abuso sexual infantil que poderá ser empregado mediante a manifestação ou não de contato físico com o abusador, dependendo para a caracterização desta espécie de violência sexual intentada contra o menor da intensidade da coação e do constrangimento efetuada pelo abusador sobre o abusado podendo-se vislumbrar a prática do assédio sexual através do emprego uma dessas modalidades.

Ao dispor acerca da conceituação inerente ao assédio sexual entendendo tratar-se o mesmo como de mais um tipo de abuso apto a manifestar-se na seara infantil, preleciona Ceila Sales de Almeida (2006, on line), acerca das características que hão de efetuar a distinção desta outra forma de manifestação do abuso sexual perpetrado contra crianças, entendendo, pois, que o assédio sexual trata-se de um mecanismo apto à “constranger o menor com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior.”

Neste diapasão, verifica-se que o delito de assédio sexual infantil caracteriza-se como crime próprio, haja vista que deverá perfazer requisitos peculiares para incidir a configuração deste tipo de abuso sexual, o qual seja o requisito de que deverá o abusador do delito em tela ser detentor da condição de superior hierárquico do menor para que possa restar configurada a prática do assédio sexual na seara infantil. Como, via de regra, criança não dispõe de relação empregatícia, nem de qualquer tipo de vínculo de subordinação oriunda de relações de trabalho, haja vista expressa vedação constante no bojo da norma constitucional quanto à prática do trabalho infantil, entender-se-á analogicamente por agente que possua condição hierárquica superior à do menor, toda e qualquer pessoa à qual a criança encontre-se, mesmo que temporariamente subordinada, como pode ser verificada no caso dos diretores de escolas e creches, professores, babás e motoristas de transportes escolares ao qual está vinculada a criança, fazendo-se de suma importância a verificação de situação de subordinação desta em face do abusador, sendo portanto aplicado o entendimento desta subordinação do menor forma análoga à previsão que alberga a ingerência da condição de subordinação hierárquica, haja vista a necessidade do uso de influência apta à ocasionar certo temor reverencial do abusador sobre o menor.

3.5 Pornografia infantil

A pornografia infantil pode ser entendida como a forma de obtenção de vantagem sexual em desfavor de uma criança que não denota necessariamente o emprego de contato físico entre o abusador e o menor, haja vista que se constitui em tipo de abuso sexual que pode ser delineado através da mera exposição do menor que tenha por finalidade a satisfação dos desígnios sexuais do abusador.

A verificação da pornografia infantil pode ser vislumbrada sob diversos enfoques haja vista que a obtenção de imagens denotando em demasia subjetivismo pornográfico pode ser detectada mediante a elaboração de vídeos, fotografias, ou ainda através de um meio de difusão amplamente utilizado para a prática deste tipo de delito, a internet.

Ao dispor acerca dessa modalidade de violência sexual intentada em desfavor do menor, busca-se no âmbito da legislação protetiva dos direitos da criança e do adolescente, tutelar sua dignidade, pautando-se pelo ideário apto a preservar a condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, haja vista que a acriança ainda não detêm lascívia de natureza sexual, encontrando-se exposta a tal manifestação obscena em face dos desejos sexuais perpetrados pelo abusador. Busca-se portanto preservar a ingenuidade advinda da imaturidade inerente à figura da criança.

Assim sendo, mister faz-se estacar a caracterização do abusador sob as diversas nuances que o mesmo pode atingir quando da prática da pornografia infantil a saber: o abusador que detêm o desejo sexual e que vislumbra a obtenção de vantagem sexual sobre o menor, sem necessariamente ter de manter contato com o mesmo, via de regra enquadrando-se nesta modalidade de abusador a figura do pedófilo que na grande maioria das vezes externa seu distúrbio advindo do desejo sexual por crianças, mediante a busca de imagens de crianças que denotem fins pornográficos, aptas à satisfazer a lascívia do pedófilo. Ressalta-se ainda o abusador – aliciador, sendo enquadrado neste diapasão o indivíduo que vislumbra a obtenção de vantagem de índole pecuniária à ser obtida em detrimento da mácula quanto à ingenuidade da criança.

Nessa ótica entende Antônio Cezar Lima Fonseca acerca do que pode ser tida como uma cena pornográfica (2001, p. 117): “Pornografia é a cena chula, grosseira, gestual ou verbal, como quando a criança e o adolescente se utilizam de palavrões.”

Assim sendo, podemos entender efetivada a prática da pornografia infantil toda vez que puder ser visualizada o uso da imagem de crianças, seja mediante o emprego de violência ou não por parte do abusador, seja mediante o coexistência ou não de contato físico entre abusador ou abusado, sendo pois, detectada a ingerência da pornografia na ótica infantil quando da elaboração e publicação de imagens de crianças à denotar teor pornográfico, observando-se nítido gravame quando a pornografia infantil denotar a prática de sexo explícito entre o menor e o abusador, haja vista que perfaz dotada de caracteres que circundam duas searas de abuso sexual infantil a saber: a pornografia e o estupro.

Há de ressaltar-se ainda que, quanto à figura do abusador, ela pode ser observada sob diversos enfoques, dependendo do núcleo do tipo, ou do grau de colaboração com a elaboração e divulgação das cenas pornográficas, estando inserido, portanto, dentro da tipificação legal sujeito às devidas sanções tanto o sujeito que dirige, como o que filma, fotografa ou pratica as cenas pornográficas ou de sexo explícito com o menor.

A pornografia infantil, principalmente a que pode ser verificada no âmbito virtual, ou seja, através da internet constitui-se atualmente na modalidade de atividade pornográfica mais difundida, detectando-se o quão crescente o é nos dias atuais o número de abusadores de crianças. Ademais, ressalta-se ainda que a pornografia virtual infantil constitui-se no mecanismo mais utilizado pelos pedófilos para dar guarida aos seus desígnios sexuais deturpados.

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3.6 Prostituição infantil

A prostituição infantil constitui-se na modalidade de exploração sexual infantil que denota natureza comercial. Aqui, crianças cedem aos desígnios sexuais de seus abusadores em troca de pagamento pelos “serviços” prestados.

Em sua grande maioria a prostituição infantil é visualizada de forma voluntária, pelo menos inicialmente, por parte da criança, não incidindo sobre esta qualquer forma de coação ou constrangimento inicial para a satisfação da lascívia de seu abusador, no entanto por tratar-se de uma atividade que denota interesses comerciais, o constrangimento e a coação passam à delinear-se na ótica da prostituição infantil, seja por parte da própria família do menor, visando auferir dinheiro, seja por meio do aliciador que obtêm grandes vantagens pecuniárias pelos serviços oferecidos pelas crianças prostituídas.

Não são poucas às vezes em que se pode visualizar o desenvolvimento da atividade de aliciamento de menores no mundo da prostituição infantil, que cresce quanto à prática de violações dos direitos fundamentais da crianças sob os mais diversos contexto

O aliciamento culmina, pois, com a tráfico e a exploração sexual infantil, crianças objetos da prostituição passam à integrar o lucrativo mercado envolvendo um verdadeiro tipo de crime organizado à ser difundido por todo o mundo. A criança prostituída passa então a ser ameaçada para prestar os devidos “favores sexuais em troca de agrados”, valores pecuniários estes que passarão à integrar o patrimônio do aliciador, levando-se portanto à um ciclo vicioso onde haverá nítida escravização de crianças.

Assim sendo corrobora Antônio Cezar Lima Fonseca (2001. P. 146) acerca da conceituação de prostituição, traçando, pois o renomado mestre entendimento acerca desta espécie de exploração e abuso sexual a ser intentada em desfavor do menor, dotada, de caracteres que denota a ingerência de qualquer tipo obtenção de vantagens pecuniárias por parte do menor para restar configurada a mesma, dispondo nesse sentido acerca da prostituição infantil: “Prostituição infantil é o comércio carnal de cunho sexual. No caso, dá-se a exploração do corpo de meninos e meninas um verdadeiro comércio sexual, onde crianças e adolescentes trocam (ou são obrigadas a trocar) prazeres sexuais por pecúnia”.

Nesse contexto, entendemos tratar-se a prostituição infantil como mais uma das diversas formas abjetas de violação dos direitos basilares inerentes a crianças, bem como numa forma sutil por parte de seus aliciadores de obterem vantagem financeira em troca do tráfico e da escravidão sexual de jovens crianças.

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Sobre a autora
Semiramys Fernandes Tomé

Mestranda em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza - UNIFOR. Docente do Curso de Direito do Centro Universitário Católica de Quixadá lecionando as disciplinas de de Prática Civil, Direito Penal II, Direito Penal IV, Direito Processual Penal I e Direito Civil VI (Sucessões) desde 2012.2. Docente convidada do Módulo de Direito Penal - Parte Especial do curso de pós-graduação em Direito e Processo Penal em 2014.2 da Faculdade Católica Rainha do Sertão - FCRS. Advogada atuante no Estado do Ceará, inscrita na OAB/CE sob o nº 22.066. É especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Vale do Acaraú- UVA (2010). Possui graduação em Direito pela Universidade de Fortaleza - UNIFOR (2009.1). Possui experiência na área de Direito, com ênfase em Direito e Processo do Trabalho e Direito e Processo Penal. Bolsista Funcap. Membro do grupo de pesquisa Mulheres e Política junto ao CNPQ. É autora de diversos artigos e capítulos de livro sobre temas de significativo relevo na área jurídica.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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