PALAVRAS-CHAVE: VALOR DA CAUSA. DANO MORAL. PEDIDO CERTO, GENÉRICO. SUBSIDIÁRIO. CÍVEL. TRABALHISTA. VINCULAÇÃO. CPC. ART. 292, V.
ABSTRACT: ABSTRACT: It is intended in this study to address the effects of art. 292, V, of the new Civil Procedure Code - Law 13,105/2015, regarding the need to establish the desired amount as reparation to moral damages (art. 292, V, CPC) and as its feature as a generic request and the possibility of a subsidiary or alternative claim for to the judge to set the quantum debeatur, given some authors’ manifestations in the sense that, considering the wording of that procedural rule, the value should be certain, determined by the individual himself, no longer being admitted the generality, the application subsidiary and the free arbitration state judge.
KEYWORDS: COMPLAINT VALUE. MORAL DAMAGES. DETERMINED REQUEST, GENERIC. SUBSIDIARY. CIVIL. LABOR. BINDING. CPC. ART. 292 V.
SUMÁRIO: Introdução; 1 O DANO MORAL E SUA DÚPLICE NATUREZA QUANTO A FINALIDADE – REPARATÓRIA E PUNITIVA/PEDAGÓGICA; 2. VALOR DA CAUSA NÃO VINCULA OU RESTRINGE O OBJETO DA LIDE NO PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL: 3. O PROCEDIMENTO – PEDIDO MÍNIMO, GENÉRICO, SUBSIDIÁRIO E ALTERNATIVO; 4 Conclusões; Referências.
INTRODUÇÃO
Com o advento do novo Código de Processo Civil – Lei 13.105/2015, surgiram artigos[1] afirmando que, em virtude do disposto no inciso V do art. 292[2], novidade do referido diploma, o valor da causa deve representar o exato quantum pretendido, inclusive em sede de dano moral, com isso afirmando não ser mais admissível o pedido genérico previsto no §1º do art. 324.
Na seara do direito do trabalho, conjugados os artigos 769 e 889[3] da Consolidação das Leis do Trabalho com a disposição contida no art. 1.046, § 2º, do novo CPC[4], entendeu o c. Tribunal Superior do Trabalho em editar a Instrução Normativa número 38[5], para desde logo dizer o que se aplica e o que não se aplica ao processo do trabalho, e, na questão do valor da causa, entendeu ser necessária a valoração do quantum pretendi, mesmo em se tratando de dano moral[6], ou seja, pela aplicabilidade do inciso V do art. 292 do novo CPC ao processo do trabalho.
Assim está descrito no dispositivo processual em estudo: Art. 292. O valor da causa constará da petição inicial ou da reconvenção e será: [...] V - na ação indenizatória, inclusive a fundada em dano moral, o valor pretendido; [...]
A novel regra, então, não permitiria mais que o autor deixasse ao livre arbítrio do julgador a fixação do quantum debeatur, resultando que em caso de improcedência do pedido formulado, fosse a parte condenada em honorários sucumbenciais, caso o valor restasse fixado à menor do que o pretendido na inicial.
Não nos parece ser esta a melhor solução e, muito menos, que haja uma limitação no pedido pelo fato de que o valor da causa deve representar o valor pretendido, em especial quando se trata de pedido de indenização decorrente de dano moral.
Para tanto, antes cabe discorrer, ainda que muito suscintamente, sobre a norma material e a doutrina quanto a natureza do dano moral, que como se sabe tem dúplice função, qual seja, indenizatória e punitiva-pedagógica e, neste último ponto em especial, pode-se dizer que não há como ser limitado o pedido mas, tão somente e para efeitos de valoração da causa, declarado certo valor, ainda que mínimo, o qual servirá de parâmetro ao julgador na fixação por sentença do quantum debeatur.
1. O DANO MORAL E SUA DÚPLICE NATUREZA QUANTO A FINALIDADE – REPARATÓRIA E PUNITIVA/PEDAGÓGICA.
Já é mais do que notória, não só pela doutrina como também pelas decisões nos tribunais, a definição de que na reparação pelo dano moral se busca, além da reparação do sofrimento experimentado pela vítima (caráter ressarcitório), também a punição e advertência do infrator pelo seu ato faltoso em relação ao direito de outrem (caráter punitivo-pedagógico).
Diversos aspectos[7] [8] devem ser avaliados pelo julgador pois, não irá tão somente mensurar o valor da dor sofrida pela vítima estabelecendo uma indenização mas, também, buscar que dentro deste valor, através de diversos critérios objetivos e subjetivos, também seja alcançada a função punitiva e pedagógica, no sentido de alertar o ofensor e adverti-lo para que não mais cometa o ilícito, cumprindo assim o Estado não somente a sua função de assegurar o direito pretendido pelo ofendido, mas garantir certa paz social ao punir aquele que desobedece a lei e causa lesão ao terceiro.
Sobre a questão da finalidade punitiva, citamos trabalho desenvolvido por ORLANDO L. Z. JUNIOR[9], no sentido de que:
Sobre o critério de fixação do valor dos danos punitivos, cabe reiterar que difere daquele empregado no arbitramento dos prejuízos materiais e das demais lesões morais, haja vista que a cláusula penal geral não é pautada pela extensão do dano, mas sim pela reprovabilidade da conduta e pela capacidade financeira do agente, como forma de efetivamente desestimular a conduta. Com efeito, a relevância dos danos morais para a integridade do sistema jurídico reside muito especialmente na sua função de coerção, ou seja, de reprimir a conduta lesiva, razão pela qual não merece ser regido pelo critério de proporcionalidade à extensão do dano, mas sim pelo parâmetro de exemplaridade. Trata-se de uma cláusula punitiva que, em relação contratual ou extracontratual, objetiva desestimular o inadimplemento das obrigações jurídicas, razão pela qual deve ser fixado num valor suscetível de gerar a mudança de comportamento do lesante.
Então, diante de tantos fatores a serem postos sob o critério do julgador, não se pode dizer, em sede de dano moral, que haverá um valor específico ou mesmo, que é a vítima a melhor parte a lhe dar mensuração pecuniária pois, o Estado aqui intervém fortemente, especialmente nos casos em que se tratam de direitos por ele protegidos em razão do caráter social, como ocorre para as crianças e adolescentes, consumidores, enfim, aqueles a quem a lei confere proteção especial e em decorrência de matérias de ordem pública.
E isto se dá em especial quando tratamos de direito material trabalhista, que em sua maioria constitui norma com caráter de ordem pública, cogente, cuja aplicação pede ao julgador melhor cautela na proteção de interesses de cunho social.
Passada esta singela análise sobre a dúplice função que se espera da indenização pelo dano moral, cabe-nos agora abordar a sua instrumentalização no plano da solução das lides, ou seja, do processo, como meio de solução de conflitos e entrega efetiva[10] da prestação jurisdicional.
2. VALOR DA CAUSA NÃO VINCULA OU RESTRINGE O OBJETO DA LIDE NO PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL.
Ainda que deva, agora, o autor em determinada lide, dar valor ao que pretende como ressarcimento pelo dano moral sofrido, seja em demanda sob a Justiça Comum, seja aquela pertencente a Justiça Especializada do Trabalho, isso não limita o jurisconsulto em seu mister de julgar, dados os diversos aspectos que devem ser avaliados quando de sua fixação, salvo a regra do art. 492 do CPC[11] que não permite a decisão ultra petita ou além do pedido do dano.
Assim, uma vez fixado pedido certo (reparação do dano moral, p.ex), de determinado valor (quantum pretendi), não poderá o julgador estabelecer valor maior, porém, poderá sim decidir a menor e, neste ponto, mais uma vez podemos afirmar que, não cabe exclusivamente ao lesado a estipulação do quantum. No máximo e tomando por base a jurisprudência poderá o autor sugerir certo valor que no seu entendimento serve como parâmetro da sua pretensão.
A valoração da causa não é parte do fundamento e do pedido[12] quanto ao direito pretendido. Também não é tão somente a declaração daquilo que se pretende para fins de dar o valor econômico da avença posta em Juízo em razão do cálculo de custas judiciais, pois pelo valor da causa será também estabelecido em determinados casos o rito processual pretendido, como no caso da Lei 9.099/95 e até para fins de condenação do vencido em honorários, na forma do §2º do artigo 84 do Novel CPC[13].
O valor da ação não vincula o pedido. Advém do entendimento subjetivo do autor quanto ao seu direito a reparação do dano que sofreu, ou objetivo, quando esteja representado, p.ex., por um orçamento específico em caso de dano material para o qual se faz necessária a prova material. Sempre estará sujeito a correção de ofício (§3º do art. 292 do CPC) e ao contraditório, através da impugnação – agora permitida nos próprios autos, como preliminar (art.293 do CPC).
Lembrando a sempre valiosa lição de Humberto Theodoro Júnior[14]:
“Determina-se, portanto, o valor da causa apurando-se a expressão econômica da relação jurídica material que o autor quer opor ao réu. O valor do objeto imediato pode influir nessa estimativa, mas nem sempre será decisivo.”
É forte em nossa jurisprudência nos Tribunais Superiores[15], dando interpretação ao art. 253 do Código de 1973, cujo correspondente no atual diploma é o artigo 292, que o valor atribuído ao pedido de dano moral e também do dano material é tão somente um norte para o valor da causa, um parâmetro para sua fixação. A nova redação e a inserção da regra estabelecida no inciso V do artigo 292 não altera este aspecto.
Alguns tem dado interpretação ao dispositivo em questão (inciso V do art.292), no sentido de que agora deve o autor formular pedido certo, não sendo cabível o genérico[16], quanto a sua pretensão de reparação, contrariando entendimento consolidado junto ao Superior Tribunal de Justiça.
É equivocado, data máxima vênia aos que discordam, dizer que o novo dispositivo processual que pede seja dado o exato valor da indenização pretendida possa vincular o pedido e que portanto este deve ser certo, não admitindo-se que se formule pretensão mínima ou que se peça, de forma subsidiária, outro valor pois, em se tratando de dano moral, como acima dito, com dúplice objetivo (reparatório e punitivo-pedagógico), cabe ao magistrado fixar o quantum debeatur, ainda que não atenda ao entendimento do autor, o quantum pretendi.
É neste sentido que “cabe ao magistrado, na fixação do valor atribuído à causa nas ações de indenização por dano moral, agir com a máxima prudência e parcimônia, de modo a se evitar exageros e possível desequilíbrio e/ou embaraçamento ao exercício do direito de defesa:”[17]
Como já demonstrado[18], há escritos no sentido ser necessário que se dê valor ao pedido, não se admitindo a generalidade mesmo em caso de dano moral[19], e existem valiosos julgados agasalhando esta tese[20] mas, o pedido em si é o de indenização pelo dano moral e, o quantum debeatur, somente poderá ser fixado após a devida cognição exauriente, mesmo que se admita julgamento antecipado ou que se trate de dano in re ipsa, o que nos leva a dizer que, em tema de dano moral é sim, ainda, admissível o pedido genérico, na forma do §1º[21] do art. 324 e até subsidiário ou alternativo, pela previsão contida no art.326[22], ambos no novo CPC.
É necessário diferenciar o quantum pretendi do quantum debeatur. O primeiro reflete a pretensão contida nos fundamentos e pedido da inicial, enquanto que o segundo, é aquele que foi definido em sentença[23], que pode ser diverso do valor pretendido pelo autor, obedecida a regra quanto ao limite do pedido, na forma do artigo 492 do CPC.[24]
E o artigo do novel Código de Processo Civil que trata da valoração da causa, inclusive quando se tratar de dano moral, vem justamente dizer isto, que se deve dar valor, que se sugere seja seguindo o atual entendimento quanto ao tema junto aos tribunais superiores mas, em momento algum proíbe o pedido mínimo e/ou lhe retira a generalidade no que diz respeito ao valor a ser definido por sentença.
Aliás, é importante lembrar que, se na Justiça Comum, onde a matéria que diz respeito a indenização pelo dano moral e seu valor já encontra-se há muito tempo sendo discutida, havendo certa jurisprudência uniforme em alguns casos, como ocorre nas negativações de nome de forma indevida junto aos chamados órgãos de proteção ao crédito, é certo que na seara do direito do trabalho ainda há muito que se caminhar em tal sentido, não havendo que se falar nesta mesma uniformidade, o que torna praticamente impossível, atualmente, que se busque certo parâmetro jurisprudencial para o pedido.
Além disto, em se falando de Justiça do Trabalho e acesso, sabe-se que não há necessidade de que a parte, seja autor reclamante ou réu, reclamado, estejam representados por advogado (art.791, caput)[25], o que demonstra ser inviável exigir-se que qualquer uma delas tenha conhecimento técnico suficiente para compreender a dúplice natureza da prestação indenizatória, em se tratando de dano moral.
É bem clara a redação do artigo 292, V, do novo CPC no sentido de que se deve dar valor à causa, valor este certo (ou seja, o que se pretende), mesmo nos casos em que o objeto não seja de fácil aferição ou, como diz o novo diploma processual, não seja imediatamente aferível.
O autor precisa dizer qual o valor que entende ser justo para si, isto pela leitura do art. 291 do CPC[26], e esta obrigação também ocorre em sede de pedido de danos morais porém, isto não quer dizer que, para este tipo de lesão, se ônus do autor dar o quantum debeatur pois, repete-se, são diversas as variáveis a serem observadas pelo julgador na aferição do valor da indenização, já que não se trata de simples prova material e exata do valor.
3. O PROCEDIMENTO – PEDIDO MÍNIMO, GENÉRICO, SUBSIDIÁRIO E ALTERNATIVO.
Partindo-se da afirmação de que, então, ainda que a nova regra processual estabeleça que o valor da causa, nas ações de dano moral, deve representar o valor pretendido, ou seja, é obrigatório que o autor expresse o valor que no seu entender é justo, tal procedimento não poderá por si só vincular o pedido ou a decisão, servindo tão somente como um parâmetro.
Ainda que se diga qual o valor pretendido, não se estará abandonando a generalidade pois, pode o autor deduzir pedido mínimo, cabendo ao julgador decidir se este é justo, se deve ser menor ou, ainda, em havendo pedido subsidiário, se para alcançar a função punitiva-pedagógica, deve ser superior ao pretendido pela vítima.
Sobre o pedido genérico e o bem da vida que se pretende buscar proteção pela tutela jurisdicional, leciona Wambier[27]:
“Quanto ao pedido mediato, este deverá ser determinado quando a extensão do bem da vida postulado puder, desde logo, ser delimitada. Todavia, pode o pedido mediato, quando não determinado, ser oportunamente determinável, se tal fixação for impossível no momento da propositura da demanda. A isto o Código chamou de pedido genérico.”
Como já dito e demonstrado acima[28], alguns dos argumentos encontrados, no sentido de que a parte deve indicar o valor pretendido e que este é certo, determinado e não comporta majoração, baseiam-se no fato de que existe numeroso material nos Tribunais Pátrios que realmente, podem nos indicar um parâmetro para este pedido. Mas, lembremo-nos, não estamos falando de decisões sumuladas, precedentes ou demandas repetitivas, conforme o rol estampado no art. 927 do CPC/15 e seus incisos[29].
Tais decisões, como já insistentemente dito, servem como um parâmetro para o pleito do autor e este, pode entender que merece um mínimo indenizável que, por sua vez, estará sujeito a cognição exauriente, com análise específica do seu caso e, então, definição do valor. O autor não possui capacitação técnica de dar certeza ao seu pedido, no muito, pode tão somente limitá-lo, dizendo que quer tal valor e pronto, ou um valor mínimo e, ainda, optar por incluir pedido subsidiário, para que o magistrado arbitre, em não sendo atendido o primeiro.
Cabe portanto, e é perfeitamente admissível o pedido de um mínimo indenizatório ou, ainda, na forma do que permite o artigo 326 do CPC/15, pedido subsidiário, cujo valor da causa será o mesmo do pedido principal (art.292, VIII do CPC/15), para que, na impossibilidade de atendimento do principal, fixar o juiz, segundo seu juízo, o quantum que entender irá significar efetiva[30] entrega da tutela reparatória e com a devida observância da função punitiva-pedagógica da indenização.