Dação em pagamento

15/10/2016 às 10:51
Leia nesta página:

Apresentaremos, aqui, anotações sobre os principais aspectos relacionados à dação em pagamento.

No Direito das obrigações, ocorre a dação em pagamento (ou do latim: datio in solutum) quando o credor aceita que o devedor dê fim à relação de obrigação existente entre eles pela substituição do objeto da prestação, ou seja, o devedor realiza o pagamento na forma de algo que não estava originalmente na obrigação estabelecida, mas que extingue-a da mesma forma, como explicou Silvio de Salvo Venosa ( Direito civil. Teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 11. ed. São Paulo: Atlas). 

A dação é, portanto, uma forma de extinção obrigacional, e sua principal característica é a natureza diversa da nova prestação perante a anterior, podendo ocorrer, por exemplo, substituindo-se dinheiro por coisa (rem pro pecuni), uma coisa por outra (rem pro re) ou mesmo uma coisa por uma obrigação de fazer.

A dação em pagamento (datio in solutum) não deve ser confundida com a dação "pro solvendo", que não extingue a obrigação, mas apenas facilita o seu cumprimento. A dação pro solvendo ocorre na dação de um crédito sem extinção da dívida originária, que, ao contrário, é conservada, suspensa ou enfraquecida. Havendo datio pro solvendo, a dívida primitiva só se extingue ao ser paga a nova.

Trata-se de forma de pagamento especial.

Repita-se que a dação em pagamento é a entrega de coisa devida que extingue a obrigação e não de outra diversa, ainda que mais valiosa. Assim era no direito romano.

Nada afeta a dação em pagamento que a coisa seja móvel ou imóvel, um bem jurídico qualquer, uma coisa ou um direito como o usufruto. Mas é mister que seja diferente da coisa devida.

Como ensinava Caio Mario da Silva Pereira (Instituições de direito civil, volume III, nona edição, pág. 194), se ocorre lançamento em conta corrente bancária, indicada ou aceita pelo credor, não se configura uma datio in solutum, porém um pagamento normal, porque se lhe proporciona a possibilidade de disposição sobre a soma de dinheiro correspondente ao crédito feito, como ensinava Larenz.

Pela mesma razão, a entrega de um cheque pelo devedor ou a expedição de uma ordem de pagamento não constitui uma datio in soluto, porém um meio de pagamento. Mas a coisa dada em pagamento deve ter existência atual.

Determinado que seja o valor da coisa, equipara-se a dação em pagamento à compra e venda, razão por que as relações entre as partes se regulam pelas normas deste contrato.

A dação em pagamento não se confunde com a doação, que constitui contrato pelo qual se institui uma liberalidade patrimonial a favor de outrem (art. 538 do CC).

Um problema que pode haver é se houver evicção.

Ela suscitava, no direito romano uma série de soluções. Dizia-se, de um lado, que  a consequência seria a repristinação da primitiva obligatio, quer fosse parcial, quer fosse total a evicção. Mas de outro lado, sustentava-se que a antiga obrigação, extinta pela datio, não se restabelecia, competindo ao credor evicto uma ação ex empto, pela qual era indenizado do dano sofrido.

O Código Civil de 1916, pronunciava-se pela primeira solução enquanto que os demais sistemas como o italiano, o uruguaio, o argentina, inclinavam-se pela segunda.

Se o devedor oferece coisa que não lhe pertence, a lei determina o restabelecimento da antiga obrigação, tornando sem efeito a quitação. Se o credor for evicto (perda da propriedade em virtude de sentença judicial ou ato administrativo de apreensão) da coisa recebida, a obrigação primitiva será restabelecida, ficando sem efeito a quitação dada, ressalvados os direitos de terceiros de boa-fé (art. 359 do CC). O devedor responde por eventual vício redibitório (defeito oculto) da coisa entregue.

Caio Mário da Silva Pereira (obra citada, pág. 196) distingue a datio in solutum da datio pro solvendo, que se verifica quando o devedor assume junto ao credor uma nova obrigação (emissão de um título cambial, por exemplo, em lugar do pagamento, ficando ajustado que a antiga dívida somente ficará extinta em virtude do pagamento da nova). Aqui, como se lê, a distinção relativamente à datio in solutum é precisa: em vez de sub-rogação de uma na outra, subsistem duas obrigações, e, quando o devedor satisfizer a segunda (que é a que lhe cumpre solver preferentemente), ficam extintas as duas. 

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos