A inversão do ônus da prova na seara trabalhista

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O CABIMENTO DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA NO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO SE CONCRETIZOU NOS DIAS ATUAIS. O PROCESSO TRABALHISTA SEGREGAVA A PARTE HIPOSSUFICIENTE, INCUTINDO DESIGUALDADE ENTRE PARTES NO PROCESSO.

De acordo com Cândido Rangel Dinamarco[1], “são inversões do ônus da prova as alterações de regras legais sobre a distribuição deste, impostas ou autorizadas por lei.”

As inversões do ônus da prova podem decorrer da vontade das partes, da lei ou de decisão do juiz, sendo legais, convencionais ou judiciais, respectivamente.

As inversões legais “são determinadas pelas presunções relativas instituídas em lei ”sendo que presunção relativa constitui “o processo mental que conduz à aceitação de um fato controvertido como existente sem que esteja provado e até que o contrário venha a sê-lo.” [2]

Desse modo, a inversão legal ocorre quando a parte é dispensada de provar as afirmações sobre fatos que teria o encargo de provar, porque referida afirmação seria presumível; todavia, trata-se de presunção relativa, cabendo a prova em contrário pela parte adversária.

1 NO DIREITO TRIBUTÁRIO

            No Direito Tributário também se constata essa inversão. A lei tributária não faz distinção para o delineamento da obrigação da constituição das provas, não havendo preterição de qualquer uma das partes, devendo triunfar sempre a verdade material e formal dos fatos. A princípio, o contribuinte, após iniciada uma ação fiscalizatória por parte da Fazenda Pública, exime-se de apresentar elementos de fato ou jurídicos que desqualifiquem os procedimentos fiscais efetuados.

Todavia, caso a administração pública logre êxito em demonstrar que houve qualquer ilicitude na movimentação financeira de qualquer cidadão, o onus probandi é invertido e ao contribuinte caberá se manifestar acerca dos fatos, colacionando qualquer tipo meio probatório capaz de elidir as asseverações da fiscalização.

É o que bem expõe o professor Alexandre Henrique [3], ao afirmar:

Desta forma, competirá exclusivamente ao contribuinte, após a demonstração por parte da administração fazendária da fraude tributária, exibir as provas técnicas, contábeis e jurídicas de que suas operações não se realizaram ao arrepio da lei. Neste caso, o ônus da prova se inverte, uma vez que os caminhos percorridos para alcançar seu desiderato só a ele é dado conhecer. As diversas administrações fazendárias não possuem o dom da onisciência e da onipresença para desvendar os caminhos percorridos até a consumação da fraude tributária, competindo, todavia, a estas provar que os valores são impraticáveis diante dos custos e preços comumente encontrados no mercado, que os lançamentos escriturais encontram-se eivados de erros, que documentos e livros contábeis e fiscais foram adulterados, de tal forma que ao contribuinte reste a dignidade da reação inibindo de forma inexorável a pretensão tributária do Estado.

O fato é que a presunção de legitimidade dos atos administrativos não isenta a administração do dever de comprovar a ocorrência do fato jurídico, bem como das circunstâncias em que este se verificou. É que, sendo os atos de lançamento e de aplicação de penalidade vinculados e regidos, dentre outros, pelos princípios da estrita legalidade e da tipicidade, tais atos dependem, necessariamente, da cabal demonstração da ocorrência dos motivos que os ensejaram. A motivação deve ser, portanto, respaldada em provas.

2 NO DIREITO CIVIL

As previsões legais encontram-se na legislação processual, destacando-se o inciso IV, do art. 334 do CPC, que prescreve não depender de prova os fatos “em cujo favor milita presunção legal de existência ou de veracidade.”

A presunção explicitada pela legislação processual somada à aplicação das máximas de experiências previstas no art. 355 do CPC garante ao juiz a aplicação da inversão do ônus da prova no direito civil. In verbis, o artigo anteriormente citado autoriza “em falta de normas jurídicas particulares, o juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e ainda as regras da experiência técnica, ressalvado, quanto a esta, o exame pericial.”

É o que se depreende do julgado a seguir:

CIVIL. RESPOSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. COLISÃO PELA TRASEIRA. PRESUNÇÃO DE CULPA DO MOTORISTA QUE ABALROA POR TRÁS. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. DOUTRINA. INOCORRÊNCIA. RECURSO PROVIDO. Culpado, em linha de princípio, o motorista que colide por trás, invertendo-se onus probandi, cabendo a ele a prova de desoneração de sua culpa. (STJ, 4ª T., RESP 198.196/99, Rel. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 12.4.99, p. 164).

Ademais, a legislação processual também autoriza a presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor quando o réu não contesta. Neste caso, trata-se de aplicação dos efeitos da revelia (art. 319). Igual efeito ocorre quando o réu não cumpre o ônus da impugnação específica previsto no art. 302.

Indiretamente, o parágrafo único, do art. 333, do CPC, autoriza a inversão convencional ou contratual quando prevê que as partes podem acordar quanto à regra de distribuição do ônus, desde que não recaia sobre direitos indisponíveis das partes e não torne excessivamente difícil a uma das partes o exercício de um direito. Assim, admite o CPC alteração contratual da regra de distribuição em se tratando de causas patrimoniais disponíveis.

Desse modo, dúvidas não há de que a lei processual admite indiretamente a inversão do ônus da prova no parágrafo único do art. 333 do CPC. Ocorre que alguns estudiosos do processo civil não aceitam bem a inversão do ônus da prova nesse ramo do direito. Sandra Aparecida Sá dos Santos[4] só admite a inversão convencional, mas, ainda assim, entende que a inversão das regras fixadas no art. 333 do CPC mostra-se ineficaz, ao fundamento de que se trata de matéria de ordem pública e pelo fato de que a atividade probatória tem por fim a prestação jurisdicional; destacando, ainda, a inoperabilidade da referida inversão frente aos poderes instrutórios do juiz que pode determinar produção de prova ainda que as partes tenham convencionado de forma inversa.

João Batista Lopes[5] também entende que não se mostra lícita a convenção sobre a distribuição do ônus da prova por reputar que “as partes não podem tolher ao juiz a liberdade de avaliação da prova.”. Nessa linha de entendimento, o autor segue assinalando que, ainda que as partes acordem de forma inversa, o magistrado não estaria obrigado, na formação do seu convencimento, a aceitar a disposição das partes.

3 PRINCÍPIO DA APTIDÃO DO ÔNUS DA PROVA

Também conhecido como aptidão para a prova, este princípio atribui o ônus da prova ao litigante que tenha melhores condições de provar o fato controvertido. Márcio Túlio Viana[6] esclarece o objetivo do princípio ao concluir que:

Unicamente assim o ônus da prova constitui instrumento para alcançar o escopo do processo, que é, não a simples composição, mas a justa composição da lide; por isso recai sobre a parte que pode levar a mais útil contribuição à convicção do juiz; e por isso, onde esta convicção deve formar-se na falta de prova, isto é, onde o juiz deva abandonar uma afirmação só porque a parte não o provocou, oferece a probabilidade máxima de coincidência desta convicção com a verdade.

Carnellutti[7] já anunciava que “à conveniência de atribuir a prova à parte que esteja mais provavelmente em situação de dá-la, e assim com base na regra de experiência, a qual estabelece qual das duas partes esteja em condições melhores de fornecer a prova do fato”.

O princípio da aptidão para a prova está expresso no art. 6º, VIII do CDC e é plenamente aplicável ao direito processual do trabalho, sob os permissivos do art. 8º, parágrafo único, CLT e, de maneira mais explícita, do art. 769 da CLT “Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as normas deste Título.”

César Machado Jr.[8] analisa que os requisitos para aplicação do art. 6º, VIII do CDC não se resumem a questão econômica ou financeira, mas se referem à uma questão probatória. Ora, se uma das partes tem maior aptidão para prova, nada mais razoável do que exigir sua produção de quem tem maiores condições de demonstrar a veracidade do fato, mesmo que isso signifique a determinação de juntada de documentos, suprindo a inércia daquela parte que proferiu, comodamente, apenas negar o fato constitutivo alegado.

            Ao analisar o caso concreto, o ônus da prova pode transitar entre o empregado ou empregador, a depender da parte que possuir melhores condições técnicas, profissionais ou fáticas de produzir a prova com absoluta independência de sua posição no processo. Trata-se de uma carga probatória dinâmica que oscilaria entre o pólo passivo e o pólo ativo do processo, também conhecida como teoria da carga dinâmica probatória.

Maurício Lindenmeyer Barbieri[9] explica que dessa maneira, se estaria estimulando a produção de provas pertinente àquela parte que esteja em condições de fornecê-la, por isso, recai sobre a parte que pode levar mais útil contribuição à convicção do Juiz; e, por isso, onde esta convicção deva formar-se na falta da prova, isto é, onde o juiz deva abandonar uma afirmação somente porque a parte não a tenha como provada, oferece a probabilidade máxima da coincidência desta com a verdade.

Este princípio consagra uma flexibilização da doutrina nacional, em subordinação ao princípio da efetividade da tutela jurisdicional, posto que objetiva garantir direitos a quem o titule.

4 NO DIREITO CONSUMERISTA

DE MANEIRA MAIS PRIVILEGIADA À PARTE HIPOSSUFICIENTE, OBSERVA-SE A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA NO CÓDIGO DO DIREITO DO CONSUMIDOR (CDC), ONDE AO CONSUMIDOR É DADA UMA PROTEÇÃO MODELO, INCLUSIVE EXPORTADA PARA OUTROS CAMPOS DO DIREITO. Trata-se de uma concepção mais moderna do legislador acerca do dever de provar, idealizada na lei nº 8.078/90, onde a mais significativa inovação, diz respeito ao fato de que somente se admite a inversão do ônus da prova a favor do consumidor, não se admitindo, em conseqüência, determiná-la para beneficiar o fornecedor. Isso ocorre em virtude do reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo, conforme dispõe o art. 4º, I, do CDC.

Em momento anterior à promulgação da legislação consumerista, denotava-se um desequilíbrio nas relações entre fornecedor e consumidor, na medida em que as regras processuais eram advindas do CPC que não concedia ao elo mais fraco da relação o amparo necessário ao equilíbrio processual.

            Não se trata de uma inversão legal, descrita pela lei de forma absoluta. Existem alguns pressupostos que devem ser observados pelo juiz para concessão do benefício. É o que dispõe o art. 6, VIII do CDC:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;

[...].

            O primeiro pressuposto é o da verossimilhança, cujos ensinamentos de Voltaire de Lima Moraes[10] elucidam qualquer dúvida a respeito do tema:

Uma alegação torna-se verossímil quando adquire foros de veracidade, quer porque se torna aceitável diante da modalidade de relação de consumo posta em juízo, quer porque, de antemão, em sede de cognição sumária, não enseja o convencimento de que possa ser tida como descabida.

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            O segundo pressuposto não deve ser analisado somente do ponto de vista econômico/financeiro. A hipossuficiência também pode atingir o campo cultural do cidadão, em face da falta de conhecimento técnico sobre o objeto de uma relação de consumo. O entendimento é pacificado na jurisprudência brasileira:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO DO CONSUMIDOR. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. Cabível a inversão do ônus da prova, porquanto notadamente se trata de caso que deverá ser analisado sob as luzes do Código de Defesa do Consumidor. Até porque as rés, certamente, têm muito mais facilidade em produzir provas acerca do correto funcionamento dos dispositivos do veículo. AGRAVO PROVIDO, DE PLANO. (Agravo de Instrumento Nº 70037323201, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marilene Bonzanini Bernardi, Julgado em 30/06/2010)

AGRAVO DE INSTRUMENTO - EMBARGOS À EXECUÇÃO - DETERMINAÇÃO DE PROVA PERICIAL CONTÁBIL, SOB AS CUSTAS DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA - PRETENSÃO DE REFORMA PARA QUE OS HONORÁRIOS SEJAM PAGOS PELOS AGRAVADOS - INTANGIBILIDADE DO DECISUM - Incidência do Código de Defesa do Consumidor ao caso vertente - Inversão do ônus da prova com a aplicação de todas as conseqüências processuais que a medida carrega, ante a hipossuficiência da ré agravada - Recurso desprovido.” (Agravo de Instrumento N° 991090892969, 17ª Câmara de Direito Privado, Tribunal de Justiça de SP, Relator: Walter Fonseca, Julgado em 26/05/2010)

            Nesse sentido, Tania Lis Tizzoni Nogueira[11] esclarece o sentido do requisito, exemplificando-o:

[...] o Código de Defesa do Consumidor foi mais além, incluindo, no sentido do vocábulo, a noção de hipossuficiência técnica. Ora, na maioria dos casos, todos nós somos tecnicamente hipossuficientes diante de um fornecedor, e somente em raras situações não o seremos, assim se tomarmos como exemplo um profissional médico que contrate os serviços de um colega para que este faça o parto de sua esposa, neste caso não haverá a hipossuficiência técnica, assim como no caso de uma grande empresa que possua elementos para suprir suas deficiências de conhecimento jurídico, ou seja, possua um departamento jurídico especializado, não poderá alegar hipossuficiência técnica na área jurídica.

Desse modo, a proteção jurídica que se dá ao consumidor em razão de sua vulnerabilidade proporciona o acesso à ordem jurídica justa, o que significa o equilíbrio no contraditório e a paridade de armas dos litigantes.

5 NO DIREITO DO TRABALHO

            o cabimento da inversão do ônus da prova no direito processual do trabalho se concretizou nos dias atuais. todavia, previamente à influência de legislações mais modernas na área de definição do dever de provar, o processo trabalhista segregava a parte hipossuficiente, incutindo desigualdade entre partes no processo. Esse era o entendimento do TST, que pugnavam pela inaplicabilidade do benefício ao empregado:

No Direito do Trabalho não deve existir a inversão do ônus da prova; determinando os art. 818, CLT e 333 do CPC, que o ônus da prova incumbe a quem alega, cabendo ao autor a prova dos fatos constitutivos de seu direito, e ao réu, as dos fatos extintivos ou modificativos do direito do autor. (TST, SDI, E-RR 4.384/88.3, Rel. Ursulino Santos)

            O entendimento anterior, supra exemplificado, não levara em conta a aplicação análoga do art. 6°, VIII do CDC e a autorização contida no art. 852-D da CLT, in verbis:

O juiz dirigirá o processo com liberdade para determinar as provas a serem produzidas, considerado o ônus probatório de cada litigante, podendo limitar ou excluir as que considerar excessivas, impertinentes ou protelatórias, bem como para apreciá-las e dar especial valor às regras de experiência comum ou técnica.

            Como sustentáculo da inversão do onus probandi, Bezerra Leite[12] aporta pela aplicação do art. 852-D da CLT no direito do trabalho ao ensinar que:

Cremos, portanto, ser analogicamente viável a aplicação da regra do art. 852-D da CLT a qualquer procedimento do processo trabalhista com apenas uma advertência: o princípio em tela só tem lugar quando não existirem outras provas nos autos suficientes à formação do convencimento do juiz acerca dos fatos alegados pelas partes.

            Em razão da mitigação da rigidez dos art. 818 da CLT e 333 do CPC, bem como da inspiração importada de outros ramos do direito que almejam a igualdade processual entre as partes, a jurisprudência trabalhista passou a admitir a inversão do ônus da prova, inclusive na forma de Súmula:

SUM-338    JORNADA DE TRABALHO. REGISTRO. ÔNUS DA PROVA (incorporadas as Orientações Jurisprudenciais nºs 234 e 306 da SBDI-1) - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005 I - É ônus do empregador que conta com mais de 10 (dez) empregados o registro da jornada de trabalho na forma do art. 74, § 2º, da CLT. A não-apresentação injustificada dos controles de frequência gera presunção relativa de veracidade da jornada de trabalho, a qual pode ser elidida por prova em contrário. (ex-Súmula nº 338 – alterada pela Res. 121/2003, DJ 21.11.2003) II - A presunção de veracidade da jornada de trabalho, ainda que prevista em instrumento normativo, pode ser elidida por prova em contrário. (ex-OJ nº 234 da SBDI-1 - inserida em 20.06.2001) III - Os cartões de ponto que demonstram horários de entrada e saída uniformes são inválidos como meio de prova, invertendo-se o ônus da prova, relativo às horas extras, que passa a ser do empregador, prevalecendo a jornada da inicial se dele não se desincumbir. (ex-OJ nº 306 da SBDI-1- DJ 11.08.2003)

           

Alguns Tribunais Regionais do Trabalho, imbuídos de flexibilidade e atentos ao caso concreto, acompanham o entendimento:

INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - HIPOSSUFICIÊNCIA DO TRABALHADOR EM DISPOR DOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS. Certo é que ao Autor incumbe provar os fatos constitutivos de seu direito e, ao Réu, os fatos extintivos desse direito ou a existência de outros, impeditivos ou modificativos, que obstem os primeiros (art. 818 da CLT e art. 333 do CPC). Por assim ser, a princípio, prevaleceria com o Reclamante - Representante Comercial - o encargo processual de evidenciar as alegações deduzidas na inicial, no sentido de que a Reclamada descontava de seus créditos os valores não adimplidos pelos clientes, em clara ofensa ao disposto no art. 33, /S1-o, da Lei 4.886/65. Contudo, in casu, a Reclamada poderia facilmente comprovar, através da exibição dos relatórios de vendas e recibos de pagamento referentes ao Autor, que não procedia a tais descontos indevidos. A inversão do ônus da prova, neste aspecto, é medida que se impõe, haja vista a hipossuficiência do trabalhador em dispor da prova. Neste contexto, a mera negativa deduzida pela defesa não prevalece, especialmente quando existem indícios que fortalecem as alegações iniciais, autorizando a conclusão de que realmente foram realizados, a despeito da citada norma legal, descontos em prejuízo do Demandante. (TRT 3ª Região – 00601-2006-097-03-00-0 RO, Oitava Turma, Rel. Márcio Ribeiro do Valle, Publicado em 18-11-2006)

            Destarte, no Direito do Trabalho, vige o princípio da aptidão da prova; a significar que o onus probandi é de quem possui condições de cumpri-lo. Essa teoria foi transplantada para o processo do trabalho sob a denominação de inversão do ônus da prova, que já é uma realidade no direito brasileiro, ora implícita, ora expressa.

            Não obstante a inovação, alguns autores defendem que o legislador consumerista transpassou no art. 6º, VIII, do CDC uma corporificação tímida e mitigada do princípio da aptidão da prova.

            A despeito da discussão, percebe-se que as normas que regem a relação de emprego e os dissídios na Justiça do Trabalho não se esgotam no conteúdo da CLT por expressa determinação legal. Por este motivo é que podem ser extraídos direitos dos trabalhadores de normas direcionadas a outras categorias, assim como o processo do trabalho pode ser conduzido conforme normas dirigidas a outros tipos de procedimento.

            Embora em sua literalidade o artigo consumerista utilize a conjunção alternativa em “verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente”, o requisito da hipossuficiência é sempre presumível ao trabalhador, apesar de não absoluto. Logo, resta verificar a verossimilhança das alegações incluindo ainda nos pressupostos a serem analisados pelo magistrado o fato de que os meios de prova necessários estejam na posse do empregador.

            De tal modo, dentro do processo trabalhista, unindo-se os três requisitos em questão, torna-se perfeitamente cabível (ainda sob a discricionariedade do julgador) a inversão do ônus da prova, cultivando-se assim, o princípio da igualdade na instrução probatória.


[1] Dinamarco, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 11 ed., São Paulo: Malheiros, 2003, p. 76.

[2] DINAMARCO, Cândido Rangel. Op. Cit., p. 77

[3] FERREIRA, A. H. S. O ônus da prova no Direito Tributário . Jus Navigandi, Teresina, a. 7, n. 62, fev. 2003. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3772>. Acesso em: 14 jul. 2010.

[4] SANTOS, S. A. S A Inversão do Ônus da Prova como Garantia do Devido Processo Legal. Revista dos Tribunais, São Paulo , 2002.

[5] LOPES, J. B. A prova no Direito Processual Civil. 2. ed. São Paulo: RT, 2002, p. 48.

[6] VIANA, Márcio Túlio. “Critérios para inversão do ônus da prova no processo do trabalho”. In  Revista LTr, São Paulo, vol. 58, outubro/94

[7] CARNELUTTI, F. A Prova Civil. Capinas: Bookseller, 2002, p. 196.

[8] Op. cit. p. 146.

[9] BARBIERI, M. L. O PRINCÍPIO DA APTIDÃO À PRODUÇÃO DA PROVA. Juris Síntese nº 42 - JUL/AGO de 2003.

[10] MORAES, V. L. Anotações sobre o ônus da prova no Código de Processo Civil e no Código do Consumidor. Ajuris, n. 74, p. 44-53, nov./1998.

[11] NOGUEIRA, T. L. T. Revista de Direito do Consumidor, a. 10, n. 57, p. 58-59.

[12] LEITE, C. Curso de direito processual do trabalho. 7. ed.  São Paulo: LTr, 2009, p.505.

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Sobre os autores
Charles Antônio Ximenes de Paiva

Servidor com vínculo em comissão no município de Groaíras. Graduando em Direito pela Faculdade Luciano Feijão - FLF e Pós- Graduando em Direito Público e Administrativo pelo Instituto Vale do Acaraú - IVA

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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