Resumo: A presente pesquisa tem por objetivo analisar os instrumentos de que dispõe o CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) no combate às práticas anticoncorrenciais, destacando o combate aos cartéis. Em seu desenvolvimento foram abordadas as possibilidades de cooperação, envolvendo pessoas físicas ou não, sendo que estas podem se encontrar efetivamente envolvidas nas práticas ilegais, sejam elas na esfera criminal ou administrativa. Foi feita uma breve analise acerca dos institutos elencados na Lei nº 12.529/11, bem como comentários sobre as sanções, requisitos e objetivos de cada uma das possibilidades de cooperação previstas legalmente. Restou demonstrada a necessidade de cooperação entre Ministério Público, Polícias e do CADE no combate a tal tipo de criminalidade, ainda tida como pouco combatida no Brasil.
Palavras-chave: Cartéis. Infrações anticoncorrenciais. CADE. Lei 12.529/11. Ilícito administrativo. Acordo de Leniência. Termo de Cessação de Condutas. Colaboração Premiada.
1. Introdução, 2. Programa de Leniência, 3. Termo de Cessação de Condutas, 4. Colaboração Premiada, 5. Conclusão, 6. Referências.
1. INTRODUÇÃO
Sob o viés da livre concorrência, a economia de um Estado toma contornos de eficiência na medida em que propicia aos seus consumidores, um maior número de opção de produtos e serviços sob custos mais favoráveis. Com as diversas ferramentas de captação de mercado, as práticas na busca de espaço na economia tornam este embate entre as empresas cada vez mais acirrado.
Neste cenário, aflora como situação mais benéfica aos empresários cooperar entre si do que competir, surge então, como prática anticoncorrencial mais corriqueira, o cartel. O Brasil tem desenvolvido legislação e instrumentos de combate visando afastar, de maneira cada vez mais eficaz, infrações no âmbito economico que ocorram em desfavor da livre concorrência.
Este artigo aborda, numa análise perfunctória, três instrumentos trazidos pela Lei nº 12.529/11, que discorre no âmbito nacional sobre o combate a práticas anticoncorrenciais, buscando aproximar o leitor das condutas mais comuns adotadas por aqueles que se envolvem ou detem informações privilegiadas sobre os cartéis, no intuito de encerrá-los, na busca de um mercado comercial cada vez mais competitivo.
2. PROGRAMA DE LENIÊNCIA
O Programa de Leniência instituído pelo CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) é ferramenta que objetiva investigar e impor sanções nos casos de cometimento de crime contra a ordem econômica, bem como orientar as pessoas físicas e jurídicas a luz das disposições dos artigos 86 e 87 da Lei nº 12.529/ de 2011 e artigo 197 a 210 do Regimento Interno do CADE, de forma a mediar a celebração do Acordo de Leniência.
Ainda, permite que os envovlidos em prática anticoncorrencial coletiva, dentre as quais podemos citar os cartéis, alcançem benefícios no âmbito criminal e admistrativo através do Acordo celebrado, no qual, além de encerrar as condutas elencadas como ilícitas, reconhecem ua participação nestas e auxiliam as investigações sobre tal fato através de informações e documentos.
Na seara penal, a celebração do acordo acarreta a suspensão do prazo prescricional e impede o oferecimento de denúncia contra aquele que é parte celebrante do acordo em relação aos crimes tipificados na Lei de Crimes contra a ordem econômica (Lei nº 8.137/90), e naqueles ligados a prática de cartel, bem como o de associação criminosa, elencado no artigo 288 do Código Penal. No âmbito administrativo, confirmada a identificação de demais envolvidos nas práticas ilegais e a produção de provas que instruam a investigação, o celebrante terá como benesse, a extinção da ação proposta pela Administração Pública, se a Superintendência Geral do Cade não conhecer preteritamente a infração, ou a redução de um a dois terços das penas aplicadas.
Tal instrumento aplica-se às infrações trazidas pelo artigo 36 da Lei nº 12.529/11 que já existiam nos artigos 20 e 21 da Lei nº 8.884/94.
Vale ressaltar que o CARTEL é uma prática considerada “ilícita pelo objeto” pelo CADE, ou seja,não é necessário que as práticas ilícitas gerem efeitos no mercado, e, ainda, independem de culpa lato sensu em relação aos agentes. A legislação trata o cartel como ilícito administrativo e penal (art. 4º, II da Lei nº 8.137/1990), cabendo ainda a reparação pecuniária na esfera cível.
A competência na esfera administrativa para investigar e propor processos para a investigações de cartéis é da Superintência Geral do CADE, sendo que a decisão sobre tal processo é do Plenário do Tribunal do mesmo órgão (artigos 13, V e 9º, III da Lei nº 12.529/11). No âmbito criminal, cumpre ao Minitério Público investigar e oferecer denúncia (artigo 16 da Lei nº 8.137/90), sendo que a sentença é proferida por juízo criminal.
Não existe, entretanto, a possibilidade de celebração de Acordos de Leniência diretamente com o Ministério Público ou juízo criminal pois a autoridade competente para tal fim é a Superintedência Geral do CADE conforme dito acima, logo, ainda que outro ente seja procurado para celebração de tal instrumento, é requisito necessário para a ferramenta instituída pela Lei nº 12.529/11, a negociação específica com o CADE.
As penas previstas para aplicação após a análise do processo administrativo no caso de empresas envolvidas são multas no importe de 0,1% a 20% do faturamento da empresa, grupo ou conglomerado obrito no último exercício anterior a instauração do processo. No caso de pessoas físicas ou pessoas jurídicas de direito público ou privado, ainda associações ou sindicatos, não sendo possível utilizar o critério anterior, multa entre cinquenta mil e dois milhões de reais, e, no caso de administradores envolvidos, multa de 1% a 20% dos valores aplicados a empresa, todas estas cumuladas ou não a outras medidas como por exemplo a divulgação da decisão em mídias de g/rande circulação.
Na esfera penal, a prática do cartel prevê reclusão de dois a cinco anos e multa, podendo ser aumentada de um terço a metade se o crime causar dano à coletividade.
Com a atual legislação, foi excluído o óbice de que o líder do cartel não pudesse ser proponenente do Acordo de Leniência, desde que satisfaça os requisitos legais para tal. Tanto as empresas quanto as pessoas físicas podem ser proponentes do Acordo de Leniência através de ser representante legal.
Se o proponente for a empresa, os efeitos do Acordo se estenderão aos envolvidos que a compõem desde que estes cooperem também aos objetivos propostos. Lado outro, se proposto por pessoa física, tal efeito não é admitido.
Ainda que não tenha participado efetivamente da infração, o terceiro pode fazer uma representação à Superintendência do CADE, sendo que tal representação, entendida como denúncia, não se confunde com a proposta de acordo.
Os benefícios do acordo celebrado vem com a declaração de cumprimento do acordo, que não requer homologação judicial para tal. Ainda, na esfera criminal, o cumprimento do acordo extingue autoaticamente a punibilidade.
Os artigos 86 da Lei nº 15.529/11 e 198 do Regimento Interno do CADE elencam os requisitos para assinatura do Acordo, sendo eles, que a empresa seja a primeira a se candidatar para tal a respeito da infração, que ela cesse sua participação na infração, ainda, que no momento da propositura da Acordo, a Superintendência Geral do CADE não disponha de provas suficientes para sua condenação, a confissão da empresa, coopreação plena e permanente na identificação de envolvidos e provas da infração noticiada.
Tal confissão pode ser feita de maneira oral ou escrita, nos moldes do padrão porposto pelo CADE ao Acordo.
Em relação as práticas cometidas em território estrangeiro, o Programa de Leniência do CADE, estas podem ser objeto de celebração de um Acordo desde que as provas apresentadas indiquem que os efeitos da conduta anticoncorrencial forma produzidos ou poderiam ser produzidos no Brasil.
3. TERMO DE CESSAÇÃO DE CONDUTAS
Os participantes do cartel que não participem do acordo podem cooperar através do Termo de Cessação de Condutas.
Através da Resolução n.º 46, o Plenário do CADE regulamentou a celebração de Termo de Cessação de Conduta – TCC, instituído pelo artigo 53 da Lei nº. 8.444/94, atualmente tratado na Lei 12.529/11. Tal Termo representa o instrumento pelo qual aqueles sob investigação de processo administrativo para apuração de prática ofensiva à economia se comprometem a cessar a conduta objeto de investigação.
O termo de cessação de condutas concede benefícios apenas na esfera administrativa, logo o Ministério Público não é interveniente nem pode propor ação penal aos compromissários. Em relação a persecução penal, o compormissário pode, eventualmente, propor acordos de colaboração premiada.
A celebração de TCC requer obrigatóriamente a especificação de obrigações ao compromissário para fazer cessar a prática, a fixação de valor de multa para seu descumprimento, total ou parcial, a fixação de valor de contribuição pecuniária ao Fundo de defesa de Direitos Difusos, não inferior ao previsto no artigo 85, inciso III da Lei nº 12.529/11.
Libório apud Bernardes Neto e Pagotto, em SOLUÇÕES ALTERNATIVAS NEGOCIADAS EM DEFESA DA CONCORRÊNCIA: ACORDO DE LENIÊNCIA E TERMO DE COMPROMISSO DE CESSAÇÃO, p.32, apresenta entendimento de que “as propostas apresentadas Às vesperas do julgamento devem conter maiores concessões por parte do investigado do que aquelas feitas no início das investigações, pois, quanto antes for apresentada a proposta, mais vantajoso o TCC deveria ser acordo para o proponente”.
Neste instrumento, a empresa assume obrigações de não fazer pela suspensão do processo administrativo, cumprido os termos do acordo este será arquivado.
Em março deste ano, o CADE assinou Memorando com o Grupo de Combate aos cartéis do Ministério Público federal, formalizando a cooperação entre tais órgãos com as possibilidades de Acordo de Colaboração Premiada e Confissão qualificada pela delação (Leis nº 12.850/13 e 8.137/90, respectivamente).
4. COLABORAÇÃO PREMIADA
A colaboração premiada, no âmbito do combate tratado neste artigo, se mantem apenas na seara penal, feito pela pessoa física denunciante voluntária, que pode resultar no perdão judicial ou redução de até dois terços da pena imposta. Deve ser homologado pelo Juiz através de requerimento de Delegado de Polícia, Promotor de Justiça ou o defensor daquele que colabora.
Como o nome sugere, trata-se ação de pessoa em posição privilegiada que oferece condições de identificar a estrutura de organização e os envolvidos na prática de cartéis. Todavia, COELHO, p.67, alerta que “a colaboração, no entanto, sem qualquer lastro, conduzida conforme a livre discricionariedade do juiz, demonstra um excesso na observância do princípio inquisitivo, e pode violar princípios como o da segurança juridica e mesmo o da igualdade entre as partes, um motivo a mais pelo qual deve-se estabelecer critério de verificação do valor probatório da colaboração premiada”.
Assim, ainda que não se encontre na condição de investigado, o colaborador deverá falar perante o Ministério Público, a autoridade policial e o juiz na instrução criminal, sempre acompanhando de seu advogado. A mitigação ao popularmente difundido como 'direito ao silêncio', no caso da colaboração aqui tratada, é medida que efetiva a intervenção estatal em desfavor dos crimes contra a ordem econômica.
5. CONCLUSÃO
Infere-se do texto acima trazido que a Lei nº 12.529/11 buscou atualizar os demais diplomas que tratavam de combater os algumas infrações administrativas e criminais no âmbito comercial e econômico, sendo possível notar que ao condensar tais medidas de combate a práticas anticoncorrenciais num mesmo dispositivo, conferiu-se um alcançe maior a elas, bem como efetividade no enfrentamento dos ilicitos.
Restou claro que, sendo a prisão do investigado exceção nestes ilícitos, a prática combatida realmente enseja a adoção de medidas que visem conferir maior equilibrio de maneira mais rápida ao nicho de mercado atingido pela prática do cartel.
Ainda, que não importa em que nível as informações sobre o ilícito estejam, é possível àquele que busca colaborar com os órgãos destinandos a atividade persecutória neste nível de mercado, evidenciar documentos e pessoas que atuaram efetivamente nas práticas anticoncorrenciais, sendo que lhe será imposta tão somente a adoção de medidas aptas a manter o aproveitamento das informações prestadas.
Seja pessoa física ou não, empresário de grande ou pequeno porte, é papel de todos a busca por um panorama ético e legal nos diversos ramos de mercado que a economia brasileira proporciona, sendo que o esclarecimento de cada um que compõe os quadros de uma empresa e a interação entre disposições das ciências do Direito e Economia são os instumentos mais eficazes na busca de práticas benéficas aos consumidores e demais agentes da economia que conferem qualidade aos bens e serviços em circulação no território brasileiro.
6. REFERÊNCIAS
Programa de Leniência, disponível em http://www.cade.gov.br/assuntos/programa-de-leniencia, consulta em 20 de outubro de 2016.
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, Conselho Administrativo de Defesa Econômica, Guia Programa de Leniência Antitruste do Cade, disponível em http://www.cade.gov.br/acesso-a-informacao/publicacoes-institucionais/guias_do_Cade/guia_programa-de-leniencia-do-cade-final.pdf, consulta em 20 de outubro de 2016.
LIBÓRIO, Polliana Blans, Solução Alternativas Negociadas em Defesa da Concorrência: Acordo de Leniência e Termo de Compromisso de Cessação, Brasília, 2009.
COÊLHO, Dandara Perassa, Um plus à investigação da Criminalidade Econômica: O valor probatório da colaboração premiada no direito penal econômico e no antitruste, Brasília, 2015.