Da zetética no Ensino jurídico brasileiro

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29/10/2016 às 12:11

Resumo:

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  • O artigo analisa o Estado da Arte do Ensino Jurídico, explorando produções científicas recentes para identificar padrões e perspectivas zetéticas.

  • Utiliza uma metodologia de pesquisa documental e revisão bibliográfica, focando em dissertações e teses para mapear abordagens educacionais no campo jurídico.

  • Destaca a importância de estudos do tipo Estado da Arte para compreender a evolução e as tendências atuais no ensino jurídico, visando uma abordagem mais crítica e menos dogmática.


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Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Seu objetivo é, inicialmente, diferenciar o conceito de Estado da Arte de outros institutos afins e, em seguida, proceder à análise das teses e dissertações estabelecidas pela amostragem.

INTRODUÇÃO

            O presente artigo terá como objetivo apresentar uma análise do Estado da Arte a respeito do Ensino Jurídico, na tentativa de mapear as produções científicas publicadas nos últimos anos e encontrar um enfoque zetético entre os autores pesquisados. Para tanto, serão selecionadas 10 pesquisas, sendo 6 dissertações e 4 teses, objetivando o esquadrinhamento de seu conteúdo, com a finalidade de encontrar padrões de resultados e conclusões que fundamentem uma perspectiva zetética ao Ensino Jurídico. Desta feita, em relação à metodologia, a investigação será feita a partir de pesquisa documental[1], tratando dos resumos dos textos e demais obras apresentados nas referências, outrossim, a pesquisa  também consistirá em revisão bibliográfica[2]. A ideia de se construir um artigo específico para se analisar o histórico das publicações acadêmicas se torna importante na medida em que auxilia o pesquisador no início de sua pesquisa, a proporcionar mais nitidez ao objeto analisado. Ademais, para o leitor, este tipo de estudo também introduz de forma mais clara o que se pretende discorrer. O Estado da Arte, então, apontará para a possibilidade de um contato inicial com outros autores, a demonstrar a singularidade de posicionamentos sobre uma mesma questão. Este estudo também torna a pesquisa mais robusta e corrobora com uma construção mais crítica do conhecimento. Não há óbice, entretanto, em ressaltar que para o desenvolvimento de tal pesquisa não se objetivará esgotar sua construção, dada sua complexidade, o artigo, pois, deverá ser entendido como parte de um esboço na tentativa de se compreender o Ensino Jurídico no que tange o Estado da Arte. Ademais, também importa destacar que esta pequena amostragem, primeiramente representa a própria escassez de pesquisas relacionadas ao tema do Ensino Jurídico, mas também importa à finalidade de análise, a torná-la compatível com a realização de uma publicação em periódico. Para tanto, iniciar-se-á com um breve conceito sobre o Estado da Arte, a fim de de aferir sua importância no campo científico, de sorte a ressaltar a contribuição de Joana Paulin Romanowski e Romilda Teodora Ens.

            Especificamente sobre o viés zetético do Ensino Jurídico, importa, a princípio, estabelecer uma diferença com o conceito de dogmática. Conforme relembra Costa (2001), a dicotomia entre a teoria zetética e dogmática do Direito foi proposta originalmente por Theodor Viehweg: jurista alemão que, além de Direito, estudou Filosofia e exerceu a atividade de magistratura. Entretanto, com advento da Segunda Guerra Mundial, ficou desempregado. Graças ao ócio lhe foi possível a produção da obra Tópica e Jurisprudência, a qual lhe rendeu o título de livre-docente em 1953 na Universidade de Monique. Em um período mais recente, a terminologia ganhou grande notoriedade ao ser difundida no Brasil pelo jurista brasileiro Tercio Sampaio Ferraz Jr., apenas no final da década de 1970, o qual foi aluno de Viehweg na Universidade de Mainz. Sobre esta terminologia viehwegiana, o jurista comenta:

A dogmática – do grego dókein, ensinar, doutrinar – cumpre uma função informativa combinada com uma função diretiva, ao acentuar o aspecto resposta de uma investigação. A zetética – do grego zetéin, procurar, inquirir – cumpre uma função informativa-especulativa ao acentuar o aspecto pergunta de uma investigação mantendo, dessa maneira, aberto à dúvida as premissas e os princípios que ensejam respostas […]. Entre elas, como dissemos não há uma separação radical; ao contrário, na totalidade do discurso jurídico, elas se entremeiam, referem-se mutualmente, às vezes se opõem, outras se colocam paralelamente, estabelecendo um campo de possibilidades bastante diversificado (FERRAZ, 1997, p. 70).

            A despeito de não haver uma linha divisória radical entre as duas terminologias, o cerne da dessemelhança se baseia no fato de que o Direito dogmático é fixo e fechado, devendo ser aceito como é. Enquanto o Direito Zetético é mais aberto e flexível, sendo constantemente alvo de questionamento. Por este motivo que Ferraz considera a linguagem zetética informativa e a dogmática diretiva, além de informativa[3]. Segundo Viehweg (2007, apud PESSÔA), o pensamento dogmático se refere à formação da opinião derradeira, já o zetético se relaciona com investigação propriamente dita, isto é, justamente com a dissolução, através da dúvida, das meras opiniões. A dogmática jurídica pode ser bem comparada com a questão teológica. Como é evidente, nesta ciência não se questiona a existência de Deus, os estudiosos já partem da premissa de que Deus existe. A partir do momento em que um teólogo cogitar sobre a existência de Deus, então ele deixará de ser teólogo e passará a ser um filósofo ou um mero ceticista. Logo, a zetética jurídica se aproxima da investigação sobre a existência de Deus.

         Em relação à questão do Estado da Arte, embora pouco comentada nos trabalhos acadêmicos jurídicos, este tipo de pesquisa constitui forte apresso entre os estudiosos da Educação. É possível conceituá-la como um tipo específico de pesquisa em que se pretende analisar como se encontra o conhecimento naquele momento; não por outro motivo, esta espécie também recebe o nome de Estado do Conhecimento[4]. Na prática, o objetivo científico é realizar uma busca pelo que já foi publicado sobre determinado assunto em um dado período, na tentativa de identificar uma organização da produção, a identificar prontos convergentes e divergentes. O Estado da Arte, então, representa um estudo histórico e sistemático, com o objetivo de delimitar o que pensam os autores sobre o tema, evitando a realização de uma pesquisa cujo assunto já tenha sido sedimento ou saturado. Este tipo de pesquisa também pode ter por norte agregar mais conhecimento para determinada temática, o que necessitaria retomar o que já foi escrito[5].

         Todavia, inicialmente, importa diferenciar o conceito de Estado da Arte e Estado do Conhecimento dos demais conceitos que, por vezes, podem vir a causar confusão. Para tanto Nóbrega-Therrien e Therrien (2004), no artigo Trabalhos Científicos e Estado da Questão: reflexões teórico-metodológicas, desenvolvem precisa conceituação de três institutos distintos que se relacionam e, invariavelmente, se confundem, quais sejam: o Estado da Arte, o Estado da Questão e a Revisão de Literatura. Para elas, o Estado da Arte tem por objetivo mapear e discutir certa produção científica ou acadêmica em determinado campo do conhecimento. O procedimento se refere ao levantamento bibliográfico em resumos e catálogos de fontes relacionadas a um campo de investigação – procedimento este que é criticado por Ferreira (2002), como será exposto a seguir, na medida em que a mera utilização dos resumos constitui pobre fonte para pesquisa. Os resultados, por fim, apontam para um inventário descritivo da produção acadêmica e científica sobre o tema investigado. Por outro lado, conforme diferenciam as autoras, a finalidade do Estado da Questão é de levar o pesquisador a registrar, a partir de um rigoroso levantamento bibliográfico, como encontrar o tema ou o objeto de sua investigação no estado atual da ciência ao seu alcance. Trata-se do momento por excelência que resulta na definição do objeto específico da investigação, dos objetivos da pesquisa, em suma, da delimitação do problema. Deste modo, os objetivos são de delimitar e caracterizar o objeto específico na investigação de interesse do pesquisador e a consequente definição das categorias centrais da abordagem. Ou seja, o Estado da Questão se refere ao próprio levantamento bibliográfico, necessário a qualquer início de pesquisa ou realização de seu projeto. As fontes consultadas se referem às teses, dissertações, relatórios e estudos, sendo que têm como resultado clarear e delimitar a contribuição original do estudo no campo científico. In fine, ainda em relação à explicação de Nóbrega-Therrien e Therrien (2004), a Revisão de Literatura tem por objetivo desenvolver a base teórica de sustentação e análise do estado, ou seja, a definição das categorias centrais da investigação. Seu procedimento constitui o levantamento bibliográfico para compreensão e explicação de teorias e categorias relacionadas ao objeto de investigação identificado. As fontes são as mesmas do Estado da Questão, por exemplo, teses, dissertações, relatórios de pesquisas e estudos teóricos, ao passo que seus resultados indicam o referencial de análise dos dados. Em suma, pode-se dizer que enquanto o Estado da Questão constitui uma introdução à investigação, por meio da qual o pesquisador irá ter um contato inicial com o objeto pesquisado, a Revisão de Literatura se refere não apenas a apropriação das contribuições teóricas levantadas, mas da possibilidade de se desenvolver uma crítica a respeito delas[6].

        

O interesse por pesquisas que abordam “Estado da Arte” deriva da abrangência desses estudos para apontar caminhos que vêm sendo tomados e aspectos que são abordados em detrimento de outros. A realização destes balanços possibilita contribuir com a organização e análise na definição de um campo, uma área, além de indicar possíveis contribuições da pesquisa para com as rupturas sociais. A análise do campo investigativo é fundamental neste tempo de intensas mudanças associadas aos avanços crescentes da ciência e da tecnologia (ROMANOWSKI; ENS, 2006, p. 38).

          Neste sentido, a partir do pressuposto de que a pesquisa de Estado da Arte delimita os fluxos que desenvolvem o conhecimento em determinado contexto, conhecimento este existente não apenas no campo científico, mas também filosófico, em última análise, seu propósito é a superação da estagnação de seu fluxo desenvolvimental. Estágio este da ciência em que se encontra determinado objeto perante o conhecimento, delimitado por meio do Estado da Arte, no qual ao pesquisador seria possível continuar e avançar mais, a dar seguimento ao legado que seus antecessores não conseguiram. Ou, caso não seja possível que esta pesquisa prossiga, pelo menos, ela servirá de base para outras, a possibilitar que outros talvez consigam, a partir de suas veredas já desbravadas. Em última análise, é possível asseverar que a pesquisa de Estado da Arte é praticamente uma atividade intuitiva ao pesquisador, uma vez que não há conhecimento científico sem o diálogo com outros autores. Sendo assim, é imprescindível ao investigador que tome conhecimento do assunto, por meio de uma pesquisa prévia, ou seja, por meio de um estudo preliminar, a tomar contato com os principais autores, correntes e críticas a respeito do que se deseja discorrer. Assim, entende-se que é por um mínimo de leitura que se adquire subsídio suficiente para a construção de seu posicionamento sobre o assunto. O levantamento bibliográfico, por sua leitura atenta e sistemática?, constitui apenas uma das formas de estudar determinado conhecimento, cabendo ao autor explicitar ou não sua metodologia de busca no decorrer de sua discussão.

         De acordo com Ferreira (2002), a análise das pesquisas de Estado da Arte demonstra que a sensação que parece invadir esses pesquisadores é a do não conhecimento acerca da totalidade de estudos e pesquisas em determinada área de conhecimento que apresenta crescimento tanto quantitativo quanto qualitativo, principalmente reflexões desenvolvidas na Pós-Graduação. Sustentados e movidos pelo desafio de conhecer o já construído e produzido para depois buscar o que ainda não foi feito, de dedicar cada vez mais atenção a um número considerável de pesquisas realizadas de difícil acesso, de dar conta de determinado saber que se avoluma cada vez mais rapidamente e de divulgá-lo para a sociedade. Todos esses pesquisadores trazem em comum a opção metodológica, por serem pesquisas de levantamento e de avaliação do conhecimento sobre determinado tema. Como seria possível elaborar um posicionamento sobre certo assunto, desenvolver uma crítica ou progredir em determinada pesquisa, sem ter conhecimento do que já se escreveu sobre o tema? Ora, a importância de um levantamento bibliográfico robusto se relaciona à cosmovisão necessária ao início de uma pesquisa científica, ou seja, o pesquisador deve ter introjetado uma noção geral sobre o tema, para, em seguida, poder realizar estudos pontuais e mais aprofundados sobre os itens que mais lhe interessam e são mais pertinentes a seu trabalho. Neste sentido, a retomada do Estado da Arte é o primeiro passo para o desenvolvimento de uma pesquisa e para a construção de um conhecimento científico, mormente quando se pretende buscar um viés zetético nas pesquisas de Pós-Graduação sobre Ensino Jurídico. Então, seja qual for a área epistemológica, a retomada do passado se torna importante.

DISCUSSÃO

         A metodologia da pesquisa realizada para o presente artigo ocorreu no banco de dados da Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações. Inicialmente, foi estabelecido como descritor a expressão Ensino Jurídico, Educação Jurídica, Ensino de Direito e Curso de Direito entre aspas, com o objetivo de refinar a busca apenas com tal exatidão. Ademais, pesquisou-se tal descritor unicamente contido no título, por meio da ferramenta Busca Avançada do sítio eletrônico. Porém, como o número de resultados ainda era muito grande, sendo que muitos eram os trabalhos apontados pelo buscador que não tinham relação com o tema em apresso, foi delimitada apenas as teses e dissertações publicadas no Brasil e em Língua Portuguesa, datadas no último triênio de 2011 a 2013. O resultado reduziu consideravelmente, possibilitando que fosse possível a realização de uma análise mais profunda das obras. A relação de teses e dissertações final ficou em 53 trabalhos. Ainda em relação ao método utilizado durante o processo de análise, foi observado que mesmo diante de tão refinado processo de filtragem, pela leitura prévia e individual dos trabalhos, grande parte deles não condiziam com o tema do Ensino Jurídico; outros, inclusive, sequer estavam relacionados à Educação ou ao Direito[7]. No final, após a contagem dos trabalhos que, de fato, fariam relação aos itens indicados na ferramenta Pesquisa Avançada, foram encontradas apenas 10 pesquisas passíveis de serem analisadas e classificadas segundo sua categorização temática. As aparas de 43 trabalhos, mesmo após especificar claramente na busca do título eletrônico, demonstram que os resultados apontados em qualquer banco de dados são passíveis de erros:

Tabela 1: Lista definitivas de obras para análise

Dissertações

Teses

BURGARELLI, Sérgio. Tecnologia Digital e educação: o uso de novos suportes midiáticos no ensino jurídico. Dissertação de Mestrado, Universidade Presbiteriana Mackenzie SP, São Paulo, 2011.

PINTO, Daniella Basso Batista. Ensino jurídico em São Paulo: desafios da formação. Tese de Doutorado, PUC SP, São Paulo, 2013.

CHAVES, André Aparecido Bezerra. A revista da faculdade livre de direito da cidade do Rio de Janeiro: uma proposta para identidade jurídica nacional brasileira. Dissertação de Mestrado, USP SP, São Paulo, 2011.

PUGLIESI, Márcio. O ensino do direito como prática transformadora. Tese de Doutorado, PUC SP, São Paulo, 2011.

LOURENÇO, Ricardo Alves Barreira. A proposta de reforma do ensino jurídico em Chaïm Perelman e reflexões sobre sua aplicação no Brasil. Dissertação de Mestrado, PUC SP, São Paulo, 2011.

PRESTES JUNIOR, Luiz CARLOS Leal. O ensino da Medicina Legal na formação profissional da carreira jurídica. Tese de Doutorado, UERJ, Rio de Janeiro, 2012.

SCOZ, Alexandra Silva. Ensino jurídico de graduação brasileiro: ensaio sobre a produção do direito na pós-modernidade. Dissertação de Mestrado, UNIVALI, Vale do Itajaí, 2012.

SIMÕES, Helena Cristina Guimarães. Docência universitária: concepções de prática pedagógica do professor de educação jurídica. Tese de Doutorado, UFU, Uberlândia, 2013.

SILVA, Fabrício Oliveira da. Análise de necessidades de inglês jurídico para advogados. Dissertação de Mestrado, PUC SP, São Paulo, 2012A.

SILVA, Vânia Regina de Vasconcelos Reis e. Os processos de ensino e de aprendizagem no curso de Direito. Dissertação de Mestrado, USP, Ribeirão Preto, 2012B.

         Em Burgarelli (2011), a pesquisa Tecnologia Digital e educação: o uso de novos suportes midiáticos no ensino jurídico foi apresentada para o curso de Pós-Graduação de Educação, Artes e História da Cultura na Mackenzie de São Paulo. Basicamente, o trabalho envolveu uma pesquisa de revisão bibliográfica, sobretudo autores relacionados com a questão da midialogia e da tecnologia em detrimento da educação. Neste sentido, o objetivo da pesquisa foi a discussão da tecnologia com a educação, principalmente no que se refere ao Ensino Jurídico, na tentativa de investigar a relação e a importância que o avanço da tecnologia vem a ganhar nos últimos anos. Em que pese a divisão das partes e capítulos, o autor preferiu dividir a dissertação em três partes, cada uma contendo três capítulos. Na parte primeira, o autor explorou a questão da comunicação, por meio da descrição evolutiva dos processos de comunicação e digitalização. Já na parte segunda, introduziu o debate tecnológico na seara educacional, a promover um debate entre a importância que ganhou a tecnologia e a revolução digital na educação, mormente após a implementação da computação e da internet. Na parte terceira, o autor tratou do Ensino Jurídico em específico, a ressaltar as mudanças paradigmáticas nos processos com o advento da informática, bem como a utilização dos novos meios de comunicação como ferramentas auxiliadoras na sala de aula.

Claro que esse aparato tecnológico já faz parte da vida acadêmica desses alunos e que de um modo geral, tanto professores quanto alunos universitários aceitam as tecnologias, pois já estão habituados a elas, bem como as aulas virtuais realizadas nas instituições. Mas ainda há restrições por parte dos alunos entrevistados por não haver uma definição clara do papel do professor em relação a um sistema dirigido, coordenado e estruturado, onde o foco principal seria aliar tecnologia e ensino, tanto convencional quanto à distância, ajudando no aprendizado e mostrando que o processo educacional deverá seguir de forma abrangente, proporcionando ao educando qualidade de ensino e aprendizagem para que seja utilizado em sua atividade profissional futura, destacando-se na sociedade e no meio em que vive (BURGARELLI, 2011, p. 138).

         Sobre a nova relação entre a função do educador nos cursos jurídicos e a tecnologia, asseverada pelo autor, importa ressaltar que as novas tendências midiáticas e os novos recursos de comunicação vêm alterando a dinâmica na sala de aula, a utilização dos correios eletrônicos e das redes sociais como formas mais rápidas e eficazes de comunicação, bem como os recursos de mídia digital e a utilização maciça dos bancos de dados eletrônicos nas pesquisas parecem favorecer o processo de aprendizagem e ressignificar o papel do professor. Não obstante todo este aparato tecnológico, o que, de fato, difere as aulas expositivas de outrora, cujas únicas ferramentas se resumiam ao giz e à lousa, das novas aulas repletas de espetáculos digitais e recursos midiáticos de última geração? Em outras palavras, será que a utilização desenfreada da tecnologia no ambiente acadêmico não aponta para um processo de reciclagem do ensino, no qual as fragilidades que sempre estiveram presentes permanecem inócuas, camufladas agora por uma maquilagem que apenas a deixa mais atrativa?

         Em sequência às dissertações, Chaves (2011) apresenta a dissertação A revista da faculdade livre de direito da cidade do Rio de Janeiro: uma proposta para identidade jurídica nacional brasileira, defendida perante a Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP de São Paulo. A pesquisa teve por objetivo discorrer sobre a construção política e jurídica da elite carioca entre os anos de 1899 e 1919, momento histórico em que se organizava as instituições republicanas. Para tanto, foram analisados os artigos da Revista da Faculdade Livre de Direito na cidade do Rio de Janeiro, pelo motivo de que esta foi a primeira instituição a oferecer o curso de Direito no Estado do Rio de Janeiro. A teoria de Ihering, por meio das obras A Evolução do Direito e O Espírito do Direito Romano nas Diversas Fases de seu Desenvolvimento, foram também grandemente explorados pelo autor. Sobre a estrutura da dissertação, pode-se observar que foi dividida em três capítulos, além da introdução e das considerações finais. No primeiro capítulo, a pesquisa realizou uma retrospectiva historiográfica, a relembrar os processos que deram origem à inauguração do curso de Direito na cidade do Rio de Janeiro, bem como a criação da Revista da Faculdade. No capítulo seguinte, o autor explorou os diversos campos do Direito e fez uma relação com os artigos publicados na revista. Já no capítulo terceiro, relacionou a teoria de Ihering aos artigos, realçando a influência do jurista alemão nas publicações dos professores, o que favoreceu o argumento de que os docentes cariocas utilizavam a corrente jurídica alemã também na sala de aula.

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Deixaram transparecer em seus artigos que parte das regras jurídicas ou leis que os grupos dirigentes haviam estabelecido desde a mudança de forma de governo, inclusive a Constituição de 1891, estavam equivocadas por não atentar para a moral da população brasileira, o que ocasionava tensões, conflitos sociais e a necessidade de medidas extremas de suspensão de garantias individuais. Os professores autores dos artigos observaram, como também percebera Rudolf Von Ihering diante da realidade social alemã, que uma população que não acreditasse em uma determinada regra jurídica ou lei, não a cumpriria, porque a enxergaria como contrária à sua moral ou à sua cultura. Daí a ser a imoralidade nas regras jurídicas ou leis brasileiras uma provável causa das tensões e conflitos sociais do país, especialmente da população pobre contra o Estado, segundo o pensamento dos autores dos artigos publicados na Revista da Faculdade Livre de Direito da cidade do Rio de Janeiro (CHAVES, 2011, p. 118).

         Pode-se dizer que o grande mérito da dissertação de Chaves (2011) tenha sido a árdua tarefa em realizar o levantamento bibliográfico das primeiras edições da Revista da Faculdade Livre de Direito e conseguir identificar a relação entre citações e referências com a influência do pensamento alemão por meio do jurista Ihering. A pesquisa conseguiu demonstrar que mesmo sendo um curso pioneiro, no final do Século XIX, os docentes da Faculdade carioca, que também escreviam para a revista, tinham uma formação arrojada e estavam conscientes das vanguardas europeias, visto que a primeira publicação da revista data de 1899 e já continha citações Ihering, que estava vivo apenas seis anos antes. O contato com obras originais em alemão e recentemente publicadas contraria, de certa forma, o argumento de que o Ensino Jurídico no Brasil era obsoleto até para os padrões europeus[8], a indicar que os professores, pelo menos naquele tempo, estavam em aderência ao que havia de mais moderno nos debates acadêmicos da Europa.

         É importante acrescentar que embora grandes críticos do pensamento jurídico argumentem no sentido de que o ensino do Direito no Brasil, além de já começar muito atrasado em comparação à inauguração do ensino superior em outros países da América Latina[9], foi construído inicialmente com um modelo pedagógico bastante defasado para a época. Tal crítica é defendida pelos mais prestigiados pensadores jurídicos da atualidade – citados diversas vezes pelas pesquisas aqui expostas –, como Eduardo Bittar, Horácio Wanderlei Rodrigues e Tércio Sampaio Ferraz Júnior, inclusive, o mesmo argumento é reforçado na obra de comemoração da Associação Brasileira de Ensino do Direito, 180 anos do Ensino Jurídico no Brasil[10]. Não há qualquer óbice em destacar, então, que a crítica trazida por Chaves (2011), de certa forma, desestrutura e fragiliza de uma só vez todos os argumentos trazidos pelos nomeados autores. Mais do que isso, sabendo-se do fato de que diversos autores se utilizam do mesmo argumento em sua análise – como feita pelos próprios que este escrevem, Adaid e Mendonça (2010 e 2013) –, a contra-crítica relativa aos professores cariocas também avaria uma legião de tantos outros comentadores.

         Em Lourenço (2011), A proposta de reforma do ensino jurídico em Chaïm Perelman e reflexões sobre sua aplicação no Brasil, consta uma dissertação defendida no programa de Filosofia do Direito da PUC de São Paulo. A pesquisa objetivou investigar o pensamento de Perelman e sua proposta de alteração no Ensino Jurídico na Bélgica, por meio da influência da Escola da Exegese, do Positivismo Jurídico e do Jusnaturalismo Dogmático. Além disso, o autor pretendeu refletir sobre a viabilidade da mesma reforma no ensino do Brasil. O texto foi divido em quatro capítulos, além da introdução e da conclusão. No primeiro capítulo o autor se preocupou em demonstrar a proposta de reforma de ensino de Perelman, a asseverar aspectos gerais a respeito de sua obra e de seu pensamento filosófico. No segundo capítulo se realizou uma relação entre a retórica aristotélica e as críticas de Perelman ao jusnaturalismo e ao juspositivismo, sobretudo em relação aos tópicos e à retórica. Já no terceiro capítulo, o autor constrói um panorama geral do Ensino Jurídico no Brasil, com base em textos legislativos e referências históricas, relembrando os fatos que ensejaram as principais mudanças no cenário educacional. Por fim, no último capítulo foi refletido especificamente sobre a aplicabilidade da reforma proposta por Perelman.

         Em suma, com base na reforma da Bélgica desenvolvida por Perelman, Lourenço (2011) conclui que o paradigma jurídico, tanto no ensino quanto na prática se distancia da homogeneidade das teorias jusnaturalistas e juspositivistas. Assim, ao avesso de uma educação voltada à lógica dedutiva, o ensino deveria se voltar para o desenvolvimento de técnicas de argumentação que privilegiem: a Justiça tida por razoável para a sociedade em que se aplica; a Justiça que se pode dizer razoável para o caso concreto; e a decisão que se acomoda às prescrições do ordenamento jurídico. Outrossim, a partir da nova reforma de ensino de 2004, encerra o autor a dizer que a teoria de Perelman está em total consonância com a atual diretriz do Ensino Jurídico brasileiro e isso transparece em diversas partes da Legislação brasileira.

A proposta de reforma do ensino jurídico belga, proposta por Perelman, com a inclusão do ensino da retórica nos bancos universitários nos parece, por decorrência lógica, absolutamente aplicável ao ensino jurídico brasileiro (LOURENÇO, 2011, p. 99).

         Nesta senda, sabendo-se que a doutrina jurídica majoritariamente se inclina ora para o Direito Positivo ora para o Direito Natural, a contribuição da pesquisa aponta, maxime, para a fortificação da retórica aristotélica enquanto teoria para compreensão do Direito, teoria esta, de certa forma, esquecida ou pouco valorizada na academia jurídica – como apontada pelo próprio autor no segundo capítulo. Assim, a crítica de Perelman ao ensino tradicional demonstra não apenas um contrassenso ao modelo jurídico, mas representa uma nova possibilidade de se pensar o Direito, à medida em que se afasta do dogmatismo que lhe foi conferido modernamente e se junta a um Direito mais zetético, em consonância com o proposto por Viehweg[11].

         Scoz (2012), por outro lado, contribui com a pesquisa Ensino jurídico de graduação brasileiro: ensaio sobre a produção do direito na pós-modernidade, defendida para o programa de Mestrado em Ciência Jurídica na Univali em Itajaí, Santa Catarina. Em alusão ao citado resumo, a dissertação apresentou um ensaio sobre o Ensino Jurídico de Graduação brasileiro e o seu papel na produção do Direito na pós-modernidade, a abordar o tema sob a ótica da história da educação e do Ensino Jurídico de Graduação no Brasil. No que se refere à organização do texto, a pesquisa foi desmembrada em três capítulos. No capítulo primeiro o autor retomou algumas questões relacionadas aos aspectos históricos do Ensino Jurídico, desde o período Clássico até chegar ao hodierno, no contexto brasileiro. No capítulo subsequente, focou-se no Ensino Jurídico, em especial a respeito de sua relação com a cidadania, em seguida asseverou sobre a Lei de Diretrizes e Bases. No capítulo terceiro, o autor iniciou um debate sobre o Ensino Jurídico em aderência às mudanças da pós-modernidade e a construção de pensamento de um novo cidadão que se forma. Concluiu, então, o autor no sentido de que, dada as transformações sociais entre a modernidade e a pós-modernidade, criaram-se mudanças na perspectiva da formação do cidadão e da consciência política e social, as quais acabaram por influenciar também os processos de aprendizagem do Direito.

Nesse sentido, o processo de ensino-aprendizagem do Direito no ensino de graduação deve primar pela inserção de valores de solidariedade, alteridade e sensibilidade na formação discente que, aliados à razão, sejam capazes de formar hábeis conhecedores de fórmulas e técnicas jurídicas e também humanistas, cidadãos conscientes da dignidade alheia, aptos a contribuir para a concretização do Direito como prática social (SCOZ, 2012, p. 116).

         Por meio da análise do primeiro capítulo, é possível identificar que o autor atribui demasiada atenção aos longínquos antecedentes históricos da educação jurídica, a buscar na educação clássica o início de seus argumentos. Assim, no que tange à importância de se voltar ao passado na busca por entender o presente, pode-se dizer que a investigação tratou de um lapso de tempo tão grande que acabou por ficar parca, pois em poucos aspectos o autor conseguiu explorar de forma aprofundada. Outrossim, em linhas gerais a dissertação tratou de assuntos muito debatidos[12] na seara científica sobre o Ensino Jurídico, de modo que a discussão do Ensino Jurídico frente à crise na pós-modernidade pouco inova ou acrescenta para o debate acadêmico.

         Em que pese às dissertações, a pesquisa de Silva (2012A), intitulada Análise de necessidades de inglês jurídico para advogados, foi apresentada no programa de Pós-Graduação em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem, na PUC de São Paulo. Logo, nota-se que ela constitui exemplo da multidisciplinaridade encontrada na área educacional, neste caso, observa-se a aglutinação entre a Educação, o Direito e a Linguística. Como mencionou o autor em seu resumo, a pesquisa teve por objetivo desenvolver uma análise da importância do inglês para advogados de uma cidade do interior do Estado de São Paulo e para alunos de cursos de leitura e redação jurídica. Sendo esta uma pesquisa de cunho empírico e desenvolvida por meio de questionários. Sobre a estrutura da dissertação, nota-se a divisão em três capítulos. O primeiro capítulo teve como tema a fundamentação teórica, utilizando, sobretudo, o arcabouço teórico de autores como Hutchinson & Waters, Dudley-Evans & St. John e Ramos. No segundo capítulo se pretendeu explorar as questões metodológicas da pesquisa, com base nas orientações de Lüdke, Lüdke & André, Gil, Johnson, Stake e Denzin & Lincoln. O método consistiu na aplicação de dois questionários aplicados a um grupo de participantes composto por oito profissionais do Município de Sorocaba, São Paulo, 17 alunos do curso de letras e seis alunos do curso de Redação, sendo estes domiciliados no Município de São Paulo. O terceiro capítulo foi o mais robusto e representou uma discussão sobre os resultados da pesquisa em aderência à teoria proposta no primeiro capítulo, a apontar para a importância do inglês Jurídico para alunos e profissionais do Direito e a necessidade da implementação de tal curso. Conclui, então, o autor:

Como mencionado na introdução deste estudo, existe ainda uma carência de trabalhos que investiguem as necessidades de inglês de advogados dentro e fora do País, bem como pesquisas que tratem dos gêneros textuais praticados por esses profissionais, principalmente os gêneros orais. Embora a contribuição desta investigação seja modesta, os questionamentos advindos da pesquisa podem motivar outros trabalhos, concorrendo ainda mais para o Ensino-Aprendizagem de Línguas para Fins Específicos e para as pesquisas em Linguística Aplicada (SILVA, 2012A, p. 119).

         Em suma, a dissertação finaliza com a análise das entrevistas a sinalizar sobre a precariedade com que é tratado o idioma Inglês nos cursos jurídicos e, a ter em vista sua influência para o Direito Internacional e os processos civis e comerciais, os cursos de Direito deveriam incluir em seu projeto pedagógico a disciplina de inglês Jurídico. Data venia, em que pese à importância da pesquisa, inclusive a servir de alerta para os educadores e educandos da área, pode-se dizer que, à medida em que o Direito brasileiro segue a ordem latina – civil law –, tanto a doutrina quanto a jurisprudência internacional majoritariamente se referem aos países de língua romana, sobretudo, Portugal, Espanha, Itália e França. Nesta baia, se os currículos jurídicos tivessem que ser alterados para a inclusão de algum enfoque linguístico, o mais lógico seria a inclusão do Latim[13].

         Ainda em relação às dissertações, Silva (2012B) traz ao debate acadêmico a pesquisa Os processos de ensino e de aprendizagem no curso de Direito, sendo defendida no programa de Filosofia, Ciências e Letras da USP de Ribeirão Preto. Como mencionado em seu resumo, o trabalho teve como objetivo geral investigar as concepções dos alunos sobre as condições de ensino e aprendizagem no curso de Direito e observações dos aspectos que favorecem e desfavorecem a aprendizagem dentro da sala de aula. A pesquisa foi desenvolvida em uma faculdade de Direito particular da região nordeste do Estado de São Paulo. Sobre a estrutura do texto, a dissertação foi dividida em quatro capítulos, além da parte introdutória e conclusiva. Tendo em vista que se trata de uma pesquisa de cunho empírico, houve a necessidade de um capítulo específico que tratasse do método. Em um capítulo seguinte, a autora analisa os resultados obtidos por meio do experimento, demonstrando seus apontamentos a respeito das questões físicas de infraestrutura e da dinâmica de ensino, bem como o material didático e o conteúdo ministrado pelos professores. A dissertação também apresentou o resultado das entrevistas e dos questionários aplicados. O último capítulo propôs uma discussão a respeito do estabelecimento educacional, do perfil do corpo discente e docente, além de sua análise sobre a relação entre os educadores e os educandos. Sobre sua constatação a respeito das dinâmicas dentro da sala de aula, interessante citar a conclusão da autora:

As aulas no Direito, na maioria expositivas e tradicionais, com pouca ou nenhuma interposição de perguntas – o professor discursa sobre o assunto, o aluno escuta e copia – demonstram o despreparo para o magistério, já que não há variação na utilização de recursos pedagógicos e as aulas são ministradas de maneira repetitiva e monótona, sem incentivo ao debate. Com muita leitura de códigos e descontextualização do Direito, leva-se a crer que a lei existe “por-si-só” e na existência de uma dimensão metafísica em sua criação. Poucos professores incentivam a leitura de mais de um autor, e a maior parte faz uso de material apostilado, dificultando ainda mais a iniciativa do aluno na questão da pesquisa. Da mesma forma como a lei parece já nascer pronta, o “conhecimento” também já vem “pronto”, impresso em apostilas (SILVA, 2012B, 221).

         Como menciona Silva (2012B), os resultados obtidos foram agrupados em grandes conjuntos de categorias: aspectos institucionais, sala de aula, atividades extracurriculares, lazer, avaliação e dados obtidos por meio de questionário. Assim, foi possível verificar que as situações favorecedoras da aprendizagem são aquelas que aumentam a potência de agir dos alunos, promovendo afecções alegres e momentos de relaxamento, como atuações dinâmicas e encenações em sala de aula. A pesquisa revelou ainda, como continua a autora, que as situações inibidoras são maioria, promovendo afecções que diminuem a potência de agir dos alunos e inibem a ocorrência do aprendizado, como aulas dadas de uma mesma maneira, tom monótono e leitura excessiva de códigos legais, favorecedoras da passividade dos alunos. Por outro lado, a pesquisa mostrou também que, mesmo em situações pouco potencializadoras da aprendizagem, em que as afecções tristes estão presentes por quase todo o tempo, os alunos encontram linhas de fuga para o aprendizado, seja com alguns poucos professores, seja com eles mesmos em ajuda mútua.

         Em relação às teses, Pinto (2013), sob o título Ensino jurídico em São Paulo: desafios da formação, conforme demonstrado no resumo, teve por objetivo investigar como ocorre a formação do profissional do Direito na Universidade para o ingresso no mercado de trabalho, o processo de profissionalização, a atuação pedagógica dos professores em sala de aula. Sendo assim, verificou-se como é realizada a aprendizagem das profissões jurídicas, a trajetória do Ensino Jurídico no Brasil, quais conteúdos estão sendo trabalhados nas disciplinas do currículo e se os mesmos proporcionam conhecimentos de cunho humanístico para o desenvolvimento de uma aprendizagem significativa. Para tanto, foi realizada uma pesquisa bibliográfica, em livros, periódicos científicos, teses e dissertações; uma busca documental, sobretudo em relação à legislação relativa aos cursos de Graduação e à Educação Jurídica; outrossim, um estudo de caso, por meio de entrevistas a profissionais jurídicos da PUC de São Paulo. Sobre a estrutura, o texto foi divido em três capítulos, além da introdução e das considerações finais. Já que se tratou de uma pesquisa empírica, o primeiro capítulo se referiu à metodologia, a pesquisa foi realizada em uma faculdade privada inominada do Estado de São Paulo, por meio de aplicação de questionários, relativos a dados pessoais e profissionais; ademais, houve observação do campus da faculdade, em relação ao espaço físico, horário dos alunos e dinâmica de aula. No segundo capítulo, o autor fez referência aos resultados da coleta de pesquisa, formando a parte mais densa da pesquisa, onde se descreveram os detalhes das instalações, o conteúdo e metodologia ministrada nas aulas, bem como as respostas dos questionários. O terceiro capítulo tratou da discussão propriamente dita, ao relatar a disposição do prédio e o cenário das salas, o autor cita o panoptismo de Foucault, na comparação com os presídios e sanatórios, no mesmo bojo teórico comenta sobre a relação de disciplina entre professor e aluno. O autor também fez duras críticas aos conteúdos apresentados pelos docentes, sobremodo em relação à falta de estímulo para a formação crítica dos alunos[14]. A conclusão aponta para diversas questões relacionadas ao tecnicismo do Direito, ao despreparo pedagógico docente e à necessidade da construção de uma consciência de mudança:

As aulas no Direito, na maioria expositivas e tradicionais, com pouca ou nenhuma interposição de perguntas – o professor discursa sobre o assunto, o aluno escuta e copia – demonstram o despreparo para o magistério, já que não há variação na utilização de recursos pedagógicos e as aulas são ministradas de maneira repetitiva e monótona, sem incentivo ao debate. Com muita leitura de códigos e descontextualização do Direito, leva-se a crer que a lei existe por-si-só e na existência de uma dimensão metafísica em sua criação. Poucos professores incentivam a leitura de mais de um autor, e a maior parte faz uso de material apostilado, dificultando ainda mais a iniciativa do aluno na questão da pesquisa. Da mesma forma como a lei parece já nascer pronta, o conhecimento também já vem pronto, impresso em apostilas (PINTO, 2013, p. 221).

         A pesquisa foi bastante elucidativa, embora tenha sido reducionista, ao passo que tratou especificamente a respeito de uma faculdade de Direito, o fez de forma deveras completo, a conter, inclusive, figuras demonstrando a planta da faculdade e da sala de aula, e descrições precisas da forma como foram ministradas as aulas. Os resultados e as conclusões apresentadas, como citado pelo próprio autor, reavivam entraves que já duram muitas décadas a respeito da qualidade da formação em Direito. Formação esta demasiadamente tecnicista, dogmática e bacharelesta, que já era alvo de críticas no final do Século XIX e início do século XX por grandes juristas como Rui Barbosa[15] e Clóquis Beviláqua[16] [17]. A pesquisa retoma questões que vão muito além de problemas internos específicos de uma única instituição, ela representa uma realidade genérica e endêmica que vem a se arrastar por gerações de juristas formados.

         Nas conclusões finais, Pinto (2013) verificou a preocupação latente dos professores com uma formação não dogmática, mas sim, humanística, crítica, cultural e emancipatória. Por meio do cruzamento dos depoimentos com a análise evolutiva dos documentos do curso, pôde-se observar na prática a inovação e a tentativa de implementar a educação. Em relação à interdisciplinaridade, diversas vezes os entrevistados citaram sua necessidade para satisfatória formação jurídica, porém, esta não foi percebida na análise de documentos, o que demonstra que, embora os educadores tenham consciência de sua importância, na prática ela não se aplica ou não é observada. Outro ponto importante apontado pelo autor foi em relação à formação continuada, presente diversas vezes nos depoimentos[18].  Assim, conclui o autor:

Com os limites apontados, acredito que o curso de Graduação em Direito da PUC-SP se preocupa com a Formação Humanística, conforme o seu Projeto Pedagógico reformulado recentemente, e seu currículo, ao apresentar as disciplinas dos Eixos de Formação que contempla a Formação Fundamental, Profissionalizante e Prática, além do viés para a Especialização. Porém, fica patente a necessidade da reflexão quanto à Formação Continuada dos Professores do curso, pois percebi uma preocupação significativa em relação à qualificação profissional para saber fazer a Formação Humanística de seus alunos, futuros juristas (PINTO, 2013, p. 216).

        

         Na mesma linha metodológica de Silva (2012B), a pesquisa de Pinto (2013) realiza uma investigação minuciosa, a comparar teoria e prática, por um lado apresenta o que se pretende nas emendas e nos projetos pedagógicos, por outro lado confronta o resultado documental com o testemunho dos entrevistados. Possivelmente, este trabalho vai além dos anteriores, ao realizar um mapeamento minucioso do plano pedagógico do curso na Faculdade da PUC de São Paulo, o autor analisou cada disciplina e cada ementa, a possibilitar uma pesquisa mais aprofundada sobre pontos pertinentes da educação jurídica que mereceriam mais atenção.

         Pugliesi (2011), cuja pesquisa O ensino do Direito como prática transformadora, publicada na PUC São Paulo ao programa de Pós-Graduação em Educação, como identificado por meio do resumo, teve por objetivo apresentar uma proposta de formação de professores em Direito que contemplasse a capacidade de ensinar e também criar e construir conceitos por via de resolução reais de conflitos, por conseguinte, pensar a função do profissional do Direito, em seus vários afazeres, a fim de alcançar uma compreensão crítica de suas atividades e suas possibilidades de produzirem transformações sociais que produzam um novo Estado mais equânime. Do ponto de vista estrutural, a tese foi dividida em nove capítulos, o que a deixou bastante extensa, somando aproximadamente 780 páginas. O capítulo um se referiu à metodologia utilizada, qual seja, a revisão bibliográfica e análise documental. Não obsta asseverar que o autor realizou um interessante panorama teórico em busca de uma discussão e problematização filosófica da metodologia em Ciências Humanas, a retomar autores clássicos como Aristóteles, Descartes, Popper e Arendt. No capítulo 2 foi discutida a formação do mundo contemporâneo no que tange a educação, sem especificar as questões jurídicas. Naquele momento o autor se concentrou deveras na influência do contexto capitalista e da ascensão da burguesia como fenômenos precursores da contemporaneidade. No capítulo seguinte, o autor retomou a discussão sobre o ensino no período hodierno, a focalizar no processo de formação do indivíduo. Para discutir as questões subjetivas das transformações decorrentes do processo de aprendizagem, o autor buscou conceitos clássicos, como a dicotomia platônica entre corpo e alma. No capítulo quatro, seguiu a questão do enfoque subjetivo, doravante a dar atenção ao conceito de sujeito. Para tal análise, foram trazidos para o debate diversos autores, de correntes de pensamento totalmente diversas, tais como a teoria pedagógica de Vygotsky e a psicanálise de Lacan. Ainda a tratar de forma genérica da educação, no capítulo cinco o autor retornou à dinâmica da aprendizagem sobre os núcleos sociais, a discorrer a respeito do papel da escola e da família. Apenas no capítulo seis que se determina o enfoque da pesquisa no Ensino Jurídico, a dar início em sua argumentação por meio de uma retrospectiva histórica com o início do Império no Brasil até as transformações mais coevas da academia do Direito. No capítulo seguinte, a dar continuidade ao argumento do Ensino Jurídico, o autor problematiza a complexa questão da Justiça, a relacioná-la às práticas pedagógicas e dinâmicas na sala de aula. O capítulo oito, por seu turno, continua a discussão jurídica na educação, a propor, contudo, uma reforma curricular. O autor cita quatro propostas diferentes, desenvolvidas por críticos da educação do Direito: José Eduardo Faria, Eduardo Bittar, Horácio Wanderlei Rodrigues e Eliane Botelho Junqueira. Finalmente, o último capítulo trouxe a crítica do autor sobre a reforma educacional, falou-se da revalorização do papel do educador e do educando, reformulação de disciplinas fundamentais para a formação em Direito como as relativas à juridicidade e a gestão do Estado, valorização da pesquisa e dos programas de Pós-Graduação e, também, sobre a importância da formação continuada para os professores.

         De modo geral, Pugliesi (2011) trouxe à tona discussões bastante pertinentes a respeito da educação e dos processos de aprendizagem no contexto moderno. Ademais comentou, de forma bastante completa e clara, argumentos específicos sobre o Ensino Jurídico, a apresentar, inclusive, uma nova proposta, baseada na ética e na igualdade – conforme demonstra no nono capítulo. Não obstante o árduo trabalho de pesquisa, resultado de quase oitocentas páginas de tese, as contribuições importantes ao campo da Pedagogia e do Direito, se é que se possa fazer uma crítica, estaria ligada à complexidade do tema, que talvez demandasse não apenas uma tese, mas outros trabalhos. Outrossim, não se pode olvidar de mencionar que, por diversas vezes, o autor cita e critica teorias diferentes em um emaranhado teórico, de Platão a Aristóteles, passando por Vygotsky e Lacan, além de críticos modernos do Direito, como Bittar e Rodrigues.

         Em continuidade, a pesquisa de Prestes Junior (2012), O ensino da Medicina Legal na formação profissional da carreira jurídica, foi apresentado para o programa de Doutorado da Faculdade de Ciências Médicas da UERJ e teve por objetivo demonstrar a importância da disciplina de Medicina Legal, não apenas para os quintanistas em Direito Penal, mas para os demais ramos do Direito Público e Privado, sobretudo no Direito de Família. Inclusive, a pesquisa propõe a inclusão da matéria no exame de Ordem e nos demais concursos públicos[19]. Sobre a estruturação da tese, esta se apresentou dividida em três capítulos, além da introdução e da conclusão, sendo que os dois primeiros se constituem de artigos científicos já publicados. No primeiro capítulo, o autor aborda o tema da importância desta disciplina para a formação jurídica em geral, inicia a apresentar alguns aspectos históricos sobre a Medicina Legal no Brasil e a inclusão deste estudo nos cursos jurídicos frente às demandas da sociedade hodierna. O segundo capítulo trata das demandas judiciais envolvendo o imaginologista: de acordo com o autor, a quantidade de erros médicos em leituras de exames é tão grande e gera tantos processos que o fato mereceria mais atenção dos juristas[20]. No capítulo seguinte, a discussão sobre a importância da Medicina com os egressos dos cursos jurídicos é retomada, a demonstrar o autor que a disciplina é fundamental não apenas para os militantes criminais, mas também às demais áreas do Direito, principalmente civil e trabalhista.

         Por fim, a contribuição de Prestes Júnior (2011) é bastante próxima à Silva (2012A), pois ambos arguem no sentido de que é necessária uma mudança no Ensino Jurídico e defendem tal mudança a partir da inclusão de determinada disciplina. No caso de Silva (2012A), a inclusão se referia à disciplina de Inglês Jurídico, ao passo que Prestes Júnior (2011) defende o ensino da Medicina Legal para todos os alunos do Direito e não apenas aqueles que optam pelo Direito Penal no quinto ano – como ocorrem em algumas faculdades. O argumento é bastante intrigante uma vez que, embora o enfoque atual da Medicina seja dado à criminologia, na prática jurídica, conforme argumenta o autor, a atuação médica se estende a todos os campos do Direito, tanto no Público quanto no Privado, sobretudo o Direito Civil e o Direito do Trabalho, onde os laudos médicos são procedimentos corriqueiros.

         Por derradeiro, Simões (2013), com o título Docência universitária: concepções de prática pedagógica do professor de educação jurídica, apresentada ao programa de Doutorado em Educação da Universidade Federal de Uberlândia. O objetivo da pesquisa foi, então, investigar as práticas pedagógicas utilizadas por educadores nos cursos de Direito, para tanto, foi realizada uma pesquisa de campo por meio de questionário aplicado a 64 docentes do Estado do Amapá. Em relação às questões estruturais da pesquisa, o texto foi divido em quatro capítulos. No primeiro capítulo a autora tratou de apresentar aspectos gerais sobre a educação no Direito, tais como um panorama histórico e uma contextualização da função e da formação frente à mencionada crise – crise esta de ordem global, que indiretamente afeta a educação. No capítulo segundo, a autora retomou a questão do ensino, a focar seu argumento na prática pedagógica e nas dinâmicas de aprendizado. Em seguida, no capítulo terceiro, foi apresentada a metodologia de pesquisa, a qual, como mencionada, se referiu à aplicação de questionário a 64 profissionais da educação, de seis instituições de ensino diferentes, localizados no Estado do Amapá[21]. Já no capítulo quarto, discutiu-se os resultados obtidos por meio da aplicação dos questionários, os quais, segundo a autora, apontaram para uma ausência de formação para o magistério superior, além de certa tendência a uma postura mais conservadora e maior valorização da experiência enquanto prática pedagógica. Neste sentido, concluiu na seguinte leitura:

Temos, portanto, numa mesma ambiência acadêmica, o convívio e a atuação de professores com diferentes concepções de práticas pedagógicas. Uns ainda não se libertaram dos ranços de uma educação jurídica ficcional e positivista; outros se enquadram numa prática mais reflexiva e que representam, em conjunto com uma minoria de professores de concepção emergente, um modelo de docência a ser institucionalmente estimulada e preparada para contribuir com a uma educação e um mundo melhore (SIMÕES, 2013, p. 144).

         Assim como Silva (2012B), Simões (2013) também identificou, por meio dos resultados de seus questionários que a concepção pedagógica dominante na academia jurídica ainda é pautada pelo pensamento positivista-dogmático. De acordo com seus levantamentos, os professores que ministram disciplinas técnicas, tanto materiais quanto processuais – ou seja, Direito Penal, Civil, Trabalhista e Processual –, tendem a utilizar ainda mais este tipo de metodologia, por meio do contato da lei como principal fonte do Direito. Porém, em analogia às considerações de Pinto (2013), a autora também identificou a existência de um grupo minoritário de educadores que discordam deste posicionamento tradicional. Neste sentido, pode-se dizer que a pesquisa de Simões (2013) faz uma ponte entre Silva (2012B) e Pinto (2013) – apenas não se referindo diretamente à Silva (2012A) por ser uma pesquisa voltada a proposição de uma disciplina específica.

CONCLUSÃO

         O tema do presente artigo se referiu à realização de um Estado da Arte sobre o Ensino Jurídico com base na amostra de 10 pesquisas entre teses e dissertações, defendidas entre o triênio de 2011 a 2013. Para tanto se utilizou dos conceitos desenvolvidos por Joana Paulin Romanowski e Romilda Teodora Ens, na esperança de diferenciar Estado da Arte, Estado da Questão e Revisão de Literatura. O objetivo do trabalho foi, então, realizar uma comparação entre as 10 pesquisas, na tentativa de analisar seu conteúdo, procurando encontrar aspectos que comprovem uma relação entre os argumentos e a construção de um Ensino Jurídico mais zetético e crítico. Sobre a metodologia, acrescenta-se também que todas as buscas foram realizadas do Banco Digital Brasileiro de Teses e Dissertações, por meio do refinamento da pesquisa avançada e da exclusão de trabalhos que, embora tivessem sido apresentados pelo sítio, não tinham relação com o tema do Ensino Jurídico.

         Em relação aos referenciais teóricos e principais autores que se destacaram na discussão das pesquisas, pode citar a contribuição de Lourenço (2011), o qual se dedicou a construção de uma proposição de reforma baseada no Ensino Jurídico do pensamento de Chaïm Perelman. Também é possível destacar a dissertação de Chaves (2011), o qual relacionou as publicações da Revista da Faculdade Livre de Direito da cidade do Rio de Janeiro com o pensamento de Ihering. Em relação aos autores brasileiros, José Eduardo Faria, Eduardo Bittar, Horácio Wanderlei Rodrigues e Eliane Botelho Junqueira foram a base da discussão de Pugliesi (2011). Ademais, ainda em relação à sua dissertação, não obsta ressaltar a inclusão do pensamento de Vygotsky e Lacan, o que, grosso modo, aponto para uma falta de coerência epistemológica na discussão.

         Por outro lado, no que tange a amostra utilizada para a presente pesquisa, poderia se criticar a pequena quantidade de trabalhos utilizados, de forma que se comprometeria a análise, uma vez que qualquer tentativa de investigação de padrões se tornaria frágil. Contudo, é possível o contra-argumento de que, em se tratando de uma pesquisa que será publicada em periódico, por meio de artigo científico, pouco se poderia investir em uma amostra maior, pois qualquer tentativa de discussão, análise e comparação de um grupo mais robusto de pesquisas levaria a uma demasiada superficialidade. Ressalta-se, então, que o objetivo deste trabalho foi realizar um estudo baseado em uma amostragem que tornasse possível uma análise mais profunda.

         Outrossim, a pequena quantidade de pesquisas encontrada também aponta para a escassez de trabalhos defendidos nos programas de Pós-Graduação. Apesar de a amostragem ter se restringido a um grupo reduzido de trabalhos, visto que das 53 pesquisas apresentadas pela busca no banco de dados apenas 10 puderam ser utilizadas. Tal fato demonstra o desinteresse dos pesquisadores em se dedicar ao tema do ensino jurídico e também aponta para a falta de fomento a pesquisas na mesma área. Neste sentido, outro fato bastante intrigante foi a pouca quantidade de trabalhos empíricos, uma vez que dos 10 trabalhos pesquisados apenas quatro estavam relacionados a este tipo de pesquisa. Como mencionado, tal fenômeno talvez se deva ao fato de que pesquisas de campo demandam muito mais dedicação do pesquisador e requerem a remessa do projeto ao Comitê de Ética, o que retardaria ainda mais sua realização.

         De outra banda, em relação ao conteúdo das pesquisas, não há óbice em asseverar que, muito embora grande parte dos autores analisados no levantamento concordem que o Ensino Jurídico está aquém do satisfatório e necessita de mudanças, apenas alguns autores centralizaram a pesquisa nesta questão – vide, por exemplo, Silva (2012A) e Prestes Junior (2012), em que a temática da pesquisa se centralizou na proposição de mudanças ao ensino. Ademais, pelo que consta no levantamento aqui realizado, não houve qualquer autor ou crítica que levasse ao entendimento da não manutenção do ensino, ou seja, não se identificou nenhuma pesquisa a qual afirmasse que o atual modelo de ensino dos cursos de Direito está satisfatória. Todos os autores, cada um a sua crítica, concordam que o ensino atual deve ser reformado, seja pelo excesso de tecnicismo seja pelo tradicional dogmatismo. Sendo assim, grosso modo, todas as pesquisas corroboram para a construção de um Ensino Jurídico mais crítico, seja por meio do implemento de disciplinas mais zetéticas seja pela importância de uma revolução de ordem genérica.

         Contudo, importa destacar novamente que apesar de toda crítica a respeito do método arcaico ao qual foi construído o Ensino Jurídico no Brasil, muito intrigante foi a análise de Chaves (2011), que, ao retomar as publicações da Revista Jurídica da Faculdade do Rio de Janeiro, entre os anos de 1899 a 1919, constatou que já nas primeiras edições da revista os professores faziam referência ao pensamento de Rudolf Von Ihering, autor que falecera em 1892 e representava a mais contemporânea vanguarda do pensamento jurídico na Europa, sobremodo, na Alemanha. Destarte, embora tanto se tenha escrito e publicado a respeito do atraso pedagógico jurídico, pelo menos naquele contexto carioca, os acadêmicos não apenas tinham contato com os originais textos em alemães, como também baseavam suas aulas no que havia de mais avançado à época.

         Em epítome, embora Chaves (2011) expresse seu descontentamento frente ao ensino do Direito hodierno e concorde com a necessidade de uma reforma, seu argumento deveras polêmico, de certa forma, vai contra o lugar-comum trazido pelos grandes críticos e pelos que se dizem historiadores do Ensino Jurídico, os quais repetidas vezes defenderam que, além de o Brasil ter inaugurado a Graduação de forma muito retardada, iniciou seu ensino baseado no mais decrépito modelo educacional vigente do Século XIX, o coimbrão. Desta feita, é possível afirmar que tal tese transcende o modelo investigativo a respeito do Ensino Jurídico, e, em última análise, representa a própria essência zetética, pois, de certa forma, aponta para uma crítica da crítica, a demonstrar aquilo que anteriormente não era perceptível. Fica, pois, estabelecida não apenas a fragilidade e a falta de fundamento em tais críticas, que por efeito dominó acabam por afetar tantas outras, como faz renascer a clássica citação de Nelson Rodrigues (2003, p. 181): “quem pensa como a unanimidade não precisa pensar”.

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Sobre o autor
Felipe Adaid

Advogado e consultor jurídico em Direito Penal e Direito Penal Empresarial no Said & Said Advogados Associados. Foi Diretor de Gerenciamento Habitacional da Secretaria de Desenvolvimento Social e Habitação e Primeiro Secretário do Conselho de Habitação do Município da Valinhos, SP. Mestre em Educação e Políticas Públicas pela PUC Campinas. Ingressou em primeiro lugar no mestrado e foi contemplado com a bolsa CAPES durante os dois anos de curso. Cursou disciplinas de pós-graduação na Unicamp. É especializando em Direito Penal, Processo Penal e Criminologia, pela PUC Campinas. Na graduação, tem 5 semestres de créditos no cursos de Psicologia, também pela PUC Campinas. Durante a graduação de Direito também foi bolsista de iniciação científica, CNPq, e foi monitor em diversas disciplinas, tanto no curso de Direito como no curso de Psicologia. Foi membro do grupo de pesquisa Direito à Educação do Programa de Pós-Graduação da PUC Campinas. É corretor de revistas científicas pedagógicas e jurídicas. É autor de 11 livros, sendo 3 ainda em fase de pré-lançamento, e organizador de outros 10 livros, além da autoria de 44 capítulos de livros publicados no Brasil, no Chile e em Portugal. É autor de mais de 100 publicações científicas, entre artigos científicos, resenhas e anais, nacionais e internacionais. Ademais, também escreve periodicamente ensaios e artigos para jornais e blogs. No âmbito acadêmico, suas principais bases teóricas são: Foucault, Lacan, Freud, Dewey e Nietzsche. Por fim, tem interesse sobre os seguintes temas: Direito, Direito Penal, Criminologia, Psicologia, Psicologia Forense, Psicanálise, Sexualidade, Educação e Filosofia.

Informações sobre o texto

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