Instituído em 06 de julho de 2015, por meio da Lei nº 13.146, o Estatuto da Pessoa com Deficiência teve como base a Convenção sobre os direitos da Pessoa com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, que considera pessoas com deficiência (e não portadoras de deficiência), as que possuem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas
O art. 12 da Convenção, estabelece que as pessoas com deficiência possuem o direito de gozar da capacidade legal em igualdade de condições com as demais pessoas em todos os aspectos da vida; desse modo essa capacidade legal é mais ampla que capacidade civil em geral.
A Convenção explicita, sem configurar enumeração taxativa, que a pessoa com deficiência pode possuir ou herdar bens, controlar as próprias finanças e ter igual acesso a empréstimos bancários, hipotecas e outras formas de crédito financeiro. (ARAUJO, 2011, p. 35)
No início da vigência da Convenção, em 2009, a pessoa com deficiência foi excluída do título de absolutamente incapaz do exercício dos seus direitos civis.
A Lei nº 13.105, de 2015, explicitou essa mudança, quando estabeleceu, em nova redação ao artigo 3º do Código Civil, dizendo que são absolutamente incapazes apenas os menores de dezesseis anos, com exceção as pessoas enfermas ou portadoras de algum tipo de deficiência mental e qualificando como relativamente incapazes os que, por motivos transitórios, não puderem expressar sua vontade.
As pessoas com deficiência mental ou intelectual deixaram de ser consideradas absolutamente incapaz, atitude que anteriormente nosso Código Civil de 1916, qualificava essas pessoas como loucos de todo o gênero, impedindo-as, através da interdição, de praticar qualquer ato da vida civil. (SARLET, 2006)
O Código Civil, pela Lei nº 13.146 de 2015, foi atenuante nessa discriminatória qualificação, porém manteve a incapacidade absoluta para pessoas com enfermidade ou deficiência mental, sem ser necessário discernimento para a prática desses atos.
Com o advento da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, incorporada ao direito interno brasileiro por meio do Decreto Legislativo 186, de 9.7.2008 e por sua promulgação pelo Decreto Executivo nº 6.949, datado em 25 de agosto de 2009, após cinquenta anos de total vedação jurídica, no Direito brasileiro, houve sua reformulação. (BASILE, 2015)
Em situações excepcionais, a pessoa com necessidades especiais ou intelectual poderá ser submetida à curatela, no seu interesse exclusivo e não de parentes ou terceiros, a curatela, ao contrário da interdição total anterior, deve ser, de acordo com o art. 84 do Estatuto da Pessoa com Deficiência, proporcional às necessidades e circunstâncias de cada caso e durará o menor tempo possível, possuindo natureza de medida protetiva e não de interdição de exercício de direitos. (LÔBO, 2015, online).
4.1 Escorço Histórico do Estatuto
O Estatuto da Pessoa com Deficiência foi projetado, datado em 09 de outubro do ano de 2000, sendo a partir dessa data com a denominação de Estatuto do Portador de Necessidades Especiais (PL 3638/2000), como iniciativa do deputado federal Paulo Paim, que visava o compêndio.
Em fevereiro do ano de 2003, o projeto foi amplamente reestruturado e reeditado no Senado Federal com a denominação de Estatuto da Pessoa Portadora de Deficiência (PLS 06).
Em outubro do ano de 2003, foi novamente alterado e recebeu a contribuição de técnicos, professores, familiares, profissionais da área e pessoas com deficiência que, incluíram questões relevantes para o segmento, sendo constituído como o Estatuto da Pessoa com Deficiência.
No decorrer do ano de 2003, foi construída uma articulação nas cinco regiões do País, e este período, se realizaram oitocentos encontros com a participação de mais de 15 mil pessoas, sendo constituídos 86 grupos através da Internet, foi realizada uma teleconferência nacional com a participação de dezesseis assembleias legislativas estaduais que coordenaram os trabalhos, em 2003 ainda o gabinete recebeu diversas propostas de todas as partes do Brasil que foram inseridas ao estatuto, pautando o documento em pontos considerados fundamentais para o benefício deste segmento. (ASTORGA, 2007)
Alguns pontos principais das propostas, foram incluídos no PLS 429, como, não perder o que já foi conquistado, aprimorando os artigos vinculados; aumentar a renda per capita da família, para que o maior número de portadores de deficiência tenham acesso a um salário mínimo; a nomenclatura, garantindo um termo internacional e denominando como Estatuto da Pessoa com Deficiência; acessibilidade universal como eixo central; reserva de vagas em empresas públicas e privadas e cargos em comissão; regulamentação da profissão de intérprete da Língua Brasileira de Sinais e a regulamentação da lei que oficializa a Língua Brasileira de Sinais; criminalização do preconceito e direito à justiça. Assim, o Estatuto da Pessoa com Deficiência efetiva alguns avanços elaborados pelo direito internacional, estabelecendo aos portadores de necessidades especiais, novos direitos.
Segundo a redação final da Lei, o conceito de pessoa com deficiência trazido pelo artigo 2º praticamente repete o conceito já em vigor a partir da Convenção (artigo 1º), definindo-a como “aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas”
4.2 Contexto Geral do Estatuto da Pessoa com Deficiência
O mérito da lei é inegável, observa-se que a lei exagera na preocupação excessiva quanto à proteção do deficiente, impondo regras de difícil implantação na prática, porém não há dúvidas, que em sua maioria a lei acerta, conferindo à pessoa com deficiência, finalmente, a proteção que lhe é devida e procurando através do âmbito jurídico assegurar os direitos previstos, de forma para a contribuir com a visão preconceituosa que até os dias atuais acompanham essas pessoas.
Dentro desta linha de raciocínio, ocorreu um do empenho do legislador em incluir o deficiente, seja qual for sua limitação, a não ser mais visto como um ser condenado ao isolamento, ou como segregado, mas, como uma pessoa que mereça viver em sua plenitude, francamente integrado na sociedade que o cerca (ARAÚJO, 2011).
O Estatuto dedicou bastante atenção, em meio a outros temas, à acessibilidade, enfocada sob seus mais diversos aspectos.
Em uma análise objetiva, porque barreiras devem ser retiradas, respeitando o acesso do deficiente onde ele deseje ir, seja no metrô, no ônibus, ou seja, o Estatuto, veio para fim propiciar ao portador de deficiência a tão sonhada igualdade com os demais.
Diz-se da personalidade e da capacidade da pessoa com deficiência que são absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil os menores de 16 (dezesseis) anos, absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil, ou seja, só existe a hipótese de incapacidade absoluta ao menor de 16 anos.
Não mais subsistirão as hipóteses de incapacidade absoluta por motivos psíquicos, se acaso a gravidade for de tal grandeza que a pessoa enferma ou com deficiência não possa exprimir sua vontade sobre o objeto de deliberação, não poderá praticar o ato, e um curador deverá ser nomeado, conforme disposto no Código Civil e no CPC/2015.
As pessoas que, em causas transitórias puderem exprimir sua vontade, poderão praticar os atos da vida civil, desde que possam deliberar diretamente sobre o ato, não existe mais presunção de absoluta incapacidade para os que, por enfermidade ou deficiência mental, tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos e os que, mesmo por causa transitória, puderem exprimir a sua vontade.
São incapazes, relativamente a certos atos ou à maneira de os exercer, os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos; os ébrios habituais e os viciados em tóxico; aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade; os pródigos.
Em relação aos relativamente incapazes, foi revogada a hipótese das pessoas com deficiência mental com discernimento diminuído e dos excepcionais sem seu desenvolvimento completo, ou seja, considerar-se-ão relativamente incapazes aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir a sua vontade. Isso significa que, não podendo exprimir a sua vontade, não poderão praticar os atos da vida civil. (ACIEM, 2013)
As pessoas com discernimento reduzido e com desenvolvimento mental incompleto ou completo que puderem exprimir a sua vontade poderão praticar os atos da vida civil.
Não há mais a presunção de relativa incapacidade para os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido e os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo, mas que possam exprimir a sua vontade.
A deficiência é definida como toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica que gere incapacidade para o desempenho de atividade, dentro do padrão considerado normal para o ser humano; possuir deficiência permanente; possuir incapacidade, que seja redução efetiva e acentuada da capacidade de se interagir socialmente, com havendo necessidade da utilização de equipamentos, adaptações, meios ou recursos especiais para que a pessoa portadora de deficiência possa receber ou transmitir informações necessárias ao seu bem-estar pessoal e ao desempenho de função ou atividade a ser exercida.
Conforme (FONSECA 2008, p. 263), o avanço conceitual deu-se em uma perspectiva mais ampla:
“O próprio conceito de pessoa com deficiência incorporado pela Convenção, a partir da participação direta de pessoas com deficiência levadas por Organizações Não Governamentais de todo o mundo, carrega forte relevância jurídica porque incorpora na tipificação das deficiências, além dos aspectos físicos, sensoriais, intelectuais e mentais, a conjuntura social e cultural em que o cidadão com deficiência está inserido, vendo nestas o principal fator de cerceamento dos direitos humanos que lhe são inerentes”.
O conceito para definir a pessoa portadora de deficiência, pode ser entendido para o indivíduo que possua mobilidade reduzida, aquela que, não se enquadrando no conceito de pessoa portadora de deficiência, tenha, por qualquer motivo, dificuldade de movimentar-se, permanente ou temporariamente, gerando redução efetiva da mobilidade, flexibilidade, coordenação motora e percepção.
É considerada, para os efeitos do Decreto Lei, a pessoa portadora de deficiência com limitação ou incapacidade para o desempenho de atividade e se enquadra nas seguintes categorias: deficiência física, com alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física, apresentando-se sob a forma de paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetra paralisia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, ostomia, amputação ou ausência de membro, paralisia cerebral, nanismo, membros com deformidade congênita ou adquirida, exceto as deformidades estéticas e as que não produzam dificuldades para o desempenho de funções; deficiência auditiva, com perda bilateral, parcial ou total, de quarenta e um decibéis; deficiência visual, com cegueira, em que a acuidade visual é igual ou menor que 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; a baixa visão, que significa acuidade visual entre 0,3 e 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; os casos nos quais a somatória da medida do campo visual em ambos os olhos for igual ou menor que 60º; ou ainda a ocorrência simultânea de quaisquer das condições anteriores; eficiência mental, com o funcionamento intelectual significativamente inferior à média, com manifestação antes dos dezoito anos e limitações associadas a duas ou mais áreas de habilidades adaptativas, tais como a comunicação, a higiene pessoal, habilidades sociais, utilização dos recursos comunitários, saúde e segurança, habilidades acadêmicas, lazer e o trabalho; e a deficiência múltipla, que é a associação de duas ou mais deficiências. (ARAÚJO, 2011)
A lei ainda define que pessoa portadora de deficiência é aquela que tem impedimentos de longo prazo, minimamente dois anos, de natureza física, mental, intelectual, ou sensorial.
Os impedimentos podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade, em igualdade de condições com as demais pessoas.
4.3 Peculiaridades da Curatela
A curatela apenas afeta negócios jurídicos relacionados aos direitos de natureza patrimonial, não alcança nem restringe os direitos de família, como adquirir matrimônio, ter filhos e exercer os direitos da parentalidade, do trabalho, eleitoral, como votar e ser votado, de ser testemunha e de obter documentos oficiais de interesse da pessoa com deficiência.
O caráter de excepcionalidade impõe ao juiz a obrigatoriedade de fazer constar da sentença as razões e motivações para a curatela específica e seu tempo de duração.
Não se fala mais de interdição, que tinha como finalidade vedar o exercício da pessoa com deficiência mental ou intelectual, de todos os atos da vida civil, ficando sob a imposição da mediação do curador.
O novo Código de Processo Civil (CPC) revogou os artigos 1.768 a 1.773 do Código Civil, que tratam da promoção da curatela, interdição, aparentemente por disciplinarem assuntos de direito processual e não de direito material, o novo CPC desconsiderou tanto o projeto de lei que se converteu no Estatuto da Pessoa com Deficiência, quanto, o que é mais grave, a Convenção promulgada em 2009, que tem força de emenda constitucional, por ser matéria de direitos humanos, com supremacia sobre qualquer lei ordinária.
O Estatuto de 2015, restaura os artigos do Código Civil relativos à curatela revogados por este, dando-lhes nova redação, em conformidade com a Convenção, estabelecendo diferentes tempos para vacatio legis:
“O Estatuto entrará em vigor no dia 3 de janeiro de 2016 (180 dias) e o novo CPC no dia 17 de março de 2016 (um ano). A desatenção do legislador fez brotar essa aparente repristinação”.
As regras do novo CPC, possuem força normativa superior àquele, relativamente à curatela especial, como medida protetiva e temporária, não sendo cabível a interpretação que retome o modelo superado de interdição, apesar da terminologia inadequada utilizada pela lei processual.
Em suma, não existe mais, no sistema privado brasileiro, pessoa absolutamente incapaz que seja maior civilmente. Como consequência, não há que se falar mais em ação de interdição absoluta no nosso sistema civil, pois os menores não são interditados. Todas as pessoas com deficiência, das quais tratava o comando anterior, passam a ser, em regra, plenamente capazes para o Direito Civil, o que visa a sua plena inclusão social, em prol de sua dignidade. (SARLET, 2006)
No plano familiar há uma expressa inclusão plena das pessoas com deficiência, como descreve o art. 6º da lei 13.146/2015, segundo o qual a deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa, inclusive para: a) casar-se e constituir união estável; b) exercer direitos sexuais e reprodutivos; c) exercer o direito de decidir sobre o número de filhos e de ter acesso a informações adequadas sobre reprodução e planejamento familiar; d) conservar sua fertilidade, sendo vedada a esterilização compulsória; e) exercer o direito à família e à convivência familiar e comunitária; e f) exercer o direito à guarda, à tutela, à curatela e à adoção, como adotante ou adotando, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas. (BASILE, 2015)
Eventualmente, e em casos excepcionais, essas pessoas podem ser tidas como relativamente incapazes em algum enquadramento do novo art. 4º do Código Civil, como a situação de um deficiente que seja viciado em tóxicos, podendo ser tido como incapaz como qualquer outro sujeito, porém foi modificado de forma considerável pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência.
O seu inciso II não faz mais referência às pessoas com discernimento reduzido, que não são mais consideradas relativamente incapazes, como antes estava regulamentado, tendo ficado mantidas no diploma as menções os alcoólatras e aos viciados em tóxicos, que continuam dependendo de um processo de interdição relativa, com sentença judicial, para que sua incapacidade seja realmente reconhecida.
O inciso III do art. 4º do CC/2002, sem mencionar mais os excepcionais sem desenvolvimento completo, anteriormente havia incidência para a pessoa com síndrome de Down, mas atualmente não é considerado um incapaz.
4.4 O Estatuto da Pessoa com Deficiência como Forma de Promoção da Dignidade da Pessoa Humana
A Constituição Federal de 1988 elevou a dignidade da pessoa humana ao patamar de um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, além de decidir fundamentalmente que o Estado existe em função da pessoa humana e não o contrário. Essa premissa é suficiente para se inferir que não por acaso a dignidade integra o rol de direitos e garantias fundamentais, sendo consagrada como princípio fundamental.
Ingo Wolfgang Sarlet (SARLET, 2014, p. 124), assevera que:
Em termos gerais, a doutrina constitucional parte do pressuposto de que a dignidade da pessoa humana assenta-se em fundamentos ético-filosóficos, sendo ínsita à condição humana, representando um princípio supremo no trono da hierarquia das normas. Com efeito, a qualificação normativa da dignidade da pessoa humana como princípio fundamental traduz a certeza de que o art. 1º, III, da Constituição não contém apenas (embora também) uma declaração de conteúdo ético, na medida em que representa uma norma jurídico-positiva dotada, em sua plenitude, de status constitucional formal e material.
A dignidade da pessoa humana tem como escopo principal ser o valor orientador os direitos fundamentais e de todo o ordenamento jurídico, constituindo-se como princípio constitucional de maior hierarquia valorativa.
O princípio da dignidade humana é a representação do ideal de efetivação dos direitos constitucionais, constituindo-se o vetor de todo o sistema jurídico pátrio. Esse princípio pressupõe o abarcamento das expressões mais extraordinárias da dignidade do ser humano, notadamente porque o seu campo de concentração inclui dois valores fundamentais para o viver digno do homem: a vida e a liberdade.
Para Nery e Júnior (2014, p. 24), o reflexo dessa realidade dogmática na fenomenologia jurídica, especificamente, na compreensão da posição jurídica da pessoa natural, recobre da mesma dignidade o sujeito de direitos, porque a pessoa natural realiza o direito, como sujeito.
A pessoa humana deve ter o domínio único dos seus atos, exercendo a sua capacidade de agir como autor e não mais como ator. As prerrogativas são inerentes à pessoa humana que é integrante de uma comunidade social e, por isso, é detentora das suas vontades e deve, em regra, exercê-las de forma exclusiva. Quando há uma ocasião em que o sujeito de direito não consegue exprimir sua vontade de forma solitária, abre-se espaço para o instituto da representação ou assistência como forma de viabilização do exercício dessa vontade. Entrementes, essa prática dos atos por terceiros em representação ou assistência deve ser concretizada com cautela, a fim de se preservar a vontade existencialista do indivíduo.
Nessa esteira de pensamento é que o Estatuto da Pessoa com Deficiência se utiliza do princípio da dignidade da pessoa humana como vetor para a promoção da dignidade das pessoas com deficiência.
Deve ser levada em conta que a proteção ao cidadão é a maneira mais segura para garantir os seus direitos fundamentais. Em se tratando das pessoas com deficiência, esse conceito deve ser entendido da forma mais abrangente possível, sobretudo porque a concretização dos direitos dessas pessoas perpassa por uma análise mais complexa, que envolve a capacidade jurídica da pessoa deficiente, a forma de externalização da sua vontade e a promoção de sua cidadania.
A utilização do conceito de cidadania em consonância com o propósito da dignidade da pessoa humana é medida imprescindível para que esse período de transição seja ameno e que descortine um Direito Civil mais sensível às necessidades humanas, notadamente às necessidades de quem historicamente foi marginalizado frente à sua deficiência.
O Estatuto da Pessoa com Deficiência é a instrumentalização de uma mudança paradigmática na questão atinente à incapacidade civil da pessoa deficiente, sendo considerada a dignidade da pessoa humana como vetor axiológico para a concretização da inclusão social das pessoas com deficiência.
Pablo Stolze lembra que:
Em verdade, este importante estatuto, pela amplitude do alcance de suas normas, traduz uma verdadeira conquista social. Trata-se, indiscutivelmente, de um sistema normativo inclusivo, que homenageia o princípio da dignidade da pessoa humana em diversos níveis. (STOLZE, 2015, p.2)
Afirmando que o Estatuto da Pessoa com Deficiência está consonante com o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, (AGUIRRE, 2015, p. 1) preleciona que:
O tratamento dado à pessoa com deficiência ao longo da história remete ao grupo dos apartados, em que catalogados como loucos ou inválidos eram excluídos do sistema e, muitas vezes, vítimas de opressão e crueldade (...). Esse sistema estava em consonância com o paradigma patriarcal e patrimonialista característico da época em que entrou em vigor. Com ao advento da Constituição Federal de 1988, rompe-se com esse vetusto paradigma, para se adotar outro, existencialista, ancorado na tutela da pessoa humana e de sua dignidade, pautando-se pela inclusão e respeito à diversidade.
Assim, infere-se que a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência) é instrumento para a promoção da dignidade das pessoas com deficiência. A sua função primordial é garantir que a pessoa com deficiência exerça, em sua plenitude, todos os direitos que lhe são deferidos em razão da sua condição de ser humano. O cotejo entre o propósito da novel legislação e o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana é necessário e também possui como condão a promoção e proteção de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais inerentes à pessoa com deficiência.