A evolução do Direito de Família à luz da legislação

Novos conceitos: Leis 12.318/2010 e 13.058/2014

04/01/2017 às 12:01
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A evolução do Direito de Família, neste contexto, enfoca o desdobramento fático da Autoridade Parental após o rompimento conjugal, abordando os conceitos trazidos pela Lei 12.318/2010 (Alienação Parental) e a Lei 13.058/2014 (Guarda Compartilhada).


 

RESUMO

A evolução do Direito de Família, neste contexto, enfoca o desdobramento fático da Autoridade Parental após o rompimento conjugal, abordando os conceitos trazidos pela Lei 12.318/2010 (Lei de Alienação Parental) e a Lei 13.058/2014 (Lei da Guarda Compartilhada). Ao longo dos anos o Direito de Família sofreu diversas mudanças, buscando novos modelos de proteção ao menor, a família e às necessidades de avanço da sociedade. Os conceitos evoluíram e a Lei buscou acompanhar estas mudanças amparando tais conceitos. É de extrema relevância o estudo dos conceitos legais trazidos pelas referidas leis, uma vez que tais conceitos objetivam ampliar a proteção dos interesses dos menores e a abrangência da Autoridade Parental. Após a dissolução do casamento, o que fazer com a prole? Como definir o titular da guarda? Como garantir o melhor interesse do menor? O que fazer quando um dos genitores resolve dificultar o exercício da autoridade parental e/ou criar empecilhos e prejuízos à manutenção do vínculo afetivo do outro? Necessário é que tanto o Legislativo, quanto o Judiciário abordem estas questões sempre visando o melhor para o menor. A prole pertence ao casal e a definição da guarda deve ser, por regra, compartilhada, salvo diante da impossibilidade declarada de um dos genitores. Quando um dos genitores ignora o bem-estar do menor e em nome de seus interesses passa a dificultar o exercício da autoridade parental do outro, ou até mesmo, impedir a manutenção do vínculo afetivo com o menor, cabe ao Estado intervir para garantir a convivência familiar saudável.

Palavras-chave: Direito de Família. Autoridade Parental. Alienação Parental. Guarda Compartilhada. Proteção ao menor.

INTRODUÇÃO

O maior desafio deste artigo é abordar os novos conceitos à luz da moderna legislação acerca do tema, pois existe uma enorme resistência em reconhecer a evolução das relações interpessoais, principalmente no âmbito familiar, núcleo considerado restrito e intocável pela sociedade conservadora.

Até bem pouco tempo atrás o casamento era indissolúvel, logo, vê-se a dificuldade de construir um processo de dissolução do matrimônio associado à definição de guarda dos filhos. Definir o que fazer com a prole após o rompimento da sociedade conjugal e como definir o titular da guarda foram questões tratadas ao longo dos anos pela doutrina e jurisprudência, objetivando o bem-estar dos menores.

Segundo MARIA BERENICE DIAS, em seu Manual de Direito das Famílias:

“Sempre existe uma enorme resistência ao novo. Ou por medo do desconhecido ou por puro conservadorismo. A tendência é manter as coisas como estão e tentar fazer com que voltem a ser o que não são mais. A mentalidade conservadora além da dificuldade de assimilar o novo resiste a ele, sem questionar se a novidade não é para melhor.

Ainda assim, avanços acontecem, e são mais perceptíveis no que diz respeito aos vínculos afetivos. Por mais que tente, a lei não acompanha essas mudanças e o legislador não consegue impor modelos de comportamento. É difícil dizer se é a sociedade que traz reflexos nas relações familiares ou se são as mudanças no âmbito da família que levam à evolução da sociedade. Mas ninguém duvida que ocorreu uma evolução –quase uma revolução – significativa. Antes se valorizava exclusivamente a família constituída pelo casamento, tanto que sua manutenção era imposta pela Lei. Basta lembrar que o casamento era indissolúvel. Agora se privilegia a pessoa, cuja dignidade é respeitada como princípio fundamental. Além das novidades legais, sempre faço a inserção da doutrina que surgiu e atualizo a jurisprudência. Mais uma vez assumo o compromisso de trazer a debate o mais humano de todos os direitos, pois diz com o direito à felicidade, sonho de todos nós.”

O fato é que se observou ao longo dos anos que a prole, fruto do ex-casal, estava desprovida da devida proteção legislativa, pois se passou a constatar o surgimento da SAP (Síndrome da Alienação Parental), um processo de implantação de falsas memórias e/ou campanhas de desqualificação ao genitor alienado, onde a criança passa a ser visto como um estranho, que poderá causar mal a seu filho.

Este processo não é imediatista, se instala aos poucos, onde o genitor alienante utiliza-se de meios de programação emocional da criança (abuso emocional) denegrindo a imagem do outro genitor, afastando-os e impedindo sua relação de afeto.

Geralmente esta prática é realizada pelo genitor que detém a guarda do menor e com isso, acaba tendo mais convivência com a criança, por isso, a legislação atual trata da ampliação da convivência dos menores com o genitor alienado e reconheceu que a Guarda Compartilhada oferece mais garantias aos menores.

Com o advento da Lei 12.318/2010 (Lei de Alienação Parental) e a Lei 13.058/2014 (Lei da Guarda Compartilhada), o Estado, na figura do Poder Judiciário, poderá enfrentar as situações trágicas a que estão submetidas às vítimas da Síndrome da Alienação Parental (SAP), restabelecendo os tão necessários vínculos de amor entre pais e filhos atingidos, bem como, impedindo que novas vítimas surjam.

1 FAMÍLIA

1.1 BREVE HISTÓRICO SOBRE EVOLUÇÃO FAMILIAR

Na Roma antiga o Direito trazia a figura do Pátrio Poder, a família estava debaixo do poder do Pai, ou seja, do homem (“pater familias”). A família era vista como a coletividade dentro de um lar, a casa, os bens e tudo o que era necessário para o bom funcionamento dessa entidade. Era totalmente voltada ao patrimônio e à continuidade da linhagem, valorizando a filiação para fins de sucessão dos bens, onde o primogênito do sexo masculino herdava as propriedades do “pater familias”.

Essa concepção romana patriarcal ruiu no tempo do Imperador Constantino, surgindo a família cristã, com sua unidade conjugal e familiar compreendida pelo Pai, Mãe e os filhos, trazendo moralidade à sociedade.

A igreja “tenta humanizar as relações familiares, reprovando os interesses individuais, valorando a noção de conjunto”[1], com apoio dos imperadores cristãos, culminando na maior intervenção do Estado na família, surgindo a indissolubilidade do casamento, sexo para procriação e perpetuação da espécie.

Surge então a idéiarousseauniana quebrando a hierarquia familiar e defendendo a manutenção dos laços apenas em relação ao afeto. Nasce uma nova concepção de casamento, onde os cônjuges passam a se escolher, não por convenções ou interesses, mas pelo afeto, destacando a importância da prole.

A Revolução Industrial também altera a visão familiar, conforme pensamento de César Augusto de Castro Fiúza:

(...) “o casal mediano é obrigado a compartilhar o mesmo leito, o mesmo cubículo conjugal. A indissolubilidade do casamento, talvez mesmo por essa causa, começa a ser posta em xeque. A mulher se vê na contingência de trabalhar para o sustento do lar, assumindo esta nova postura com orgulho e obstinação. Começa a libertação feminina, fazendo ruir o patriarcalismo.”[2]

O Código Civil da França revolucionou o Direito de Família ao substituir o patriarcado existente pelo patriarcado estatal. Napoleão Bonaparte entendia que o ser humano era fundamental para o Estado, tanto pela riqueza que produzia, como pelo poderio militar e por isso passou a investir na formação individual desde a infância, fazendo das famílias grandes aliados.

Ao longo do século XX grandes acontecimentos influenciaram nas mudanças da estrutura familiar, como por exemplo: as grandes guerras mundiais, a falência do poder da Igreja, os regimes totalitários, a revolução sexual de 1960.

Sobre esse período afirma EDUARDO DE OLIVEITA LEITE:

“Na medida em que o acesso dos jovens à sexualidade se tornou de fato normal, esvaziado de qualquermistério, o nível de exigência e satisfação mútua nesse terreno cresceu proporcionalmente na qualidade, o que explica, em termos, a facilidade das rupturas e o recurso de novos parceiros.”[3]

Os relacionamentos agora baseados em amor e afeto, não são mais indissolúveis e com isso passou a ser cada vez mais frequente a dissolução conjugal, aumentando o número de divórcios. Neste contexto, as mulheres passaram a ser “chefes de famílias” e tornou-se praticamente uma regra que os homens ficassem com o ônus financeiro (pensão alimentícia) e a mulher cuidava da prole (guarda).

A sociedade evoluiu, as necessidades mudaram e com isso a Lei mudou. Os problemas decorrentes da guarda unilateral feminina eram quase sempre os mesmos: atos de alienação parental, os quais, de maneira recorrente, constituíram a chamada SÍNDROME DE ALIENÇÃO PARENTAL (SAP).

1.2 PODER FAMILIAR

No Código Civil de 1916, o poder familiar era chamado “pátrio poder”, por conta da sociedade patriarcal da época. Em 1962, o “pátrio poder” foi mitigado pelo Estatuto da Mulher Casada (Lei 4.121/1962), que assegurou o “pátrio poder” para ambos os pais. Mesmo depois da mudança, o termo “poder familiar” não traduz a essência do instituto, pois na verdade, trata-se de um dever natural e legal de proteção da prole e por isso a doutrina vem preferindo dizer “autoridade parental”.

Portanto, o poder familiar é um poder-função ou direito-dever[4],é o exercício da autoridade e consequente responsabilidade dos pais sobre os filhos, buscando alcançar o melhor interesse do menor, tanto no âmbito patrimonial, quanto no pessoal. O poder familiar é irrenunciável, intransferível, inalienável e imprescritível.

1.2.1 TITULARIDADE DO PODER FAMILIAR

O poder familiar pertence a ambos os pais, do nascimento até os 18 anos ou com a emancipação. Se os pais são separados, a guarda poderá ser unilateral ou compartilhada, porém, o poder familiar é de titularidade de ambos, conforme preceitua o Artigo 1.634 do Código Civil Brasileiro:

“Art. 1.634. Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos:

I - dirigir-lhes a criação e a educação;

II - exercer a guarda unilateral ou compartilhada nos termos do art. 1.584; III - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem;

IV - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para viajarem ao exterior;

V - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para mudarem sua residência permanente para outro Município;

VI - nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar;

VII - representá-los judicial e extrajudicialmente até os 16 (dezesseis) anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento;

VIII - reclamá-los de quem ilegalmente os detenha;

IX - exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição.”

1.2.1 SUSPENSÃO, PERDA E EXTINÇÃO DO PODER FAMILIAR

O poder familiar é um dever dos pais em relação aos interesses dos filhos, cabendo ao Estado fiscalizar sua adimplência, podendo aplicar sanções, como a suspensão ou a destituição do poder familiar, a quem o descumprir, porém, não como pena, mas sim no intuito de preservar o melhor interesse dos menores.[5]

A suspensão do poder familiar poderá ser total ou parcial, de acordo com a gravidade dos atos praticados, nos termos do Artigo 1.637 do Código Civil Brasileiro e por ser medida menos gravosa, está sujeita à revisão.

A perda do poder familiar é uma sanção imposta por sentença judicial, sendo medida imperativa nos termos do Artigo 1.638 do Código Civil Brasileiro.

Já a extinção do poder familiar ocorre pela morte, emancipação ou extinção do sujeito passivo (no caso de adoção, por exemplo), hipóteses previstas no Artigo 1.635 do Código Civil Brasileiro.

Importante ressaltar que a Lei utiliza-se indistintamente das expressões “perda e extinção”, porém a doutrina explica tal distinção e enfatiza que o rol da lei é meramente exemplificativo, podendo surgir outras situações concretas.

2 A PROTEÇÃO DA PROLE DE PAIS SEPARADOS

2.1 VISÃO HISTÓRICA

Sempre foi obrigação da Mãe cuidar dos filhos. Os homens foram criados para trabalhar e cuidar de questões patrimoniais, enquanto cabia às mulheres cuidar da casa e dos filhos. A legislação antiga trazia que na hipótese de divórcio, os filhos ficariam com o “cônjuge inocente” e se ambos fossem culpados, o juiz quase sempre escolhia a Mãe, desde que isso não trouxesse nenhum prejuízo moral aos filhos.

Modernamente, os homens passaram a exercer ativamente a paternidade e as mulheres passaram a trabalhar e sustentarem seus lares, portanto, a sociedade evoluiu, os conceitos familiares também e a Lei não poderia deixar de acompanhar tal evolução.

Com o fim da sociedade conjugal, os homens passaram a não aceitar a condição de meros visitadores e pagadores de pensão alimentícia, passaram a disputar a guarda dos filhos, pois estavam fartos de serem alvo das vinganças maternas, que não permitiam que estes tivessem livre acesso aos seus filhos.

O primeiro avanço legislativo ocorreu em 2008, com o advento da Lei 11.698/2008, lei que instituiu a Guarda Compartilhada e sinalizou a preferência pelo compartilhamento da guarda, porém, o uso da expressão “sempre que possível”, deu margem a interpretações equivocadas pela jurisprudência e na maioria das vezes o compartilhamento da guarda não era aplicado pelos juízes, prevalecendo a vontade do genitor que não queria dividir a guarda.

Neste sentido, o Superior Tribunal de Justiça, trouxe um brilhante acórdão da Ministra Nancy Andrighi, no ano de 2011, enfatizando a Guarda Compartilhada como regra e como a modalidade que melhor atendia aos interesses da prole:

“CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. FAMÍLIA. GUARDA COMPARTILHADA.

CONSENSO. NECESSIDADE. ALTERNÂNCIA DE RESIDÊNCIA DO MENOR. POSSIBILIDADE.

1. Ausente qualquer um dos vícios assinalados no art. 535 do CPC, inviável alegada violação de dispositivo de lei.

2. A guarda compartilhada busca a plena proteção do melhor interesse dos filhos, pois reflete, com muito mais acuidade, a realidade da organização social atual que caminha para o fim das rígidas divisões de papéis sociais definidas pelo gênero dos pais.

3. A guarda compartilhada é o ideal a ser buscado no exercício do Poder Familiar entre pais separados, mesmo que demandem deles reestruturações, concessões e adequações diversas, para que seus filhos possam usufruir, durante sua formação, do ideal psicológico de duplo referencial.

4. Apesar de a separação ou do divórcio usualmente coincidirem com o ápice do distanciamento do antigo casal e com a maior evidenciação das diferenças existentes, o melhor interesse do menor, ainda assim, dita a aplicação da guarda compartilhada como regra, mesmo na hipótese de ausência de consenso.

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5. A inviabilidade da guarda compartilhada, por ausência de consenso, faria prevalecer o exercício de uma potestade inexistente por um dos pais. E diz-se inexistente, porque contrária ao escopo do Poder Familiar que existe para a proteção da prole.

6. A imposição judicial das atribuições de cada um dos pais, e o período de convivência da criança sob guarda compartilhada, quando não houver consenso, é medida extrema, porém necessária à implementação dessa nova visão, para que não se faça do texto legal, letra morta.

7. A custódia física conjunta é o ideal a ser buscado na fixação da guarda compartilhada, porque sua implementação quebra a monoparentalidade na criação dos filhos, fato corriqueiro na guarda unilateral, que é substituída pela implementação de condições propícias à continuidade da existência de fontes bifrontais de exercício do Poder Familiar.

8. A fixação de um lapso temporal qualquer, em que a custódia física ficará com um dos pais, permite que a mesma rotina do filho seja vivenciada à luz do contato materno e paterno, além de habilitar a criança a ter uma visão tridimensional da realidade, apurada a partir da síntese dessas isoladas experiências interativas.

9. O estabelecimento da custódia física conjunta, sujeita-se, contudo, à possibilidade prática de sua implementação, devendo ser observada as peculiaridades fáticas que envolvem pais e filho, como a localização das residências, capacidade financeira das partes, disponibilidade de tempo e rotinas do menor, além de outras circunstâncias que devem ser observadas.

10. A guarda compartilhada deve ser tida como regra, e a custódia física conjunta - sempre que possível - como sua efetiva expressão.

11. Recurso especial não provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do (a) Sr (a). Ministro (a) Relator (a). Os Srs. Ministros Massami Uyeda, Sidnei Beneti, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas BôasCueva votaram com a Sra. Ministra Relatora.Brasília (DF), 23 de agosto de 2011 (Data do Julgamento). MINISTRA NANCY ANDRIGHI. Relatora”

Apesar do grande avanço com a Jurisprudência do STJ, os juízes em primeiro grau continuaram resistindo em fixar a Guarda Compartilhada como regra, o que fez com que o legislador se manifestasse para esclarecer o significado da expressão “guarda compartilhada” e estabelecer sua aplicação, através da Lei 13.058/2014 que fixou como regra a Guarda Compartilhada ao alterar o Artigo 1.584 do Código Civil:

“§2º Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar, será aplicada a guarda compartilhada, salvo se um dos genitores declarar ao magistrado que não deseja a guarda do menor.”

A Lei 13.058/14, que merece ser chamada de Lei da Igualdade Parental, explicita o modo de compartilhamento (Artigo 1.583, §2º do CCB): o tempo de convívio com os filhos deve ser dividido de forma equilibrada com a mãe e com o pai, sempre tendo em vista as condições fáticas e os interesses dos filhos[6].Neste sentido, a guarda compartilhada é a modalidade que melhor atende aos interesses dos menores, pois possibilita o relacionamento afetivo com ambos os genitores e suas respectivas famílias, salvaguardando seus direitos e garantias fundamentais.

2.2 GUARDA

A palavra guarda expressa uma ideia de “coisificação” do filho, colocando-o mais na condição de objeto, do que de sujeito de direito. Daí a preferência pela expressão direito de convivência[7].

Com o passar do tempo observou-se que quanto mais conflituosa for a relação dos genitores, maior necessidade haverá de regulamentar detalhadamente o regime de convivência dos pais com a prole, evitando que um genitor fique à mercê do poder do outro, só tendo acesso ao filho quando este permitir.

A lei agora prioriza que ambos os genitores deverão ter direitos, deveres e responsabilidades conjuntas (Artigo 1.583, § 1º do CCB), havendo, além disso, a divisão equilibrada do tempo de convivência (Artigo 1.583, § 2º do CCB) e havendo inobservância dolosa ou culposa resultará em pena de multa para ambos nos termos do Artigo 249 do ECA.

Atualmente, segundo a Lei, a guarda pode ser unilateral ou compartilhada (Artigo 1.583 do CCB), sendo esta última a regra, conforme Artigo 1.584, §2º do CCB.

2.2 GUARDA UNILATERAL

Nesta hipótese, a guarda é atribuída a um só dos genitores (Artigo 1.583, §1º do CCB), devendo ser fixado para o outro um período mínimo de convívio e atualmente, esta modalidade só ocorrerá se o genitor declarar em juízo que não deseja a guarda do filho, conforme Art. 1.584, § 2º in fine do Código Civil Brasileiro.

O genitor que não desejar a guarda terá a obrigação de supervisionar os interesses dos filhos e para isso terá legitimidade para solicitar informações e até prestações de contas sobre quaisquer assuntos referentes aos filhos (Artigo 1.583, §5º do CCB).

Inclusive, a Lei estendeu essa legitimidade aos estabelecimentos públicos e privados, os quais não poderão se negar a fornecer informações para os genitores, sob pena de multa, que podem variar de R$200,00 à R$500,00 por dia, (Artigo 1.584, §6º do CCB).

Ao genitor não guardião é resguardado a visitação ao menor, que será acordada pelos pais e homologada pelo juiz ou somente fixada por este, quando não há acordo entre os genitores no que se refere à visitação, nos termos do Artigo 1.589 do Código Civil Brasileiro. Importante frisar quer a visitação é uma obrigação do genitor para atender o direito e o bem-estar do menor a ser visitado.

2.2 GUARDA COMPARTILHADA

Antes do rompimento conjugal, os pais exercem em conjunto suas funções, parentais e com o advento do divórcio, normalmente há uma redefinição de tarefas, porém, nem sempre de forma equilibrada. A guarda compartilhada tem por condão garantir de forma efetiva que, mesmo com o fim do vínculo conjugal, a responsabilidade parental continue conjunta, garantindo o exercício do poder familiar aos genitores de forma plena e equilibrada, visando o melhor interesse da prole.

Os pais deverão participar de forma mais intensa do desenvolvimento integral dos filhos e preservar a relação afetiva com eles. Segundo Maria Antonieta Pisano Motta,

“a guarda compartilhada deve ser tomada, antes de tudo, como uma postura, como o reflexo de uma mentalidade, segundo a qual pai e mãe são igualmente importantes para os filhos de qualquer idade e, portanto, essas relações devem ser preservadas para a garantia de que o adequado desenvolvimento fisiopsíquico das crianças ou adolescentes envolvidos venha a ocorrer.”[8]

A lei determinou que a guarda compartilhada agora é a regra, pois traz amplas garantias aos filhos e retira da guarda a antiga ideia de posse da prole, primando pelo relacionamento afetivo e divisão de responsabilidades entre os pais.

A guarda compartilhada poderá ser fixada por acordo entre os pais (Artigo 1.584, I do Código Civil Brasileiro) ou por determinação judicial, quando verificado que ambos têm condições de exercer o poder familiar (Artigo 1.584, II do Código Civil Brasileiro).

Fixada a guarda compartilhada, caberá ao juiz estabelecer as atribuições de cada genitor e o período de convivência com a prole, buscando sempre o equilíbrio, nos termos do Artigo 1.584, § 3º do Código Civil Brasileiro).

No que se refere aos alimentos, estes são de responsabilidade de ambos os pais, devendo, portanto, serem divididos entre eles, devendo cada um concorrer na medida de sua própria capacidade financeira. Neste sentido, mesmo a guarda sendo compartilhada, a obrigação alimentar poderá subsistir em situações excepcionais, desde que comprovado que um genitor tenha melhor condição financeira que o outro e que este necessita de ajuda para complementar os alimentos do menor quando este estiver em sua companhia.

3 A SÍNDROME DA ALIENAÇÃO PARENTAL

Ao longo dos anos, na esteira dos conflitos familiares, surgiu um fenômeno conhecido como Síndrome da Alienação Parental – SAP, ou simplesmente, Alienação Parental ou ainda “implementação de falsas memórias”.

Era comum que, após o rompimento conjugal, um pai passasse a desqualificar a imagem do outro para a prole, porém, esta prática reiterada passou a “gerar frutos” capazes de trazer grandes prejuízos aos menores e por isso passou a ser objeto de estudos e atenção jurídica.

A primeira definição de Síndrome de Alienação Parental – SAP, foi trazida em 1985 por Richard Gardner, professor de psiquiatria clínica na Universidade de Columbia nos Estados Unidos da América, onde exercia também a função de perito judicial. A partir dessa experiência, notou-se que a SAP tem seu início quando um dos cônjuges não consegue lidar adequadamente com o “luto da separação” e começa a nutrir sentimentos ruins contra o outro, desencadeando um desejo de vingança, alimentado pela rejeição, raiva, traição, angústia e abandono, desencadeando um processo de desmoralização do ex-parceiro perante a prole.

Neste contexto, o genitor ferido emocionalmente passa a tentar anular o outro nas suas funções parentais e ao mesmo tempo incitar um sentimento de rejeição da prole diante dele, desqualificando sua imagem para os filhos, chegando ao ponto de implementar falsas memórias na prole, realizando verdadeira “lavagemcerebral”, como explica Lenita Duarte,

“ao abusar do poder parental, o genitor alienador busca persuadir os filhos a acreditar em suas crenças e opiniões. Ao conseguir impressioná-los, leva-os a se sentirem amedrontados na presença do não guardião. Por outro lado, ao não verem mais o genitor, sem compreenderem a razão de seu afastamento, os filhos sentem-se traídos e rejeitados, não querendo mais vê-lo. Como consequência, sentem-se também desamparados e podem apresentar diversos sintomas.”[9]

Observe que o filho é utilizado como objeto de instrumentalização do ódio do genitor alienador, sendo convencido de que deve se afastar e deixar de amar o genitor alienado, pois acredita em toda falsa versão que lhe foi implantada.

Segundo Ana Carolina Carpes Madaleno e Rolf Madaleno[10], a SAP:

“[...] trata-se de uma campanha liderada pelo genitor detentor da guarda da prole, no sentido de programar a criança para que odeie e repudie, sem justificativa, o outro genitor, transformando a sua consciência mediante diferentes estratégias, com o objetivo de obstruir, impedir ou mesmo destruir os vínculos entre o menor e o pai não guardião, caracterizado, também, pelo conjunto de sintomas dela resultantes, causando, assim, uma forte relação de dependência e submissão do menor com o genitor alienante. E, uma vez instaurado o assédio, a própria criança contribui para a alienação. ”

Diante disto, mostra-se essencial a busca por novos modelos capazes de dar proteção ao interesse do menor e de responder às necessidades do avanço da sociedade. Nesse contexto, cabe ser analisado o estudo da guarda compartilhada, como forma de proporcionar esse amparo.

Para atender tais necessidades, no ano de 2010 o Poder Legislativo positiva e regula o conceito de Alienação Parental, publicando a Lei 12.318/2010, a qual traz em seu Artigo 2º o conceito de “ato de alienação parental”:

“Art. 2o  Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.” 

Neste contexto, é mister analisar como a Síndrome de Alienação Parental se instala e como identificar os estágios desta síndrome.

3.1 ESTÁGIOS DA SÍNDROME DE ALIENAÇÃO PARENTAL

De acordo com a ocorrência, progressão e gravidade da Síndrome de Alienação Parental, os especialistas a definem em três níveis:

  1. Estágio I ou leve (ligeiro): neste estágio a visitação ao menor ocorre quase que sem problemas; Existem conflitos pontuais e o menor ainda mostra afeição pelo genitor alienado. Embora exista uma campanha difamatória em desfavor do genitor alienado, o vínculo emocional entre o menor e o genitor alienado ainda é forte, quase como era durante a convivência familiar. Quando o genitor alienante não está presente o menor o defende e o apóia e por vezes demonstra-se culpado em relação ao alienante por ser afetuoso com o genitor alienado. Neste estágio, uma decisão judicial seria possivelmente eficaz para resolver o conflito inicial.

  1. Estágio II ou médio (moderado): com o avanço das agressões e sua prática reiterada, o alienante acaba conseguindo influenciar os desejos e sentimentos do menor, criando um vínculo forte e o tornando “cúmplice” na prática da alienação parental. Nesta fase, os conflitos na hora de buscar ou entregar os menores são constantes e é comum que o genitor alienado tenha que se explicar e se defender das acusações feitas pelo alienante, para que seu período de visitação transcorra com tranqüilidade. Torna-se mais comum situações em que o menor defenda o alienante e acuse e/ou culpe o alienado, podendo pontualmente, apoiar o genitor alienado, fazendo com que o vínculo afetivo comece a se deteriorar. Observa-se nesta etapa um distanciamento não apenas em relação ao genitor alienado, mas também em relação à família deste.
     
  2. Estágio III ou grave: neste estágio os menores estão totalmente perturbados e programados para odiar o genitor alienado e sua família. As visitas são difíceis, repletas de ódio e provocações ou simplesmente não ocorrem, porque o vínculo afetivo encontra-se totalmente cortado entre eles. É habitual que haja crises de choro, explosão de violência ou ao contrário, crianças emudecidas que se recusam a interagir com o genitor alienado. A síndrome alcança seu ápice, pois o menor agora, sem ajuda do genitor alienante, passa a realizar todos os atos para os quais foi programado pelo alienante, o qual passa a “se fazer de vítima”. As encenações tornam-se constantes e o alienante passa a agir obsessivamente para “defender” a prole do suposto mal causado pelo genitor alienado, transferindo essa paranóia para a prole, que passa a agir como se o genitor alienado fosse a causador de todos os males. Nesta fase, o alienador testa a prole constantemente acerca da sua “lealdade”, impedindo que toda esta situação seja revertida.

3.2 SAP x ABUSO SEXUAL

É comum que o genitor alienante utilize as mais diversas táticas para impedir a visitação do genitor alienado à prole e a mais cruel delas é a falsa denúncia de abuso sexual contra a criança.

O alienante aproveita-se do distanciamento e do ódio instalado no menor e programa falsas memórias na criança, fazendo-a repetir o discurso vitimista até inseri-lo no seu consciente como se verdade fosse, a qual nem percebe a manipulação que está sofrendo.

É preciso analisar as situações de possíveis abusos sexuais com muito cuidado, pois é possível que um genitor que realmente abusou sexualmente do filho tente se esconder detrás da SAP, para livrar-se da referida prática criminosa.

No quadro[11] abaixo podemos identificar as principais diferenças entre a SAP e as situações reais de abusos ou negligência:

ABUSO OU NEGLIGÊNCIA

SAP

Comportamento do menor

A criança recorda com facilidade os acontecimentos, sem nenhuma ajuda externa; o relato é detalhado e possui credibilidade.

Por não ter vivido o que relata, o menor precisa de ajuda para ·recordar-se· dos fatos. Quando o relato acontece na presençade irmãos ou do genitor alienante, a troca de olhares é intensa entre eles, como se necessitasse de ajuda ou aprovação; poucos detalhes e credibilidade.

Possui conhecimentos sexuais inadequados para sua idade; confusão referente às relações sociais; pavor em relação a contatos com adultos; brincadeiras sexuais precoces e desapropriadas; masturbação excessiva; agressões sexuais a outros menores etc.

Não existem indicadores sexuais ou são próprios da idade.

É comum o aparecimento de indícios físicos, como infecções e lesões.

Sem indícios físicos, porém alguns alienadores podem provocar hematomas.

Apresentam distúrbios funcionais, como enurese, sono alterado e distúrbios alimentares.

Não apresentam distúrbios funcionais.

Costumam apresentar sentimento de culpa, vergonha, sintomas depressivos e tentativa de suicídio.

Não apresentam sentimento de culpa.

Comportamento do genitor que denuncia o abuso

Tem consciência da dor e da destruição de vínculos que a denúncia acarreta; requer celeridade para averiguar os fatos; algumas vezes também sofreu abuso (físico ou emocional) do ex-cônjuge.

Não se importa nem

toma conhecimento do transtorno que a alegação causará à família; sua intenção é ganhar tempo, buscando laudos que sejam satisfatórios à sua pretensão, não importando o tempo que leve nem quantos tenha que realizar; interfere diversas vezes no processo, para atrapalhar.

Comportamento do genitor acusado

Não raro, apresenta distúrbios em outras áreas da vida.

Aparentemente saudável em todas as áreas de sua vida.

3.3 SAP x MÃE USURPADORA

Quando a prole é fruto de um relacionamento rápido, que terminou antes da criança nascer ou ainda bebês, é comum que as mães tentem usurpar a figura paterna, pois não os consideram pais do seu filho. Esta modalidade diferencia-se da SAP mo que se refere ao vínculo entre pai e filho, pois ao invés de tentar destruí-lo, ela quer que este não se estabeleça, já que ainda não foi construído.

3.4 SAP x LAVAGEM CEREBRAL

Na verdade a SAP é um processo muito mais complexo, que engloba, também a lavagem cerebral, porém, é muito mais ampla que esta última. Na SAP é possível, em estágios mais graves, que o menor vítima passe a ter ideias próprias de ódio e desprezo, que dificilmente serão desconstituídas na fase adulta.

3.5 SAP x ALIENAÇÃO PARENTAL

De acordo com Richard Gardner, existem diferenças entre Síndrome da Alienação Parental e apenas a alienação parental; a última pode ser fruto de uma real situação de abuso, de negligência, maus-tratos ou conflitos familiares, ou seja, a alienação, o alijamento do genitor é justificado por suas condutas (como alcoolismo, conduta antissocial, entre outras), não devendo se confundir com os comportamentos normais, como repreender a criança por algo que ela fez, fato que na SAP é exacerbado pelo outro genitor e utilizado como munição para injúrias.[12]

3.6 CONSEQUÊNCIAS DA SAP NOS MENORES

A prole afetada pela síndrome de alienação parental tem uma tendência de distorcer a realidade e apresentar distúrbios emocionais decorrentes das experiências ruins vivenciadas ao longo dos anos, o que pode gerar diversas fobias na fase adulta.

Essas crianças, para sobreviverem no meio de tantos conflitos, aprendem a manipular suas emoções, a falarem somente uma parte da verdade e/ou mentirem, exprimem falsas emoções e tornam-se prematuramente espertas, perdendo a melhor parte da infância, que lhe fora roubada pelo genitor alienante.

Tornam-se adultos inseguros, carentes, com incapacidade de adaptação, manipuladores, dificuldades com autoestima e podem ligar-se a vícios como álcool e drogas, em casos mais graves, sofrem com mania de perseguição, depressão e até o suicídio. É comum, em longo prazo, o menor apresentar um enorme sentimento de culpa, em razão de ter sido “cúmplice” do genitor alienante em desfavor do outro que ele igualmente amava.

3.7 ENFRENTANDO E TRATANDO A SAP

A Síndrome da Alienação Parental prejudica os menores em diversos níveis, seja violando direitos, seja afetando a saúde física e/ou emocional. Trata-se de forma de abuso do poder parental, que viola o Princípio da Proteção Integral do Menor (Artigo 1º do Estatuto da Criança e do Adolescente), bem como, o direito fundamental à dignidade, cláusula pétrea prevista no Artigo 227 da Constituição Federal, portanto, a SAP deve ser enfrentada pelo Estado com a efetiva atuação do Ministério Público e do Poder Judiciário.

É notório que o Estado ainda não está devidamente preparado para enfrentar os casos de SAP, pois há carência de equipes multidisciplinares suficientes para dar a atenção necessária aos casos, o que às vezes acarreta medidas equivocadas. O Poder Judiciário precisa enfrentar com coragem tais situações e deixar de fazer “vistas grossas”, tomando medidas enérgicas iniciais, impedindo a instalação mais gravosa do quadro da SAP.

José Manuel Aguilar, ao lembrar suas experiências como psicólogo, relata que:

“De todos os casos que participei, aqueles em que se manteve – embora apenas durante duas horas por semana – o contacto com o filho alienado, o vínculo afetivo e as tentativas de alienação do progenitor não avançaram com a intensidade que este poderia desejar. (...) Este pai, um professor do ensino primário cuja ex-mulher decidiu afastá-lo da sua filha de alguns meses quando se separaram, depois de conseguir uma sentença em tribunal que lhe conferia um regime de visitas, já visita há mais de um ano a sua filha, que vive duzentos quilômetros de si, todas as semanas sem falta. Muitas vezes só para passar alguns minutos com ela. Neste momento, pai e filha desfrutam já de uma relação afectivacorreta.”[13]

Observe a importância da intervenção judicial nos estágios iniciais da SAP, o que pode ser fator determinante para impedir sua progressão. Outra estratégia é a mediação, que poderá ser eficaz para restabelecer a comunicação entre as partes, facilitando o diálogo, buscando estabelecer acordos e compromissos mútuos. O mediador ideal é aquele que detenha preparo de natureza multidisciplinar.

Nos casos mais graves da SAP, as únicas alternativas para garantia dos interesses dos menores é a inversão ou substituição da guarda, para que o menor não permaneça debaixo da manipulação diária do genitor alienante. Esta alteração da guarda deve ser feita da forma menos traumática possível para o menor. Há quem defenda que não é ideal que o menor seja colocado imediatamente para conviver com o genitor que fora programado para odiar, que o ideal seria passaruns dias com parentes próximos, recebendo visitas diárias do genitor alienado e progressivamente passe a conviver com ele. Depois de instalado na casa do genitor alienado, passaria a visitar o genitor alienante, primeiramente supervisionado por profissionais e só depois de revertida a SAP as vistas poderiam ser desassistidas.

A SAP é um processo de difícil solução, que necessita de uma rede de ajuda, a qual deve começar pela informação da existência da síndrome para o maior número de pessoas possíveis, pois somente entendendo suas características é possível conhecer um meio de impedir sua implantação. A sociedade não pode fechar os olhos para um crime que acontece dia a dia no lar de seres indefesos e em plena formação, mas, para que esta malfadada síndrome da alienação parental não se dissemine como uma descontrolada praga, não bastam leis inteligentes e excepcionais, como sucede com a Lei 12.318/2010 (Lei da Alienação Parental), porquanto é preciso saber fazer com que os mecanismos legais e processuais postos à disposição da sociedade sejam eficientemente colocados a serviço da criança e do adolescente alienados de seu outro genitor, urgindo que todos os operadores do Direito trabalhem em união de esforços na salvaguarda das crianças e adolescentes em situação crescente e latente de risco, posto que a Lei 12.318/2010 é um dispositivo legal que precisa ser compreendido, para que, com seu auxílio, sejam superados os tabus sociais e jurídicos que ainda travam em sua plenitude, a sua aplicação.[14]

  1. DA ALIENAÇÃO SEVERA E AS MEDIDAS JUDICIAIS

No Artigo 6º da Lei 12.318/2010 o legislador sugere algumas medidas judiciais aplicáveis ao caso de acordo com a gravidade do ato de alienação detectado:

“Art. 6o  Caracterizados atos típicos de alienação parental ou qualquer conduta que dificulte a convivência de criança ou adolescente com genitor, em ação autônoma ou incidental, o juiz poderá, cumulativamente ou não, sem prejuízo da decorrente responsabilidade civil ou criminal e da ampla utilização de instrumentos processuais aptos a inibir ou atenuar seus efeitos, segundo a gravidade do caso: 

I - declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador; 

II - ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado; 

III - estipular multa ao alienador; 

IV - determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial; 

V - determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão; 

VI - determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente; 

VII - declarar a suspensão da autoridade parental. 

Parágrafo único.  Caracterizado mudança abusiva de endereço, inviabilização ou obstrução à convivência familiar, o juiz também poderá inverter a obrigação de levar para ou retirar a criança ou adolescente da residência do genitor, por ocasião das alternâncias dos períodos de convivência familiar.” 

Este artigo autoriza ao Juiz que faça cessar logo no estágio inicial os atos de alienação ou atenue seus efeitos através das referidas medidas, sem prejuízo de outras medidas judiciais cabíveis, bem como, de eventuais ações cíveis e/ou criminais.

3.7.2 A SAP E A ALTERAÇÃO DA GUARDA

Nos casos mais graves de alienação parental, a Lei determina a alteração da guarda para compartilhada ou sua inversão, na hipótese em que não seja possível a guarda compartilhada, conforme Artigo 7º da Lei 12.318/2010:

“Art. 7o  A atribuição ou alteração da guarda dar-se-á por preferência ao genitor que viabiliza a efetiva convivência da criança ou adolescente com o outro genitor nas hipóteses em que seja inviável a guarda compartilhada.” 

O legislador neste artigo já demonstrava a nítida preferência pelo regime da guarda compartilhada em detrimento da guarda unilateral, mesmo nos casos onde havia a prática de atos de alienação parental, atendendo ao princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, salvaguardando o direito de permanecer no seio familiar, conforme Artigo 19 do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA.

Os juízes por diversas vezes deixaram de aplicar tal dispositivo, por acreditarem que a guarda conjunta não era compatível ao processo litigioso de disputa da guarda, pois os pais seriam incapazes de agirem juntos, em prol do interesse do menor, mas tão somente em prol dos seus próprios interesses.

Para dirimir de vez tal questão, o legislador publicou a Lei 13.058/2014 estabelecendo que a Guarda Compartilhada agora é a regra, sendo uma modalidade de guarda física, em que ambos os pais deveram ter igual tempo de convívio com a prole, sempre levando em conta o melhor interesse do menor (Artigo 1.583, § 2º Código Civil Brasileiro).

A Lei busca equilibrar o convívio dos filhos com os pais e impedir que o quadro da SAP se instale, evitando a convivência desigual, que beneficiaria ao genitor alienante ou nos casos em que a SAP já se instalou, o genitor alienado teria a possibilidade de reverter a campanha desqualificativa que fora vítima.

A opção pela guarda compartilhada como regra, mesmo entre genitores em litígio, é uma questão de política legislativa que todos devem respeitar, nada obstante com convicções contrárias. Mais do que isso, deve-se entender que essa opção não é fruto do acaso ou da posição arbitrária e irreal do legislador, mas fundada em conclusões extraídas de profundos estudos, voltados para o ideal na criação, formação e preservação da saúde física, mental, psicológica e emocional das crianças e dos adolescentes, num mundo marcado pelo pluralismo, pela diversidade e pela complexidade nas relações humanas.[15]

CONCLUSÃO

A família ao longo do tempo sofreu diversas modificações nos seus conceitos e formação, principalmente devido às questões religiosas e reviravoltas tecnológicas, associadas ao movimento feminista e o predomínio do amor nas relações pós-guerra.

Surgem novos arranjos familiares e no Brasil a Constituição de 1988 introduz diversos princípios inovadores, capazes de abarcar tais relações. As crianças e adolescentes passam a ter direitos priorizados e os pais deixam de ter direitos e passam a ter deveres com a prole.

Mecanismos legais e judiciais são criados para impedir que os menores sejam vítimas de joguetes nas mãos dos pais e no caso de alienação parental, o Estado passa a intervir para garantir a guarda, a visitação e salvaguardar os laços afetivos saudáveis entre pais e filhos, utilizando-se sempre que possível da guarda compartilhada, que foi consagrado como meio eficaz para evitar a concentração do poder familiar nas mãos de um único genitor, o que propicia a ocorrência e efetivação da síndrome da alienação parental.

THE EVOLUTION OF FAMILY RIGHTS ACCORDING TO THE LEGISLATION

NEW CONCEPTS : LAW 12.318/2010 and 13.058/2014

The evolution of the family rights, in this context, focuses on the de facto split of parental authority after marital disruption, addressing the concepts brought by Law 12.318/2010 (parental alienation law) and Law 13.058/2014 (shared guard act). Along the years the family rights suffered several changes, seeking new models protection of minors, the family and for the advancement of society needs. Concepts evolved and the law sought to keep up with these changes bolstering such concepts. It is of utmost relevance the study of legal concepts brought by these laws, since such concepts are intended to expand the protection of the interests of minors and the scope of parental authority. After the dissolution of the marriage, what to do with the offspring? Defining the holder of the guard? How to guarantee the best interest of children? What to do when one of the parents solve difficult the exercise of parental authority or create setbacks and losses to the maintenance of the affective bond of the other? Necessary that both the legislature and the judiciary address these issues always seeking the best for the minors. The offspring belongs to the couple and the definition of the guard must be by rule, shared, except given the declared impossibility of one parent. When one of parents ignore welfare of children and your interests name happens to hinder the exercise of parental authority of the other, or even prevent the maintenance of the affective bond with the lowest, it is the State intervene to ensure a healthy living family.

Keywords: Family Rights. Parental Authority. Parental Alienation. Shared Custody. Protection of Minors.

REFERÊNCIAS

LEITE, Eduardo de Oliveira. Tratado de direito de família: Origem e evolução do casamento. Curitiba: Juruá, 1991.

FIÚZA, César Augusto de Castro. Mudança de paradigmas: do tradicional ao contemporâneo. Anais do II Congresso Brasileiro de Direito de Família. A família na travessia do milênio. Belo Horizonte: Del Rey, 2000.

DIAS, Maria. Berenice. Manual de Direito das Famílias. 10.Ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015.

MADALENO, Ana Carolina Carpes e MADALENO Rolf. Síndrome da Alienação Parental. 3ª.Ed., Rio de Janeiro: Editora Forense, 2015.

MIGUEL, Jamil.A guarda compartilhada agora é a regra: comentários à Lei 13.058/2014. Campinas, SP: Millenium Editora, 2015.


[1]LEITE, Eduardo de Oliveira. Tratado de direito de família: Origem e evolução do casamento. Curitiba: Juruá, 1991. p. 101.

[2]FIÚZA, César Augusto de Castro. Mudança de paradigmas: do tradicional ao contemporâneo. Anais do II Congresso Brasileiro de Direito de Família. A família na travessia do milênio. Belo Horizonte: Del Rey, 2000. p. 35.

[3]LEITE, Eduardo de Oliveira. Tratado de direito de família: Origem e evolução do casamento. Curitiba: Juruá, 1991. p. 101 e 336.

[4]DIAS, Maria. Berenice. Manual de Direito das Famílias. 10.Ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 461.

[5]DIAS, Maria. Berenice. Manual de Direito das Famílias. 10.Ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 470.

[6]DIAS, Maria. Berenice. Manual de Direito das Famílias. 10.Ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 521

[7]DIAS, Maria. Berenice. Manual de Direito das Famílias. 10.Ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 522.

[8]MOTTA, Maria Antonieta Pisano. Compartilhando a Guarda..., 597

[9]DUARTE, Lenita Pacheco Lemos. A angústia das Crianças..., 270

[10]MADALENO, A. C. C.; MADALENO, R. Síndrome da Alienação Parental. 3. Ed., Rio de Janeiro: Editora Forense, 2015.

[11]MADALENO, Ana Carolina Carpes e MADALENO Rolf. Síndrome da Alienação Parental. 3ª.Ed., Rio de Janeiro: Editora Forense, 2015. p. 49.

[12]MADALENO, Ana Carolina Carpes e MADALENO Rolf. Síndrome da Alienação Parental. 3ª.Ed., Rio de Janeiro: Editora Forense, 2015. p. 51.

[13]AGUILAR, José Manuel. Síndrome de Alienação Parental: filhos manipulados por um cônjuge para odiar o outro. Portugal: Caleidoscópio, 2008. p. 134.

[14]MADALENO, Ana Carolina Carpes e MADALENO Rolf. Síndrome da Alienação Parental. 3ª.Ed., Rio de Janeiro: Editora Forense, 2015. p. 67.

[15]MIGUEL, Jamil. A GUARDA COMPARTILHADA AGORA É A REGRA: comentários à Lei 13.058/2014. Campinas, SP: Millenium Editora, 2015. p. 63.

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Sobre a autora
Ada Angela Gonçalves

FUNCIONÁRIA PÚBLICA (SECRETARIA DE SEGURANÇA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO)

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Artigo científico apresentado ao curso de Pós-Graduação em Direito Civil e Processo Civil da Universidade Iguaçu como exigência final para conclusão do curso. Orientador(a): Profª Maristela Chicharo

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