Análise da vulnerabilidade dos moradores de rua à luz dos direitos humanos.

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Abordagem acerca da vulnerabilidade dos moradores de ruas diante de uma perspectiva de respeito aos direitos humanos.

1 – INTRODUÇÃO

Historicamente ao longo de décadas pode-se perceber o descaso constante e contínuo a uma sociedade marcada inerentemente pelo rotulo da desigualdade social, fato que está intrinsecamente ligado à supervalorização do fator econômico em detrimento do respeito dos direitos conquistados constitucionalmente. Nesse sentido podemos perceber que diante de tantos descasos, a população em situação vulnerável de rua é uma das partes da sociedade que dramaticamente vem sendo mais atingida, pois visivelmente a sua situação estatística é sem dúvida de uma extrema vulnerabilidade social, o que consequentemente proporciona a estar vulnerável sobre o alvo constante dos atos de violência de níveis extremamente alarmante presente na nossa sociedade nos dias atuais.

Hoje o presente dessa situação crítica que os telejornais nos informam, são nada mais de um passado que o Estado não cuidou para prevenir, e um real presente que nos preocupa com o futuro conduzido pelo mentor contínuo do modelo capitalista que se instalou ao longo dos séculos. Infelizmente temos que nos lembrar de casos de impunidades cometidos a esses moradores de rua que impunemente ficaram a mercê de justiças punitivas a altura de tamanha brutalidade criminal como: em Brasília, Alagoas e tantos outros casos que de certo interesse social ficaram ocultos. Pois são casos como estes que demonstra a evidência urgente da implantação de políticas públicas que seja capaz de enfrentar uma das mais complexas realidades das pessoas que vivem uma situação preocupante de rua, que são também cidadãos que merecem o cuidado, o respeito e a oportunidade de também usufruir dos direitos estabelecidos na constituição cidadã.

Portanto, pode-se destacar que a realidade da qual vive hoje a população em situação de rua nos evidencia a forma de caráter destrutivo de sistema capitalista, que impulsiona parte da população a extrema pobreza, provocando assim o aumento desenfreado de atos já citados anteriormente, causando a todos indignação e até mesmo medo e temor a alguns setores sociais, que muitas vezes são ameaçados diante da ocupação de um espaço público e os mesmos não gozam de um espaço privado como moradia. Sendo assim, passamos a entender que estamos diante de um fenômeno social e reconhecer a insuficiência com relação à eficácia de respostas condizentes a real problemática. Compreender a necessidade urgente da inclusão nas políticas públicas de assistência será uma opção para o enfrentamento desta problemática. Pois a questão dos moradores de rua só será resolvida quando de fato e de direito o Estado reconhecer a sua responsabilidade e a sociedade se conscientizar de reconhecer também o seu papel na participação de construir uma consciência coletiva de direitos e deveres iguais.

O objetivo geral da pesquisa é oferecer uma reflexão, sobre a análise dos direitos humanos a luz da vulnerabilidade dos moradores de rua, com informações de fundamentos jurídicos que possam ajudar a minimizar real problemática.

2. OS MORADORES DE RUA E A NECESSIDADE DE GARANTIA DOS SEUS DIREITOS FUNDAMENTAIS

A população brasileira ainda registra altos índices estatísticos de moradores permanentes de ruas que vivem em estado permanente de vulnerabilidade. São na realidade vulneráveis por não ter muitas vezes documentos, certidões indispensáveis a cidadania, vulneráveis por não ter casas, dinheiro ou emprego fixo, vulneráveis por não terem acesso à educação ou acesso à saúde básica. No tocante a situação de rua pode ser representada por três formas como afirma (Rosa, 2005 pág. 42). “ficar na rua – circunstancialmente; estar na rua – recentemente; e ser da rua – permanentemente”, portanto, diante dessa afirmação é possível perceber a realidade nas quais esses vivem nas ruas.

Nessa ótica as pessoas que ficam na rua: reflete a precariedade da vida, pelo desemprego ou por se deslocarem de sua região para outra cidade em busca de emprego, de tratamento de saúde ou situações respectivas. Enquanto as pessoas que estão na rua: são aqueles indivíduos que não se sentem ameaçados nas ruas, em razão disso, passam a estabelecer relações com as pessoas que vivem na rua, criando estratégia de sobrevivência. E por fim, as pessoas que são da rua: esses indivíduos se encontram instalados nas ruas a um período de tempo considerável e, em função disso, foram sofrendo um processo de debilitação física e mental, especialmente pelo uso do álcool, das drogas e violência.

Diante dessa triste realidade, estes moradores concentram-se em áreas comerciais (centro da cidade) por haver maior chance de se conseguir doação de algum alimento ou obter algum dinheiro por meio de trabalhos informais como: flanelinhas, ajudantes de feira, revenda de ingressos, etc.Fatores que muitas vezes ampliam situações de violência, fome, medo etc. Tudo isso muitas vezes impulsionado pela vulnerabilidade pessoal, social, fruto da falha nas políticas públicas desenhadas para promover e suprimir distorções históricas de extrema miséria.

Entretanto, um dos grandes desafios de todo pesquisador da população em situação de rua é definir quem se enquadra como parte deste grupo, quais são suas características e quais são os limites de sua caracterização. Porém, entre tais pesquisadores vigora o consenso de que o surgimento do que se designou “população em situação de rua” como um segmento forte remonta às revoluções industriais da modernidade, às mudanças sociais oriundas desse novo modo de vida expresso em tais revoluções (MELO, 2011)

 Daí, a justificativa de compreender as razões dos altos conflitos que muitas vezes emergem nas inter-relações entre a população de rua e os demais habitantes das cidades ou até mesmo os travados entre eles, ou talvez a culpabilização individual da extrema pobreza em que vivem. Fato que por muitas vezes também vem a sofrer barreiras por sua historia de vida, e o preconceito que muitas vezes diminui sua autoestima, interferindo na situação de inter-relação social, o que implica consequentemente na construção de sua cidadania.

Nesse sentido, a preocupação do Poder Público com este segmento social, é recente, pois a partir de 1988, com o reconhecimento dos direitos sociais como direitos fundamentais da pessoa pela Constituição Federal vigente e com a Lei Orgânica de Assistência Social, que se reconheceu a Assistência Social como Política Pública, é que o Estado passou a assumir seu compromisso de manter políticas públicas de atenção à população de rua.

Portanto, pode-se explicitar que após pesquisar sobre tamanha problemática empreendida com a população de rua na ótica de diversos autores apontam diversos fatores que constituem a vulnerabilidade desse grupo, apontando que a existência dessa população e sua permanência nessa situação é questão moral e ética, ou seja, que todos os indivíduos e grupos vulneráveis devem ser protegidos e respeitados a integridade pessoal dos indivíduos em causa, como estar estabelecido e como propõe a Declaração Universal dos Direitos Humanos, e a Política Nacional para População em situação de Rua instituída no Decreto lei nº 7.053 de 2009 foi um grande passo em sentido ao reconhecimento e concretização dos direitos individuais e sociais da população em situação de vulnerabilidade.

Porém, vale destacar que o principio da vulnerabilidade carrega duas significações distintas: uma geral correlacionada a todos e a tudo que aquilo que vive, entendo que a morte é inexorável a vida. E uma especifica relacionada à vulnerabilidade a grupos. Refletindo sobre tal diferença, semântica, (Schramm, 2006) aprofunda a distinção conceitual, passando a considerar “que todos são suscetíveis a ser feridos em algum grau, bastando para isso está vivo, porém para o autor, nem todos são suscetíveis na mesma intensidade existindo disparidade nas formas e grau de suscetibilidade com: vulnerados a fome, vulnerados na moradia, vulnerados a outros habitantes da cidade, vulnerados aos agentes de Estado, vulnerados no trabalho e na identidade, vulnerados por não perceber vulnerados.” Assim, o entendimento da distinção entre potencia e ato esta então, no cerne da reflexão para tal distinção. Desta forma (Mattos, 2004) afirma: “a falácia de que todos possuem iguais oportunidades e a evidencia de que, embora a produção seja social, apropriação dos ganhos é sempre individual, sendo as pessoas em situação de rua testemunhas vivas de que a exploração e a desigualdade estão no cerne deste modo de produção”.

A população de rua neste contexto em sua maioria não é mesmo nem resguardada pelo documento básico de cidadania (RG), e estes seres são expostos às interferes tanto climáticas como sociais, as políticas governamentais relacionadas à população de rua na maioria das vezes são basicamente voltada para sua eliminação. As autoridades que deveriam ampará-los pretendem de fato expulsa-los das áreas das cidades que ocupa, ou seja, tentam subtraí-los do olhar dos cidadãos. Fato que demonstra que a população de rua esta exposta às circunstancias de vulnerabilidade.

Entretanto, a questão da vulnerabilidade sobre a população de rua só será de fato reconhecida quando na verdade as autoridades começarem de verdade a por em pratica o discurso do real direito estabelecido pelo Decreto Lei nº 7.053 de 23 de dezembro de 2009 que afirmar que todos os indivíduos são, em tese, membro de um estado, isto é, seus cidadãos que possuem, por lei, os mesmo direitos e obrigações. Essa igualdade perante a lei foi uma conquista de todos os cidadãos indistintamente de classe, assim podemos reafirmar e dizer que os indivíduos vêm adquirido novos direitos, tais como, os direitos políticos, que foram estendidos a amplas camadas das populações, como também consolidados em quase todo mundo os direitos sociais, que pretende assegurar ao individuo o mínimo de bem-estar econômico e de segurança, visando permiti-lhe compartilhar das conquistas socioeconômico e culturais da sociedade. Sendo assim, para tornar efetivos esses direitos foram criadas instituições especificas como os Tribunais de Justiça, que protegem os indivíduos; os sistemas Eleitorais e os órgãos Legislativos e Representativos, que assegura a representação à participação política dos cidadãos; e, os Sistemas de Educação, de Serviços Sociais e Previdenciários que garantem os direitos sociais, além de estabelecer os princípios de política nacional como: respeito à dignidade da pessoa, direito a convivência familiar e comunitária, valorização e respeito à vida e à cidadania, atendimento humanizado e universalizado, e respeito às condições sociais e diferenças de origem, raça, idade, nacionalidade, gênero, orientação sexual,

Nesse sentindo, (Sahid Maluf, 1974) afirma: “os direitos fundamentais da pessoa humana não se efetiva apenas no plano constitucional ou intra-estatal, são direitos supra-estatal”. Acrescentado, “não são criações da lei no sentido jurídico; são revelações das leis eternas e imutáveis que dirigem a humanidade”. Agrega, ainda: “não decorrem da vontade do Estado, porque antecederam e superam as organizações políticas”. Cabe lembrar que a Declaração Universal dos Direitos Humanos compreende a formulação das garantias mínimas, às quais, todo ser humano tem um direito inviolável decorrente da sua própria dignidade essencial. Essa preocupação em formular e defender os direitos humanos data da mais remota antiguidade. O código de Hamurabi(Babilônia), filosofia de Mêncio (China), a República de Platão, o Direito Romano, dentre outros, são marcos a destacar-se nessa macha da humanidade para afirmação dos direitos humanos.

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Entretanto, a pessoa em situação de rua é tratada pela população também como coitada. Nesse estigma encontra-se o discurso religioso de enquadrar as pessoas em situação de rua como dignas de piedade (Mattos, 2004). Haja vista, que a forma como a sociedade enxerga o morador de rua é essencialmente ideológica, reproduzindo as relações de dominação vigentes. A fim de melhor entender tal relação de dominação faz-se essencial a citação esclarecedora presente na obra de Karl Marx (Marx e Engelsm, 1998): “cada nova classe no poder é obrigada, quanto mais não seja para atingir os seus fins, a representar o seu interesse como sendo o interesse comum a todos os membros da sociedade ou, exprimindo a coisa no plano das ideias, a dar aos seus pensamentos a forma da universalidade, a representá-los como sendo os únicos razoáveis, os únicos verdadeiramente válidos”.

Por fim, não bastam as garantias legais para que haja de fato justiça social. Claro de que nada adianta assegurar-se na lei condições mínimas de sobrevivência, quando em realidade essas garantias mínimas as quais todo ser humano tem direito são constantemente violadas e desrespeitadas, não atendendo de fato o que demanda as políticas publicas com relação às populações de rua em situação de vulnerabilidade.

3. REFERÊNCIAS

  • BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil;

  • BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Pesquisa Nacional sobre a População em Situação de Rua. 2009;

  • BRASIL. Presidência da República. Decreto nº 7.053, de 23 de dezembro de 2009;

  • GIL, Antônio Carlos. Como Elaborar um Projeto de Pesquisa. 5ª ed. São Paulo: Atlas – 2010;

  • LAKATOS, Eva Maria. Fundamentos de metodologia cientifica /Marina de Andrade Marconi, Eva Maria Lakatos. – 5ª. ed. – São Paulo: Atlas 2003;

  • MALUF, Sahid. Direito Constitucional. 8ª Ed. São Paulo: Sugestões Literarias, 1974;

  • MARX, Karl e ENGELSM, Friedrich, a ideologia Alemã. São Paulo: M. Fontes, 1998;

  • MATTOS, Ricardo Mendes e Ferreira, Ricardo Franklin. Quem vocês pensam que (Elas) são? Representação sobre as Pessoas em Situação de Rua. 2004;

  • MELO, Tomás Henrique de Azevedo Gomes. A Rua e a Sociedade: articulações políticas, socialidade e a luta por reconhecimento da população em situação de rua. Curitiba. 2011. Dissertação (mestrado em antropologia) – Universidade Federal do Paraná;

  • PEDRON, Ademar João. Metodologia científica: auxiliar do estudo, da leitura e da pesquisa. 4ª ed. Scala Gráfica e Editora, 2003. (edição do autor);

  • ROSA, Cleisa Moreno Maffei. Vidas de rua. São Paulo. 2005;

  • SCHRAMM, FR. A saúde é um direito ou um dever? Autocrítica da saúde publica.RevBrasBioet. 2006;

  • UNESCO. Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos. 2005;

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Sobre os autores
Jorge Augusto Gonçalves Dantas

Aluno do 10º semestre de Direito da UNILEÃO.

Maria larissa Leite Martins

Acadêmica de Direito da UNILEÃO - 10º semeste

Maria Socorro Henrique Montenegro

Sou Acadêmica de direito da UNILEÃO, do 10º semestre.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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