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O princípio da autotutela

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A Administração Pública possui o poder de controlar seus próprios atos, anulando-os quando ilegais ou revogando-os quando inconvenientes. Essa autotutela não afasta a competência do Poder Judiciário de controlar a legalidade dos atos públicos.

O princípio da autotutela estabelece que a Administração Pública possui o poder de controlar os próprios atos, anulando-os quando ilegais ou revogando-os quando inconvenientes ou inoportunos. Assim, a Administração não precisa recorrer ao Poder Judiciário para corrigir os seus atos, podendo fazê-lo diretamente.

Esse princípio possui previsão em duas súmulas do STF, a 346, que estabelece que “A Administração Pública pode declarar a nulidade dos seus próprios atos”, e 473, que dispõe o seguinte:

Súmula nº 473:

A Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revoga-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.

Atualmente, o princípio ganhou previsão legal, conforme consta no art. 53 da Lei 9.784/99: “A Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos.

Nesse contexto, a autotutela envolve dois aspectos da atuação administrativa:

  • a) legalidade: em relação ao qual a Administração procede, de ofício ou por provocação, a anulação de atos ilegais; e

  • b) mérito: em que reexamina atos anteriores quanto à conveniência e oportunidade de sua manutenção ou desfazimento (revogação).

Quanto ao aspecto da legalidade, conforme consta na Lei 9.784/99, a Administração deve anular seus próprios atos, quando possuírem alguma ilegalidade. Trata-se, portanto, de um poder-dever, ou seja, uma obrigação. Dessa forma, o controle de legalidade, em decorrência da autotutela, pode ser realizado independentemente de provocação, pois se trata de um poder-dever de ofício da Administração.

Todavia, no Brasil vigora o princípio da inafastabilidade de tutela jurisdicional (sistema de jurisdição única), segundo o qual a lei não afastará do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito (art. 5º, XXXV, CF). Assim, o controle de legalidade realizado pela própria Administração Pública não afasta a competência do Poder Judiciário de controlar a legalidade dos atos públicos.

A diferença, no entanto, é que a Administração pode agir de ofício, enquanto o Poder Judiciário só atuará mediante provocação.

A Administração não se limita ao controle de atos ilegais, pois poderá retirar do mundo jurídico atos válidos, porém que se mostraram inconvenientes ou inoportunos. Nesse caso, não estamos mais falando de controle de legalidade, mas de controle de mérito. Dessa forma, após o juízo de valor sobre a conveniência e oportunidade, a Administração poderá revogar o ato. Aqui reside uma segunda diferença da autotutela para o controle judicial, pois somente a própria Administração que editou o ato poderá revogá-lo, não podendo o Poder Judiciário anular um ato válido, porém inconveniente de outro Poder.

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Vale dizer, o Poder Judiciário poderá anular um ato ilegal de outro Poder, porém não poderá revogar um ato válido. Isso ocorre porque o controle judicial analisa os aspectos de legalidade e legitimidade, mas não pode se imiscuir no mérito administrativo.

Com efeito, a autotutela também encontra limites no princípio da segurança jurídica e da estabilidade das relações jurídicas. Assim, conforme consta no art. 54 da Lei 9.784/99, o direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé. Assim, após esse prazo, o exercício da autotutela se torna incabível.

Finalmente, outra limitação para a autotutela se refere à necessidade de oportunizar o contraditório e a ampla defesa, por meio de processo administrativo, às pessoas cujos interesses serão afetados negativamente em decorrência do desfazimento do ato.

Todavia, conforme ensina Lucas Rocha Furtado, a necessidade de direito de defesa só ocorre nas hipóteses de atos individuais – definidos estes como os atos que afetam pessoa ou pessoas determinadas -, como anulação da nomeação de uma pessoa aprovada em concurso. Nesse caso, a nomeação é um ato individual, pois alcançou uma pessoa determinada. Para anular esse ato, deverá ser oportunizado o contraditório e a ampla defesa ao interessado, que poderá trazer argumentos para evitar o desfazimento do ato. Por outro lado, quando os forem gerais, como a anulação de um concurso público por motivo de vazamento de gabarito, não se fala em direito de defesa.

A professora Maria Silvia Zanella Di Pietro apresenta um segundo significado do princípio da autotutela. De acordo com a doutrina, a autotutela também se refere ao poder que a Administração Pública possui para zelar pelos bens que integram o seu patrimônio, sem necessitar de título fornecido pelo Poder Judiciário. Assim, ela pode, por meio de medidas de polícia administrativa, impedir quaisquer atos que coloquem em risco a conservação desses bens.

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Sobre o autor
Caio César Soares Ribeiro Patriota

Formado na Universidade Federal de Juiz de Fora - UFJF - 2º semestre de 2012. OAB/MG 141.711 e OAB/SP 445.733.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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