Mais vozes e mais forças abrem portas na advocacia: mais mulheres na OAB

03/04/2017 às 10:27
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RESUMO: A advocacia é uma profissão exercida por profissional liberal, bacharel ou bacharela em Direito que, após realização de uma avaliação, chamada no Brasil de “exame de ordem”, devendo demonstrar que possui capacitação, conhecimentos e práticas necessários ao exercício do labor advocatício, passa a ser chamado de advogado ou advogada. Em seguida, após aprovação, o examinado ou examinada passará, portanto, a exercer a representação dos interesses das pessoas físicas ou jurídicas, seja em juízo ou fora dele, quer entre si, quer perante o Estado. O exercício da advocacia trata-se de uma das mais antigas profissões da história da humanidade e, mesmo sendo polêmica, por muito tempo e ainda nos tempos atuais é considerada nobre. O que se observa é que no exercício da profissão tem se tornado cada vez maior o número de mulheres atuando, até mesmo em searas consideradas mais complexas, como é o caso da advocacia criminal, que em tempos mais remotos era estimada como predominantemente masculina. Nos últimos anos tem crescido o número de mulheres inscritas na Ordem dos Advogados do Brasil, chegando a alcançar quase 50% da sua totalidade, o que em breve espaço de tempo poderá ultrapassar a metade, se tornando necessária e obrigatória a maior visibilidade das suas atuações e vozes.


INTRODUÇÃO

A Constituição de 1988, sem dúvida, foi um avanço para a concepção da igualdade entre os gêneros em todos os segmentos, mas também um marco na proteção dos direitos das mulheres. É evidente que essa transformação social tomou forma a partir da segunda metade do século XX, mas ainda tem sido uma luta árdua. A desigualdade existe desde os primórdios e perpassa por um paradigma que legitimava declaradamente a organização familiar como sendo meramente patriarcal, dando sempre preferência e visibilidade ao homem, seja para tomar frente aos negócios da família, como para cuidar dessa em todos os âmbitos.

Após a constituinte, criou-se uma ideologia de igualdade de direitos e deveres, contudo, não foi e ainda não está sendo possível se consolidar com todos os êxitos, pois existem muitas perguntas sem respostas e espaços de resistência.

No momento atual, depois das grandes guerras mundiais, dos avanços científicos e tecnológicos, surgiu inquestionavelmente a possibilidade de outros espaços para a mulher. Com a presença do crescente movimento feminista, que desde a década de 40 já dava seus primeiros passos, é inegável a possibilidade de um futuro culturalmente e historicamente diferente.

A percepção quanto à padronização da mulher e em que ela poderia desenvolver suas atividades, principalmente no âmbito profissional, tem sido tema de constantes discursos sobre gênero e práticas sociais, onde o saber e o poder se entrecruzam, deixando de lado estereótipos de que mulher não pode fazer certas coisas pelo fato de ser mulher.

Mais mulheres e mais vozes femininas passaram a conduzir ações nos diversos campos da sociedade, incluindo a construção civil, aviação, campeonatos de lutas marciais, futebol, atuação em grandes organizações, na política etc., assegurando às mulheres direito à cidadania, legitimando seu papel também enquanto agentes de transformação. As mulheres estão cada vez mais dedicadas ao trabalho, sendo responsáveis pelo sustento de aproximadamente 33% das famílias brasileiras.

Atualmente, ainda urge a necessidade de se promover ações em prol da igualdade, suscitando mudanças profundas na cultura e nos costumes da sociedade, provocando criação de espaços para a mulher exercer seu papel de protagonista da sua própria história, sem interferência e com legitimidade. O presente artigo tem como escopo a análise do fenômeno desse avanço da mulher na sociedade, em especial no meio jurídico. Salienta-se que todo o trabalho se baseou na metodologia expositiva, com visões traçadas por mestres doutrinadores de pensamentos múltiplos com relevância para a temática, como QUINTANEIRO (1996). É evidente que apenas o Direito não tem o poder de tornar realidade o ideal de igualdade efetiva entre homens e mulheres.


BREVE HISTORICO DA ADVOCACIA E NOMES RELEVANTES

Memórias trazem relatos dos primeiros advogados existentes no mundo, a exemplo de Moisés (no Êxodo), quando assumiu a liderança da defesa de seu povo; e ainda o próprio Jesus Cristo que, ao ver Maria Madalena, àquela época considerada adúltera e prestes a ser apedrejada, impediu que assim o fizessem, invocando a Lei Mosaica.

A Grécia é considerada o berço da advocacia, pois foi nesse país que surgiram grandes oradores como Demóstenes, Péricles, Sócrates, Aristides, Temístocles, entre outros. Esses homens foram considerados grandes advogados por sua persuasão e dialética. No entanto, Sólon foi o primeiro a regulamentar a profissão, mas a essa época eram excluídos desse mister as mulheres, os escravos e os infames.

A entidade brasileira que representa os interesses da classe levou o nome de Ordem, e se deu da forma mais remota, ainda no Direito Romano, antes da Idade Média, ali já se percebia a existência dessa denominação "Ordo".

Segundo Madeira (2002), "os advogados são agrupados junto aos tribunais mais importantes onde postulam no seio de um colégio que dispõe de personalidade moral”.

Por fim, em 20 de agosto de 1880 fora apresentado ao Legislativo da Corte o Projeto de Lei n.º 95, que visava à criação da Ordem dos Advogados do Brasil, com base no trabalho de Saldanha Marinho, então Presidente do IAB – Instituto dos Advogados Brasileiros. Com a aprovação, o instituto anteriormente existente modificaria o referido Estatuto para retirar de seus objetivos a criação da OAB, transformando o próprio Instituto na Ordem dos Advogados do Brasil. Contudo, apenas em 18 de novembro de 1930, pelo decreto presidencial nº 19.408, pouco depois da Revolução de 30, foi definitivamente criada a OAB, para representar os interesses da advocacia.

O notável e ainda desejado ofício não é simplesmente uma profissão, mas um múnus público e essencial para a justiça. A advocacia tem basicamente sete funções jurídicas, quais sejam: Assessoria jurídica, Consultoria jurídica, Procuradoria jurídica, Auditoria jurídica, Controladoria jurídica, Planejamento jurídico e Ensino jurídico. A ordem não faz qualquer restrição para o exercício de nenhuma delas, quanto à gênero, portanto, podendo ser exercidas por homens e mulheres.

Dentre os muitos advogados de destaque na advocatícia brasileira, figuraram nos quadros ainda do Instituto dos Advogados Brasileiros: Ruy Barbosa, Clóvis Beviláqua, Pedro Calmon, Teixeira de Freitas, Eduardo Otto e vários outros. Ressaltando que, Myrthes Gomes de Campos foi a primeira mulher a exercer a advocacia no Brasil e a primeira do gênero a fazer parte do Instituto, rompendo com os preconceitos de uma sociedade eminentemente machista e patriarcal, em julho de 1906.

A indispensabilidade da advocacia é das mais importantes de suas características. A Constituição Federal do Brasil (1988) dispõe no seu artigo 133 que "o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei".

A advocacia por constituir-se em verdadeiro baluarte do Estado Democrático de Direito e da cultura jurídica nacional, deverá ser exercida por qualquer profissional apto, sem qualquer discriminação de gênero.


CONQUISTAS E PERSPECTIVAS DA ADVOCACIA PARA A MULHER

Em março de 2013, após longas discussões em diversos eventos promovidos pela Ordem, em especial nas conferências, viu-se a necessidade de um instrumento mais eficaz que desse respaldo e ao mesmo tempo visibilidade ao trabalho da mulher advogada, bem como tratasse das suas prerrogativas de uma maneira mais diligente, então foi criada a Comissão Especial da Mulher Advogada – CNMA, com o propósito de fortalecer a figura da mulher na sociedade brasileira, especialmente no exercício da Advocacia.

A OAB portou-se mais uma vez com o compromisso em defender os direitos das mulheres e das advogadas, com o objetivo propor mecanismos que facilitem o dia-a-dia, proporcionando igualdade na profissão. No mês de setembro de 2015, através de provimento, a Ordem dos Advogados do Brasil cria o Plano Nacional de Valorização da Mulher Advogada, onde determina que as seccionais se adaptem e adotem as medidas ali contidas. Entre os diversos pontos, o documento traz como diretrizes, por exemplo: “descontos na anuidade ou até total isenção às profissionais no ano em que tiverem ou adotarem filhos; a igualdade de gêneros e a participação das mulheres nos espaços de poder; a publicação periódica de pesquisas e artigos por meio da OAB – Ordem dos Advogados do Brasil, tendo como tema principal a mulher e sua realidade social e profissional...”. (PROVIMENTO Nº 164/2015).

A luta tem sido uma constante, pois anterior a isso, em novembro de 2014, o Conselho Pleno da Ordem dos Advogados do Brasil, aprovou mudança em suas eleições internas. Passando a ser exigido que as chapas para direção da Ordem contem com, pelo menos, 30% de representação de gênero. Isso foi mais uma vitória para a mulher advogada. Essa medida visa a igualdade de representação dos gêneros.

A história tem mudado os padrões e tem trazido para o cenário da advocacia mulheres advogadas de sucesso, mostrando que a conquista das mulheres por um espaço no mundo jurídico já é uma realidade. Podendo aqui ser citados como exemplos: a advogada Isabel Cristina Gomes, de Santo André-SP, a primeira mulher a ocupar um cargo na direção da 3M do Brasil, hoje diretora do departamento jurídico da empresa; Fernanda Marinela, advogada e professora de várias instituições renomadas no Brasil, que foi eleita a primeira presidente da OAB de Alagoas/SE; a advogada Juliana Martinelli, sócia da Martinelli advocacia empresarial, que foi apontada como uma das advogadas mais admiradas em Direito Societário, na revista Anuário Jurídico, dentre muitas outras, que têm realizado relevantes trabalhos como diretoras, vice-presidentes, conselheiras, presidentes de comissões das seccionais e subseções da Ordem dos Advogados em todo o Brasil.

O ano de 2016 foi proclamado pelo Conselho Federal da OAB – Ordem dos Advogados do Brasil como o ano da Mulher Advogada, onde certamente deverá ser reafirmada a importância da mulher na sociedade e a luta da Ordem pela igualdade de gêneros. Muitas vozes femininas clamarão dentro da Ordem por igualdade de oportunidades, onde a identidade feminina não seja apenas mais um número, mas que se tenha a representatividade respeitada, de fato.

Nem precisava necessariamente ser aceita. Já tinha passado dessa fase. Todo ser excluído sonha em um dia fazer parte de um grupo. Mas ela era a excluída mais incluída da humanidade. (MUNHÓZ, 2014).

Embora a igualdade já esteja prevista na Constituição Federal de 1988, ainda que majoritariamente a população brasileira seja mulher, apesar de que o eleitorado nacional majoritário seja mulher, ainda que o número de advogadas inscritas na Ordem chegue a ser metade, o que parece é que a mulher tem sido excluída das instituições, do cenário político e outros meios, em razão do gênero, por isso é muito importante que novas portas se abram, que se criem mecanismos e meios, para abordar e implementar a promoção da igualdade.

Na carreira jurídica, em especial da mulher advogada, o Plano Nacional da Mulher Advogada foi uma conquista histórica, pois este traz diretrizes que evidenciam a mulher e que ajudam na facilitação do desempenho da sua atividade laboral, como desconto na anuidade ou até total isenção às profissionais no ano em que tiverem ou adotarem filhos, a promoção de diálogo com as instituições, visando humanizar as estruturas judiciárias voltadas às advogadas, a participação da mulher nos espaços de poder, dentre outras.

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Com a crescente presença da mulher nas carreiras jurídicas, a OAB-Ordem dos Advogados do Brasil tinha e tem o condão de promover ações que tragam para a realidade essa igualdade e que não fique apenas no papel, uma vez que a instituição é garantidora do exercício da democracia, não podendo, desta forma, se curvar apenas a necessidade de defesa da advogada. A Ordem deverá ser da advocacia, para que advogados e advogadas sintam-se incluídos na forma mais abundante do termo, não deixando margem para que haja diferenciação de tratamento dispensado a nenhum dos dois.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Apesar de tantas leis constitucionais, penais, civis e trabalhistas voltadas para a proteção dos direitos da mulher, pode-se perceber na prática que, mesmo com todo este aparato legal, a mulher ainda não conseguiu ver os seus direitos plenamente respeitados. As barreiras culturais têm-se mostrado mais fortes do que as leis criadas para elevar a mulher a sua real posição de igualdade e ao pleno exercício da cidadania. As mulheres, em especial as do meio jurídico, que têm essa formação nata para o combate à desigualdade, devem estar em permanente exercício de luta atual e diária.

Não é imperceptível que grandes e valiosas conquistas já podem ser sinalizadas até o presente século, posto que a situação de suposta inferioridade se arrasta há séculos e, anteriormente as mulheres não tinham sequer domínio sobre sua vontade, mas a luta pela igualdade de gênero deverá ser de todos, sem exceção, iniciando pelo ambiente familiar, passando pelo social, escolar e acadêmico.

O estabelecimento de igualdade de direitos entre homens e mulheres está diretamente relacionado com o desenvolvimento das sociedades. Portanto, é necessário incluir nos planos de ação seja dos governos, seja das instituições públicas ou privadas, mecanismos de implementação para reconhecer o papel da mulher, sua voz e representação como um fator fundamental para garantir a igualdade de gênero.

E assim, em especial, as mulheres de carreira jurídica devem ter plena consciência sobre o papel da condição feminina na sociedade, principalmente onde as tradições culturais induzem ao errático conceito da desigualdade dos gêneros.

Nesse diapasão, é válido relembrar que a figura da Mulher Advogada nasceu juntamente com o direito, quando traz como emblema a Themis, da mitologia grega, deusa da justiça.  Desse modo, a mulher esteve presente na carreira jurídica desde o início, o que não é lembrado por muitos.

Em pleno século XXI, a mulher ainda necessita de cotas para composição de chapas, seja na política, seja na instituição da Ordem, com o fito de participarem de forma mais ativa, contudo, vem quebrando barreiras, soltando sua voz, enfrentando o preconceito com o empoderamento e provando sua capacidade pouco a pouco.

De acordo com levantamento estatístico, no âmbito da advocacia nacional, ainda se demonstra a clara exclusão das mulheres nas funções políticas e administrativas, mesmo elas constituindo quase a metade dos inscritos na Ordem. As mulheres advogadas ainda guardam posição minoritária nos órgãos de direção e gestão da advocacia, por isso, frente a essa realidade, mister se faz ressalvar que, ainda, no âmbito da participação, há também falta de conscientização das oportunidades e possibilidades de participação para as mulheres.

Diante disso, conclui-se que o Provimento que institui o Plano Nacional de Valorização da Mulher Advogada, por si só, não é a principal ferramenta para inclusão da mulher e o necessário para mudar o cenário da advocacia. Muitas mulheres ainda precisam perceber que possuem um rol de liberdades e que podem e devem desfrutar nesta sociedade que está em plena evolução, uma ebulição de direitos em construção, que necessitam da sua participação ativa. Deve-se disseminar este pensamento, essa liberdade, e suas decorrentes responsabilidades, conduzindo o público feminino, da área jurídica especificamente, a refletir com mais afinco e, consequentemente, agindo, demonstrando e ecoando suas vozes, abrindo portas, ousando e crendo na sua plena capacidade.


REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.

BRASIL, Provimento nº 164, de 21 de setembro de 2015. Cria o Plano Nacional de Valorização da Mulher Advogada e dá outras providências. Diário Oficial da União. Brasília, DF, 29 set. 2015. Disponível em: http://www.portal.imprenanacional.gov.br. Acesso em: 13 set.. 2016.

MADEIRA, Hélcio Maciel França. História da Advocacia. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2002.

MUNHÓZ, Carolina. O reino das vozes que não se calam. Rio de Janeiro. Rocco. 2014.

QUINTANEIRO, Tania. Retratos de mulher: O cotidiano feminino no Brasil sob o olhar de viageiros do século XIX. Rio de Janeiro: Vozes, 1996.

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