Cabimento de exceção de pré-executividade em execução fiscal ajuizada pelo Município de Campo Grande visando a cobrança de IPTU

04/04/2017 às 10:33
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Nos casos em que a matéria de defesa verse sobre “questão de ordem pública” ou “nulidades absolutas”, é a Exceção de Pré-executividade meio idôneo e capaz de satisfazer aos interesses do jurisdicionado a fim de extinguir a ação de execução.

                      

Nos casos em que a matéria de defesa verse sobre “questão de ordem pública” ou “nulidades absolutas”, é a Exceção de Pré-executividade meio idôneo e capaz de satisfazer aos interesses do jurisdicionado a fim de extinguir a ação de execução cujo título executivo se encontra prescrito ou possui alguma nulidade.

Nesse sentido, oportunas são as palavras de Humberto Theodoro Júnior, quando assim se manifestou:

“É assim que está assente na doutrina e jurisprudência atuais a possibilidade de o devedor usar da exceção de pré-executividade, independentemente de penhora ou depósito da coisa e sem sujeição ao procedimento dos embargos, sempre que sua defesa se referir a matéria de ordem pública e ligada às condições da ação executiva e seus pressupostos processuais.” (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. v. 2., Rio de Janeiro: Forense, 2004. in p. 285).

Sobre o tema também se manifestou o ilustre professor Cândido Rangel Dinamarco, quando explica que o mito de serem os embargos à execução o único remédio à disposição do devedor para se defender contra o processo executivo, já não vigora mais, principalmente quando a objeção a ser feita ao cabimento da execução tenha como fundamento matéria que ao juiz incumba conhecer e decidir de ofício.[1]

Como se sabe, a matéria relativa à prescrição é de ordem pública, podendo ser alegada a qualquer momento e decretada de ofício pelo magistrado, consoante entendimento já sedimentado no meio jurisprudencial e, especialmente, perante o Egrégio Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, que por diversas vezes já se manifestou no sentido de que a Exceção de Pré-Executividade é meio idôneo para combater a execução fiscal de crédito tributário prescrito, senão vejamos alguns julgados:

APELAÇÃO CÍVEL – EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE À EXECUÇÃO FISCAL – PRELIMINAR – PRESCRIÇÃO – IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO – DILAÇÃO PROBATÓRIA – NÃO-OCORRÊNCIA – APLICAÇÃO DA SÚMULA 106 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA – IMPOSSIBILIDADE – CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL, ARTIGO 174, § 1º, I, – INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO SOMENTE COM A CITAÇÃO PESSOAL FEITA AO DEVEDOR – PETIÇÃO SUSPENDENDO O FEITO – NOTÓRIA DESÍDIA EXEQÜENTE – TRANSCURSO DO LAPSO TEMPORAL DE CINCO ANOS – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO IMPROVIDO. Torna-se importante ressaltar que o fato de se configurar a exceção de pré-executividade como um meio de defesa não regulado expressamente pelo Código de Processo Civil, não obsta sua interposição no intuito de que sejam argüidas matérias de ordem pública ou nulidades absolutas que dispensem, para seu exame, dilação probatória, o que torna evidente que o pedido delineado se mostra juridicamente possível. Transcorrido o lapso temporal de cinco anos entre a constituição definitiva do crédito tributário e a citação pessoal do devedor, é inquestionável a vigência dos efeitos decorrentes do instituto da prescrição, conforme estabelece o inciso I, do § 1º, do artigo 174, do Código Tributário Nacional. (TJMS. Relator: Des. Rêmolo Letteriello. Publicação: 26/11/2004 nº Diário: 933 – 09/11/2004).

Desse modo, protocolada Exceção de Pré-Executividade no processo executivo a qual versa sobre a decretação da prescrição pura do crédito tributário exequendo, que é matéria de ordem pública, e que se pauta pela demonstração ab initio de sua configuração, deve ser admitida, recebida, processada e levada a julgamento para, ao final, decretar a extinção da ação de execução fiscal ora combatida.

Pois bem, após restar demonstrado o cabimento de Exceção de Pré-executividade, convém relembrar o conceito do instituto jurídico da prescrição à luz do ordenamento jurídico brasileiro.         

O profesor Kiyoshi Harada, ao discorrer sobre o tema, assim se manifestou:

A prescrição significa prazo para o exercício do direito. Tem seu fundamento no princípio da segurança jurídica. Visa estabilizar as relações jurídicas. Não convém deixar que o credor fique indefinidamente com a espada de Dâmocles na cabeça do devedor, pois isso poderia afetar suas relações com terceiros que, por sua vez, afetariam inúmeras outras relações jurídicas criando ‘efeito cascata’ a desestabilizar a ordem jurídica. (HARADA, Kiyoshi. Prescrição tributária. Interrupção e suspensão. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1475, 16 jul. 2007.)

O conceito de prescrição aplicado à seara tributária, contudo, reclama maiores esclarecimentos, à medida que se trata de uma construção calcada nas normas jurídicas insculpidas no texto do Código Tributário Nacional. Sobre a prescrição do crédito tributário, assim dispôs o CTN:

Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data de sua constituição definitiva.

Percebe-se, pois, que o instituto da prescrição em matéria tributária é de natureza complexa, à medida que se forma e se apoia na conjugação de outros institutos e elementos de direito tributário, envolvendo o conceito de “crédito tributário”, o “momento em que se dá a sua constituição definitiva”, e, de forma derivada, o instituto do “lançamento”, entre outros.

Oportuno observar o caminho legal fornecido pelo CTN para se chegar à compreensão do instituto da prescrição descrita no art. 174, vejamos:

Art. 139. O crédito tributário decorre da obrigação principal e tem a mesma natureza desta.

Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória.

§ 1°. A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente.

Art. 142. Compete privativamente à autoridade administraiva constituir o crédio tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo o caso, propor a aplicação da penalidade cabível.

Nesse sentido, esclarecedoras são as lições do jurista Ives Gandra da Silva Martins, quando assim se manifestou sobre o tema:

“O lançamento é, portanto, ato final que reconhece a existência da obrigação tributária e constitui o respectivo crédito, vale dizer, cria, no universo administrativo, o direito à exigência da obrigação nascida, no mais das vezes, preteritamente”.

(...)

“se, por inércia ou por qualquer outro motivo, a autoridade administrativa não exercer o dever de lançar, nos prazos estipulados, constituindo o crédio tributário, ou se, uma vez lançado, deixar de executá-lo judicialmnte, também nos prazos definidos no Código Tributário Nacional, terá lugar a punição da inércia, constituídas pelas vedações provocadas pelos institutos da decadência e da prescrição. Tais institutos tem por objetivo, exclusivamente, ofertar segurança maior ao direito (...)”. “Seu escopo é, pois, com clareza, ofertar, de um lado, um prazo temporal suficiente para o exercício do poder fiscalizatório, para o exercício do dever impositivo e, de outro, não permitir que esse prazo ultrapasse o razoável, que não se prolongue ao infinito. Decadência e prescrição punem a desídia, a imperícia, a negligência, a omissão da Administração Pública e garante a segurança jurídica, dando estabilidade às relações entre o Fisco e contribuinte, impedindo que, após determinado prazo, possam ser alcançadas. (Decadência e prescrição / coordenador Ives gandra da Silva martins; conferencista inaugural José carlos moreira Alves. – São paulo: Editora Revista dos Tribunais: Centro de Extensão Universitária, 207. p. 20-21).  

Diante do que se viu, tem-se que o Código Tributário Nacional estabeleceu o prazo de prescrição para a cobrança do crédito tributário em 05 (cinco) anos, contados da sua constituição definitiva, que se dá pelo lançamento.

Estabeleceu, também, no parágrafo único do art. 174, as causas que interrompem esse prazo:

Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva.

Parágrafo único. A prescrição se interrompe:

I - pelo despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal;

II - pelo protesto judicial;

III - por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor;

IV - por qualquer ato inequívoco ainda que extrajudicial, que importe em reconhecimento do débito pelo devedor.

Pois bem, no caso do lançamento de IPTU no âmbito do Município de Campo Grande, MS, nos termos do art. 15, § 2º, da Lei Complementar n. 02/92, considera-se feita a notificação do lançamento 15 dias após a publicação do edital de notificação do lançamento a qual ocorre geralmente no início do ano.

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Assim, por exemplo, se a notificação do lançamento ocorrera em 07/02/2004, o prazo prescricional se iniciou em 24/02/2004 e se findou em 24/02/2009.

Em caso idêntico o TJMS decidiu:

E M E N T A – AGRAVO DE INSTRUMENTO – EXECUÇÃO FISCAL IPTU – INÍCIO DO PRAZO PRESCRICIONAL – LANÇAMENTO 15 DIAS APÓS A PUBLICAÇÃO DO EDITAL DE NOTIFICAÇÃO – RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.

No que se refere ao início da contagem do prazo prescricional, o artigo 174 do Código Nacional Tributário estabelece que a ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco 5 anos, contados da data de sua constituição definitiva. A constituição definitiva do crédito tributário somente ocorrerá quando, depois de lançado o tributo, estiver exaurido o prazo para a apresentação da defesa. Este é o marco inicial da prescrição. A inscrição não é ato de constituição do crédito tributário. Nos termos do art. 15, § 2º, da Lei Complementar n. 02/92, considera-se feita a notificação do lançamento 15 dias após a publicação do edital, de modo que a notificação ocorreu de fato em 06/02/1997. Por outro lado, não foi alegado ou acostado qualquer documento evidenciando a interposição de recurso administrativo, daí que é esta a data deflagradora do prazo prescricional, com término em 07/02/2002. Ajuizada a demanda em 14/11/2002, prescrita pois a pretensão executiva. (Agravo de Instrumento - Nº 0603280-03.2012.8.12.0000 - Campo Grande Relator – Exmo. Sr. Des. Sideni Soncini Pimentel)

Portanto, quanto ao exercício do ano de 2004 referente à cobrança de IPTU, a Execução Fiscal teria que ser proposta até o dia 24/02/2009, de modo que, caso movida após tal data, deve ser extinta a execução com base no art. 156, V, do CTN[2].

Portanto, caso o contribuinte se depare com tal circunstância, deve ele apresentar Exceção de Pré-executividade para o fim de, inicialmente, pedir a suspensão das medidas executivas, que são desnecessárias no curso do julgamento da Exceção de Pré-Executividade e, como pedido principal, requerer a declaração da extinção do crédito tributário inscrito na Dívida Ativa em razão da ocorrência da prescrição do crédito tributário, ante o decurso do prazo superior a 05 (cinco) anos entre a constituição definitiva do crédito e o ajuizamento da ação, devendo a ação de execução fiscal ser extinta, com julgamento de mérito, nos termos do que determina o art. 156, V, do CTN, c.c. o art. 487, II, do CPC.

               


[1] Nesse sentido: DINAMARCO, Cândido Rangel. Execução civil. 5ª ed., São Paulo: Malheiros, 1997, p. 451. 

[2] Art. 156. Extinguem o crédito tributário: (...) V - a prescrição e a decadência;

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Sobre o autor
Thiago Chianca Oliveira

Especialista em Direito Processual Civil e Direito Público (administrativo, ambiental, constitucional e tributário). Advogado, inscrito na OAB/MS. Sócio do Escritório Godoy & Chianca - Advocacia e Consultoria Jurídica, sediado em Campo Grande, MS, com atuação nos ramos do direito agrário, civil e público.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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