1 INTRODUÇÃO
O presente estudo discorre acerca da quantidade de processos em andamento no Poder Judiciário do Estado do Tocantins, cuja tramitação ocorre, em todas as suas fases, de maneira eletrônica com o sistema e-Proc. Relata ainda a evolução dos métodos burocrático e gerencial de administração pública, da necessidade de evolução dos processos de trabalho das escrivanias judiciais.
Este trabalho levanta o seguinte problema: como a reinvenção dos processos de trabalho nas varas do Poder Judiciário Tocantinense pode influenciar na razoável duração do processo?
Com base neste questionamento, este trabalho busca subsídios dentro do contexto da tramitação processual, mais especificamente na evolução dos processos de trabalho interno das escrivanias judiciais, com intuito de elucidar acerca da possibilidade do escrivão judicial se posicionar como supervisor cartorário, bem como da utilização do processo eletrônico para criação de redes de trabalho com aptidão de ultrapassar os limites da competência territorial da Comarca ou Vara, para melhor aproveitamento dos recursos materiais e tempo disponíveis.
Portanto, como objetivo, o presente trabalho estudou sobre a reelaboração dos processos de trabalho dentro das escrivanias em rede, buscando-se relatar procedimentos que, de algum modo, são elementos que contribuem, de modo sinergético, para a celeridade processual e otimização os trabalhos cartorários.
Esta pesquisa justifica-se pelo aumento indiscriminado de processos, bem como pela demora da entrega da prestação jurisdicional, sem um real conhecimento da importância da razoável duração do processo.
Para a realização deste trabalho foi utilizada a pesquisa bibliográfica. A pesquisa bibliográfica é elaborada a partir de material publicado, sejam livros, revistas, artigos científicos, dentre outros. A pesquisa bibliográfica tem “o objetivo de colocar o pesquisador em contato direto com todo material já escrito sobre o assunto da pesquisa” (PRODANOV; FREITAS; 2013, p. 51).
O trabalho está dividido em seções que abordam a necessidade de adaptação dos processos de trabalho do Poder Judiciário, hauridos para a litigância individual e antes da vigente sociedade massificada, para, com isso, ter condições de prestar jurisdição em prazo razoável.
2 A REINVENÇÃO DOS PROCESSOS DE TRABALHO NAS VARAS DO PODER JUDICIÁRIO TOCANTINENSE
O número de conflitos que chegam à alçada do Poder Judiciário nacional é noticiado com intensidade pelos meios de comunicação e pelas pesquisas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), como o “Justiça em Números”.
O total de casos novos somado aos casos pendentes no Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins (TJTO) em 2016 era de 413.681 processos e, em 2015, de 419.263 processos[1]. Desempenho que, entretanto, não permitiu evolução no ranqueamento promovido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O que denota campo propício à inovação.
As já antigas exortações normativas sobre a necessária celeridade da prestação jurisdicional estabelecidas em todo mundo, sobre o paradoxo da justiça tardia, sobre também ser o juiz servidor público e como tal jungido aos princípios da Administração Pública, dentre os quais a eficiência (MEIRELES, 2015) e as tradicionais alternativas para a superação do que corriqueiramente a sociedade denomina de morosidade do Poder Judiciário, como por exemplo: “número de juízes proporcional à efetiva demanda e à população” (CF, art. 93, XII) demandam compreensão à luz dos desafios postos pelos novos horizontes sociais que nos são postos e à natural limitação humana da capacidade de trabalho individual do magistrado.
Jobim (2016) relembra não haver dúvida de que o Direito não é um a priori, mas fenômeno cultural que deve plasmar os valores comunitários e torná-los vigentes. Deve refletir a sociedade, sujeitando-se aos fatos da vida social. Como produto do homem, deve ser compreendido sob o prisma das cambiantes contingências históricas, variáveis no tempo e no espaço. Por isso a necessidade de constante reinvenção.
O processo no Poder Judiciário do Estado do Tocantins é exclusiva e integralmente eletrônico, o que desafia a dar conta, a tempo e modo, das novas e volumosas demandas, decorrentes, consoante Asperti (2014), não propriamente da democratização do acesso à justiça mas, isto sim, do uso deliberadamente exagerado do Poder Judiciário pelos denominados grandes litigantes: poder público, concessionárias de serviço público e instituições financeiras. Confluentes relatórios das Organizações das Nações Unidas (ONU) e do CNJ revelam a recorrência de determinadas classes processuais e de assuntos como, por exemplo: direito do consumidor – responsabilidade do fornecedor/indenização por dano moral e direito civil – obrigações/espécies de contratos.
A prestação jurisdicional, um dos pilares do Estado Democrático de Direito, precisa reinventar-se para “reencontrar a confiança dos cidadãos” (NALINI, 2015). Os mesmos e já trilhados caminhos não conduzirão a resultados diversos.
O Código de Processo Civil (CPC) recém-promulgado deu passos largos nessa direção, por exemplo, senão ao mitigar o formalismo processual quanto estatui o máximo aproveitamento dos atos processuais, ao criar novos institutos, como a cooperação nacional (CPC, art. 67), que estimula pensamento em rede, superador do tradicional isolamento gerencial das unidades judiciárias, seu(s) juiz(es)-gestor(es) e servidor(es)-gestor(es), tudo em prol da célere entrega da prestação jurisdicional.
A modernização dos processos de trabalho - das atividades-meio, compreendidas como atividade de suporte e de preparação à prolação da sentença e/ou do acórdão, momento culminante do processo judicial - é um dos temas mais debatidos no Direito atualmente. A almejada efetividade da prestação jurisdicional depende disso.
Em importante medida o CPC vigente tratou dessa questão, que também deve ser posta com urgência na ordem do dia pelos Tribunais no exercício de sua competência constitucional para organizar suas secretarias e serviços auxiliares, consoante determinam os artigos 96, I, b, 99 e 125, § 1º, todos da Constituição Federal (CF); organização que carreia em si o poder de dispor sobre suas atribuições e deve modificar-se segundo as circunstâncias do Estado e da Sociedade e manter-se atualizada, eficiente e eficaz, sempre orientada à densificação das condições essenciais da justiça e ao interesse social. Em sentido latíssimo, a organização judiciária é o instrumento de realização da justiça, que, como já ressaltado, descaracteriza-se se realizada a destempo.
Necessidade de aperfeiçoamento constante que, nos termos da autonomia administrativa conferida pelo art. 99 da CF e segundo Slaibi Filho (2016), “[...] coaduna-se com a possibilidade de os Tribunais, respeitados os termos concedidos pelo Executivo” e por resolução de seus órgãos administrativos, “[...] até mesmo alterar a organização judiciária [...]” ou instituir, reunir ou extinguir serviços.
Trata-se de realidade apreendida com apenas dois anos de vigência da atual Lei de Organização Judiciária (LOJ), tendo em conta o acréscimo, em 1998, por intermédio da Lei Complementar nº 16, de 13/11/1998, do parágrafo 14 ao artigo 25 da Lei Complementar Estadual nº 10, de 11 de janeiro de 1996 (LOJ), que estabelece a possibilidade de alterar-se a competência das varas e juizados por meio de resolução do Tribunal Pleno para adequá-la à atual realidade dos conflitos.
Necessária adaptação das competências jurisdicionais e das atividades-meio, basta ver a enorme disparidade entre o número de casos novos distribuídos às diversas Varas e Comarcas do Estado e suas diversas taxas de congestionamento, dados reveladores, de um lado, da sobrecarga de trabalho de alguns, com elevação do congestionamento, e subaproveitamento da mão de obra de outros tantos, de outro, da diversidade de metodologias gerenciais na condução dos serviços judiciários.
A tônica segue sendo a razoável duração do processo compreendida, conforme pontuado por Ramos (2014) e preconizado pelo art. 4º do CPC, além do § 8º do art. 6º da Convenção Europeia de Direitos Humanos, como a entrega da prestação jurisdicional em tempo adequado para os interessados, nem rápida, nem lenta, na medida da necessidade de tempo suficiente para o amplo exercício do direito de defesa e observada a complexidade da causa, eventual atividade procrastinatória das partes e do juiz, sem olvidar, é claro, a diversidade de operacionalização das atividades-meio em cada juízo.
As iniciativas adotadas de modo esparso, ou capitaneadas pelo CNJ, são diversas e paradigmáticas:
a) seus mutirões carcerários, de que trata a Lei Federal nº 12.106/2009, notadamente em seu art. 1º, § 1º, II quanto à realização de mutirões para análise judicial de temas específicos: prisão, medida de segurança e internação de adolescente;
b) o planejamento estratégico do referido Conselho, objeto da Resolução nº 194/2014, administrativamente vinculante, quanto à gestão das demandas repetitivas e dos grandes litigantes e à eficiência;
c) o projeto do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará (TJCE), de que trata sua Resolução nº 02, de 02 de novembro de 2013, pelo qual se reuniram as secretarias das Varas de Fazenda Pública da Comarca de Fortaleza e alteram-se as competências desses Juízos;
d) o provimento nº 300, de 05 de novembro de 2013, do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul (TJMS) que instituiu a Central de Processamento Eletrônico de Feitos Judiciais (CPE), com o explícito propósito de “[...] agilizar e aperfeiçoar as atividades jurisdicionais, de modo a possibilitar o aumento do número de processos trabalhados por usuário em comparação com o modelo cartorário tradicional, [...] otimizar a utilização de mão de obras, concentrando a realização de tarefas de todos os cartórios judiciais, de expedição, publicação, registros e outras atividades, com exceção daquelas que exijam atendimento pessoal”;
e) a instituição, pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC), com os mesmos propósitos, do Núcleo de Tramitação Remota na estrutura administrativa da Diretoria-Geral Judiciária, composto pelas divisões de execução fiscal, execução penal, direito bancário, execução cível e cumprimento de sentença e direito penal, que opera mediante a padronização de rotinas procedimentais e textual de atos cartorários e do juiz, viabilizadora da tramitação automatizada;
f) o provimento do Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), nº 2.129/2013 e o provimento conjunto nº 1/2014 instituidoras das Unidades de Processamento Judicial, pelas quais se reúnem os serviços judiciais de três a cinco varas da mesma competência com intenção de adaptação das atividades-meio do Poder Judiciário à nova realidade do processo eletrônico dentre tantas outras.
Tudo a revelar o despertar do Poder Judiciário à agregação de uma visão de atacado, de escala, à tradicional percepção varejista das demandas postas sob sua apreciação. Em síntese, à necessidade de gestão.
3 EVOLUÇÃO DA GESTÃO
A modernização da administração pública teve intuito de seguir as transformações do mundo contemporâneo, com vistas a engrenar a máquina estatal para atender aos anseios da sociedade de forma célere e eficaz.
Em 2004, foi acrescentado o inciso LXXVIII ao art. 5º na Constituição Federal pela Emenda Constitucional nº 45, onde reza que todos têm o direito a uma razoável duração do processo.
A administração burocrática surgiu no século XIX, onde até então se via no Brasil uma administração puramente patrimonialista:
Característica principal, o de maior relevância econômica e cultural, será a do predomínio, junto ao foco superior de poder, do quadro administrativo, o estamento que, de aristocrático, se burocratiza progressivamente, em mudança de acomodação não estrutural. O domínio tradicional se configura no patrimonialismo, quando aparece o estado-maior de comando do chefe, junto à casa real, que se estende sobre o largo território, subordinando muitas unidades políticas. (FAORO, 1995, p.35)
Somente na era de Getúlio Vargas é que a administração burocrática chegou ao Brasil e foi alvo de duras críticas por ser considerada morosa e ineficiente. No entanto, apesar das críticas, representou grande avanço para a época. Max Weber (1997) descreve na sociologia as características que proporcionam, dentre outras vantagens, maior intensidade e extensão no serviço público, precisão, continuidade, disciplina, rigor, confiança, e calculabilidade para o governante e para os cidadãos, baseadas no mérito profissional.
A administração pública burocrática substituiu a administração patrimonialista, a qual determinou as monarquias absolutas, onde se confundiam patrimônio público e privado. Na administração patrimonialista, o Estado era propriedade do rei e o preceito eram o nepotismo, empreguismo, corrupção. Porém, esse modelo de administração seria incompatível com o capitalismo industrial bem como as democracias parlamentares, as quais surgem no século XIX, porque é vital para o capitalismo que haja separação entre o Estado e o mercado. Assim, era cogente que houvesse uma administração que pudesse diferenciar o público e o privado e separar o político e o administrador público, surgindo então, a administração burocrática moderna (PEREIRA, 1996).
O mencionado autor cita que:
A administração pública burocrática clássica foi adotada porque era uma alternativa muito superior à administração patrimonialista do Estado. Entretanto o pressuposto de eficiência em que se baseava não se revelou real. No momento em que o pequeno Estado liberal do século XIX deu definitivamente lugar ao grande Estado social e econômico do século XX, verificou-se que não garantia nem rapidez, nem boa qualidade nem custo baixo para os serviços prestados ao público. Na verdade, a administração burocrática é lenta, cara, auto-referida, pouco ou nada orientada para o atendimento das demandas dos cidadãos. (PEREIRA, 1996, P.5)
Tendo em vista as circunstâncias políticas, sociais e econômicas do Brasil, a administração pública burocrática entrou em crise, uma vez que não conseguiu se manter pelos entraves decorrentes do próprio modelo, como a morosidade no atendimento, prestação de serviço público cara, dentre tantos outros fatores. Então, um novo modelo de administração pública surge, na esperança de corrigir esses erros, que é a administração pública gerencial.
Pereira (1996, p. 6) discorre que:
A primeira tentativa de reforma gerencial da administração pública brasileira, entretanto, irá acontecer no final dos anos 60, através do Decreto-Lei 200, de 1967, sob o comando de Amaral Peixoto e a inspiração de Hélio Beltrão, que iria ser o pioneiro das novas ideias no Brasil.
Essa reforma foi uma tentativa de superar a rigidez da administração burocrática, e foi considerada o primeiro momento da administração gerencial no Brasil, com ênfase na descentralização mediante a autonomia da administração indireta. (PEREIRA, 1996)
Em 1995, a reforma gerencial vem à tona, com objetivo de acabar com as práticas patrimonialistas do antigo modelo de administração pública, tendo como base os princípios da nova gestão pública. Essa forma trouxe mudanças para a sociedade, ao invés de mudanças institucionais. (PEREIRA, 1996).
Com o passar dos tempos, a nova administração pública foi se delineando com a descentralização político-administrativa e organizações com poucos níveis hierárquicos ao invés de piramidal; no lugar da desconfiança total, confiança limitada; controle por resultados dos processos administrativos e uma administração voltada para o atendimento do cidadão. (PEREIRA, 1996).
Acrescenta ainda que:
A modernização ou o aumento da eficiência da administração pública será o resultado a médio prazo de um complexo projeto de reforma, através do qual se buscará a um só tempo fortalecer a administração pública direta ou o “núcleo estratégico do Estado”, e descentralizar a administração pública através da implantação de “agências autônomas” e de “organizações sociais” controladas por contratos de gestão. (PEREIRA, 1996, p. 18).
Quatro setores dentro do Estado são base para a proposta de reforma: o núcleo estratégico do Estado, as atividades exclusivas de Estado, os serviços não-exclusivos ou competitivos, e a produção de bens e serviços para o mercado (PEREIRA, 1996).
O modelo de administração pública gerencial, plenamente aplicável ao Poder Judiciário, tem como referência o modelo de administração utilizado pelo setor privado (MATIAS-PEREIRA, 2012), caracterizado, em suma, pela descentralização das decisões e funções do Estado, pela já mencionada autonomia na gestão de recursos humanos, materiais e financeiros; ênfase na qualidade e na produtividade do serviço público; orientação para resultados e para clientes (cliente-cidadão); minimização de custos e redução dos controles das atividades-meio. Isso porque no modelo weberiano, prioriza-se o controle dos processos, partindo-se do valor primordial de prevenção da corrupção.
Na administração pública gerencial, priorizam-se desempenho e implicações, que podem ser controlados a posteriori, sem abrir mão da legalidade durante os processos, partindo-se da primazia da eficiência. Assim, tem-se metas, indicadores de atuação e efeitos previamente planejados e depois controlados ao longo dos processos, com ênfase no controle dos resultados, e não no controle dos processos como fins em si mesmos, essa última característica típica do modelo burocrático (FIGUEIREDO, 2014).
4 O PROJETO ESCRIVANIAS EM REDE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO TOCANTINS (TJTO)
Com esteio nessas premissas e instado a agir também pela recente promulgação de um novo CPC, novas iniciativas tem sido adotadas com o resultado almejado de promover atividade processual satisfativa (CPC art. 4º) com celeridade, mas sem descaracterizar o processo ou suprimir as garantias historicamente construídas. O que, sem perder de vistas as fundamentais limitações orçamentárias e de pessoal, afigura-se possível fazer mediante a reorganização dos serviços e dos processos de trabalho.
O apuramento tecnológico, notadamente no jovem Estado do Tocantins - e por isso mais permeável às necessárias inovações - em que o processo judicial é inteiramente eletrônico e desenvolvido sem custos adicionais por equipe técnica do próprio TJTO, deve ser posto no vértice das análises, porquanto possibilita soluções novas para questões do emprego de métodos anacrônicos de trabalho, na medida em que possibilita o encurtamento de distâncias, facilitando a comunicação e com isso a troca de experiências, a supressão de burocracias desnecessárias de organização etc.
Nessas constatações e cioso do necessário pensamento sistêmico, no aprendizado organizacional, e na criação de uma cultura de inovação, vem se desenvolvendo atualmente projetos pilotos para unificação de escrivanias e a interligação das Comarcas cujas escrivanias estejam assim reunidas.
A Secretaria das Varas Criminais (SECRIM), criada pela Resolução nº 7, de 23 de abril de 2015[2], pela qual foram reunidas as escrivanias da 1ª, 2ª e 3ª Varas Criminais da Comarca de Palmas, cuja instalação ocorreu em 29 de abril de 2015, conforme a Portaria nº 1616, de 28 de abril de 2015[3], bem como a Contadorias Judiciais Unificadas (COJUN), foram experiências exitosas quanto ao aproveitamento dos recursos humanos disponíveis, à celeridade no cumprimento das diligências, ao compartilhamento de conhecimentos entre os servidores, decisivo para redução do retrabalho e, ainda, à padronização das rotinas de trabalho.
Outras experiências piloto estão sendo pensadas, como a unificação das escrivanias da Comarca de Dianópolis, nas quais a reunião, ao que tudo indica, dar-se-á independentemente da competência dos respectivos Juízos (Cível, Criminal e Juizado Especial).
Todas essas experiências, entretanto, sujeitam-se à mesma observação: se por um lado têm a relevantíssima virtude de aproveitar melhor os recursos humanos disponíveis - necessária porque, como já dito, a organização judiciária do Poder Judiciário Tocantinense não mais atende ao fluxo das demandas que acodem às diversas Comarcas e Varas de maneira desigual -, por outro, insistem na sistemática de não centralizar a gestão judiciária (métodos de trabalho) e jurisdicional, com o que não se aproveita integralmente o potencial redutor de distâncias e de padronização de rotinas de trabalho que os recursos informáticos, dentre os quais o processo eletrônico, permitem.
O processo eletrônico permite que essa atividade seja desempenhada com dedicação especializada e exclusiva, além de uniformidade em diversas comarcas - senão em todas. Com evidentes ganhos em efetividade e transparência, fundamental para substituir os controles burocráticos por controles sociais. Mais que isso, reduzindo o efeito loteria a que se submete o jurisdicionado ao aforar sua pretensão e torcer para que a distribuição lhe contemple com magistrado mais afeito às atividades gerenciais.
Um avanço possível, sem alteração legislativa, sem necessidade do decurso do longo tempo necessário à alteração cultural a respeito da compreensão dos papéis institucionais e sem aumento de despesa - ou com reduzido investimento em ações de treinamento - é a ressignificação do papel institucional do escrivão (FIGUEIREDO, 2014)
A postura profissional e o compromisso institucional do escrivão, aliadas a diversas outras iniciativas em curso, são fundamentais para a moderna, eficaz e eficiente gestão da Vara.
É fundamental a implementação do processo de delegação, consoante limitações inerentes à multiplicidade de encargos da atividade jurisdicional; delegação em certa medida recomendada pela moderna gestão gerencial que deve ser encampada, a exemplo do disposto no art. 203 do CPC (SLAIBI FILHO, 2016).
É fundamental a parceria entre magistrado e escrivão para o sucesso da gestão judiciária e do atendimento ao direito humano fundamental à célere entrega da atividade jurisdicional satisfativa.
Esse raciocínio converge a uma efetividade e sob fiscalização da Corregedoria-Geral de Justiça (CGJUS), na adaptação dos fluxos processuais e das rotinas de trabalho, com padronização de rotinas e de expedientes.
O escrivão, ou diretor de secretaria ou o coordenador das escrivanias unificadas, ou das escrivanias em rede, deve atuar com atenção ao planejamento estratégico institucional e como gerente da unidade. Pessoa que pensa os fluxos processuais e de trabalho analisando de forma autônoma, mas limitado e fiscalizado pela CGJUS, pois sua atividade será determinante para a fluidez do trâmite processual e dos processos de trabalho e à supressão de etapas mortas e de paralisação indevida do processo.
Deve desempenhar objetivos claramente estabelecidos de coordenação do fluxo dos trabalhos e dos escreventes, estagiários e voluntários lotados na unidade, com vistas à correta e célere sucessão de atos processuais, com mínima intervenção do juiz, ao qual possibilitará conferir maior foco a atividade precípua: decidir e julgar.
O gerente deve, precipuamente (FIGUEIREDO, 2014), treinar seus colaboradores, atuar na correção dos equívocos e no aperfeiçoamento dos processos de trabalho e colaborar com o planejamento estratégico, conduzindo as melhorias necessárias.
Assim deve ser tanto na escrivania de uma comarca de 1ª instância como na coordenação das escrivanias unificadas ou em rede que se tem instalado, sob pena de unificar-se apenas formalmente os trabalhos, mantendo-se sob o crivo do juiz o acompanhamento, o treinamento, a fiscalização e o controle de atividades que, em tese, não necessariamente favorecem sua unidade jurisdicional, na medida em que o trabalho será remoto.
5. UNIFICAÇÃO DAS ESCRIVANIAS
O CNJ tem como uma das diretrizes a valorização da primeira instância do Poder Judiciário com desenvolvimento de ações que impulsionam os feitos no primeiro grau de jurisdição.
Em 2013, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul teve a iniciativa pioneira a criação de um modelo de cartório que centraliza o atendimento a diversas varas, conseguiu dar agilidade ao trâmite processual com o denominado “Cartório do Futuro”.
Essa prática conhecida como Cartório do Futuro recebeu o nome oficial de Central de Processamento Eletrônico (CPE), que serviu de inspiração para outros Estados no Brasil, como Ceará, Santa Catarina, São Paulo e consiste em uma central que reúne servidores responsáveis por atender a diversas varas, o que acarreta em uma diminuição do número de processos por unidade.
A CPE atende a 26 varas do Juizado Especial Adjunto, 21 de Execução Penal, 03 de Violência Doméstica, 01 de Execução Fiscal Municipal e 01 de Crime Residual e a divisão dos processos é feita por coordenadorias. Uma parte dos funcionários que trabalham no Cartório do Futuro é transferida de outros setores e outra é admitida por meio da abertura de novos concursos. No total são 150 postos de trabalho, cada funcionário atende de duas a três Varas e a Central funciona em dois turnos, de manhã e à tarde.
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), que é considerado um dos maiores Tribunais, também aderiu, em novembro de 2014, ao Cartório do Futuro, inaugurado no Fórum João Mendes, em São Paulo (SP), com nome oficial de Unidade de Processamento Judicial (UPJ), o qual reuniu um acervo de 18 mil processos e redistribuiu os servidores de cinco varas cíveis, da 41a à 45a, do Foro Central, em um cartório unificado e organizou equipes em 10 gabinetes de magistrados.
As atividades da UPJ foram divididas por equipes: uma nos gabinetes, a qual elabora minutas de despachos, decisões e sentenças; outra na movimentação processual e outra para atendimento ao público.
No modelo de cartórios tradicionais, os serventuários interrompem suas atividades constantemente para atendimento ao público externo e telefone. Já no Cartório do Futuro esses empecilhos não ocorre, posto que os servidores responsáveis pela movimentação processual são isolados da área de atendimento, evitando distrações e aumentando a celeridade dos atos. O Cartório do Futuro é uma nova forma de gerir pessoas, processos de trabalho, espaço físico, acervo e orçamento[4].
6. CONCLUSÃO
O direito é fenômeno social, não possui significação apriorística. Deve, portanto, adaptar-se ao tempo e ao contexto da comunidade cujas relações pretende reger, o que faz com o propósito de viabilizar a realização da personalidade de cada um.
Nesse cenário, o aperfeiçoamento das atividades-meio necessárias à preparação dos processos judiciais ao julgamento das demandas é, ao lado de outras reformas que se tem feito no sistema de justiça, fundamental para realização do direito humano fundamental a julgamento em prazo razoável, característica essencial do processo justo, da efetividade da Justiça.
A sociedade tecnológica e da informação rompeu as fronteiras territoriais tradicionais em medida direta da iteração que viabiliza e à qual cada vez mais estamos acostumados. Ao que se alia, no Poder Judiciário do Estado do Tocantins, o processo integralmente eletrônico, a exigirem releitura dos processos de trabalho para adequarem-se não apenas ao constante fluxo de informações e às interações cada vez mais rápidas – o que altera a percepção comum sobre a passagem do tempo e, consequentemente, sobre a utilidade do produto da jurisdição: a sentença –, como também à racionalização dos recursos humanos e materiais disponíveis.
A modelagem tradicional das atividades-meio tem se revelado insuficiente para o julgamento das demandas em tempo razoável: há setores sobrecarregados e outros tantos subaproveitados, dentre outras razões, porque o volume da demanda alterou-se desde a concepção e a instalação dessas estruturas, bem como em face da corriqueira sazonalidade de certas demandas, como as relacionadas aos impactos sociais e econômicos de barragens edificadas no Estado do Tocantins em passado recente, ou mesmo ações relacionadas a benefícios previdenciários ou a questões de Direito do Consumidor.
Assim, tendo analisado a evolução da administração burocrática à gerencial e pontualmente as possibilidades de trabalho remoto mediante o processo eletrônico e a internet, concluir-se que uma das chaves para a continuidade do processo de descongestionamento vivido atualmente no Poder Judiciário estadual é a correção da prática do trabalho dos escrivães, supervisores do trabalho da equipe disponível e somente nesta medida eficiente auxiliar da justiça. Prática que pode ser aliada à formação de redes de trabalho entre as diversas Comarcas ou Varas do Estado como forma de otimizar o uso dos meios disponíveis.
REFERÊNCIAS
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FAORO, Raymundo. Os donos do poder. 11ª ed., São Paulo: Globo, v.2, 1995.
JOBIM, Marco Félix. Cultura, escolas e fases metodológicas do processo. 3ª ed. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2016.
MEIRELES, Edilton. Cooperação judiciária nacional. Revista de Processo, São Paulo, v. 249, p. 59-80, novembro 2015.
NALINI, José Renato. A rebelião da toga. 3ª ed. São Paulo: RT, 2015.
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PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. Estado, Sociedade Civil e Legitimidade burocrática. Lua Nova – Revista de Cultura e Política, nº. 36, 1995: 85 – 104.
PRODANOV, Cleber Cristiano Freitas, Ernani Cesar de. Metodologia do trabalho científico [recurso eletrônico]: métodos e técnicas da pesquisa e do trabalho acadêmico - 2. ed. – Novo Hamburgo: Feevale, 2013.
RAMOS, André de Carvalho. Curso de direitos humanos. São Paulo: Saraiva, 2014.
SLAIBI FILHO, Nagib. Magistratura e gestão judiciária. São Paulo: Forense, 2016.
WEBER, Max. Economia y sociedad. Trad. José Medina Echavarría et. al. 11 reimpresión. Mexico: Fondo de Cultura Económica, 1997. 1245 p.
[1] Sítio do CNJ. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/pj-justica-em-numeros>. Acesso em 26/03/2017.
[2] Resolução nº 7, de 23 de abril de 2015. Publicada no Diário da Justiça nº 3563. Disponível em: <http://wwa.tjto.jus.br/diario/diariopublicado/2387.pdf>. Acesso em: 28 de março de 2017.
[3] Portaria nº 1616, de 28 de abril de 2015. Publicada no Diário da Justiça nº 3567. Disponível em: <http://wwa.tjto.jus.br/diario/diariopublicado/2391.pdf>. Acesso em: 28 de março de 2017.
[4] Balardim, Graziela. Cartório do futuro: modelo já é utilizado pela maior corte do planeta. Disponível em: <http://www.sajdigital.com.br/tribunal-de-justica/cartorio-do-futuro-sao-paulo/>. Acesso em: 27 de fevereiro de 2017